REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7664144
Bianka Zloccowick Borner de Oliveira¹
RESUMO
O presente artigo visa analisar os princípios gerais da justiça de transição, como mecanismos de obtenção da verdade, de reparação e reconciliação da sociedade, para obtenção da paz sustentável em situações pós-conflito. Dentro desse contexto, será analisada, mais especificamente, a utilização da anistia e seus limites de aplicabilidade em relação aos crimes contra a humanidade. Para ilustrar esses conceitos, o estudo termina com a análise do caso Herzog vs. Brasil, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2018.
PALAVRA-CHAVE: direito internacional; direitos humanos; justiça de transição; anistia; crimes contra a humanidade.
ABSTRACT: This article aims to analyze the general principles of transitional justice, as mechanisms for obtaining the truth, reparation and reconciliation of society, in order to achieve sustainable peace in postconflict situations. Within this context, the use of amnesty and its limits of applicability in relation to crimes against humanity will be analyzed more specifically. To illustrate these concepts, the study ends with an analysis of Herzog vs. Brasil case, judged by the InterAmerican Court of Human Rights in 2018.
KEYWORDS international law; human rights; transitional justice; amnesty; crimes against humanity.
1 INTRODUÇÃO
A evolução do sistema internacional de proteção dos direitos humanos tem como marco jurídico inicial a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, que consagra a ideia de direitos humanos universais e indivisíveis, mais tarde reforçada pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 e pela Declaração de Direitos Humanos de Viena, de 1993.
Nesse contexto, diversos instrumentos internacionais foram concebidos para prevenir e combater as violações de direitos humanos, estabelecendo-se um núcleo inderrogável de direitos, que devem ser respeitados seja em tempos de guerra, conflitos internos, instabilidade, ou calamidades públicas. São exemplos a Convenção Contra o Genocídio (1948), as Convenções de Genebra (1949), Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamento Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1984), o Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão (ONU, 1998), a Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra os Desaparecimentos Forçados (2006), entre outras.
É também nesse cenário que o Estado assume o papel de principal responsável pela proteção da sua população contra violações a esses direitos, assumindo a obrigação internacional de garantir a segurança, a vida e o bem-estar do seu povo[1].
Como meio de garantir a efetividade desses direitos, muitos instrumentos estabelecem proteção penal internacional contra a violação de direitos humanos, por meio da tipificação de crimes internacionais. Buscou-se, com isso, a proteção universal e inderrogável da dignidade humana, tanto na sua versão individual (a vida, a integridade física e psicológica dos indivíduos, etc.), quanto na sua versão coletiva (quando atingem a humanidade como um todo)[2].
A tipificação de crimes internacionais para a proteção dos direitos humanos denota uma mudança de paradigma do conceito de soberania de modelo westfaliano até então vigente, na medida em que estabelece uma proteção penal que transcende a reserva de atuação do Estado, possibilitando intervenções internacionais em casos nos quais o próprio Estado viola ou não garante a segurança humana da sua população [3].
Neste sentido, desde a Convenção Contra o Genocídio (1948), nasce a ideia de criação de uma corte penal internacional para julgar crimes que, por representarem graves violações dos direitos humanos, afrontam a ordem internacional e devem ser punidos, ainda que as instâncias nacionais não sejam capazes de o fazer.[4]
Foi nesse cenário que houve a instituição do Tribunal Internacional Militar de Nuremberg e, posteriormente, a criação de Tribunais ad hoc para o julgamento dos crimes contra os direitos humanos cometidos na ex-Iugoslávia, em Ruanda e Serra Leoa. Mais tarde, foi criado, ainda, o Tribunal Penal Internacional, de caráter permanente, pelo Estatuto de Roma (1998), que prevê expressamente hipóteses de crimes contra a humanidade, e possui atuação complementar e cooperativa em relação aos Estados Nacionais no processamento e julgamento desses crimes.
Ao lado do sistema normativo global, surgiram os sistemas regionais de proteção, que buscam internacionalizar os direitos humanos nos planos regionais, como o Sistema Interamericano, regrado pela Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (1969) e sob jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH); o Sistema Europeu, regido pela Convenção Europeia de Direitos Humanos(1950) e submetido à jurisdição do Tribunal Europeu dos Direitos do Humanos (TEDH); e o Sistema Africano, regido pela Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos, e submetido à jurisdição do Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos (TADHP).
Apesar dos esforços internacionais, muitos Estados passaram ou ainda passam por períodos de guerra, instabilidade, conflitos armados ou regimes autoritários, nos quais se verifica a violação sistemática e massiva de direitos humanos e o cometimento de crimes contra a humanidade. Ao término desse período, as marcas da violência e das atrocidades ficam por toda parte, arraigadas na sociedade, nos organismos do Estado, e sobretudo, nas vítimas e seus familiares.
Com isso, desenvolveu-se no direito internacional o estudo da justiça de transição, que busca estabelecer as ações necessárias para a reconstrução da paz sustentável no Estado, após o período de conflito, violência ou violação sistemática de direitos humanos, a fim de promover a reparação dos crimes e a reconciliação do seu povo.
O presente estudo tem por objetivo examinar os princípios gerais e os instrumentos basilares da justiça de transição, à luz da doutrina desenvolvida sobre a matéria, bem como de experiências internacionais e da jurisprudência dos tribunais internacionais.
Em um primeiro momento, será analisada a responsabilidade do Estado e da comunidade internacional quanto ao dever de prevenir e reagir contra violações de direitos humanos, em especial, a prática de crimes contra a humanidade, assim como quanto à obrigação de reconstruir a paz em situações pós-conflitos.
Em seguida, serão analisados os instrumentos que constituem os pilares da justiça de transição, que incluem medidas de obtenção da verdade, reparação das vítimas, punição dos criminosos, reformas institucionais e reconciliação da sociedade. Como será visto ao longo do presente trabalho, um dos grandes desafios consiste na combinação das ações da justiça de transição, pois não é tarefa fácil encontrar o equilíbrio entre justiça e paz em Estados com história, sociedade, moral e costumes completamente diversos.
Após essa análise geral, será enfrentada no presente estudo a possibilidade de concessão de anistia aos perpetradores de crimes contra a humanidade. Prática comum, por exemplo, na transição democrática da América Latina pós-ditaduras, a anistia é alvo de críticas de diversos organismos internacionais, por ter a capacidade de gerar impunidade e injustiça continuada. Neste sentido, o presente trabalho buscará analisar a validade do uso da anistia como mecanismo de reconciliação e os limites para sua aplicação, em especial, com relação às graves violações de direitos humanos.
Por fim, a fim de ilustrar os conceitos examinados na prática, será analisado com maiores detalhes o caso Herzog v. Brasil, julgado em 2018 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que sintetiza o tratamento e os limites da anistia como mecanismo da justiça de transição no plano internacional.
2 A RESPONSABILIDADE DE PROTEGER E A RECONSTRUÇÃO DA PAZ
A primeira questão a ser enfrentada quando se verifica uma situação de conflito ou regime autoritário em um determinado Estado é a quem deve ser atribuída a responsabilidade pela proteção dos direitos humanos violados.
Conforme a teoria defendida pelo Professor Wladimir Brito, a responsabilidade de proteger impõe aos Estados e à comunidade internacional a obrigação de prevenir a perpetração de atrocidades, o dever de reagir aos crimes contra os direitos humanos, e a obrigação de reconstruir as sociedades afetadas pela violência massiva constatada no período conflituoso[5].
Por muito tempo, considerou-se que a soberania garantia ao Estado uma espécie de escudo contra qualquer tipo de intervenção internacional, ainda que fosse verificada a perpetração de atrocidades pelo próprio Estado, com a sua anuência ou mesmo negligência.
No entanto, desde a criação das Nações Unidas e a ascensão dos direitos humanos, houve uma progressiva mudança de paradigma, pela qual se passou a entender a soberania como responsabilidade do Estado de proteger a sua população e garantir a segurança humana em todas as suas vertentes: alimentar, econômica, sanitária, meio-ambiental, política, comunitária, pessoal e militar.[6]
Neste sentido, pese embora se mantenha a competência original do Estado para prevenir e reagir a conflitos e violações de direitos humanos, caso ele não exerça a sua função, incorrerá em violação da responsabilidade internacional, o que autoriza a intervenção da comunidade internacional.
Quanto à responsabilidade de reconstrução, Wladimir Brito define como um “conjunto de ações e de operações que visam prevenir o reacendimento dos conflitos armados e consolidar progressivamente e de forma duradoura a paz”[7]. Nesse caso, deve existir uma cooperação entre a comunidade internacional e o Estado afetado, a partir de uma política de “light footprint”, isto é, uma intervenção internacional mínima que vise a capacitação das instituições locais, e com base no “ownership principle”, de acordo com o qual a população deve participar ativamente no processo de reconstrução da paz.
Isso porque, em muitos casos, ao final do conflito ou do período autoritário, o Estado se encontra tão devastado ou mesmo contaminado pelo autoritarismo, que é preciso a atuação da comunidade internacional, ainda que limitada e cooperativa, como acima descrito.
O processo de reconstrução pode envolver diversas áreas, como a da segurança, da justiça, da boa governança, da economia e da política, devendo, em todos os casos, ter como prius o desenvolvimento de instituições sólidas que confiram autonomia ao Estado e a participação democrática da população, a fim de construir uma paz sustentável e duradoura.
No presente trabalho, será aprofundada a reconstrução da justiça, por meio dos instrumentos da chamada “justiça de transição”, abaixo destacados.
3 JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO: PRINCÍPIOS GERAIS
A justiça de transição compõe um conjunto de ações que devem ser adotadas para a reconstrução da paz em um Estado após um período de guerra, conflitos armados ou regimes autoritários, no qual se constataram violações sistemáticas de direitos humanos. Nesse processo, busca-se alcançar a justiça por meio do enfrentamento do passado, mas também pela superação e reconciliação da sociedade para a construção de um futuro pacífico.[8]
O surgimento da justiça de transição tem relação estreita com a proteção internacional dos direitos humanos, sobretudo após a ascensão ocorrida no pós Segunda Guerra Mundial, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a criação da Organização das Nações Unidas, e o desenvolvimento de mecanismos internacionais de promoção, controle e garantia dos direitos humanos. A partir dessas bases, estruturou-se a ideia de justiça de transição, com a finalidade de investigar e reparar as violações de direitos humanos cometidas nos Estados e alicerçar uma transformação alinhada com os princípios internacionais de proteção desses direitos.
A Organização das Nações Unidas aponta que as iniciativas da justiça de transição promovem a fiscalização, reforçam o respeito pelos direitos humanos e são cruciais para fomentar os níveis de confiança da sociedade civil, necessários para apoiar as reformas do Estado no período pós-conflito. Essas iniciativas compreendem mecanismos judiciais e extrajudiciais, incluindo processamento de indivíduos, reparação das vítimas, busca da verdade, reformas institucionais, a demissão de agentes do antigo regime, ou a combinação de todos esses processos[9].
É importante salientar que as ações da justiça de transição variam em relação a cada Estado e cada situação, em razão de diferenças econômicas, sociais e culturais. A heterogeneidade de valores e costumes dos povos demanda respostas diferentes e específicas, que atendam aos anseios daquela determinada sociedade. Dessa forma, não há uma “receita” exata de justiça de transição, que sirva a todas as situações.[10]
Apesar disso, é possível estabelecer alguns pilares da justiça de transição, que irão formar o núcleo essencial das ações, podendo ser aplicadas em maior ou menor medida, de acordo com as necessidades de cada Estado. São eles: (i) a revelação da verdade e a formação da memória sobre o passado; (ii) a reparação das vitimas; (iii) a reforma das instituições perpetradoras dos abusos; (iv) o processamento dos agentes, e (v) a reconciliação.[11]
Para uma melhor compreensão do tema, esses pilares serão abaixo individualmente analisados, com uma breve exposição dos fundamentos, objetivos e experiências internacionais em situações de transição pós-conflitos.
3.1 Direito à verdade e à memória coletiva
O direito à verdade possui status de direito humano internacional e foi originalmente proposto para garantir o direito de familiares de obter informações sobre os entes desaparecidos, incluindo as vítimas de execução extrajudicial, transferência ou desaparecimento forçado. Neste sentido, foi previsto no artigo 32 do Protocolo I Adicional da Convenção de Genebra (1949) o “direito que as famílias têm de conhecer o destino dos seus membros.”
Assim, o direito à verdade tem uma dimensão individual, no sentido de conceder às vítimas ou suas famílias as informações sobre os fatos e crimes cometidos, aos quais muitas vezes não tinham acesso em virtude dos obstáculos criados pelos abusadores. É fato que nas ditaduras da América Latina, por exemplo, muitas famílias não tinham sequer ciência sobre a morte dos seus familiares, que desapareciam forçadamente por ações do Estado, o que impedia o exercício do luto[12].
A evolução dos direitos humanos e das liberdades e garantias individuais ampliou o espectro desse direito, que assumiu uma dimensão coletiva, diretamente ligada ao direito à informação de interesse público e à memória coletiva, de modo a assegurar à população o conhecimento da sua história e as violações e abusos ocorridos no passado.
Hoje, o direito à verdade está previsto em diversos instrumentos internacionais e figura entre o Conjunto de Princípios Para a Proteção e Promoção dos Direitos Humanos por meio do Combate à Impunidade da ONU, no qual estabelece, como Princípio 2° que “toda pessoa tem o direito inalienável de saber a verdade sobre eventos do passado relacionados à perpetração de crimes hediondos e sobre as circunstâncias e motivos que levaram, por meio de massiva ou sistemática violação, à perpetração desses crimes […]”.[13]
Nessa perspectiva, a ONU declara que a preservação da memória coletiva tem papel de grande relevância para os direitos humanos, pois é a partir do conhecimento das verdades históricas sobre a violência e os crimes contra a humanidade que se pode evitar que a sociedade cometa os mesmos erros do passado. Ou seja, a preservação de arquivos e documentação alusiva às violações dos direitos humanos é crucial para assegurar um registro histórico verdadeiro e a preservação da memória coletiva .[14]
Neste contexto, a justiça de transição envolve instrumentos de investigação e revelação da verdade e formação da memória coletiva sobre as violações de direitos humanos perpetradas durante o período de conflito ou ditadura. Nesse aspecto, destaca-se a criação das Comissões da Verdade e Reconciliação, instauradas em diversos Estados, com diferentes níveis de atribuições e poderes.
Essas Comissões são órgãos independentes e temporários que têm como objetivo de investigar os crimes cometidos, identificar os agentes responsáveis e garantir o direito à verdade às vítimas e à sociedade. Trata-se de um importante mecanismo de justiça e também de superação e reconciliação da sociedade, por meio do qual as vítimas têm a oportunidade de serem finalmente ouvidas e obterem reconhecimento oficial do seu sofrimento.[15]
A experiência na América latina, que viveu períodos de ditadura militar entre as décadas de 60 e 80 do século XX, demonstra o importante papel das Comissões da Verdade nos períodos pós-ditaduras militares como instrumento de transição democrática e a consolidação da paz sustentável, registrando-se a criação de Comissões da Verdade na Argentina (1984), Chile (1990) e no Uruguai (2000). Já no século XXI, foram instauradas Comissões no Peru (2001), Paraguai (2003), Equador (2007), e de forma bastante atrasada, no Brasil (2011) e na Bolívia (2016), com o objetivo de investigar e tornar públicos os crimes dos regimes autoritários, por meio da busca pela memória e pela verdade histórica. Na América Central, as Comissões da Verdade também constituíram elemento fundamental nas políticas de transição, sobretudo na Guatemala (1994), em El Salvador (1992), em Honduras (1990) e no Haiti (1994).
Em muitos casos, as Comissões da Verdade servem também como mecanismos alternativos de solução de conflitos e têm poderes para conceder anistias e perdões, como foi o caso da África do Sul, em que a Truth and Reconciliation Comission (1995), criada para lidar com as violações perpetradas no período do apatheid, ofereceu indulto aos agentes que confessaram os crimes cometidos, dispensando o processamento judicial.[16]
Antonio Cassese aponta uma série de vantagens dessas Comissões como meio de reação das atrocidades:
(i) Further understanding in lieu of vengeance, reparation in lieu of retaliation, and reconciliantion instead of victimization; (ii) promote a kind of historical catharsis, through public exposure of crimes; (iii) delve into the historical, social and political roots of the crimes; (iv) establish a historial record of the atrocities committed; and (v) prevent or render superfluous long trials against thousands of alleged perpetrators.[17]
Em suma, a busca pela verdade constitui um dos mais relevantes mecanismos da justiça de transição para expor as violações aos direitos humanos cometidas no passado, reconhecer as atrocidades e o sofrimento das vítimas e, assim, criar uma memória coletiva e uma consciência crítica na população, de modo a evitar a repetição dessas situações.
3.2 Reparação das vítimas
Além de revelar a verdade sobre as atrocidades cometidas, o Estado tem o dever de reparar os danos causados às vítimas de graves violações de direitos humanos. Essa reparação não necessariamente será uma indenização pecuniária, mas pode assumir a forma de assistência psicológica ou até medidas simbólicas, como homenagens, memoriais e pedidos oficiais de perdão.[18]
As medidas de reparação podem variar a depender do grau de violação de direitos humanos sofrido pela vítima, assim como do tipo de crime cometido, mas devem buscar uma reparação justa e equitativa, que gere o sentimento de justiça e compensação adequada dos danos sofridos. Conforme Ernesto Verdeja define, a reparação consiste em “those policies and initiatives that attempt to restore to victims their sense of dignity and moral worth and eliminate the social disparagement and economic marginalization that accompanied their targeting, with the goal of returning their status as citizens”.[19]
Diversos tratados internacionais preveem a reparação das vítimas de violações de direitos humanos, como exemplo da Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamento Cruéis, Desumanos ou Degradantes da ONU (1984), em seu artigo 14.°, e do Estatuto de Roma (1998), que confere ao Tribunal Penal Internacional (TPI) a competência para fixar medidas de reparação, como restituição, indenização ou reabilitação às vítimas ou aos titulares desse direito, em seu artigo 75.°.
Na América Latina, a Argentina foi o Estado com o maior programa de reparação das vítimas da ditadura, desembolsando indenizações de $ 200.000 (duzentos mil dólares) para as famílias de desaparecidos e mortos listados pela Comissão Nacional de Desaparecidos(CONADEP).[20]
Porém, é preciso destacar que a reparação deve vir acompanhada das demais ações da justiça de transição, sob pena de ser confundida com a “compra pelo silêncio” das vítimas. Como sustenta Kora Andrieu: “Reparative justice without any attempt to reform institutions or punish perpetrators could be viewed as a form of „payment‟, or, worse, as hush money.”[21]
3.3 Processamento e punição
Os períodos de conflitos armados ou de regimes autoritários são marcados por violações sistemáticas de direitos humanos, com perpetração de crimes de várias naturezas, inclusive de índole internacional, como perseguições, torturas, transferências forçadas, prisões arbitrárias, desaparecimentos forçados, e outros crimes contra a humanidade.
A investigação, processamento e punição desses crimes são do interesse não apenas das vítimas, como dimensão do acesso à justiça, ou dos Estados onde foram praticados, no exercício do jus puniendi, mas de toda a comunidade internacional, constituindo normas jus cogens.
Assim, a justiça de transição inclui mecanismos de punição dos criminosos e reparação das vítimas, seja pela criação de Tribunais Internacionais ad hoc, como foi o caso dos Tribunais criados para julgar os crimes cometidos na ex- Iugoslávia (1993), em Ruanda (1994), e em Serra Leoa (2002), ou de processamento dos crimes pelos Estados Nacionais com a possibilidade de ação complementar ou cooperativa do Tribunal Penal Internacional (2002).
Há diversas Convenções Internacionais que instituem a obrigação dos Estados de processar e punir os crimes internacionais contra os direitos humanos. As Convenções de Genebra (1949), atualizadas pelos dois Protocolos adicionais de 1977, a Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamento Cruéis, Desumanos ou Degradantes (ONU, 1984), a
Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra os Desaparecimentos Forçados (ONU, 2006), estabelecem a obrigação de adoção de todas as medidas legislativas, administrativas e judiciais para investigar, julgar e punir as violações de direitos humanos.
Além disso, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), bem como os Tribunais regionais de direitos humanos, como o Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e o Tribunal Africano de Direitos Humanos e dos Povos (TADHP) representam mais uma instância de proteção internacional, com competência para declarar a responsabilidade do Estado pela violação de direitos humanos ou pela omissão em julgar ou punir os perpetradores. Apenas para citar um exemplo de case law, a CIJ no julgamento do caso Belgium vs. Senegal[22], em 2012, determinou que o Senegal tinha obrigação internacional de processar e julgar o ex-ditador da República do Chade, Hissène Habré, que estava asilado em seu território, pela prática dos crimes de tortura cometidos durante o período de ditadura (1982-1990) ou extraditá-lo para a Bélgica para tais fins, nos termos da Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamento Cruéis, Desumanos ou Degradantes (ONU, 1984).
O julgamento dos perpetradores tem vários méritos para a justiça de transição, uma vez que estabelece responsabilidades individuais num contexto de culpa coletiva, cessa as intenções de vingança das vítimas, na medida em que observam a justiça ser feita pelas vias próprias, e preparam as vítimas para a reconciliação com seus algozes, ao terem a certeza de que estes pagaram pelos seus crimes. Por fim, os julgamentos formam um registro público das atrocidades cometidas, criam a memória coletiva sobre os eventos e as vítimas, e reprimem a prática desses crimes.[23]
3.4 Reformas institucionais
Também é recomendável, e algumas vezes imprescindível, que a transição importe em reformas institucionais, a fim de promover mudanças ou dissolver as instituições e organismos que foram responsáveis pela prática dos abusos contra os direitos humanos. Esse processo pode implicar na extinção ou reformulação de órgãos públicos, na responsabilização e demissão dos perpetradores dos cargos públicos, assim como a vedação a que esses agentes voltem a assumir cargos governamentais.[24]
A ausência dessas reformas pode resultar na desconfiança da população nos órgãos públicos e na continuidade da cultura autoritária remanescente do período de conflito ou ditadura. Analisando o contexto brasileiro, Flávia Piovesan observa os prejuízos advindos da ausência de adoção desse mecanismo de justiça de transição e ressalta ainda ser necessário promover “transformações profundas no aparato repressivo de segurança herdado do regime militar – o que inclui reformas nas Forças Armadas e nas polícias civil e militar”.[25]
Desse modo, trata-se de medidas importantes para restaurar a confiança dos cidadãos no poder público, dissolver quaisquer resquícios da cultura abusiva impregnada no órgão e evitar o ressurgimento das ideias e políticas avessas aos direitos humanos no ambiente estatal. Ou seja, a reforma dos organismos que eram responsáveis pelos abusos é essencial para o fortalecimento da democracia, do estado de direito e da proteção dos direitos humanos.
3.5 Reconciliação
A reconciliação é um dos objetivos principais da justiça de transição, no sentido de superação das desavenças e hostilidades entre os grupos envolvidos nos conflitos e harmonização dos interesses da sociedade, incluindo as minorias vulneráveis, que são essenciais para a consolidação de uma paz sustentável.
Ela é necessária porque, nas sociedades marcadas por violência sistemática, violações massivas de direitos humanos e/ou conflitos armados se verifica um ambiente de desconfiança, ódio e ressentimento que não desaparecem em um “passe de mágica”, simplesmente pelo decreto de fim do conflito ou regime autoritário. Assim, a falta de medidas de reconciliação pode gerar um potencial de retorno da violência, ações de vingança, e ressurgimento de violações de direitos humanos.
Uma ideia equivocada da reconciliação pode associá-la ao esquecimento ou à impunidade – ideia esta fomentada pelas chamadas “auto anistias” instituídas por muitos governos ditatoriais militares que, sob pretexto de propiciar uma “conciliação nacional”, determinaram o perdão de todos os crimes cometidos durante o período que estavam no poder[26].
Conforme será abordado no tópico seguinte, as anistias podem servir de mecanismo de reconciliação, nomeadamente em casos de conflitos entre grupos sociais, em que se tornam necessárias para garantir a pacificação do Estado. Contudo, não podem constituir obstáculos à busca pela verdade, prestação de contas, e reparação das vítimas em casos de crimes contra a humanidade.
A noção adequada de reconciliação deve estar atrelada a todo o conjunto de medidas que visem tratar as feridas e cicatrizá-las, impedindo o ressurgimento dos conflitos e violações de direitos humanos. Dentre estas medidas, figuram as já citadas ações de busca pela verdade, processamento e punição dos perpetradores, a reparação das vítimas, que se adequadamente realizadas, podem ser capazes de concretizar a justiça e apaziguar os interesses. Além dessas, devem ser adotadas medidas de inclusão dos diversos grupos sociais, étnicos ou políticos envolvidos nos conflitos, com participação no projeto de reconstrução e democratização do Estado.
4 A ANISTIA E A IMPUNIDADE DE CRIMES CONTRA A HUMANIDADE
A noção de crime contra a humanidade remonta ao Acordo de Londres (1945), e ao Estatuto do Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, quando foram dispostos, pela primeira vez, em um acordo internacional. Apesar disso, naquele documento, exigia-se que os crimes contra a humanidade possuíssem conexão com crimes de guerra ou crimes contra a paz.
Após o desenvolvimento dos direitos humanos no plano internacional e das diversas Convenções em matéria de prevenção de violação desses direitos, como a Convenção Contra o Genocídio (ONU, 1948), a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes Contra a Humanidade(ONU, 1968), os crimes contra a humanidade ganharam total autonomia, podendo ser praticados em tempos de paz.
O Estatuto de Roma (ONU, 1998), no artigo 7.º, elenca como crimes contra a humanidade: (a) homicídio; (b) extermínio; (c) escravidão; (d) deportação ou transferência à força de uma população; (e) prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave ilegal; (f) tortura; (g) violação, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra violência sexual grave; (h) perseguição de um grupo ou coletividade identificável, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de sexo, relacionados com outros crimes; (i) desaparecimento forçado de pessoas; (j) crime de apartheid; e (k) outros atos desumanos que causem intencionalmente grande sofrimento, ferimentos graves ou afetem a saúde mental ou física.
Para a caracterização dos crimes contra a humanidade, de acordo com as normas internacionais, devem ser verificados alguns elementos objetivos e subjetivos: (a) em primeiro lugar, a ofensa deve ser grave, consistindo em um sério ataque à dignidade humana; (b) além disso, não podem ser ofensas isoladas ou esporádicas, isto é, devem consistir em uma prática massiva e sistemática; (c) as atrocidades devem constituir uma política do próprio governo ou incentivada ou tolerada pelo governo; (d) as vítimas devem ser civis; (e) requer-se, ainda, que o perpetrador tenha ciência de que aquele ato faz parte de uma prática sistemática ou massiva de violações de direitos humanos.[27]
Conforme sustenta Susana Aires de Souza, a tutela penal dos crimes contra a humanidade visa proteger o bem jurídico universal e inderrogável que consiste na dignidade humana em sua acessão coletiva[28]. Em outras palavras, um crime de homicídio cometido por agente do governo dentro do contexto de violação massiva de direitos humanos não viola apenas a dignidade humana individual da vítima (o direito à vida), mas a dignidade da humanidade como um todo.
Nessa esteira, os instrumentos internacionais, como a Convenção Contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamento Cruéis, Desumanos ou Degradantes (ONU, 1984), entre outras, estabelecem a jurisdição compulsória aos Estados Nacionais para investigar, processar e punir o cometimento desses crimes, de acordo com os princípios da territorialidade ou nacionalidade. Além disso, os instrumentos internacionais também estabelecem a jurisdição universal, de modo que cabe ao Estado extraditar o agente para algum dos Estados que o solicite e tenha o direito de processar e julgá-lo, independentemente de acordo prévio de extradição.[29]
A prática dos crimes contra a humanidade é comum em Estados que passam por períodos de conflitos armados ou ditaduras. Voltando-se para os regimes autoritários das ditaduras militares na América Latina nas décadas de 1960 a 1980, nos diversos relatórios das Comissões da Verdade, há denúncias da prática sistemática, massiva e estruturada de crimes como tortura, detenção arbitrária, execução sumária, arbitrária e extrajudicial, desaparecimentos forçados, violência sexual, entre outros crimes pelos órgãos governamentais[30].
Em tópicos anteriores, foi destacado que a justiça de transição em períodos pós conflito ou pós-ditadura exige, em maior ou menor medida, a investigação, processamento e punição desses crimes, seja por órgãos jurisdicionais nacionais ou internacionais (tribunais ad hoc ou o próprio TPI).
Contudo, em muitos países da América Latina, houve a edição de Leis de Anistia que concederam o perdão e impediram o julgamento dos crimes perpetrados durante o período de ditadura. Isso ocorreu, por exemplo, na Argentina (Lei n. 23.492/1986), no Chile (Decreto-Lei
n. 2.191/1978), no Uruguai (Lei n. 18.848/1986), no Peru (Lei n. 26.479/1995) e também no Brasil (Lei n. 6.683/1979). Essas leis de anistia foram sancionadas no período de decadência dos regimes militares, pelos próprios agentes da ditadura, pelo que são chamadas de “auto anistias”.
Também foi o caso da África do Sul, em que a Truth and Reconciliation Comission (TRC) teve como principal instrumento de reconciliação a concessão de anistia, com base na ideia de perdão como superação dos conflitos, ou “no future withour forgiveness”, nas palavras do Arcebispo Desmond Tutu.
É bem verdade que a concessão de anistia pode ter efeitos positivos, nomeadamente, quando há conflito armado entre grupos da população, situação em que pode servir como um compromisso de paz (anistia de compromisso).
No entanto, o seu uso abusivo, como escudo contra a revelação da verdade e a punição dos agentes responsáveis por crimes contra a humanidade é contrário ao direito internacional, que reconhece a jurisdição compulsória e universal, bem como a imprescritibilidade desses crimes e pode gerar um sentimento de impunidade e injustiça continuadas.
O uso abusivo da anistia nas experiências da América do Sul demonstram que essa prática pode prejudicar a justiça de transição, uma vez que retira das vítimas a oportunidade de ver seus algozes pagarem pelos crimes cometidos, além de gerar um sentimento coletivo de impunidade e impedir ou reduzir a confiança e credibilidade das instituições judiciais.
Mesmo na África do Sul, onde houve inovação na utilização desse mecanismo de reconciliação pela TRC, há grupos de vítimas que buscam a revogação da anistia e a persecução criminal dos culpados, como é o caso do Khulumani Support Group, e o próprio Arcebispo Desmond Tutu lamentou publicamente a falha da TRC ao permitir que muitos perpetradores de direitos humanos da era do apartheid escapassem à justiça[31].
Neste sentido, a ONU já salientou, desde 2004, que as negociações, acordos de paz e mandados do Conselho de Segurança rejeitarão “any endorsement of amnesty for genocide, war crimes, or crimes against humanity, including those relating to ethnic, gender and sexually based international crimes, ensure that no such amnesty previously granted is a bar to prosecution before any United Nations-created or assisted court”.[32]
Ao relegar esses crimes ao esquecimento, permitindo que os agentes nunca sejam julgados e punidos pelos graves abusos aos direitos humanos, a anistia apresenta duas facetas prejudiciais à transição democrática: primeiro, ela induz futuros ditadores ou perpetradores a confiarem na impunidade (repetindo a mesma estratégia de “auto anistia”) e segundo, joga o ressentimento, o ódio e a vontade de vingança das vítimas apenas para “debaixo do tapete”, de tal forma que podem retornar à cena a qualquer momento.
Neste sentido, o esquecimento e a anistia desses crimes têm sido constantemente refutadas e invalidadas pelas Cortes Internacionais. Como assinala Kora Andrieu, os ideais liberais de justiça prevalecentes na ordem internacional atual assumem que as sociedades precisam confrontar o passado para seguir em frente, de modo que a anistia e a amnésia não não mais aceitáveis.[33]
A Corte Internacional de Justiça, no já citado caso Belgium vs. Senegal, afirmou categoricamente que a proibição da tortura é parte do direito internacional costumeiro e se tornou norma peremptória (jus cogens), devendo se submeter à jurisdição compulsória e universal.[34]
O Tribunal Europeu de Direitos Humanos, no caso Abdülsamet Yaman vs. Turquia, declarou que os processos criminais relativos a crimes como a tortura, que impliquem violações graves de direitos humanos, devem ser imprescritíveis, e que não se devem permitir anistias ou perdões quanto a tais crimes.[35]
No mesmo sentido, o Tribunal Africano de Direitos Humanos e dos Povos também enfrentou a questão no caso Zimbabwe Human Rights NGO Forum vs. Zimbábue, no qual afirmou que a concessão de anistia para os crimes de tortura, assassinato e outras violações de direitos humanos configura ofensa à obrigações internacionais e constitui incentivo à impunidade.[36]
Por sua vez, a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem jurisprudência consolidada no sentido de impedir a aplicação de anistia para os crimes contra a humanidade, e já invalidou algumas das citadas leis de “auto anistia” das ditaduras da América Latina, como as do Chile, Uruguai, Peru e Brasil.
No caso Barrios Altos vs. Peru (2001), numa decisão histórica, a CIDH considerou que as leis de anistia que excluem a responsabilidade dos agentes e impedem investigações e punições de direitos humanos como tortura, execuções arbitrárias e desaparecimentos forçados são incompatíveis com a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San
José da Costa Rica). A Corte assinalou que a lei de “auto anistia” viola o direito ao acesso à justiça, bem como o direito das vítimas e suas famílias de conhecerem a verdade e de receber a reparação pelos danos sofridos, além de perpetuar impunidade e propiciar uma injustiça continuada. No voto categórico do juiz Cançado Trindade, ele afirma que as leis de anistia são manifestamente contrárias ao Direito Internacional dos Direitos Humanos e que a impunidade tem como consequência a “erosión de la confianza de la población en las instituciones públicas”.[37]
Outro caso emblemático julgado pela CIDH foi o Almonacid Arellano vs. Chile
(2006).[38], que também invalidou a lei de “auto anistia” do governo Pinochet e afirmou a incompatibilidade da norma com a ordem internacional. A Corte concluiu que o crime de execução extrajudicial cometido configurou crime contra a humanidade, uma vez que inserido no contexto de sistemática violação de direitos humanos do regime ditatorial, e, por isso, se submetem à jurisdição compulsória e imprescritível.
A lei de anistia brasileira também foi objeto de análise pela CIDH, no caso Gomes Lund vs. Brasil (2010)[39], que tinha como pano de fundo a detenção, tortura, o desaparecimento forçado e a execução extrajudicial de membros da “Guerrilha do Araguaia”, um movimento armado de resistência ao regime militar integrado por membros do Partido Comunista do Brasil, em operações do exército brasileiro entre 1972 e 1975, durante a ditadura militar. Neste caso, a Corte igualmente considerou que a lei de “auto anistia” era incompatível com as normas internacionais, seja a Convenção Americana de Direitos Humanos, seja as normas jus cogens sobre crimes contra a humanidade.
É, portanto, matéria consolidada no sistema internacional de proteção dos direitos humanos a invalidade de leis de “auto anistia” e a prejudicialidade dessa medida para a concretização da justiça de transição, na medida em que gera a impunidade e uma injustiça continuada.
Na mesma direção desses casos, será abaixo analisada com maiores detalhes a mais recente manifestação da Corte Interamericana sobre a matéria no caso Vladmir Herzog vs. Brasil (2018).
5 O CASO HERZOG VS. BRASIL NA CORTE INTERNACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
Em 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos concluiu o julgamento do caso Herzog v. Brasil, no qual examinou a responsabilidade do Brasil pela impunidade dos crimes de detenção arbitrária, tortura e execução extrajudicial do jornalista Vladmir Herzog, em 25 de outubro de 1975, durante o regime de ditadura militar, em virtude da aplicação da Lei de Anistia brasileira (Lei n. 6.683/1979).
5.1 Breve contexto histórico
O Brasil passou por um regime de ditadura militar, a partir de 1964 até 1985, no qual vigorou a Doutrina da Segurança Nacional, sob a regência de normas de exceção, como atos institucionais que funcionavam como artefatos legais para legitimar medidas repressivas. O auge desse estado repressivo ocorreu em 1968, com a promulgação do Ato Institucional n.° 540, que entre outras medidas, autorizou o fechamento do Congresso Nacional, a censura da imprensa, a suspensão dos direitos individuais e políticos, da liberdade de expressão, de reunião e da garantia de habeas corpus.
2010. Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021;
[40], BRASIL. Ato Institucional n.° 5, de 13 de dezembro de 1968. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ait/ait-05-68.htm. Acesso em 14 de maio de 2021.
O regime militar construiu uma larga estrutura repressiva, a partir do aparelhamento das Forças Armadas, com a criação de centros de informação da Marinha (CENIMAR), do Exército (CIE) e da Aeronáutica (CISA), bem como com a estruturação dos Centros de Operações de Defesa Interna (CODI) e dos respectivos Departamentos de Operações Internas (DOI).
Conforme exposto pela Corte, com base nos relatórios da Comissão Nacional da Verdade, as provas demonstram a prática sistemática e massiva de diversos crimes contra a humanidade pelos órgãos do regime militar, como a perseguição política dos membros do Partido Comunista Brasileiro, detenções arbitrárias, desaparecimentos forçados, além de diversas modalidades de tortura, tais como choque elétrico, cadeira do dragão, palmatória, afogamento, telefone, uso de produtos químicos, sufocamento, enforcamento, crucificação, furar poço de petróleo, geladeora, pau de arara, uso de animais, coroa de cristo, “churrasquinho”, além de torturas psicológicas.[41]
5.2 O caso de Vladmir Herzog
Vladmir Herzog foi um jornalista e membro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), nascido na antiga Iugoslávia em 1937, que em 1946 chegou ao Brasil e foi naturalizado brasileiro. Durante a sua carreira jornalística, trabalhou no jornal “O Estado de São Paulo”, na BBC Londres, e em 1972, assumiu o cargo de secretário e depois diretor do programa “Hora da Notícia”, no canal TV Cultura.
Herzog foi detido arbitrariamente no DOI-CODI de São Paulo, durante a “Operação Radar”, dirigida contra os membros do PCB, no dia 25 de outubro de 1975. Foi interrogado, torturado e assassinado por agentes do governo.
Sua morte foi forjada de suicídio pelo Comando do II Exército, com uso de laudos falsos e fotos manipuladas. No inquérito policial militar que sucedeu a morte, concluiu-se que se tratava de “quadro típico de suicídio por enforcamento”[42].
A morte de Herzog causou grande comoção popular, seguida de greves dos sindicatos dos jornalistas, estudantes e professores, e milhares de pessoas participaram do enterro e da missa realizada em sua homenagem na Catedral de São Paulo.
Após o fim da ditadura militar, em 1992, houve uma tentativa de abertura de inquérito policial para investigar os crimes cometidos contra Herzog, em virtude de uma entrevista dada por Pedro Antonio Mira Grancieri, um agente do regime militar, na qual reconhece que foi o responsável pelo interrogatório do jornalista. Entretanto, esse inquérito foi encerrado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, com base na Lei de Anistia brasileira (Lei n.° 6.683/79).
A anistia brasileira ficou conhecida pela slogan “ampla, geral e irrestrita”, na campanha pela qual a sociedade clamou pelo perdão aos presos políticos e exilados da ditadura. Mas a lei de anistia não perdoou apenas os dissidentes e presos políticos que cometeram atos considerados crimes na ditadura. A Lei n.° 6.683/79 brasileira concedeu anistia a todos que cometeram crimes políticos ou “conexos”, inclusive servidores públicos e militares, no período de 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. Por isso, é considerada uma lei de “auto anistia” do governo, que impediu o julgamento e a punição dos agentes públicos que cometeram crimes contra a humanidade no período da ditadura, como foi o caso da tortura e assassinato de Herzog.
Após a promulgação da Lei n.º 9.140/1995, pela qual o governo brasileiro reconheceu a prática de assassinato de opositores políticos no período de 1961 a 1979, a família de Herzog tentou novamente obrigar o Estado brasileiro a investigar e punir os crimes contra a humanidade cometidos. Contudo, o inquérito foi novamente arquivado, com fundamento na ausência de tipificação da tortura no direito interno e de prescrição punitiva dos crimes.
Superadas todas as tentativas internas de punição dos crimes contra a humanidade perpetrados contra Vladmir Herzog sem sucesso, o caso foi submetido pela família da vítima à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que por sua vez, submeteu o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
5.3 A decisão da Corte
A Corte Interamericana concluiu que a tortura e morte de Vladmir Herzog devem ser considerados crimes contra a humanidade, cometidos no contexto de violações sistemáticas e massivas de direitos humanos por agentes governamentais, e com isso, se submetem a jurisdição compulsória e universal.
Além disso, considerou que o fato de a legislação interna não conter tipificação do crime de tortura na data dos fatos não feria o princípio da legalidade (nullum crimen, nulla poena sine lege). Isso porque, pelo menos desde 1945, o Direito Internacional proíbe a perpetração da tortura, de modo que no momento dos fatos, em 1975, a proibição do crime já havia alcançado o status de norma jus cogens, o que impunha ao Brasil a obrigação de investigar, julgar e punir os responsáveis.
No mesmo sentido, quanto à alegação de prescrição, a Corte concluiu que a imprescritibilidade dos crimes contra a humanidade já era norma jus cogens de direito internacional, e também se aplicava ao Brasil, independentemente de o Estado ter ou não ratificado a Convenção de Imprescritibilidade.
Por fim, reafirmando a sua jurisprudência nos casos Barrios Altos vs. Peru, Arellano vs. Chile e Gomes Lund vs. Brasil, a Corte declarou que as leis de “auto anistia”, que excluem a responsabilidade por graves violações de direitos humanos, como a tortura, o desaparecimento forçado e as execuções sumárias e extralegais, são incompatíveis com os tratados de Direitos Humanos, servem de incentivo à impunidade e geram uma injustiça continuada:
Nesse sentido, as leis de anistia, em casos de graves violações de direitos humanos, são manifestamente incompatíveis com a letra e o espírito do Pacto de San José, pois infringem o disposto por seus artigos 1.1 e 2, porquanto impedem a investigação e a punição dos responsáveis pelas violações graves de direitos humanos e, consequentemente, o acesso das vítimas e seus familiares à verdade sobre o ocorrido e às reparações respectivas, impedindo, assim, o pleno, oportuno e efetivo império da justiça nos casos pertinentes, favorecendo, em contrapartida, a impunidade e a arbitrariedade, prejudicando, ademais, seriamente, o Estado de Direito, razões pelas quais se declarou que, à luz do Direito Internacional, elas carecem de efeitos jurídicos
Diante de todo o exposto, a Corte declarou a responsabilidade do Brasil pela violação do direito de acesso à justiça, de investigação, julgamento e punição dos responsáveis pela tortura e assassinato de Vladmir Herzog, assim como declarou que o Brasil violou o direito dos familiares da vítima de conhecer a verdade.
Assim, determinou que o Brasil adote as medidas cabíveis para investigar, processar e punir os culpados pela tortura e assassinato de Herzog, realizar ato público de reconhecimento de responsabilidade pelos atos cometidos por seus agentes na ditadura, tomar as medidas necessárias para declarar a imprescritibilidade de crimes contra a humanidade e, além disso, fixou indenizações a título de reparação às vítimas.
6 CONCLUSÃO
A reconstrução da justiça em situações pós-conflito ou pós-ditaduras- não é tarefa fácil e exige esforços do próprio Estado em cooperação com a comunidade internacional. A justiça de transição envolve o enfrentamento do passado, em uma sociedade marcada por conflitos, violência e atrocidades contra os direitos humanos, mas também a construção do futuro, para prevenir que tais atos não voltem a assombrar a população.
Como apresentado neste estudo, a justiça deve ser feita de modo que a verdade seja revelada, criando-se uma memória coletiva sobre os fatos; as vítimas sejam reparadas; as instituições sejam reformadas e os culpados sejam punidos por todos os crimes contra a humanidade perpetrados. Por outro lado, a reconciliação deve ser buscada, por meio da participação ativa da população no processo de reconstrução, a fim de obter a paz sustentável no Estado.
Porém, a reconciliação não pode ser tida como sinônimo de esquecimento e impunidade, por meio de anistias amplas e irrestritas. Para obter a paz duradoura e sustentável é preciso enfrentar o passado e responsabilizar os culpados, ou os fantasmas das atrocidades permanecerão rondando através dos tempos. Como acentua Antonio Cassese: “[l]ike an open wound, it lingers and, if untreated, festers.”[43]
O desafio consiste, portanto, em encontrar um equilíbrio entre os meios de alcançar a justiça, sem que esta se transfigure em vingança, e os meios de reconciliação da população, sem que esta seja sinônimo de impunidade. Como destaca Flávia Piovesan:
A justiça de transição lança o delicado desafio de romper com o passado autoritário e viabilizar o ritual de passagem à ordem democrática. O risco é que as concessões ao passado possam comprometer e debilitar a busca democrática, corrompendo-a com as marcas de um continuísmo autoritário. Justiça e paz; justiça sem paz; e paz sem justiça são os dilemas da transição democrática.[44]
Em qualquer caso, é preciso não esquecer o objetivo fulcral do processo de reconstrução, que consiste em alcançar a segurança humana em todas as suas vertentes: alimentar, econômica, sanitária, meio-ambiental, política, comunitária, pessoal e militar, e, com isso, prevenir a recorrência de violações dos direitos humanos da população.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1] BRITO, Wladimir. Responsabilidade de Proteger no Direito Internacional. Edições Almedina S.A., 2017, p.
[2] .AIRES DE SOUZA, SUSA. Sobre o Bem Jurídico-Penal Protegido nos Crimes Contra a Humanidade.” Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 83, 2007, p.633. 3
[3] BRITO, Wladimir. Op. Cit., p.12.
[4] PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional, 16. Ed., São Paulo, Saraiva, 2016, p. 315.
[5] BRITO, Wladimir. Op. Cit., p. 11.
[6] BRITO, Wladimir. Op. Cit., p. 18-19.
[7] BRITO, Wladimir. Op. Cit., p. 119.
[8] LAMBOURNE, Wendy. Transformative Justice, reconciliation and peacebuilding. In Transitional justice theories, (Ed.) Susanne Buckley-Zistel…[et. al.], Routledge, 2014, p. 19.
[9] UNITED NATIONS. Security Council. The rule of law and transitional justice in conflict and post-conflict societies. 2011.
[10] Há muitas críticas quanto a uma “ocidentalização” da justiça de transição, quando são desconsiderados os aspectos histórico, social e cultural da população, impondo-se uma justiça reparativa e retributiva nos moldes ocidentais. Neste sentido: LAMBOURNE, Wendy. Transformative Justice, reconciliation and peacebuilding.In Transitional justice theories, (Ed.) Susanne Buckley-Zistel…[et. al.], Routledge, 2014, p. 19.
[11] ZYL, Paul Van. “Promoting Transitional Justice in Post-Conflict Societies”. Security Governance in PostConflict Peacebuilding, Alan Bryden e Heiner Hänggi (eds.), DCAF, Genebra, 2005, p. 49. A versão em português foi traduzida e publicada pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça no “Dossiê: o que é justiça de transição?” da Revista Anistia Política e Justiça de Transição, nº. 01. © 2005 Lit-Verlag. Traduzido e publicado com permissão.
[12] O Relatório da Comissão Nacional de Desaparecidos na Argentina, denominado Nunca Más, documentou casos de cerca de 9 mil desaparecidos durante o período da ditadura militar argentina.
[13] UNITED NATIONS. Economic and Social Council. Comission on Human Rigths. Updated Set of principles for the protection and promotion of human rights through action to combat impunity. (E/CN.4/2005/102/Add.1). Disponível em: https://undocs.org/E/CN.4/2005/102/Add.1. Acesso em 13 de maio de 2021. Tradução livre.
[14] CENTRO REGIONAL DE INFORMAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – UNRIC. O holocausto e a dignidade humana em reflexão no Dia Internacional de Comemoração em memória das vítimas do holocausto. Bruxelas, maio 2017. Disponível em:
[15] ZYL, Paul Van. Op. Cit. P. 58.
[16] CASSESE, Antonio. International Criminal Law. Oxford University Press, 2003, p. 10.
[17] Ibidem.
[18] ZYL, Paul Van. Op. Cit. P. 52.
[19] VERDEJA, Ernesto. A Critical Theory of Reparative Justice. Constellations, Volume 15, Number 2, 2008, p.208.
[20] Idem. P. 216.
[21] ANDRIEU, Kora. Political liberalism after mass violence: John Rawls and a „theory‟ os transitional justice. In Transitional justice theories, (Ed.) Susanne Buckley-Zistel…[et. al.], Routledge, 2014, p. 19.p. 95.
[22] CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Questions relating to the Obligation to Prosecute or Extradite (Belgium v. Senegal), Judgment, I.C.J. Reports 2012. Disponível em: https://www.icj–cij.org/public/files/caserelated/144/144–20120720–JUD–01–00–EN.pdf. Acesso em 13 de maio de 2021.
[23] CASSESE, Antonio. Op. Cit. P. 6.
[24] ZYL, Paul Van. Op. Cit. p. 54.
[25] PIOVESAN, Flávia. Direito internacional dos direitos humanos e lei de anistia: o caso brasileiro… p. 106.
[26] Essa prática foi observada, por exemplo, no Chile, no Peru e no Brasil.
[27] CASSESE, Antonio. Op. Cit, p. 64-94.
[28] AIRES DE SOUZA, Susana. Sobre o Bem Jurídico-Penal Protegido nos Crimes Contra a Humanidade.” Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 83, 2007, p. 615-638.
[29] PIOVESAN, Flávia. Direito internacional dos direitos humanos e lei de anistia: o caso brasileiro… p. 98.
[30] Neste sentido: BRASIL. Comissão Nacional da Verdade. Parte III, Métodos e práticas nas graves violações de direitos humanos e suas vítimas. o relatório da Comissão Nacional da Verdade no Brasil. Disponível em: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_pagina_275_a_592.pdf ; PERU, Comissión Nacional de la Verdad y Reconciliación. TOMO VI, Sección cuarta: los crímenes y violaciones de los derechos humanos. Disponível em: https://www.cverdad.org.pe/ifinal/; CHILE, Informe de la Comisión Nacional de Verdad y Reconciliación. Reed. elaborada por la Corporación Nacional de Reparación y Reconciliación. [Santiago]: La Corporación, 1996 ([Santiago] : Andros Impresores) 2 t. en 3 v. Disponível em: http://www.memoriachilena.gob.cl/602/w3-article-85801.html.
[31] Ver: https://www.theguardian.com/world/2005/dec/17/southafrica.rorycarroll. Acesso em 28.06.2021.
[32] UNITED NATIONS. Security Council. The rule of law and transitional justice in conflict and post-conflict societies. S/2004/616, 3 de agosto de 2004. Disponível em http://undocs.org/es/S/2004/616 . Acesso em 14 de maio de 2021.
[33] ANDRIEU, Kora, Op. Cit, p. 89.
[34] CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Questions relating to the Obligation to Prosecute or Extradite (Belgium v. Senegal), Judgment, I.C.J. Reports 2012, par. 99. Disponível em: https://www.icjcij.org/public/files/case–related/144/144–20120720–JUD–01–00–EN.pdf. Acesso em 13 de maio de 2021.
[35] TRIBUNAL EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS. Caso ABDULSAMET YAMAN v. TURKEY. No. 32446/96, Sentença de 2 de novembro 2004, par. 55. Disponível em: https://hudoc.echr.coe.int/eng#{%22itemid%22:[%22001–67228%22]}. Acesso em 13 de maio de 2021.
[36] TRIBUNAL AFRICANO DE DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS. Caso Zimbabwe Human Rights NGO Forum Vs. Zimbábue, Comunicação No. 245/02, Decisão de 21 de maio de 2006, par. 78 e 215. Disponível em: https://ihrda.uwazi.io/pt/entity/ak15hbi38v969bqwqvn78ehfr?page=15. Acesso em 13 de maio de 2021.
[37] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Barrios Altos vs. Peru. Mérito. Sentença de 14 de março de 2001. Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/Seriec_75_esp.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021.
[38] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Almonacid Arellano e outros vs. Chile. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de setembro de 2006. Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_154_esp.pdf . Acesso em 14 de maio de 2021.
[39] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 24 de novembro de 2010. Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/caso/articulos/seriec_219_por.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021;
[40]BRASIL. Ato Institucional n.° 5, de 13 de dezembro de 1968. Disponível em:
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[41] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Herzog vs. Brasil. Sentença de 15 de março de 2018. (Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas). Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_353_por.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021.
[42] CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Herzog vs. Brasil. Sentença de 15 de março de 2018. (Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas). Disponível em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_353_por.pdf. Acesso em 14 de maio de 2021.
[43] CASSESE, Antonio., Op. Cit, p. 5.
[44] PIOVESAN, Flávia. Direito internacional dos direitos humanos e lei de anistia: o caso brasileiro, p. 104. In O que resta da ditadura: a exceção brasileira. Edson Teles e Vladimir Safatle (Orgs.). – São Paulo : Boitempo, 2010, p. 99.
¹Advogada. Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra. Pós-graduada em Direito Tributário pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.