REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7315892
Gabriella Lima Duarte1
Jakeline Nogueira Pinto de Araújo2
Rosyvania Araújo Mendes3
Resumo: O presente trabalho, foi desenvolvido com intuito de compreender acerca da temática da responsabilidade ambiental com ênfase na responsabilidade objetiva do poluidor, quanto aos danos provocados as famílias do Distrito Industrial Pequiá de Baixo na Cidade de Açailândia – MA. Tendo em vista que, a comunidade vive em completo abandono, em razão da ausência de políticas públicas de planejamento urbano que possam fornecer condições dignas de habitação, agravadas após a instalação do Parque Siderúrgico Açailandense. Desde então, têm gerados diversos danos ambientais e sociais a população residente em seu entorno, e por essa razão merece ser objeto de estudo. Sendo assim, a metodologia utilizada para a sua elaboração, foi uma abordagem qualitativa, com objetivo geral de compreender a responsabilidade objetiva do poluidor diante dos danos provocados as famílias do Distrito Industrial do Pequiá de Baixo. Para isso, os procedimentos técnicos utilizados foram, a análise bibliográfica e documental. Observando as causas de crescimento da industrialização nas cidades brasileiras e os seus reflexos a comunidade, o papel da função social da propriedade e pôr fim, a responsabilidade objetiva do poluidor para a composição de um modelo de justiça sensível às questões ambientais. Logo, constata-se que a luta por moradia digna está longe de chegar ao fim, mas que, se observada por outra ótica, traz sinais claros de que a mobilização social, fez com que a comunidade ganhasse reconhecimento internacional, atuando na construção de uma sociedade mais justa e humana na luta pela justiça ambiental e pelos Direitos Humanos.
Palavras-chave: Siderurgia; Responsabilidade ambiental; Danos ambientais.
Abstract: The present work was developed in order to understand about the theme of environmental responsibility with emphasis on the objective responsibility of the polluter, regarding the damages caused to the families of the Industrial District Pequiá of Baixo in the City of Açailândia – MA. Considering that the community lives in complete abandonment, due to the absence of public policies for urban planning that can provide decent housing conditions, worsened after the installation of Steel Park Açailandense. Since then, several environmental and social damages have been generated to the population residing in its surroundings, and for this reason, it deserves to be an object of study. Therefore, the methodology used for its elaboration was a qualitative approach, with the general objective of understanding the objective responsibility of the polluter in the face of the damage caused to the families of the Industrial District of Pequiá of Baixo. For this, the technical procedures used were the bibliographic and documental analysis. Observing the causes of growth of industrialization in Brazilian cities and its effects on the community, the role of the social function of property and, finally, the objective responsibility of the polluter for the composition of a model of justice sensitive to environmental issues. Therefore, it appears that the struggle for decent housing is far from coming to an end, but that, if observed from another point of view, it brings clear signs that social mobilization has made the community gain international recognition, acting in the construction of a fairer and more humane society in the struggle for environmental justice and human rights.
Keywords: Steel industry; Environmental responsibility; Environmental damage.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo, abordará acerca da responsabilidade ambiental com ênfase na responsabilidade objetiva do poluidor quanto aos danos provocados as famílias do Distrito Industrial Pequiá de Baixo em Açailândia/MA. Tendo em vista que o cenário local, trata-se de uma comunidade que vive em completo abandono, sem a mínima qualidade de vida, em decorrência do crescimento acelerado dos espaços urbanos e a instalação do Parque Siderúrgico Açailandense que surgiu com o discurso do impulsionamento ao progresso e desenvolvimento. Entretanto, desde então têm gerados diversos danos ambientais e sociais a população residente em seu entorno, e por essa razão merece ser objeto de estudo.
Destarte, seguiremos com o seguinte questionamento, qual a responsabilidade objetiva do poluidor diante dos danos socioambientais na comunidade do Pequiá de Baixo em Açailândia – MA?
Assim, o presente trabalho foi desenvolvido com objetivo de compreender a responsabilidade objetiva do poluidor, diante dos danos socioambientais sofridos na comunidade do Pequiá de Baixo em Açailândia – MA. Os capítulos abordados no presente trabalho trataram sobre as respectivas temáticas: identificar as causas de crescimento da industrialização nas cidades brasileiras e os seus reflexos a comunidade, dentro do mesmo capitulo, foi abordado acerca do crescimento industrial versos os danos ambientais; no capítulo seguinte, discute-se o papel da função social da propriedade em relação ao planejamento urbanístico implementado na cidade de Açailândia – MA, a partir da perspectiva ambiental, e por fim no último capítulo, é identificado qual a responsabilidade objetiva do poluidor, acerca dos danos provocados há comunidade do Pequiá de Baixo.
É indubitável, que inicialmente seja descrito a metodologia utilizada para a elaboração do projeto de pesquisa. Consequentemente as razões, acerca da escolha dos métodos e a sua aplicabilidade, no que tange a consecução dos objetivos delineados na pesquisa.
Para que o conhecimento possa ser considerado científico, torna-se necessário identificar as operações mentais e técnicas que possibilitam a sua verificação. Podese definir método, como caminho para se chegar a um determinado fim. Portanto, é fundamental que se delimite os meios a serem utilizados na elaboração do projeto de pesquisa. (GIL, 2008, p.8)
A abordagem utilizada para a elaboração da pesquisa foi qualitativa, e para isso foi realizado uma pesquisa documental, analisando informações obtidas na consulta a processos judiciais sobre o tema que também foi instrumento de estudo, e os registros midiáticos disponíveis como: revistas, jornais, periódicos e outras fontes semelhantes.
No que se refere a estruturação do presente trabalho, tratasse-se de uma pesquisa exploratória, quanto aos procedimentos técnicos que foram utilizados durante a pesquisa, como bibliografias e documentos.
Durante a presente pesquisa, foram analisados a relação existente entre a destinação da propriedade privada e sua relação com as políticas de planejamento dos espaços da cidade, e o, papel dos movimentos de organização comunitária da comunidade Pequiá de Baixo, na busca de práticas que favoreçam a composição de um modelo de justiça sensível às questões ambientais que os acomete, para atuar diretamente na construção de uma sociedade mais justa e humana.
2. AS CAUSAS DE CRESCIMENTO DA INDUSTRIALIZAÇÃO NAS CIDADES BRASILEIRAS E OS SEUS REFLEXOS A COMUNIDADE.
O Brasil tem buscado ferramentas que possam proporcionar o aumento da industrialização, de modo a favorecer o crescimento do consumo, que reflete diretamente na sua economia, portanto, influenciando no processo de urbanização nas cidades brasileiras.
Desse modo, as alterações vêm sendo percebidas nas últimas décadas com o reflexo do desenvolvimento socioeconômico que o país experimentou. Tais mudanças de paradigmas de produção iniciadas a partir da Revolução Industrial, tem contribuído para o crescimento do número consolidado de fábricas e polos industriais instalados entorno das cidades.
Apesar da Revolução Industrial haver ao longo do século XIX contribuído para o desenvolvimento da sociedade, a mesma impôs à humanidade um aumento nos conflitos envolvendo a disputa pelos espaços disponíveis entre os que buscam moradia e os que objetivam a exploração de atividades econômicas. (PESTANA, 2013, p. 7)
A partir do final da década de 1970, um conjunto de políticas governamentais desencadearam a implantação de um polo siderúrgico no Município de Açailândia, localizada no interior do Maranhão, a cidade passou a ser vista pela população da região, como oportunidade de emprego, gerando uma intensa disputa pelas áreas periféricas para comportar os núcleos familiares e o desenvolvimento de atividades agropastoris de subsistência, ainda que sem políticas públicas que viabilizassem níveis aceitáveis de qualidade de vida.
É nesse contexto que surgiu o bairro do Pequiá de Baixo, sem uma estrutura mínima para receber as famílias que ali se instalaram, com o objetivo de buscar melhores condições de vida. Sendo posteriormente agravada após instalação e expansão contínua do Parque Siderúrgico Açailandense e de seus resíduos. Assim, o que a princípio parecia ser sinônimo de crescimento e esperança, tem por outro lado provocado diversos danos socioambientais.
2.1 Crescimento industrial versos os danos ambientais.
O Parque Siderúrgico Açailandense, encontra-se a 14 km do centro urbano da cidade de Açailândia, local que abriga empresas de transporte multimodal e estocagem de produtos derivados do petróleo, como combustível para veículos a motor de combustão.
Em razão da instalação das indústrias no bairro Pequiá de Baixo, diversificadas oportunidades de investimentos e negócios surgiram no Município de Açailândia. Sendo favorecida em face de sua localização geográfica e pela existência de pátio multimodal para transporte de mercadorias.
A principal fonte de economia do município é a exportação de ferro gusa gerada por indústrias siderúrgicas instaladas no distrito industrial do Pequiá. O município, possui ainda uma distribuidora da BR Petrobras e o 2º Maior entreposto da Vale no Maranhão. Por este motivo, o município tornou-se o terceiro maior arrecadador de ICMS entre os 217 municípios maranhenses. Açailândia tem cerca de 750 estabelecimentos comerciais em todos os níveis, o comércio, indústria, agricultura e pecuária, também se destacam na economia, tanto que o município possui um dos maiores rebanhos bovinos do estado do Maranhão, um frigorífico instalado na cidade e a expectativa de instalação de outro grande frigorífico, além de vários laticínios. (PREFEITURA MUNICIPAL DE AÇAILÂNDIA, 2022)
O posicionamento geográfico de Açailândia, tem contribuído para a rápida expansão da cidade, ocorrendo em paralelo à ausência de políticas de planejamento urbanístico. Ao final dos anos 1970, começaram a surgir os primeiros sinais do reflexo de um crescimento desorganizado do Distrito Industrial Pequiá de Baixo, com a presença de resíduos impulsionando o cenário de degradação ambiental ali existente.
Com a intensa ocupação de famílias nos setores marginais das rodovias de Açailândia, ocorreu a significativa reorganização das estruturas dos espaços ocupados pelas pessoas que se instalaram no município, sendo criados ainda que informais núcleos de habitação, assentamentos e novos bairros como a Vila Ildemar, que importou em definitivo processo de avanço do centro urbano em direção ao Distrito Industrial do Pequiá.
Em razão da ausência de políticas de planejamento ambiental e de urbanização, importou no surgimento de um espaço que não apresenta condições básicas para proporcionar habitação com o mínimo de dignidade humana. Nota-se que aqueles que foram direcionados para as áreas periféricas, os chamados despossuídos, habitam em uma região, a qual são desenvolvidas atividades industriais, expostos a produtos químicos, capazes de provocar o desenvolvimento de endemias respiratórias e carcinogênicas, o que afeta de maneira significativa a sustentabilidade do ambiente habitável.
A comunidade do Pequiá de Baixo é a mais afetada pelas atividades desenvolvidas nas siderúrgicas. A ausência de aparelhos estruturais sanitários que possibilitem a drenagem das águas utilizadas nos imóveis residenciais ou daquelas originadas de precipitações pluviométricas, não favorece o bem estar da comunidade. (PESTANA, 2013, p.42)
Além disso, a população está sujeita a intensos sons vindos das siderúrgicas e aciaria, os resíduos sólidos e gasosos, os metais pesados despejados nos mananciais utilizados para o consumo comunitário.
Na atualidade, a situação da qualidade do ar das cidades está longe de ser considerada boa, apresentando, entretanto, sob vários aspectos, um quadro muito diferente daquele do passado. A continuidade da queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) como fonte de energia para atender as necessidades modernas, além de gerar a contaminação do ar nas áreas urbano-industriais, tem criado sérios problemas ambientais como a acidificação do meio ambiente e o aquecimento global da atmosfera. Contudo, a utilização da eletricidade, do gás natural e de derivados de petróleo que passaram a substituir em grande parte o uso do carvão mineral, permitiu a um grande número de centros urbanos, particularmente a dos países com industrialização antiga, libertarem-se das mazelas de um ar carregado de fumaça preta. (DANNI – OLIVEIRA, 2009, p. 114-120)
Com o desenvolvimento industrial, novas máquinas são postas em funcionamento, para proporcionar o aumento da capacidade produtiva. Somado a isso, diferentes agentes poluidores passam a fazer parte do ar e do cotidiano das pessoas que habitam na região.
É indubitável que o planejamento urbano é uma ferramenta indispensável no crescimento e desenvolvimento das cidades. Deste modo, é necessário aplicação de políticas sociais por parte do setor público, que seja capaz de dar vozes a comunidade, sobe a tentativa de atender as demandas e proporcionar uma vida digna.
3 O PAPEL DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE EM RELAÇÃO AO PLANEJAMENTO URBANÍSTICO IMPLEMENTADO NA CIDADE DE AÇAILÂNDIA – MA.
A função social da propriedade, está condicionada ao atendimento dos interesses da coletividade. Por se tratar de um conjunto de princípios normativos definidos na própria Constituição Federal, a qual equipara-se às garantias fundamentais originadas dos direitos humanos.
Na gestão urbana, as decisões […] amparadas por políticas municipais de zoneamento, determinam o tipo de crescimento urbano e, mais ainda, se haverá ou não crescimento. Por meio de legislação específica sobre o uso do solo e a função social da propriedade, bem como pelo emprego criterioso da adequada limitação do abastecimento de água, drenagem, alturas de prédios, disposição do lixo, construção de malha rodoviária e sistemas de transporte, uma cidade pode influenciar positivamente seu futuro. […] De outra parte, ao permitir a degradação de certas áreas, está estimulando a formação de aglomerados habitacionais subnormais, bem como atraindo moradores não qualificados e de baixa renda, ao mesmo tempo em que declinam as oportunidades de emprego. (BARCELLOS E BARCELLOS, 2006, p. 139- 140).
Nota-se que a função social da propriedade não se resume ao mero exercício do direito de dono. Dessa maneira, o conceito vincula-se a elementos exteriores ou de natureza comunitária, logo é dever de todos preservar o meio ambiente, atribuindo destinação útil em benefício da coletividade, agindo em conformidade com o plano diretor de cada município, com o propósito de manter o equilíbrio socioambiental dos espaços para as gerações futuras. De acordo com Di Pietro (2003, p.388), “Preceitua o princípio da função social da propriedade, pondera que enquanto este impõe ao proprietário particular um conjunto de obrigações positivas, exige do Estado contínua atuação fiscalizadora.”
Desse modo, o Estado e o particular devem atuar em conformidade promovendo a proteção ambiental e a defesa dos interesses da coletividade. Assim, o planejamento das cidades deve oportunizar o envolvimento das lideranças comunitárias, para o exercício da cidadania nas discussões que buscam solucionar os problemas que surgem no processo, além de estimular o empoderamento na concretização do direito a um espaço socioambiental saudável e equilibrado, essencial para a qualidade de vida.
A ocupação da cidade de Açailândia no Maranhão, se aproxima da realidade de muitos municípios brasileiros que sofreram o processo de ocupação irregular de seus espaços urbanos, em que se verifica a má distribuição populacional, ocupando algumas áreas da cidade e quase nenhuma em outras.
A ausência de planejamento urbano, infraestruturas de acessibilidade e circulação nos espaços urbanos, gera prejuízo para todos, principalmente para aqueles que residem em zonas periféricas. Um claro exemplo, trata-se acerca das famílias que habitam o bairro Pequiá de Baixo, a qual estão expostas a doenças respiratórias e epiteliais, como as alergias e carcinomas que afetam a via digestiva e o aparelho respiratório, ocasionado pela contínua exposição às partículas de fuligem originadas das caldeiras das siderúrgicas, em suspensão no ar e presentes nas águas.
O consumo contínuo e obrigatório de ar é indispensável aos pulmões, mas muitos órgãos também são afetados pelo ar: olhos, nariz e ouvidos. Embora muitas das decorrências dos poluentes atmosféricos ainda sejam desconhecidos, alguns efeitos agudos manifestam-se na irritação das mucosas do sistema respiratório, na tosse, no desconforto causado por maus odores, na irritação dos olhos, no prejuízo da visibilidade, no envenenamento e mesmo na morte. A doença crônica, o encurtamento da vida, o câncer no pulmão, a bronquite, o enfisema e as doenças alérgicas são os efeitos que podem surgir a longo prazo. (SILVA, 2004, p. 161)
A responsabilidade pela preservação ambiental, encontra-se na própria etimologia da palavra ambiente, que significa tudo que faz parte do meio em que vive o ser humano, os seres vivos ou as coisas. No Brasil a definição legal de meio ambiente, encontra-se fundamentada na Lei 6.938/81, na redação de seu artigo 3º, inciso I, em que conceitua formalmente o meio ambiente, como um o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas (BRASIL, 1981).
Assim, as atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, a sanções penais e administrativas independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Surge daí a inegável relevância de se abordar a responsabilidade objetiva do poluidor, acerca dos danos provocados há comunidade do Pequiá de Baixo.
4. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO POLUIDOR, ACERCA DOS DANOS PROVOCADOS HÁ COMUNIDADE DO PEQUIÁ DE BAIXO EM AÇAILÂNDIA/MA.
São abordados no capítulo final deste trabalho a Responsabilidade objetiva do poluidor, acerca dos danos provocados há comunidade do Pequiá de Baixo em Açailândia/MA, resultantes das políticas de planejamento urbano municipal e do desenvolvimento da atividade siderúrgica local.
A Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), dispõe em seu artigo 5º, caput e incisos XXII e XXIII que a propriedade é um direito fundamental, posto no mesmo patamar dos direitos à vida e à liberdade. Assim, o acesso à proteção constitucional sobre o direito à propriedade, está condicionado a atribuir destinação ao patrimônio privado capaz de favorecer o bem da coletividade, uma vez que assegura ao proprietário o exercício de seus direitos.
É nesse sentindo que os 21 moradores do bairro Pequiá de Baixo, em Açailândia, ingressaram na via judicial, por meio do processo de número 0805987-30.2021.8.10.0022 ainda no ano de 2005, com o objetivo de reivindicar o reconhecimento da responsabilidade da companhia siderúrgica, por danos morais e materiais decorrentes da poluição provocada pelas atividades industriais sobre o modo de vida, a saúde e o patrimônio dessas pessoas.
A companhia foi condenada a indenizar os moradores, tanto em primeira como em segunda instância, que insatisfeitos com o resultado interporam recursos, que foram inadmitidos ou julgados improcedentes. A gravidade dos efeitos à saúde humana e ao ambiente fez com que a comunidade Pequiá de Baixo ganhasse repercussão e notoriedade nacional e internacional. Em 2020, o Jornal Nacional da rede TV Globo, abordou sobre os efeitos que a comunidade sofria, tratava-se sobre a história de sofrimento enfrentada pela comunidade Pequiá de Baixo, que a mais de 10 anos aguardam por moradia em condições dignas. A luta das famílias de é um exemplo claro de como a indústria tem operado por décadas sem o olhar adequado aos direitos humanos.
A história de sofrimento e luta dos moradores do Pequiá de Baixo tem sido objeto de reportagens jornalísticas no Brasil e no exterior, campanhas, inquéritos civis públicos, ações penais por crimes ambientais e de relatórios e estudos por parte de institutos de pesquisa e de organizações idôneas, como a Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH).
A FIDH (Federação Internacional de Direitos Humanos) e a JnT trabalham juntas desde 2010 com objetivo de denunciar as violações provocadas pela indústria siderúrgica no Maranhão. Em maio de 2011, FIDH e a JnT publicaram junto com a justiça Global, o relatório ‘‘Brasil: quanto vale os direitos humanos? – os impactos sobre os direitos humanos relacionados à indústria de mineração e siderurgia em Açailândia, produzido por metodologia COBHRIA. (FIDH, JUSTIÇA GLOBAL, JUSTIÇA NOS TRILHOS. 2011, p. 142)
O relatório documentou os impactos da indústria sobre o direito humano à saúde, à um ambiente saudável, à moradia adequada, à vida, à integridade física, à informação e participação e ao acesso à justiça, e formulou recomendações para todas as partes interessadas.
Ainda em se tratando ainda da reportagem do Jornal Nacional da rede TV Globo, a história de sofrimento, doenças e de violações de direitos dos moradores de Pequiá foi apresentada em longa reportagem com a duração de pouco mais de 5 minutos, sobre o seguinte tema: A comunidade no interior do Maranhão espera solução para problema ambiental. A reportagem então, abordou sobre a história de sofrimento enfrentada pela comunidade Pequiá de Baixo, que a mais de 10 anos aguardam por moradia em condições dignas. A luta dessas famílias é um exemplo claro de como a indústria tem operado por décadas sem o olhar adequado aos direitos humanos.
Além disso, a situação da comunidade foi debatida em sessão do Conselho Nacional de Direitos Humanos, em audiência temática na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, em Washington DC (EUA) e motivou duas comunicações oficiais do Conselho de Direitos Humanos da ONU ao Estado Brasileiro, para que apresente soluções que possam reverter o atual cenário.
Logo a responsabilidade ambiental, pauta-se pela teoria do risco da atividade, segundo a qual aqueles que desempenham atividade de risco geradora de lesão, deve indenizar pelos danos, inclusive solidariamente, caso constatada uma cadeia produtiva.
A fim de configurar a responsabilidade civil por dano ambiental, devem concorrer o nexo de causalidade entre a conduta lesiva e o dano. Não se haverá de perquirir a existência de culpa do agente, em razão do comando legal que estabelece a responsabilidade objetiva.
Dispõe o Art. 14 Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981:
§1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade Civil e criminal por danos provocados ao meio ambiente. (BRASIL, 1981)
Desse modo, a atividade poluente acaba sendo uma apropriação pelo poluidor dos direitos de outrem, pois na realidade a emissão poluente representa um confisco do direito de outrem em viver em um ambiente saudável.
Na responsabilidade civil subjetiva, a imputação do dano irá ligar-se a ideia de previsibilidade, já na responsabilidade objetiva, o requisito de previsibilidade não existe, sendo que o critério de imputação é quase automático. O ordenamento supõe que todo aquele que se entrega a atividades gravadas com a reponsabilidade objetiva deve fazer um juízo de previsão pelo simples fato de dedicar-se a elas.
A teoria do risco é o embasamento jurídico que os juristas elaboraram ao final do século XIX para justificar a responsabilidade objetiva. Risco nessa acepção jurídica significa perigo, potencialidade de dano, previsibilidade de perda ou de responsabilidade pelo dano, compreendidos os eventos incertos e futuros inesperados, mas, temidos ou receados que possa trazer perdas ou danos. (WOLKOFF, 2010, p.5)
No Brasil, o sistema conjuga a responsabilidade objetiva e a reparação integral tendo por pressuposto a atividade que ocasione riscos para a saúde e para o meio ambiente, sendo o nexo o fator que permite que o risco se integre na unidade ao ato que é fonte da obrigação de indenizar de modo que preservação ambiental e os danos que digam respeito a atividade estarão sempre vinculados a ela.
Por isso, a submissão de alguém a um habitat ecologicamente desequilibrado e pernicioso, poluído, de forma a causar sofrimento – inclusive implicações negativas a saúde física e psicológica – certamente configura-se o dano moral. A respeito, proclama a doutrina que é juridicamente possível o ressarcimento de danos morais difusos e coletivos. Portanto, é admissível o reconhecimento do dano moral e de sua quantificação. (PACCAGENELA, 2005, p.167)
O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito fundamental do homem e assegurado pelo legislador constituinte e encontra-se intimamente ligado ao direito à vida a proteção da dignidade humana, afim de garantir condições adequadas de qualidade de vida. Assim, possa-se considerar que toda a coletividade é atingida quando da ocorrência de danos ambientais provocados pelo poluidor.
Das 21 ações judiciais, que buscam a reparação dos danos sofridos, em sentença ficou configurado o dano moral, que podem ser traduzidos tanto pela poluição atmosférica quanto pela poluição sonora gerada pela siderúrgica. Restou demostrado que no ambiente residencial os moradores estavam submetidos à precipitação de fuligem (subproduto da produção do ferro gusa) e ainda a poluição sonora, ambas detectadas e relatadas no laudo pericial realizado por Dr. Ulisses Brigatto Albino, biólogo, mestre e doutor na área constatou que em todas as casas periciadas, pertencentes a moradores constante nos processos, havia muita fuligem sobre móveis, inclusive camas e utensílios de cozinha (PROCESSO, nº 0805987-30.2021.8.10.0022).
As condições que vivem os populares, seus hábitos tornam a situação mais críticas. Os animais de criação, como porcos e galináceos comem detritos contendo traços dos metais que podem ser carreados pela água pluvial quando esta escorre por dentro do pátio da empresa antes de atingir os quintais. Esses animais são utilizados para alimentação humana, isso faz com que a absolvição de possíveis elementos metálicos se torne ainda maior.
Os danos patrimoniais também se restam evidenciados as condições do ambiente, irresistível e a constatação de que a área é inabitável, não serve mais para suportar imóveis residenciais ou mesmo meramente comerciais.
Apesar do progresso alcançado no processo de realocação de mais de 300 famílias de Pequiá de Baixo (cerca de 1.110 pessoas), a convivência com a poluição, e os demais riscos associados, segue sendo um elemento cotidiano da vida dos mais de 7.500 moradores de todo Pequiá (IBGE 2010). O Estado, em suas diferentes escalas, não consegue estruturar uma estratégia para o devido enfrentamento dos problemas de saúde derivados da contaminação ambiental. As iniciativas do Estado são, via de regra, restritas a respostas a reivindicações e manifestações de protesto da própria comunidade.
Vale lembrar que somente após todos estes acontecimentos haverem adquirido vultuosa notoriedade é que a situação da comunidade do Pequiá de Baixo passou a ser tratada verdadeiramente como o grande problema do município de Açailândia, cujas consequências resultam da contínua exposição aos problemas socioambientais à que a mesma é acometida, sendo estes identificados em síntese, na poluição do ar, água e solo, na degradação ambiental da flora e da fauna, na vulnerabilidade da comunidade a endemias e o empobrecimento generalizado das vidas humanas impactadas pela negação aos direitos que, minimamente, devem ser assegurados para que se torne possível uma existência com dignidade.
4 CONCLUSÃO
Entende-se, portanto que a implementação de um polo siderúrgico no município de Açailândia foi um marco histórico que proporcionou de forma intensificada o crescimento econômico e consequentemente oportunizou emprego para a população de Açailândia e Região.
Contudo, o posicionamento geográfico de Açailândia contribuiu para a rápida expansão da cidade, ocorrendo em paralelo à ausência de políticas de planejamento urbanístico. A população passou a disputar os espaços disponíveis, com as indústrias guseiras e a Vale S/A, empresa detentora da concessão de extração do minério de ferro na Serra dos Carajás no estado do Pará.
Diante desse cenário, a comunidade do Pequiá de Baixo foi obrigada a conviver ao longo dos anos em ambientes que não apresenta condições básicas para proporcionar habitação com o mínimo de dignidade humana, expostos a produtos químicos, capazes de provocar proliferação de doenças, derivados da contínua exposição à poeira, fuligens e barulho, além de não possuir políticas que disponha de atendimento básico aos moradores que encontram-se em muitos casos impossibilitados de prover seu próprio sustento.
O atual contexto, contrária a função social da propriedade privada, que não se limita ao direito de dono, está condicionada ao atendimento dos interesses da coletividade de modo que é dever de todos preservar o meio ambiente, com o propósito de manter o equilíbrio socioambiental dos espaços urbanos. À vista disso, as pessoas passaram a identificar na função social que a propriedade privada possui, como uma motivação para reivindicar seus direitos, dessa forma empoderando-se comunitariamente na busca pela reparação dos prejuízos sofridos e o resgate de sua dignidade, por meio do judiciário, para que o poluidor seja responsabilizado objetivamente, por danos morais e materiais decorrentes da poluição provocada pelas atividades industriais sobre o modo de vida, a saúde e o patrimônio dessas pessoas e ao meio ambiente.
Durante a elaboração da pesquisa, constatou que a companhia Siderúrgica foi condenada a indenizar os moradores, tanto em primeira como em segunda instância, diante da gravidade dos danos provocados à saúde humana e ao meio ambiente. Contudo, a lide não chegou ao fim, tendo em vista que ainda tramitam ações judiciais para que seja realizado o pagamento das respectivas indenizações, é importante mencionar também, que o reassentamento para as famílias do Pequiá de Baixo, ainda não ocorreu, sendo que o novo nome do bairro foi denominado Pequiá da Conquista, sendo que as obras estão atrasadas e até o atual momento, não foi entregue.
A luta por moradia digna pela comunidade está longe de chegar ao fim, mas que se observada por outra ótica, traz sinais claros de que mobilização social influência diretamente na construção de uma sociedade mais justa e humana, na luta pela justiça ambiental e pelos Direitos Humanos.
REFERÊNCIAS
BARCELLOS, Paulo Fernando Pinto. BARCELLOS, Luiz Fernando Pinto. Planejamento urbano sob perspectiva sistêmica: considerações sobre a função social da propriedade e a preocupação ambiental. Rev. FAE, Curitiba, v.7, n.1. 2006. Disponível em: http://www.unifae.br/publicacoes/pdf/revista_da_fae/fae_v7_n1/rev_fae_v7_n1_10_paulo.pdf . Acesso em: 01/11/2022.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocom pilado.htm. Acesso em: 01/11/2022.
BRASIL. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a política nacional do meio ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938com pilada.htm. Acesso em: 01/11/2022.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Função social da propriedade pública. In: Luiz Guilherme da Costa Wagner Júnior. (Org.). Estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari. 1ed.Belo Horizonte/MG: Del Rey, 2003, v. 1, p. 385-408.
FIDH. JUSTIÇA GLOBAL. JUSTIÇA NOS TRILHOS. Brasil quanto valem os direitos humanos. 3. ed. rev e atual. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2000. Disponível em: http://fidh.org/IMG/pdf/rapport_bresil-port-LD-2.pdf. Acesso em: 01/11/2022.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2012. http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=ae2e5cc8-fa16-4af2-a11fc79a97cc881d. Acesso em: 01/11/2022
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Informações estatísticas sobre o município de Açailândia/MA. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1. Acesso em: 01/11/2022.
JORNAL NACIONAL. Comunidade do interior do Maranhão sofre com problema ambiental há mais de 10 anos. Disponível em: https://g1.globo.com/jornalnacional/noticia/2020/12/28/comunidade-do-interior-do-maranhao-sofre-com-problemaambiental-ha-mais-de-10-anos.ghtml. Acesso em: 01/11/2022
PACCAGENELA, Luis Henrique. Dano moral ambiental, in Dano moral e sua quantificação. Augustin, Sérgio (coorf.). 2ª ed. Caxias do Sul/RS: Plenum, 2005, p.167.
PESTANA, Thiago Vale. Os impactos socioambientais decorrentes da atividade siderúrgica na comunidade Pequiá de Baixo em Açailândia/MA. 2013. Dissertação (mestrado) – Curso de ambiente e desenvolvimento. Universidade do Vale Taquari – Univates, Lajeado, 12 dez. 2013.
PREFEITURA MUNICIPAL DE AÇAILÂNDIA. O Município – Economia. Disponível em: https://www.acailandia.ma.gov.br/omunicipio/economia#:~:text=A%20principal%20fonte%20de%20economia,Norte%20e%20N ordeste%20do%20Pa%C3%ADs. Acesso em: 01/11/2022.
SILVA, Américo Luís Martins da. Direito do meio ambiente e dos recursos naturais. São Paulo: RT, 2004, p. 161
WOLKOFF. Alexander Porto Marinho. A Teoria do Risco e a Responsabilidade Civil Objetiva do Empreendedor. Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=ae2e5cc8-fa16-4af2-a11fc79a97cc881d. Acesso em: 01/11/2022
DANNI-OLIVEIRA, Inês Moresco. Poluição do ar como causa de morbidade e mortalidade da população urbana. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/raega/article/viewFile/14249/9575. Acesso em: 01/11/2022.
1Acadêmica do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito da Faculdade Facimp Wyden, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.
2Orientadora, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional – UNIALFA, Especialista em Direito Público – UNIFENAS; Professora e Coordenadora do curso Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP
3Co-orientadora, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional – UNITAU, Especialista em Docência do Ensino Superior e Direito Administrativo – FACIBRA; Professora do curso de Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP