UMA REVISÃO DA LITERATURA SOBRE A PEDAGOGIA WALDORF: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA PARA A EDUCAÇÃO

A REVIEW OF THE LITERATURE ON WALDORF PEDAGOGY: CONTRIBUTIONS OF PSYCHOLOGY TO EDUCATION

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11223887


Paola Wildner Itaqui


Resumo: Introdução: A Pedagogia Waldorf fundamenta práticas educativas há mais de um século e, no entanto, há uma escassez de material na literatura científica acerca do tema. Essa metodologia de ensino possui uma visão de homem e infância únicas e pode ser um caminho diante dos problemas enfrentados pela Educação na atualidade. Metodologia: Revisão de literatura o qual foi produzido diante da temática da Pedagogia Waldorf. A partir de uma pesquisa no banco de dados da Scielo e foram encontrados 9 artigos pertinentes ao assunto. Resultados e discussão: O fracasso escolar caracteriza-se por um processo complexo e histórico que acarreta principalmente em evasão escolar e problemas de aprendizagem. A principal diferença entre a escola Waldorf e tradicional é a concepção do ser humano que as orienta. A escola convencional tem como objetivo a aquisição de competências intelectuais com foco nas atividades no desenvolvimento cognitivo. Para aqueles alunos os quais não se adaptam a esse modo, a meta passa a ser o controle do corpo. Pelo contrário, na escola Waldorf, o ensino consiste em direcionar o foco em três âmbitos: desenvolvimento volitivo, afetivo e cognitivo. Assim, por atender o aluno em maior grau de integralidade, essa dinâmica escolar diminui a incidência de alunos não adaptados.

Palavras-chaves: Psicologia da Educação; Pedagogia de Waldorf; Práticas educativas.

Summary: Introduction: Waldorf Pedagogy has been the basis of educational practices for more than a century and, however, there is a scarcity of material in the scientific literature on the subject. This teaching methodology has a unique vision of man and childhood and can be a way forward in facing the problems faced by Education today. Methodology: Literature review which was produced on the theme of Waldorf Pedagogy. From a search in the Scielo database, 9 articles relevant to the subject were found. Results and discussion: School failure is characterized by a complex and historical process that mainly results in school dropout and learning problems. The main difference between the Waldorf and traditional schools is the conception of the human being that guides them. Conventional school aims to acquire intellectual skills with a focus on cognitive development activities. For those students who do not adapt to this mode, the goal becomes body control. On the contrary, at the Waldorf school, teaching consists of focusing on three areas: volitional, affective and cognitive development. Thus, by serving the student with a greater degree of completeness, this school dynamic reduces the incidence of non-adapted students.

Keywords: Educational Psychology; Waldorf pedagogy; Educational practices.

INTRODUÇÃO

A crise da educação atual é caracterizada, entre outros problemas, pelo conceito de ‘’fracasso escolar’’. Através do resgate do pensamento do filósofo Rudolf Steiner, tem-se como objetivo articular os conceitos de desenvolvimento e aprendizagem e identificar sua contribuição para o sucesso escolar.

 A Pedagogia Waldorf fundamenta práticas educativas há mais de um século e, no entanto, há uma escassez de material na literatura científica acerca do tema. Essa metodologia de ensino possui uma visão de homem e infância únicas e pode ser um caminho diante dos problemas enfrentados pela Educação na atualidade.

Este artigo é uma revisão de literatura o qual foi produzido diante da temática da Pedagogia Waldorf. A partir de uma pesquisa no banco de dados da Scielo e foram encontrados 9 artigos pertinentes ao assunto. 

CRISE DA EDUCAÇÃO

A Educação vem passando por uma crise em razão da demanda de alunos não adaptados à escola atual que foca no conteudismo, deixando de lado a formação integral do ser. Ademais, perpetua-se a visão de normalidade versus anormalidade nos profissionais da educação, existindo um padrão de comportamento que leva ao ‘’sucesso escolar’’ (ANDRADA, 2005, p. 197). Nessa direção, existem muitos estudos que discutem a questão do fracasso escolar produzido no ensino tradicional.

O fracasso escolar caracteriza-se por um processo complexo e histórico que acarreta principalmente em evasão escolar e problemas de aprendizagem. Outrora, tal fato já fora justificado sob o âmbito médico, psicométrico e por fim, sociopolítico. Sendo esta temática a mais discutida atualmente para com as escolas brasileiras (BOSSA, 2008, p. 19). O conceito retrata, principalmente, questões como baixo rendimento causado por dificuldades de aprendizagem, reprovação escolar e distorção entre o ano e idade do aluno. Segundo dados do IBGE (2010), os índices são de 10,3% para reprovação; 3,1% para abandono escolar e 23,6% para distorção ano-idade.

A problemática do fracasso escolar não repercute apenas no âmbito educacional, mas também se relaciona com questões no que se refere ao próprio indivíduo e também à sociedade. A vivência deste pode ser um fator contribuinte para implicações clínicas e sofrimento psicológico, como abuso de drogas, problemas de conduta, envolvimento com criminalidade e gravidez na adolescência, além de um prejuízo moral e exclusão social (Pezzi, 2017).

A principal diferença entre a escola Waldorf e tradicional é a concepção do ser humano que as orienta. A escola convencional tem como objetivo a aquisição de competências intelectuais com foco nas atividades no desenvolvimento cognitivo. Para aqueles alunos os quais não se adaptam a esse modo, a meta passa a ser o controle do corpo. Pelo contrário, na escola Waldorf, o ensino consiste em direcionar o foco em três âmbitos: desenvolvimento volitivo, afetivo e cognitivo. Assim, por atender o aluno em maior grau de integralidade, essa dinâmica escolar diminui a incidência de alunos não adaptados (BACH JUNIOR & STOLTZ, 2012, p 165).

Destaca-se que a dinâmica e conduta de professores de classe para as principais disciplinas ao decorrer de todo ensino fundamental das instituições Waldorf contribuem para a menor exclusão escolar e a metade da taxa de reprovação após o quinto ano, visto que o vínculo afetivo entre os docentes e educandos mantém-se por mais tempo. De acordo com o INEP, a desistência dos estudos na escola pública aumenta em 165% no sexto ano e a reprovação de estudantes dobra, justamente no período em que se deixa de ter professores únicos e passa-se aos orientadores destinados a cada matéria.

A PEDAGOGIA WALDORF

A Pedagogia Waldorf tem suas raízes na Antroposofia, ciência espiritualista criada pelo filósofo Rudolf Steiner durante o século XX que nasceu diante de uma crítica ao reducionismo do homem às leis químicas e físicas pela ciência moderna e considera-o formado de três partes: o pensar, o sentir e o querer (LANZ, 2000, p. 15). Em 1919 na Alemanha, Steiner foi convidado para criar uma escola que acolheria os filhos de funcionários da fábrica de cigarros Waldorf-Astoria. Essa escola seria aberta para todas as crianças da comunidade, teria um currículo unificado de 12 anos e os professores seriam os administradores dela.

As escolas Waldorf têm como objetivo central a busca pelo desenvolvimento integral de cada estudante, oferecendo as condições necessárias para que cada aluno identifique e desenvolva seu máximo potencial, a fim de formar cidadãos capazes de contribuir ativamente para a sociedade, agindo de forma autônoma e consciente.

Na Educação Infantil a proposta é desenvolver habilidades motoras, sociais e autonomia a partir do Brincar Livre. O ambiente físico é composto de salas que remetem uma atmosfera familiar, com cozinha, móveis e brinquedos de materiais naturais.

Ao chegar no Ensino Fundamental o grupo de alunos, até então composto de idades mistas, torna-se fixo e conta com um educador de referência: o professor de classe, figura que acompanha o grupo até o último ano do Ensino Fundamental II. Assim, é possível ter um olhar individualizado e profundo referente aos potenciais e desafios de cada criança. Além das disciplinas previstas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), outros conhecimentos são transmitidos, como música, trabalhos manuais e jardinagem. Não há livros didáticos e os alunos confeccionam os próprios cadernos e materiais de estudo. No cotidiano do ensino das disciplinas, o professor de classe utiliza procedimentos artísticos como pintura em aquarela, narrativas, mitos e contos que norteiam sua ação docente.

No Ensino Médio os alunos ganham no currículo os estudos de artes aplicadas, teatro, canto coral e trabalho social. Na Pedagogia Waldorf, todo o aprendizado se concretiza através do fazer. A partir da vivência e experimentação durante todo o período escolar, os alunos demonstram, por meio de suas criações, os conhecimentos adquiridos e praticam a criatividade, concentração e autoconhecimento.

DESENVOLVIMENTO HUMANO PARA STEINER

Para Steiner, o desenvolvimento humano harmônico contempla a integralidade nos âmbitos físico, emocional e espiritual e decorre em ciclos de sete anos chamados de setênios. Em cada um desses ciclos ocorre o desenvolvimento mais aprofundado de uma ‘’entidade humana’’. Apesar dessa divisão estar presente em toda a vida, quando falamos de Educação, a ênfase acontece nos primeiros 21 anos, ou seja, durante três setênios. Segundo Romanelli (2016):

A Antroposofia considera o ser humano como portador de quatro entidades ou corpos. (…) O primeiro deles é o corpo físico, composto das substâncias do mundo mineral e sujeito às leis que o regem. Como segunda entidade o homem possui o corpo etérico ou vital, portador do princípio que atua nos seres vivos (…) crescimento, reprodução e demais funções metabólicas. A terceira entidade, corpo astral ou das sensações, que aparece apenas nos animais e no homem, sendo veículo da vida de sentimentos e de sua expressão. A quarta entidade é o EU, portadora da individualidade, da consciência humana. (…)’ (ROMANELLI, 2016, p. 180).

Os ciclos são caracterizados por uma determinada constelação anímico-mental sendo que no primeiro setênio há o domínio do corpo etérico, no segundo do corpo astral e no terceiro do ‘’Eu’’ (TEIXEIRA, 1986, p. 117).

Conforme descrito por Lanz (2000, p.38 a 40 X):

1º setênio: Ao nascer e separar-se do corpo materno, o corpo físico evidentemente está formado. A criança até os 7 anos vive em seu metabolismo e nos membros, agindo através dos movimentos e regida pelas ações metabólicas: sono, fome, dor, etc. O corpo etérico, por outro lado, não está individualizado, ainda há ligação com as forças etéricas universais e durante sete anos ele se desenvolverá, provocando a queda dos dentes de leite e formação da dentição definitiva quando pronto. Com o nascimento do corpo etérico a criança ganha novas funções como memória e raciocínio e mostra-se madura para a idade escolar, ingressando no Ensino Fundamental.

2º setênio: durante o segundo setênio o corpo astral se desenvolve trazendo a capacidade mais consolidada do pensar e do sentir e formando a individualidade sentimental. Dos 7 aos 14 anos esse sistema é ampliado por uma gama de sentimentos, as vivências sociais tornam-se mais amplas e o entusiasmo ou repulsa pelo aprendizado surge.

3º setênio: ao início do terceiro setênio o jovem está na puberdade, sofrendo a tendência de retrair-se, entrando em choque com o mundo exterior. Seu espírito crítico e raciocínio estão em pleno desenvolvimento e estarão totalmente formados ao final do setênio. Na entrada da adolescência a consciência ganha forma: o juízo, a abstração de pensamento e a reflexão sobre os problemas próprios e do mundo. Aqui, entre os 18 e 21 anos, a entidade do ‘’Eu’’ forma-se por completo, a maturidade intelectual e moral está desenvolvida e o jovem passa a responder às leis civis e exercer o direito de cidadão.

Segundo Romanelli (2016), o desenvolvimento à luz da Antroposofia é considerado pleno quando permite que o ser humano adquira e utilize suas capacidades e habilidades de viver socialmente como um indivíduo autônomo. Para Steiner, essa formação humana configura agentes de construção de uma sociedade em que seja viável a felicidade, equilíbrio, ritmo e harmonia.

APRENDIZAGEM PARA STEINER

Durante o primeiro setênio a criança é dominada pela vontade e tem uma memória rudimentar. Por isso, todo o seu aprendizado deve estar voltado para o impulso volitivo — aprender fazendo. No segundo setênio, ela é tomada por uma vivência sentimental do mundo e com isso é necessário o envolvimento emocional para que se mantenha engajada no aprendizado. Já no terceiro setênio, o conhecimento é adquirido através da observação objetiva e científica e o ensino passa a envolver totalmente suas forças intelectuais. (LANZ, 2000, p. X)

O processo educacional, segundo a Antroposofia, se realiza de forma endógena como algo orgânico e através do contato com o mundo. Cada fase do amadurecimento, por sua vez, traz consigo uma forma adequada desse contato externo. (LANZ, 2000, p. 40)

REFERÊNCIAS

ANDRADA, Edla G. C. Novos Paradigmas na Prática do Psicólogo Escolar. Psicologia: Reflexão e Crítica, 2005, 18(2), pp.196-199

BACH JUNIOR, J.; STOLTZ, T. Disciplinaridade e normalização na escola Waldorf: desafios à pedagogia de Rudolf Steiner. Ideação, [S. l.], v. 14, n. 1, p. 155–173, 2012.DOI:   10.48075/ri.v14i1.6169.     Disponível    em:           https://erevista.unioeste.br/index.php/ideacao/article/view/6169.

Bossa, Nadia A. Fracasso Escolar: um olhar psicopedagógico. Porto Alegre, Artmed, 2008.

LANZ, Rudolf. A pedagogia waldorf: Caminho para um ensino mais humano. 7a Edição. São Paulo: Editora Antroposófica, 2000.

ROMANELLI, Rosely A. Procedimentos artísticos no ensino Waldorf. Revista. Fac.Educ. (Univ. do Estado de Mato Grosso), Vol. 26, Ano 14, Nº 2 p. 177-198, jul./dez.2016.

TEIXEIRA, Maria C. S. Formas alternativas de administração da educação: um estudo de caso: a Escola Rudolf  Steiner de São Paulo. Revista Fac. Educ. (Univ. do São Paulo) 12(1/2): 107-143, 1986.

INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA (INEP). Censo Escolar, . Brasília: MEC, . Informacão retirada de: https://novo.qedu.org.br/brasil/taxas-rendimento 

PEZZI, F. A. S; MARIN, A. H. Fracasso Escolar na Educação Básica: Revisão Sistemática da Literatura. Temas em Psicologia, Vol. 25, nº 1, março 2017, 1-15.Disponível em: https://doi.org/10.9788/TP2017.1-01