REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11123056
Vanderlei Fernandes Barreto1
RESUMO
Este artigo tem como premissa básica, debater o Serviço Social pautado na interdisciplinaridade e, enquanto profissão, sua presença nos ditames que norteiam a questão social acerca da educação. Neste cenário, não há como negar que a sociedade brasileira vive certamente com profundas desigualdades sociais e, nesse cenário, a educação em seus diversos níveis, realiza a priori um projeto de desenvolvimento social, pois o ato de educar transfigura imagens, artes, culturas além das relações intrapessoais que desenvolve o educando e, certamente, à prática do educador. O Serviço Social está inserido na educação e, em especial, com o olhar que possibilita criar pontes dialógicas entre as desigualdades sociais como o acesso ao ensino público e, este, desestruturado por meio de políticas públicas ineficazes e às escolas particulares que a priori podem apresentar melhores estruturas organizacional para a educação. Contudo, o Serviço Social preconiza que, se a escola pública é um direito do cidadão, a escola privada apresenta o acesso ou a falta dele em detrimento do capital, que separa e confunde a educação como moeda de troca e o imaginário educacional democrático e livre a todos indistintamente. De outro lado o imaginário enquanto processo social histórico é apresentado na discussão, pois nortear questão social é criar pontes dialógicas com o ser humano frente às dimensões da educação e, portanto, a Escola tem papel preponderante neste cenário.
INTRODUÇÃO
Ao criarmos uma ponte dialógica interdisciplinar entre Serviço Social e as prerrogativas da questão social sob o olhar da Educação inclusiva, podemos perceber o sujeito em estado de vulnerabilidade enquanto ser humano que para ter uma vida digna, deve a priori, ter acesso à: Educação, trabalho, lazer, alimentação, moradia, transporte público, saúde, segurança entre outros direitos, mas no processo contraditório contemporâneo, tais indicadores de políticas públicas se mostram ineficazes.
Nessa perspectiva, a compreensão do imaginário social se faz presente, ao estudarmos a Escola no século XXI, e que a mesma tenha comprometimento com sua missão pois ela encontra-se no processo de transformação frente à sociedade do conhecimento, e não só em relação às expectativas pedagógicas, mas com a formação de seres humanizados que estão inseridos na sociedade enquanto cidadãos.
A Escola está preocupada com a realidade concreta e cria novos paradigmas interdisciplinares, unindo ensino, pesquisa, em um novo contexto de ser escola. A produção e divulgação do conhecimento propiciam uma ponte dialógica entre professor e aluno, e o papel do professor é o de orientador das atividades que permitirão ao aluno compreender seu papel ativo no processo de ensinoaprendizagem.
Por outro lado, o docente também poderá ser o motivador e incentivador do desenvolvimento de seus alunos perante o corpo social na sociedade, este entendido como uma rede de relacionamentos sociais na sociedade, como afirma Penteado (2001, p.17) “Fundamental é considerar que o perfil do professor não se constrói no vácuo, mas na relação professor/aluno”.
Notadamente, a Escola é o campo de pesquisa para experiências democráticas e pluralistas na sociedade em que atua, transformando-se os objetivos e as metas em ações mais apropriadas para a aprendizagem. Portanto, a escola tem que consolidar o projeto pedagógico e ao mesmo tempo interagir na autonomia dentro do processo de socialização com satisfação; com isso, a autonomia torna-se um vínculo para estimular o discente por meio de novas práticas educativas.
Educação como direito do cidadão brasileiro
Contudo, ao conceber a Educação como direito do cidadão brasileiro, o acesso à mesma demonstra a marca da desigualdade brasileira. Nesse aspecto, o ser humano para ter uma vida digna, deve a priori, ter acesso à: Educação, trabalho, lazer, alimentação, moradia, transporte público, saúde, segurança entre outros direitos.
A realidade histórica brasileira e contemporânea demonstra fatos reais e distintos desse cenário caracterizado pela falácia apregoada pelos políticos acerca dos Direitos do cidadão, como a Educação de nível superior.
Ao criarmos uma ponte dialógica entre as prerrogativas da questão social sob o olhar da Educação inclusiva, que na verdade, é excludente para muitos, há de fato um abismo intransponível entre o que de fato “é” e o quê “deveria ser” a educação no Brasil.
Notadamente há problemas recorrentes com a Educação de nível superior, pois o acesso do aluno a este tipo de ensino mostra-se excludente ao considerarmos a mensalidade configurada no acesso e permanência dos alunos em Universidades particulares de ponta. De outro lado, não há como negar que em nossa contemporaneidade, pensar em questão social, é remeter a relação desigual entre capital e trabalho e, neste cenário, se faz necessário refletir acerca da correta distinção entre sujeito e objeto de intervenção que se consubstancia nos indicadores de vulnerabilidade do acesso à educação entre outras políticas pública.
Nesta situação, atuar e pensar nesses atores, é nortear pensamento para o acolhimento, respeito, a moral, assim como não julgar e acima de tudo propiciar condições em que haja possibilidade pela busca constante da garantia de acesso aos direitos sociais desses atores que necessitam da intervenção profissional do Serviço Social, que notadamente além de fundamental, é humano na perspectiva do atendimento à questão social e, esta, no olhar de Iamamoto é compreendida como:
A Questão Social pode ser definida como: o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho tornase mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos se mantém privada, monopolizada por uma parte da sociedade. (IAMAMOTO, 2003, p. 27)
De outro lado, o contexto social, a região geográfica constituída como periferia em que os alunos estão inseridos, é de fato considerada como aspectos relevantes no processo de uma Educação excludente.
A Educação no Ensino Superior
A educação no ensino superior nas instituições particulares e, em especial, nas regiões periféricas da cidade de São Paulo, passa por profundas alterações. Seja pela questão governamental reduzindo o financiamento estudantil, ou pela falta de recursos oriundos do próprio estudante, que deixa a universidade devido ao alto custo das mensalidades, considerando que a educação pública não atende a todos e, em especial, ao público de baixa renda.
Ao Estado nesse cenário, apregoa-se “Portanto do ponto de vista liberal, a educação pública a cargo do Estado é a regra. A iniciativa privada em matéria de ensino constitui, pois, exceção” (SAVIANNI, 1992, p.19).
Do texto de Demerval Savianni, coaduna-se a ideia de que o ensino particular portanto é destinado às elites, e o papel do Estado na relação do capital, apresentase na fala de Mascaro (2013,p.19) “[…] o estado é um derivado necessário da própria reprodução capitalista; essas relações ensejam sua constituição ou sua formação”.
Diante deste cenário, é razoável conceber que a questão econômica é prerrogativa fundamental nessa relação e, portanto, as diferenças sociais denotam o grau das desigualdades dos alunos de periferia, bem como seu acesso ao nível superior.
A educação inclusiva nessa abordagem econômica redunda no direito à educação, porém, esta, nas IES particulares é mercadoria que se estabelece preço, e, este valor, mensura a capacidade do aluno de inserção na academia. Portanto, o direito é relativo a quem pode pagar e não de quem necessita, pois conforme Marx (1996, p.165-166), “os valores-de-uso só se realizam pelo uso ou pelo consumo. Constitui o conteúdo material da riqueza, qualquer que seja a forma social dessa riqueza”.
Depreende-se que somos todos mercadorias balizadas pelo poder de consumo, de compra, de acumulação de riqueza. Isto é inclusão ou exclusão no espaço acadêmico, Netto (1986, p.17), retrata “[…] como a sociedade burguesa se funda na exploração e na opressão da maioria pela minoria […]”.
Entrementes, esse cenário, apresenta o porquê das IES particulares manterem uma educação bancária embasadas na premissa de Paulo Freire. Pois é mais fácil criar indivíduos robóticos que apenas memorizem o conteúdo, em detrimento de seres pensantes e cônscios de seus direitos.
É razoável conceber dessa assertiva que de fato é mais fácil gerenciar pessoas que não tenham interesse em reivindicar melhor qualidade no ensino, até por que, os discentes não sabem, ou tem dificuldade na avaliação da qualidade das Instituições de Ensino Superior.
De outro lado, no processo de avaliação, alguns docentes não estão preparados para atender alunos excluídos pela sociedade, à margem de um sistema que não propicia políticas sociais de inclusão, como se observa nas regiões mais afastadas do centro da cidade de São Paulo.
Estes alunos devem a priori, receber acolhimento necessário, pois o poder sobre os mesmos no olhar de subserviência ou incapacidade intelectual é progressivo quando são estigmatizados diante de suas realidades socioeconômicas e epistemológicas.
Ao realizar avaliações, provas ou quaisquer instrumentos de controle sem, contudo, desqualificar o aluno, conforme percebemos “As mudanças em relação à avaliação talvez sejam as mais difíceis de serem realizadas pelos atores educacionais, porque envolvem relações de poder e de controle e por se realizar de maneira formal e informal” (JACOMINI, 2010, p.64). Neste texto, a professora e pesquisadora Márcia Aparecida Jacomini, instiga a pensarmos de forma diferenciada o processo de avaliação, pois essa relação de poder pode, em certo aspecto, provocar no aluno, sentimento de desmotivação a ponto de abandonar seus estudos.
Nota-se que, o processo de avaliação pode circunscrever um processo desigual, como assevera Philippe Perrenoud (1999, p.14) “A escola conformou-se com as desigualdades de êxito por tanto tempo quanto elas pareciam na ordem das coisas”. Depreende-se que a formação dos alunos dependia nesse olhar, do interesse individual do discente, não havia, portanto, preocupação com o desnível social ou cognitivo.
Adorno (1995), por sua vez, esclarece que também quando o papel dos docentes no contato com provas de competência em concursos, estes professores sentem apreensão sobre o processo de avaliação e, até mesmo, “incompreensão de seu sentido”, percebemos que o debate acerca do processo de avaliação ocorre em várias dimensões – Professor e aluno.
De outro lado, o Estado segue inoperante e desinteressado frente às necessidades de comunidades periféricas, sem qualquer acesso as políticas sociais, ou enfrentamento das desigualdades sociais, como se percebe na assertiva de Maria Carmelita Yazbek (2006, p.35) “Sabemos que a política social no Brasil tem funcionado ambiguamente na perspectiva de acomodação das relações entre Estado e a sociedade civil […] a intervenção do Estado vem se revelando inoperante e incapaz […]”.
Outro olhar nesse cenário é consubstanciado por José Paulo Netto (2011), demonstrando como o Estado de forma a preservar aspectos continuístas da Ditadura, mostra-se ainda nos tempos atuais, forte impactando nas universidades, estas, segundo o autor, apresentam aspectos burocráticos, disfuncional, cuja base não há como perceber sua própria identidade.
A Educação inclusiva faz-se entre ambas as partes envolvidas no processo de formação, seja no olhar do professor ou do aluno quando há um crescimento das pessoas, abertura para o diálogo franco onde existam portas abertas para quem educa e para quem é educado.
A interação entre a realidade de inclusão de alunos a margem da sociedade e como são tratadas as prerrogativas de avaliação, reafirmam as perspectivas apontadas tanto em Paulo Freire quanto Adorno.
Não existe educação sem que ela seja uma comunicação transversal, passando por diversos aspectos do próprio conhecimento, como a história de vida.
Sara Paín (1999, p.89), nos elucida “quando consideramos os dois processos como provenientes de uma mesma estrutura”. De outro lado, temos a ótica de olhares diversos sobre o mesmo contexto, e sob outra perspectiva, Milton Santos (2002, p.24) ressalta sobre as questões demográficas que vivem aqueles sob condições de vulnerabilidade “Não há pacto social sem pacto territorial concomitante, mesmo que este não venha explicitado”, ou seja, aspectos relacionados aos espaços geográficos e periféricos contribuem para a devida compreensão dos sujeitos que vivem sob condições precárias e tentam acesso ao ensino superior.
A educação seria uma instância exterior da sociedade, isto é, de fora ela contribui para o ordenamento e equilíbrio permanentes. Se a educação tem por finalidade a adaptação do indivíduo na sociedade e também reforçar os laços sociais e promover a integração de todos no corpo social, pode-se depreender que a educação assume a autonomia, na medida em que configura e mantém a conformação desse corpo social, considerando que a educação pode ser transformadora em nossa sociedade, como preconiza “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda” (FREIRE, 2015, p. 77), ou seja, sem educação, não há como identificar uma sociedade justa, que atinja todo o tecido da relação social.
Ao considerarmos essa análise de ressignificação, ou seja, da necessidade de formar alunos críticos e socialmente responsáveis, sendo a escola um espaço dialógico para tal formação, pois no que concerne ao papel do docente, este, deverá possuir formação diferenciada sob diversos aspectos da Função-educador e, humanizados como assevera o Prof. Alexandre Filordi de Carvalho (2014).
O desafio é possibilitar que cada indivíduo possa construir sua própria identidade complexa, incluindo-o dentro de vários setores tais como: político, religioso, artístico, econômico, familiar etc., pertencendo a uma pluralidade e não apenas a um eixo que exclui e domina. A escola deve funcionar como instrumento da sociedade, conduzindo não só a aprendizagem do saber, mas também do saber comportar-se como cidadão.
Dessa forma, a educação não será mecanicamente reprodutivista tecnicista ocupando cada vez mais as questões sobre as carências da sociedade e ampliando suas responsabilidades para além do ensino acadêmico.
Neste aspecto, evidencia-se que o processo de ensino aprendizagem não pode ser estanque, ao contrário, trata-se de um olhar diferenciado e constante, como afirma Freire (1979, p.35): “a educação tem caráter permanente, não há seres educados e não educados, estamos todos nos educando.”
Nessa perspectiva, cabe ressaltar que a questão social é oriunda das mazelas, desrespeito aos direitos do cidadão, bem como da corrupção avassaladora que aflige o Brasil há muitos anos e notadamente em todos os tipos de poder, seja de direita ou de esquerda.
Se no século XIX, Karl Marx (1818 – 1883), já alertava para o fato do homem ser balizado como mercadoria pelo capital, a questão social está intrinsecamente relacionada com políticas sociais e na relação decorrente da mesma acerca da produção e riqueza frente às recorrentes situações de pauperização da classe social desfavorecida e não incluída na elite capitalista, apesar da primeira manter a segunda, como se percebe na afirmativa de Lara e Maranhão (2019, p.44):
Podemos perceber que a chamada questão social situa-se visceralmente no interior das relações sociais de produção capitalista […] A questão social, aloja-se, portanto, na lei geral da acumulação capitalista, pois, quanto maior a riqueza social e o capital tornado potência social e produtiva dominante, maior é a pobreza que atinge o conjunto da população trabalhadora.
Diante do exposto, é compreensível notar que a questão social não é um tema apreciado por aqueles que acreditam que o Brasil em 2020 está em grande expansão econômica, social e política.
Essas pessoas, ao contrário do que possa parecer, têm plena consciência de que a desigualdade social é abismal.
Não há como negar que vivemos sob a égide de um capitalismo fundamentado sob princípios que privilegiam elites políticas, religiosas, esta, inclusive pode em certo aspecto configurar o olhar do capitalismo, como assevera Walter Benjamin (2013, p.21):
O capitalismo deve ser visto como uma religião, isto é, o capitalismo está essencialmente a serviço das mesmas preocupações, aflições inquietações a que outrora as assim chamadas religiões quiseram oferecer resposta. A demonstração da estrutura religiosa do capitalismo, que não é só uma formação condicionada pela religião, como pensou Weber, mas um fenômeno essencialmente religioso nos levaria ainda hoje a desviar para uma polêmica generalizada e desmedida. Não temos como puxar a rede dentro da qual nos encontramos.
Nota-se que segundo esse autor, o capitalismo tem uma fundamentação muito mais arraigada em nossa sociedade do que meramente possa transparecer para o incauto.
Não se trata apenas do poder de compra, de possuir bens. O capitalismo enquanto religião envolve vários aspectos, de ordem cultural, social e até mesmo psicológica, pois considerar indivíduos de baixa renda, que não tiveram acesso às necessidades básicas para sua sobrevivência, certamente não estão inseridos no rol de profissionais cujas carreiras e salários proporcionam bem estar para suas famílias, bem como pertencentes à elite de universidades, enfim, vencedores segundo o olhar do capitalismo.
Indivíduos fora desses grupos vivem à margem da sociedade e configuram o imaginário social para alguns e realidade para outros. Nesse cenário, Laplatine e Trindade (1997, p.27) afirmam: “O processo do imaginário constitui-se da relação entre o sujeito e o objeto que percorre desde o real, que aparece ao sujeito figurado em imagens, até representação possível do real.”
Ao analisarmos essas categorias acerca do acesso à educação, é possível depreender do imaginário em relação não somente a um indivíduo, mas também sobre a sociedade em que o mesmo está inserido, expresso no conjunto de suas obras e crenças. (WUNENBURGER, 2007, p.7). Evidencia-se, portanto, que o imaginário atua em linha tênue entre o real e o simbólico
Por meio dessa perspectiva, é possível compreender a análise da educação inclusiva e atores que dela fazem parte. Refletir sobre tais premissas do universo acadêmico em detrimento da experiência cotidiana dos discentes, bem como do mundo real – espaço escolar – que os cerca, tais como homossexualidade, diferenças de classes, violência e drogas.
O que deveria ocorrer no espaço escolar, em outra perspectiva, embasa o olhar de Moacir Gadotti (2010, p.15):
Na sociedade da informação, o papel social da escola foi consideravelmente ampliado. É uma escola presente na cidade, no município, criando novos conhecimentos, relações sociais e humanas, sem abrir mão do conhecimento historicamente produzido pela humanidade, uma escola científica e transformadora.
Outro aspecto a ser considerado, norteia a Escola imaginária cuja literatura a professora Dra. Lílian do Valle da Universidade Estadual do Rio de Janeiro apresenta acerca da Escola pública, das crises recorrentes dessas instituições, bem como acerca da construção que a sociedade realiza sobre o futuro do ensino público que afeta o acesso à educação, conforme afirma Lílian do Valle (1997, p.7): “A escola pública vai mal, estudando a história dessa instituição, verificamos que, onde foi implantada, este diagnóstico é tão recorrente que deve mesmo ser tomado como conatural à sua existência”.
Depreende-se da fala da professora, que apesar do roteiro expresso, a escola no escopo do imaginário apresenta nuances de aspectos políticos, estruturais, bem como epistemológicos “A educação é como um espelho fiel que nos reproduz com clareza o que uma sociedade é, o que ela deseja de si e o que ela afirma desejar” (VALLE, 1997, P. 8).
A sociedade na perspectiva histórica delineia como foi e como será a educação pública e até mesma a privada, pois quaisquer projetos devem ter significados sociais e respectivos investimentos que a sociedade imagina ter como poder de ação.
Este cenário é dialético e histórico, como se observa nas ponderações da pesquisa elaborada pela professora Lílian do Vale (1997, p.23):
Para instalar o tempo escolar em suas raízes históricas e evidenciar sua dependência em relação a uma matriz de significações sociais definidas, é necessário aceitar que a noção de Escola Púbica pode ser situada e datada, não se apresentando nem como uma espécie de produção espontânea da vida social, nem como um universal das sociedades ou, ao menos, das sociedades modernas. Tal como a Escola pública de inscreve em um determinado projeto político de sociedade e traz a marca do tipo de investimentos sociais que permitiram seu nascimento e constituição e que, continuamente renovados, explica sua permanência, a noção de tempo escolar é tecida por um conjunto de significações sociais da qual depende: para desvendar sua crise, é preciso entender sua emergência.
Não há como dissociar a educação de Políticas Públicas e, nesse caso, em se tratando de Brasil, o tema Educação toma um rumo que embasa diversas teorias, postulados ideológicos que demandam extensos debates e pesquisas. Contudo, o Serviço Social tem a prerrogativa de perceber a educação enquanto Política Pública, norteadora do constructo do papel do Estado que possibilite o acesso às políticas sociais, como se afirma:
As políticas sociais têm sua gênese e dinâmica determinadas pelas mudanças qualitativas ocorridas na organização da produção e nas relações de poder que impulsionaram a redefinição das estratégias econômicas e político-sociais do Estado nas sociedades capitalistas […] Situar a educação como política social do Estado capitalista significa, antes de tudo, admitir a refuncionalização social dos sistemas educacionais em face das mudanças qualitativas ocorridas na fase monopolista do capitalismo, tanto em relação à organização da produção quanto em relação às estruturas jurídico-políticas e às relações globais. (NEVES, 1999, p.11-16).
Nota-se pelo olhar de Lúcia Neves, que transitar acerca da educação no imaginário político, é criar categorias de análises políticas sobre a produção do Estado capitalista e respectivos interesses que os mesmos mantêm nos sistemas educacionais.
A educação é fruidora de emoções, sensações, imagens, artes e culturas que estão inseridas no cotidiano dos atores que dela fazem parte. Nessa perspectiva, não é propício os rótulos, de quem manda e quem obedece em sala de aula, mas no olhar de Paulo Freire (1996, p.25) “Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”.
Dessa forma não há como imaginar o espaço escolar sem a construção de pontes dialógicas entre educadores e educandos, além da constatação que a educação no imaginário social é plural em sua manifestação cultural, artística e humanizada, como afirmam Baseio e Cunha (2018, p.11) “Sabe-se que as manifestações artísticas estão presentes em todas as sociedades humanas em maior ou menor grau e apresentam-se de tantas maneiras diferentes quanto são seus autores e culturas”.
A interdisciplinaridade como ferramenta de múltiplos espaços
A interdisciplinaridade segundo Fazenda (2001, p. 112) é o processo de conscientização da abordagem interdisciplinar, manifesta no empenho do professor com seu trabalho e embasada pelas experiências e vivências de suas próprias práticas pedagógicas onde ele se constrói e reconstrói. Ela afirma ainda que no espaço escolar, na sala de aula interdisciplinar, a obrigação e a satisfação se alternam, a humildade supera a arrogância, a cooperação a solidão, a generalidade a especialização, a homogeneidade pela diversidade do grupo heterogêneo, a reprodução pela produção do conhecimento (FAZENDA, 2002, p. 114).
A prática da Interdisciplinaridade é a força que movimenta os saberes, seja na sala de aula, nas praças e parques. A interdisciplinaridade se fez presente, no movimento e transformação de cada indivíduo, pois todos juntos, professores, alunos, comunidade em geral, é possível transformar os espaços, seja na sala de aula nas praças e parques, democratizando o acesso à educação.
Assim como Fazenda, é possível depreender que somente com atitudes significativas e práticas relevantes na interdisciplinaridade, redunda em transformações e mudanças no processo de ensino-aprendizagem.
Considerações Finais
Este trabalho procura contribuir com docentes, discentes e todos os interessados no Serviço Social, na educação, bem como no imaginário social, pautados na perspectiva da Interdisciplinaridade, esta, naturalmente entendida como uma categoria de ação, de prática pedagógica.
A compreensão de vivermos num Brasil atrasado em sua reforma do sistema educacional é clara e evidente. Trata-se de uma confirmação trágica, mas a constatação desta afirmativa embasa a realidade atual e pode ser reconhecida nas redes de ensino superior, seja particular ou pública.
Segundo Fazenda (2013), os docentes, muitas vezes perdidos na sua função de professar, impedidos de revelar seus talentos ocultos, anulados do desejo da pergunta, com a criatividade embotada, prisioneiros de um tempo de tarefas, recheados de melancolia, induzidos a cumprir o necessário e cegos frente à beleza do supérfluo, não entendem que a teoria interdisciplinar só se legitima na sua ação.
Podemos considerar a contribuição da Interdisciplinaridade, uma categoria de ação exercida na prática de sala de aula, nas praças, parques e, sua metodologia, facilitadora para o exercício de inferência e reflexão sem os quais nada se pode esperar da escola.
Utilizar ferramentas de metodologias ativas e interdisciplinares como a possibilidade de trabalhar fora da sala de aula, como nas praças e parques, facilitará os movimentos de ação, transformação e mudanças nas pessoas, nos alunos, nos professores, pois o processo interdisciplinar busca resgatar a sensibilidade perdida com atividades de sensibilização e percepção de si mesmo e do outro.
A interdisciplinaridade permite-nos olhar o que não se mostra e intuir o que ainda não se consegue, mas esse olhar exige uma disciplina própria, capaz de ler nas entrelinhas. (Fazenda 1999).
Assim, a atitude de responsabilidade com as pessoas, com o conhecimento, com as inovações e consigo mesmo, devem ser o ponto chave do docente à procura de uma prática Interdisciplinar na sala de aula e em diversos espaços.
Nessa perspectiva, não há como retroceder, a escola contemporânea é fundamentalmente um espaço de comunicação e, de forma dialética, a ação educadora se faz num processo de ação comunicativa. Dessa forma, como estabelece Penteado (1991, p.112) “Ensino é comunicação […]. Não qualquer tipo de comunicação. Mas comunicação dialógica. Não meramente reprodutora, mas elaboradora do conhecimento”.
Evidencia-se que o processo de ensino-aprendizagem não pode ser estanque, ao contrário, trata-se de um olhar diferenciado e constante, como afirma Freire (1979, p.35): “A educação tem caráter permanente. Não há seres educados e não educados. Estamos todos nos educando.”
A ação Interdisciplinar através da Pedagogia apresenta possibilidades, estas, intrinsecamente ligadas com fatores como: humildade, desapego, ética, amor, nuances interdisciplinares seja em sala de aula, nas praças e parques, como afirma Fazenda (2013, p.26): “Na interdisciplinaridade escolar, as noções, finalidades, habilidades e técnicas visam favorecer, sobretudo o processo de aprendizagem, respeitando os saberes dos alunos e sua interação”.
O imaginário social e educacional transpassa barreiras culturais, históricas e sociais. Permite múltiplas compreensões, visões utópicas e ideológicas, pois “O imaginário educacional é uma modalidade, ou uma especificação, daquilo que nós denominamos de imaginário bidimensional: imaginário sócio-cultural (ideologia, utopia, metáforas) e imaginário de símbolos e arquétipos” (WUNENBURGER, 2006, P.26).
Enfim, o Estado que respeita a Educação, que respeita o aluno, sua realidade e condição holística em sala de aula e que atua, no sentido da eliminação ou mitigação das desigualdades sociais, certamente propiciará transformação e desenvolvimento integral do ser humano e, talvez, possamos conceber uma sociedade brasileira que de fato possa superar as reais e profundas desigualdades sociais em nossa contemporaneidade.
REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor W. Educação e Emancipação. 3.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
AMARO, Sarita. Serviço Social em Escolas: Fundamentos, processos e desafios
BASEIO, Maria Auxiliadora Fontana; CUNHA, Maria Zilda. Vicente do Rego Monteiro: Imaginário mítico em jogo estético. In: BASEIO, Maria Auxiliadora Fontana (Org). ARTE CULTURA E IMAGINÁRIO II. São Paulo: Terceira Margem, 2018.
BENJAMIN, Walter. O capitalismo como religião. São Paulo: Boitempo, 2013
CARVALHO, Alexandre Filordi de. Foucault e a Função-Educador. 2. ed. Ijuí: Unijuí, 2014.
FAZENDA, Ivani C.Arantes. (Org.).O Que é Interdisciplinaridade?. São Paulo: Cortez, 2013.
______. Formação de Docentes Interdisciplinares. Curitiba: CRV, 2013.
FAZENDA, Ivani C.Arantes. Integração e Interdisciplinaridade no Ensino Brasileiro. São Paulo, Loyola, 2002.
______. Interdisciplinaridade: História, teoria e pesquisa. Campinas, SP, Papirus, 2001.
______. A virtude da força nas práticas interdisciplinares. São Paulo, Papirus, 1999.
PERRENOUD, Philippe. Avaliação da excelência à Relação das Aprendizagens: entre duas lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1999.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2015.
______.Educação e mudança. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
______. Pedagogia da Autonomia. 15 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GADOTTI, Moacir. Qualidade na educação: uma nova abordagem. São Paulo: Editora e Livraria Instituto Paulo Freire, 2010.
IAMAMOTO, M. V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003
JACOMINI, Mácia Aparecida. Educar sem reprovar. São Paulo: Cortez, 2010.
LAPLANTINE, François; TRINDADE, Liana. O que é Imaginário. São Paulo: Brasiliense, 1997.
LARA, Ricardo; MARANHÃO, Cézar. Fundamentos do trabalho, questão social e serviço social. In: Trabalho, Questão Social e Serviço Social – a autofagia do capital. São Paulo: Cortez, 2019.
Mady, Charles. O futuro das universidades públicas. Disponível em:<https://jornal.usp.br/artigos/o-futuro-das-universidades-publicas/> Acesso em: 22 de mar de 2024.
MARX, Karl. O Capital: Crítica da economia política. Vol1. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
MASCARO, Alysson Leandro. Estado e Forma Política. São Paulo: Boitempo, 2013.
NETTO, José Paulo. Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social no Brasil. 16. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
______. O que é Marxismo. São Paulo: Nova Cultural: Brasiliense, 1986.
NEVES, Lúcia Maria Wanderley. Educação e Política no Brasil de Hoje. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1999.
PENTEADO, Heloísa Dupas. Televisão e escola: conflito ou cooperação?. São Paulo: Cortez, 1991.
PENTEADO, Heloísa Dupas.(Org.).Pedagogia da comunicação:teorias e práticas. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
PAÍN, Sara. A função da ignorância. Porto Alegre: Artmed, 1999.
SANTOS, Milton. O País distorcido: o Brasil, a Globalização e a cidadania. São Paulo: Publifolha, 2002.
SAVIANI, Demerval. NEO-LIBERALISMO OU PÓS-LIBERALISMO? Educação Pública, Crise do Estado e Democracia na América Latina. In: VELLOSO,Jacques; MELLO,Guiomar Namo de; WACHOWICZ (Orgs). Campinas: Papirus, 1992.
VALLE, Lílian do. A escola imaginária. Rio de Janeiro: DP&A Editora,1997.
WUNENBURGER, Jean Jacques. O imaginário. São Paulo: Loyola, 2007.
WUNENBURGER, Jean Jacques; ARAÚJO, Alberto Filipe. EDUCAÇÃO E IMAGINÁRIO: Introdução a uma filosofia do imaginário educacional. São Paulo: Cortez, 2006.
YAZBEK, Maria Carmelita. Classes subalternas e assistência social. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2006.
1Mestre em Ciências Humanas – Coordenador Acadêmico do Centro Universitário Católico ítalo Brasileiro