REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11134443
Ilda da Costa Francisco¹
Resumo
O presente estudo é um recorte da dissertação do mestrado que tem como objetivo, descrever com base no processo histórico os principais aspectos da educação em Angola. Trata-se de um estudo bibliográfico, cronologicamente apresentado em quatro momentos: A era colonial, chegada dos portugueses em Angola, em 1482. A era pós-colonial, proclamação da independência ano 1975. A era do acordo de paz, em 2002, e a realização das eleições gerais em 2017. Entendemos com base neste percurso que os aspectos ligados à luta pelos direitos político e social, a reorganização do sistema educacional, a democratização e a reforma do Estado demarcam o sentido da educação do cidadão angolano.
Palavras-chave: Angola. Educação. Percurso histórico.
Abstract
This study is an excerpt from a master’s dissertation which aims to describe the main aspects of education in Angola based on the historical process. It is a bibliographical study, presented chronologically in four stages: The colonial era, the arrival of the Portuguese in Angola in 1482. The post-colonial era, the proclamation of independence in 1975. The era of the peace agreement in 2002 and the general elections in 2017. Based on this journey, we understand that the aspects linked to the struggle for political and social rights, the reorganization of the education system, democratization and the reform of the state mark out the meaning of education for Angolan citizens.
Keywords: Angola. Education. Historical journey.
Introdução
A história é conhecida por demarcar e consolidar os acontecimentos nas sociedades. Compensatoriamente, a educação na história das sociedades, desempenha ao longo dos tempos, todo um processo ligado ao conhecimento.
Dito deste modo, pensamos que em qualquer sociedade a relação entre a história e educação é permeada de acontecimentos que registam processos e sentidos ligados ao conhecimento humano. Em outras palavras, Angola é um exemplo de sociedade cujas questões, amparadas pela história e pela educação possuem registros e demarcam cronologicamente fatos no tempo e no espaço.
Sendo assim, objetivamos com este estudo descrever o percurso histórico ligado aos aspectos da educação angolana, contextualizando, o descobrimento do país, a institucionalização da educação bem como, os limites da oferta formativa aos nativos, fatos retratados a partir da era colonial. Procura-se ainda, descrever através do marco da independência de 1975 um contexto voltado a gestão do angolano para o angolano que evidenciou materializar os direitos políticos e sociais no cenário submerso a guerra civil, efeito do próprio processo de libertação de Angola.
Nos momentos subsequentes como a proclamação da paz em 2002 e as eleições gerais de 2017, atentamos a descrição do contexto caracterizado pela (re)democratização e a reforma do Estado, idealizado sobretudo, no enquadramento global centrado à economia. Localmente, o ideário estabeleceu um novo homem (angolano) a responsabilidade de desenvolvimento do país.
A educação na era colonial – 1482
No ano de 1482 desembarcavam em Angola, concretamente na foz do rio Zaire, conhecido anteriormente como o Reino do Congo², o navegador portugues Diogo Cão. A consignada expedição marítima realizada na rota do oceano atlântico, foi nomeada como a “descoberta de Angola”.
Por sua vez, em 1575, chegava em Angola o comandante português Diogo Cão, acompanhado de uma comitiva constituída por 100 famílias e 400 soldados que ao se estabelecer desenvolveu alianças com os nativos³ resultando, mais adiante, na colonização dos mesmos.
Como base para a sua estratégia de dominação, Portugal passou a introduzir no mercado angolano pedras preciosas e especiarias como o cravo e a canela, produtos provenientes da Índia, tornando-se na grande novidade. De facto, Portugal possuía uma vasta experiência no mercado, fruto de suas expedições marítimas, e isso possibilitou de certo modo, relativizar o comércio e ampliar cada vez mais o mercado e as ofertas, ou seja, trocas de produtos pela força de trabalho.
Portanto, foi por meio da força de trabalho que naturalizou o comércio de escravos, segundo Neto (2005), foram mudanças permitidas por alguns responsáveis africanos que, embora esclarecidos dos objetivos de Portugal, cooperavam e consentiram com o comércio em troca de bebidas e armas.
A ingenuidade em apoiar as novidades trazidas pelos portugueses conduziu à invasão das terras angolanas, como consequência os portugueses efetivaram a colonização e instituíram Angola em sua província ultramarina. Inquestionavelmente, estando sob o domínio português e em condição de escravos, os nativos perderam seus direitos, e passaram a ser considerados ‘indígena’ que, por Estatuto4.
Consideram-se indígenas das referidas províncias indivíduos de raça negra ou seus descendentes que, tendo nascido ou vivendo habitualmente nelas, não possuam ainda ilustração e os seus hábitos individuais e sociais pressupostos para a integral aplicação do direito público e privado dos cidadãos portugueses. Consideram-se igualmente indígenas os indivíduos nascidos de pais e mães indígenas em local estranho àquelas províncias para onde os pais se tenham temporariamente deslocado. (PORTUGAL, 1954, p. 201).
A inserção deste Estatuto retirava automaticamente os direitos civis, jurídicos e até políticos dos nativos, pois a Portugal interessava capitalizar e unir as colônias de Angola e Moçambique com o objetivo de fortalecer sua economia e garantir mão-de-obra para o cultivo e o trabalho em minas.
Assim, o cenário apresentado em Angola e nas demais colônias portuguesas pontuava para ascensão da economia o que, eventualmente, atrai portugueses e europeus a tornarem de Angola o seu habitat, não obstante, a educação passou também a ser pensanda meio segundo os quais, atrairia a população portuguesa à colónia.
Portanto, durante o período da colonização portuguesa em Angola várias propostas de educação foram vivenciadas, alinhadas às políticas do governos português. Da mesma forma, esses momentos são entendidos como fixação da matriz educacional portuguesa no processo de construção do sistema educativo angolano.
A educação na era colonial é marcada por um longo processo de luta e enfrentamentos, sobretudo, para os nativos, por isso, os tensionamentos foram considerados “móbil para o reforço do elo entre a repressão e exclusão escolar dos indígenas negros de Angola”.
Segundo Neto ( 2005, p. 60), durante a era colonial existiram cinco fases da educação em Angola:
Educação Jesuíta (1575-1759) – O período de doutrinamento foi caracterizado pela forte ligação então existente a Igreja Católica e o Estado Português, mais se preocupando com o ensino da religião aos indígenas de Angola, deixando de lado a sua instrução e o seu letramento.
Educação Pombalina (1759-1792) – Grandes modificações na Europa, resultantes da evolução do pensamento iluminista. O período que atende por “pombalino” tem início ainda no reinado de D. João V, com o surgimento da Academia Real de História (1720), estendendo-se até o reinado de D. Maria I, quando foi criada, em Portugal, a Academia Real de Ciências, em 1779.
Educação Joanina (1792-1845) – O nascimento do capital angolano aplicado na produção, o enfraquecimento do comércio com o Brasil, o interesse dos países industriais da Europa, fizeram com que em 1844, os portos de Luanda e Benguela fossem abertos a todos os países. […] Esse desenvolvimento proporcionou à sociedade colonial grandes transformações. Portugal foi invadido, em 1807, pelas tropas francesas, e a família real […] se viu obrigada a refugiar-se no Brasil. […] Nesse período também se pode notar a grande crise política e econômica que assolou Portugal com a ausência da monarquia. […] A instalação imediata do governo português em território brasileiro obrigou-o a reorganizar-se administrativamente, nomeando titulares dos ministérios e estabelecendo no Rio de Janeiro, então capital da Colônia, quase todos os órgãos de administração pública e de justiça – o que ocorreu também em algumas das capitanias […] A possibilidade de um maior contato com povos e ideias diferentes, propiciada pela abertura dos portos, intensificou-se a partir de 1815, principalmente com a França, de onde veio, em 1816, uma missão de artistas composta de escultor, pintor, arquiteto, gravador, maquinista, empreiteiro de obra de ferraria, oficial de serralheiro, surradores de peles, curtidores e carpinteiros de carros. No que se refere ao campo educacional, foram criados cursos para um preparo mais diversificado de pessoal.
Educação Falcão e Rebelo da Silva (1845-1926) – A abolição do tráfico de escravos […] Decreto de 1891 que obrigava as companhias a criarem escolas em localidades com mais de 500 habitantes. Orientações fundamentais no que diziam ao respeito da educação dos nativos.
Educação Salazarista (1926-1961) – Ato colonial decreto 18.570, de 8 de julho de 1930. […] interesses econômicos que nortearam posteriormente a concepção, a organização e a evolução do sistema de ensino na colônia. […] Foram sendo criadas instituições especializadas em artes e ofícios. Acordos missionários [estabeleciam] que as missões católicas portuguesas eram consideradas instituições de utilidade imperial e sentido eminentemente civilizador. Organização dos alguns organismos de ensino e investigação. Na década de 1960, foram organizados alguns organismos de ensino e investigação e criados outros, como o Centro de Antropobiologia e o Centro de Estudos de Antropologia Cultural [e o] curso de Administração Colonial.
Mais do que o cumprimento da ordem metropolitana, os decretos e as leis sobre educação de alguma forma traziam mudanças administrativas e educacionais. É possível constatar que, no primeiro momento, a educação era oferecida aos nativos em forma de dogmas a fé católica no sentido do cumprimento da alienação para o fim que se esperava: a servidão.
Contudo, no momento em que impera o Estado novo, o governo de Salazar apresenta uma nova administração sustentada pelo decreto 18.570, onde a educação se atenta à organização do ensino nas colônias nesta ótica, Liberato (2014), fundamente este ato colonial como o que circunscreve a ideologia da raça e sua divisão.
A partir de 1930 passou a ser implementado em Angola o sistema de ensino para os indígenas baseado na profissionalização. De acordo com Neto (2005), este sistema era subdividido em duas escolas: artes e ofícios para rapazes e moças, segundo se descreve abaixo.
Quadro 1 – Estrutura educativa – ano de 1930
Contrário a isto, Neto (2005) pontua que o sistema educativo português era mais desenvolvido, por possuir na sua estrutura o ensino industrial, comercial e o liceu e o ensino superior. Porquanto, embora existam diferenças cruciais entre ambos sistemas, é importante frisar que as leis promovidas pelo governo de Salazar se tornam significativas por possibilitar a educação aos nativos ainda que, os fins nela impostos baseia o ensino voltado a “educação moral, cívica, intelectual e física, estabelecidos nas leis e também na aquisição de hábitos e aptidões de trabalho de harmonia com sexos, as condições sociais e as convivências das economias regionais” (PORTUGAL, 1954, p. 201).
Por consequência, o decreto sobre o Estatuto dos indígenas foi também responsável por implantar o ensino obrigatório da língua portuguesa na instrução dos nativos, ajustando-o como meio de comunicação entre todos, referindo “difundir a língua portuguesa, mas, como instrumento dele, poderá ser autorizado o emprego de idiomas nativos” (PORTUGAL, 1954, p. 204).
Assim, os níveis de aprofundamento da educação oferecida a europeus e assimilados5 não era igual ao dos nativos, ou seja, havia privilégios concedidos há uma elite. Na percepção de Silva (2015, p. 67), “a proposta educativa de Portugal para a população nativa de suas colônias englobava ações que estavam muito aquém do sistema escolar predominante para os brancos, colonos e, em alguns casos, assimilados; já para os indígenas não assimilados restava uma instrução rudimentar voltada para o trabalho”.
O jogo de intenções do regime português e as buscas e vindas por um direito que cada vez mais se apresentava incompleto e longe da realização despertaram a insatisfação das elites angolanas, que no entender de Liberato (2014) desempenharam na década de 1960 a importante contribuição na materialização do ensino superior a saber,
Angola não dispunha de nenhuma instituição de ensino superior no seu território […] os estudantes tinham de se deslocar a Portugal. Apesar de serem atribuídas bolsas de estudo para a frequência no ensino superior na metrópole, o fato é que esse acesso estava vedado à maioria dos angolanos. (LIBERATO, 2014, p. 1012).
Entendemos a proposta de bolsa para a formação em Portugal como um ato de resposta aos anseios por formação universitária dos angolanos. Porém, a alegada participação ilusória beneficiava apenas a um grupo de privilegiados que dispunham das condições logísticas para tal.
Neste sentido, a década de 1960, corretamente no ano de 1962 é criado os “Estudos Gerais Universitários nos territórios de Angola e Moçambique, por meio da publicação do Decreto N. 44530 que, em sua introdução, enaltece os esforços do governo português pela iniciativa e enfatizava a importância dos Sistemas do Ensino Superior de suas províncias estarem diretamente integrados à Universidade Portuguesa” (IZAR,2016, p. 130).
Os Estudos Gerais Universitários (EGU), surgi como resposta à luta pela libertação nacional, que teve início a 4 de fevereiro de 1961, conflito foi motivado por nacionalistas que disseminaram ataques à casa da reclusão e à cadeia de São Paulo a fim de libertar os presos políticos e lutar pelos seus direitos, (Neto, 2005).
A educação na era pós-colonial – 1975
O contexto da educação na era pós-colonial decorre dalegitimidade da luta pelos direitos dos angolanos, representada pelas forças políticas como o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), a União Nacional para a Independência Total de Angola (Unita) e a Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), conferida com “a assinatura, a 15 de janeiro de 1975, do Acordo de Alvor, determinaria uma mudança decisiva no processo de autodeterminação de Angola” (GOUVEIA, 2017, p. 225).
O processo de libertação que envolvia os três movimentos políticos não resultou em acordo, pelo contrário, pairava no seio destes movimentos partidário a vontade que cada um tinha de governar o país, logo, o que seria a governação do angolano para o angolano no sentido de luta contra o regime portugues, tornou-se a guerra civil entre os angolanos após a proclamação da independência.
Todavia, isto não impediu que entre os movimentos políticos, o partido MPLA assumisse o governo; por conseguinte, “Agostinho Neto foi indicado pelo MPLA como presidente da República nesse mesmo dia, contudo governou até 10 de setembro de 1979. […] Em 21 de setembro, José Eduardo dos Santos toma posse como presidente da República por indicação do bureau MPLA” (PAXE, 2014, p. 64).
Estando no poder, o MPLA concentrou suas idealizações governamentais nas reformas do Estado. Para Neto (2005), as reformas que tiveram início em 1977, aprovadas em 1978, ocasionaram de diversas preocupações, dentre elas, o sistema educacional pela importância da educação na formação do cidadão com base na nova sociedade angolana fruto da independência.
Seguindo tal lógica, o programa de governação do MPLA desenvolveu a estratégia reformista para a educação a partir da visão marxista-leninista, introduzida por meio dos programas de ensino no intuito de que “a educação e instrução marxistas capacitam os indivíduos a compreenderem a natureza e o discurso do desenvolvimento social e, com sucesso, executar as tarefas e obrigações sociais assumidas” (MPLA-PT, 1981 apud NETO, 2005, p. 117).
A independência de Angola e, posteriormente, a guerra civil transformaram Angola em um cenário frenético de conflitos com consequências, houve enfraquecimento a nível das estruturas humanas impondo o governo a realizar estratégia de reformar o país, inicialmente recompondo a ausência destes quadros.
A questão da quantidade e do nível de qualidade dos quadros era fundamental para se pensar o desenvolvimento assente nas estratégias definidas devido, primeiro, pela saída em massa dos quadros portugueses de Angola antes da independência, depois pelo abandono do país dos quadros angolanos aliados aos outros dois movimentos de libertação […] por isso, uma política de educação diferenciada recomendava-se para efetivar o direito à educação dos angolanos e também para [que] o país a curto, médio e longo prazo contasse com quadros qualificados para seus desafios econômicos, políticos e sociais. (PAXE, 2014, p. 68).
Certamente, ao proclamar a independência em 1975, Angola concorria para a legitimidade e organização nos domínios político, econômico, cultural e social sob o principal prisma de se pensar em potencializar o país com recursos humanos qualificados.
Embora o contexto se apresentasse instável por conta do conflito armado, a educação cumpria com a função formativa, e buscava reafirmar-se dentro da realidade do país. Com base nisto, houve a necessidade da reorganização do sistema educacional que, na visão de Nguluve (2006), marcava-se pelo desafio de fundamentar os valores culturais para a sociedade, permitindo, em 1978, a seguinte estrutura do sistema de ensino.
Quadro 2 – Estrutura educativa – ano de 1978
Vale ressaltar que, embora houvesse uma estrutura do sistema educacional em Angola, dois anos após a independência, ainda eram nítidos os reflexos do rompimento das relações com Portugal dado que, parte da gestão, senão toda a gestão do país sempre esteve a cargo dos portugueses. Por esta razão, não seria de mau tom pontuar morbidez em certas instituições em detrimento de ausência de quadros.
Buscando flexibilizar esta realidade, adotaram-se medidas de formação no exterior com a implementação de “Bolsa de estudo de responsabilidade do Instituto Nacional de Bolsa de Estudo (Inabe), criado em 1976 como estratégia para a formação de quadros técnicos necessários ao desenvolvimento do país em território estrangeiro” (IZAR, 2016, p. 134).
A referida intervenção não se dava apenas sob o ponto de vista do investimento dos quadros angolanos mas, buscava consolidar toda uma política educativa em um contexto histórico baseado em novos princípios. Tal abordagem, neste contexto de fortes pressões políticas, constituíram nos anos de 1975 a 2001 as principais preocupações do Estado angolano.
Com a criação da 1ª Lei Constitucional da República Popular de Angola em 1975 seguidamente, a 2ª Lei constitucional de Angola no ano de 1992, ambas consolidaram o novo Estado, distante da visão colonialista, mencionado por Gouveia (2017) no acordo de Bicesse, mediado por Portugal em 31 de maio de 1991 entre os líderes dos partidos MPLA e Unita, frisando que,
não foram apenas o estabelecimento do fim das hostilidades, mas sobretudo o lançamento em novas bases de um Estado de Direito Democrático, com o abandono dos aspectos matriarcais anteriores, de inspiração socialista […] A transição democrática e constitucional que Angola viveu a partir deste tempo assentou em diversos momentos constituintes que, no seu conjunto, deram origem a uma nova ordem constitucional tributária do paradigma do Estado de Direito Democrático. (GOUVEIA, 2017, p. 228).
A abertura trazida na nova ordem constitucional 1975 e, no ano seguinte, a revisão da constituição e as eleições legislativas de 1992 demarca momentos contundentes na história de Angola, pese embora, haver a insatisfação da Unita nos resultados eleitorais ocorrendo “[a] nova guerra não teve declaração oficial de início dos confrontos por qualquer uma das partes” (BITTENCOURT, 2016, p. 190).
De certo, a guerra civil não estagnou a educação visto que, em 1980 foi realizado um diagnóstico do sistema educacional e os resultados revelaram que “a educação sofria sobremaneira os efeitos da guerra e enfermava de profundas distorções nos seus principais dispositivos […] currículos, processo de ensino e aprendizagem, corpo docente, corpo discente, administração e gestão e recursos materiais” (NGULUVE, 2006, p. 114).
Em 1986, em detrimento dos diagnósticos realizados foram emitidas ideias e opiniões baseadas nas novas reformulações do Estado, configurados na lei de revisão constitucional de 1992. Em 1993 foram promovidos encontros como vias possíveis de mitigar os problemas do sistema educativo angolano, resultando na criação do projeto da Lei de Bases do Sistema de Educação, n. 13/01 de 31 de dezembro, que reformulou o sistema educacional relacionando às:
mudanças profundas no sistema socioeconómico, nomeadamente a transição da economia de orientação socialista para uma economia de mercado, sugerem uma readaptação do sistema educativo, com vista a responder às novas exigências da formação de recursos humanos, necessário ao progresso socioeconómico da sociedade angolana. (ANGOLA, 2001a, p. 2).
Ademais, estas mudanças foram os ajustes às propostas da Unesco no que concerne a melhoria do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), não obstante, o sistema educacional “assenta-se na lei constitucional, no plano nacional e nas experiências acumuladas e adquiridas a nível internacional” (ANGOLA, 2001a, p. 2). Para isso, objetivou:
Desenvolver harmoniosamente as capacidades físicas, intelectuais, morais, cívicas, estéticas e laborais da jovem geração, de maneira contínua e sistemática e elevar o seu nível científico, técnico e tecnológico, a fim de contribuir para o desenvolvimento socioeconómico do País.
Formar um indivíduo capaz de compreender os problemas nacionais, regionais e internacionais de forma crítica e construtiva para a sua participação ativa na vida social, à luz dos princípios democráticos.
Promover o desenvolvimento da consciência pessoal e social dos indivíduos em geral e da jovem geração em particular, o respeito pelos valores e símbolos nacionais, pela dignidade humana, pela tolerância e cultura de paz, a unidade nacional, a preservação do ambiente e a consequente melhoria da qualidade de vida.
Fomentar o respeito devido aos outros indivíduos e aos superiores interesses da nação angolana na promoção do direito e respeito à vida, à liberdade e à integridade pessoal.
Desenvolver o espírito de solidariedade entre os povos em atitude de respeito pela diferença de outrem, permitindo uma saudável integração do mundo.
O Conselho de Ministros de Angola aprova a Estratégia Integrada para a melhoria do sistema de educação (2001-2015). A visão estratégica deste instrumento dizia respeito às medidas de políticas educativas, considerando a educação o progresso para a dimensão proposta, porque:
a criação de condições de estabilidade macro-económica para a implementação de medidas políticas de ajustamento estrutural, consolidação da edificação de uma sociedade democrática e de direito, recuperação socioeconómica e reconciliação nacional impõe necessariamente a adopção de políticas educativas integradas e sustentáveis que, em primeira instância, contribuam para o desenvolvimento do capital humano, redução das desigualdades sociais e para o progresso humano, onde, por conseguinte, a Educação assume um papel-chave, tendo em conta a sua dimensão e abrangência. (ANGOLA, 2001b, p.10).
Nas observações do governo angolano, as questões relativas ao acesso e à qualidade constituíam dois dos principais problemas do sistema educativo angolano, especificamente na educação geral. O papel crucial desta estratégia seria um sentido para a educação nos períodos de 2001 a 2015, em que ações e normatizações efetuassem a correção do sistema da educação em quatro fases que se descrevem:
- Caracterização do sistema educativo
- Estratégia de intervenção
- Gestão do sistema
- Conclusões e recomendações finais.
A primeira fase da estratégia correspondeu ao diagnóstico da educação, de busca pelas acomodações, em uma era de conflito interno, que possibilita compreender os abalos das diversas estruturas, incluindo a educação.
A estratégia de intervenção são as possibilidades de medidas a serem adotadas para a estabilidade no horizonte definido (2001-2015). Sobre a gestão do sistema, são as delimitações das atribuições que envolvem governo central, provinciais, os gestores e o pessoal das unidades, bem como os recursos e meios necessários para responder às necessidades do setor, em virtude disto, à última fase tratava de assegurar as ações de impacto social e educativo para culminar na implementação futura da Lei de educação angolana.
A Lei nº. 13/01, de 31 de dezembro de 2001, organizou a educação em seis subsistemas de ensino: Educação Pré-escolar, Ensino geral, Ensino técnico-profissional, Formação de professores, Educação de adultos e Ensino superior, com os seguintes níveis:
1. Educação Pré-escolar
a) Jardim de infância
2. Ensino geral
a) Ensino primário – 1ª a 6ª Classe
b) Ensino secundário: 1º ciclo – 7ª a 9ª classe: 2º ciclo – 10ª a 13ª classe
3. Ensino superior
a) Bacharelado
b) Graduação
c) Pós-graduação
Todo este evento relacionado à reforma de 2001 decorreu nas proximidades do acordo de paz, em abril de 2002, momento aguardado para o presumível rumo do país e da educação, em particular.
Porquanto, a regulamentação da Lei nº. 13/01, de 31 obedeceu a cinco etapas de implementação que, segundo Menezes (2010), tratou-se de uma operacionalização descrita no Decreto nº 2/05 de 14 de janeiro. São elas: fase de preparação, fase de experimentação, fase de avaliação e correção, fase de generalização e de avaliação global.
Segundo o Ministério da Educação (2001b), citado por Nguluve (2006, p. 135), estas fases podem assim ser discriminadas:
Fase de preparação – 2002/2012: Perfis de saída, planos de estudos, programas de ensino e materiais pedagógicos.
Fase de Experimentação – 2004/2010: Instituições escolares em cada uma das 18 províncias do país, a fim de possibilitar que em cada uma delas se desenvolvam experiências e competências próprias e locais de gestão da implementação do Novo Sistema de Educação.
Fase de avaliação e correção – 2004/2010: Experimentação e correção, com base nos dados recolhidos durante a fase de experimentação do Novo Sistema de Educação, essencialmente na adequação dos currículos […] elaboração, edição, aquisição e distribuição de manuais e livros escolares, a capacitação de professores.
Fase de generalização – 2006/2011: Aplicação dos respetivos currículos em todo o país. […] À medida que se tiver implementado o novo sistema de ensino, ir-se-á extinguir também o sistema de ensino anterior.
Avaliação global – 2012/2015: Assegurada com a abrangência da avaliação dos princípios dispositivos do sistema de educação […] Análise dos currículos, processo de ensino e aprendizagem, corpo docente e discente, administração e gestão dos recursos materiais.
Essas fases respondem ao processo gradual encontrado para a implementação do dispositivo com relação aos problemas da educação dentro do aspecto do progresso político-econômico revigorado na reflexão da paz alcançada. Na análise política, os desafios estavam em torno do desenvolvimento, da reconstrução e da melhoria da educação.
Fundamental para a sociedade angolana, sobretudo neste momento em que a política econômica do desenvolvimento do capital se realiza através da entrada de capitais e investimentos externos, impulsionados e justificados, em grande parte, pelo discurso de desenvolvimento e crescimento do capital econômico sustentável. (NGULUVE, 2006, p. 137).
Esta reforma foi pensada para a remodelação e o funcionamento das estruturas de desenvolvimento de Angola, medida que se ajusta a uma estratégia de crescimento. Reforça-se o papel crucial apresentado para a educação ao desenvolver as Estratégias Integradas para a melhoria do Sistema da Educação (2001-2015):
Fundamental de dar a conhecer as linhas características gerais e específicas (diagnóstico) e o prognóstico a curto, médio e longo prazos do Sistema de Educação, com predominância para os subsistemas […] recomendações de Conferência Regionais e Internacionais do domínio da Educação e que engajam […] Decénio Africano de Educação, instituído pela OUA, o quadro de ação do Fórum Mundial sobre Educação para Todos e o Decénio das Nações Unidas de Alfabetização para todos cujos compromissos se estendem até 2015. (ANGOLA, 2001b, p.10)
A LBSE nº 13/01 de 31 de dezembro de 20016, nos termos da sua definição, afirma:
A educação constitui um processo que visa preparar o indivíduo para as exigências da vida política, económica e social do País e que se desenvolve na convivência humana, no currículo familiar, nas relações de trabalho, nas instituições de ensino e de investigação científico-técnica, nos órgãos de comunicação social, nas organizações comunitárias, nas organizações filantrópicas e religiosas e através de manifestações culturais e gimno-desportivas.
O sistema de educação é o conjunto de estruturas e modalidades, através das quais se realiza a educação, tendentes à formação harmoniosa e integral do indivíduo, com vista à construção de uma sociedade livre, democrática, de paz e progresso social. (ANGOLA, 2001a, p. 2)
Em 2002 há o fim da guerra civil e é assinado o acordo de paz, em 4 de abril, entre MPLA e Unita, que permitiu áurea a implementação da nova Constituição da República em 2010, que:
Representa o culminar do processo de transição constitucional iniciado em 1991, com a aprovação, pela Assembleia do Povo, da Lei n.º 12/91, que consagrou a democracia multipartidária, as garantias dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o sistema económico de mercado, mudanças aprofundadas, mais tarde, pela Lei de Revisão Constitucional n.º 23/92. (ANGOLA, 2010, p. 4).
Dessa forma, na ausência da guerra civil, aspiravam-se a diversas possibilidades. Os momentos seguintes foram marcados por anseios e motivações por revitalizar e dar sentido às diversas lutas de consagração, independência e soberania de um país.
A educação na era do acordo de paz – 2002
A educação pensada para este contexto é uma associação das diversas tentativas buscadas na democratização de Angola. Nesta era, vivenciam-se as reformulações das reformas anteriores com o objetivo de se acentuar as necessidades da formação real do sujeito angolano, norteada pela recente LBSE nº 13/01 de 31 de dezembro de 2001.
Portanto, em 2016 o sistema educativo passa a ter vigor pela nova Lei, a de n. 17/16 de 7 de outubro, revogando-se a anterior. Esta lei representa uma ampliação do sistema e discorre sobre os desafios, traduzindo-os em “Planos e Programas Estratégicos de Desenvolvimento, a fim de garantir a inserção de Angola no contexto regional e internacional” (ANGOLA, 2016b, p. 3.993).
O sistema de educação é unificado igual à lei anterior, porém sua organização buscou fortalecer a articulação entres os seis (6) subsistemas de ensino: pré-escolar, ensino geral, ensino técnico-profissional, formação de professores, educação de adultos e ensino superior, processados quatro níveis de ensino, a educação pré-escolar, ensino geral (ensino primário e ensino secundário) e o ensino superior.
Segundo o dispositivo, o subsistema da educação pré-escolar é responsável pela educação na primeira infância. Sua estrutura compreende três etapas: a creche – dos 3 meses aos 3 anos de idade; jardim de infância – dos 3 aos 5 anos de idade; a classe de iniciação, dos 5 aos 6 anos de idade. A fase inicial da formação tem os seguintes objetivos:
Estimular o desenvolvimento intelectual, físico, moral, estético e afetivo da criança, garantindo-lhe um ambiente sadio, de forma a facilitar a sua entrada no subsistema de ensino geral.
Permitir uma melhor integração e participação da criança através da observação e compreensão do meio natural, social e cultural que a rodeia.
Desenvolver as capacidades de expressão, de comunicação, de imaginação criadora e de estimular a curiosidade e a atividade lúdica da criança. (ANGOLA, 2016a, p. 3.996).
O subsistema de ensino geral estrutura-se em ensino primário e ensino secundário. O ensino primário tem a duração de 6 (seis) anos, abarca crianças que completam 6 anos até o ano de matrícula, isto é, a 31 de maio. Quanto à sua organização, o processo de ensino é realizado em ciclos, ou seja, três ciclos de aprendizagem para cada duas classes escolares.
Nas 1ª e 2ª classes são cumpridos os objetivos pedagógicos efetuados na 2ª classe. Para a 3ª e 4ª classes, cumpre-se a avaliação dos objetivos pedagógicos efetuados na 4ª classe, ao passo que para as classes da 5ª e 6ª são cumpridas as avaliações dos objetivos pedagógicos da 6ª classe.
O ensino secundário geral prioriza a formação para ascensão do nível alto de ensino à formação superior ou à inserção direta no mercado de trabalho, quando do cumprimento da formação profissional. Esse nível de ensino organiza-se em dois ciclos que abarcam três classes de ensino. O I ciclo do ensino secundário geral agrega a 7ª, 8ª e 9ª classes para as idades compreendidas entre os 12 (doze) aos 14 (catorze) anos de idade. O II ciclo do ensino secundário geral compreende a 10ª, 11ª e 12ª classes das para as idades de 15 a 17 anos.
Segundo a Lei n. 17/16, os objetivos do subsistema geral são:
Assegurar a formação harmoniosa e integral de qualidade, que permita o desenvolvimento das capacidades intelectuais, laborais, artísticas, cívicas, morais, éticas, estéticas e físicas.
Assegurar conhecimento técnico-científicos e tecnológicos que favoreçam um saber-fazer eficaz e eficiente que se adapte às exigências de desenvolvimento económico e social.
Educar as crianças, jovens e cidadãos adultos para adquirirem hábitos, habilidades, capacidades e atitudes necessárias ao seu desenvolvimento.
Promover na juventude e noutras camadas sociais o amor ao trabalho e potenciá-los para aprendizagem de uma atividade laboral socialmente útil e capaz de melhorar as suas condições de vida.
Assegurar à nova geração uma orientação vocacional e profissional sólida e útil à sua inserção na vida ativa. (ANGOLA, 2016a, p. 3.996).
O ensino técnico profissional, como anteriormente mencionado, faz menção a uma formação técnica que responde por desenvolver conhecimento que possibilite a inserção imediata no mercado de trabalho. Estrutura-se em Formação profissional básica e Ensino secundário técnico-profissional. A frequência para a educação profissional básica é após a conclusão do ensino primário em sequência da 7ª, 8ª e 9ª classes, podendo ser frequentada por alunos com idades compreendidas aos 12, 14 e 17 anos.
Em relação ao secundário técnico-profissional, este é realizado após a conclusão do profissional básico que compreende as classes de 9ª a 12ª, com duração de quatro anos a partir dos 15 anos de idade. Esta formação tem como objetivo:
Assegurar o ensino e a formação técnica e profissional dos indivíduos em idade escolar, dos candidatos a emprego e dos trabalhadores.
Capacitar para o exercício de uma atividade profissional ou especializada.
Dar respostas às necessidades do País em mão-de-obra qualificada e especializada, ajustada à evolução técnica e tecnológica.
Desenvolver a valorização do trabalho, potenciando a aprendizagem de uma atividade laboral socialmente útil e a melhoria das condições de vida.
Promover hábitos e atitudes necessárias ao desenvolvimento da consciência nacional.
Assegurar uma base científica que permita a continuação dos estudos e uma formação integral, assente em valores morais, cívicos e patrióticos.
Consolidar a vocação profissional e a preparação para a vida ativa para o aumento dos níveis de produtividade. (ANGOLA, 2016a, p. 3998)
O subsistema da formação de professores é um “conjunto de órgãos, instituições, instituições e recursos vocacionados à preparação e habilitação de professores e demais agentes de educação para todos os subsistemas de ensino” (ANGOLA, 2016a, p. 3.999). Sua estrutura se desenvolve em duas formas: ensino secundário pedagógico e ensino superior pedagógico.
Na formação para o ensino secundário pedagógico, o processo permite que os indivíduos adquiram e desenvolvam conhecimentos, hábitos, habilidades, capacidades e atitudes para o exercício da profissão docente na educação pré-escolar, ensino primário e no I ciclo do ensino secundário regular, adultos e na formação especial em função dos critérios. Esta formação se realiza após a conclusão da 9ª classe; ocorre nos magistérios e conta com a duração de quatro anos.
Em relação ao ensino superior pedagógico, o processo é desenvolvido nas instituições superiores voltadas à formação de professores e agentes em educação. São habilidades para atividade docente e apoio à docência dos vários subsistemas e níveis de ensino. Assim sendo, este subsistema prima pelos seguintes objetivos:
Formar professores e demais agentes de educação com perfil necessário à materialização integral dos objetivos gerais da educação nos diferentes subsistemas de ensino.
Formar professores e demais agentes de educação com sólidos conhecimentos científicos, pedagógicos, metodológicos, técnicos e práticos.
Promover hábitos, habilidades, capacidades e atitudes necessárias ao desenvolvimento da consciência nacional.
Promover a integridade e idoneidade patriótica, moral e cívica, de modo que os professores e agentes de educação assumam com responsabilidade a tarefa de educar.
Desenvolver ações de atualização e aperfeiçoamento permanente dos professores e agentes da educação.
Promover ações de agregação pedagógica destinadas a indivíduos com formação em diversas áreas de conhecimento para o exercício do serviço docente. (ANGOLA, 2016a, p. 3.999).
A educação de adultos integra conjuntos de diversos órgãos, instituições, disposições e recursos vocacionados para a implementação de processos educativos baseados em princípios e tarefas de andragogia. Este subsistema integra a visão socioeducativa e econômica dos indivíduos a partir dos 15 anos de idade e estrutura-se em ensino primário e ensino secundário.
O ensino primário de adultos organiza-se em duas formas: alfabetização, 1ª e 2ª classes e é frequentado por alunos a partir de 15 anos de idade. A segunda fase deste ensino é a pós-alfabetização, que corresponde às 3ª, 4ª, 5ª e 6ª classes para frequência de alunos com idade de 17 anos.
O ensino secundário para adultos organiza-se em: I ciclo do ensino secundário geral para a 7ª, 8ª, 9ª classes e o II ciclo compreende a 10ª, 11ª e 12ª classes. A formação básica profissional compreende a 7ª, 8ª, 9ª classes e, por fim, o ensino secundário técnico para 10ª, 11ª, 12ª e 13ª classes tem uma formação que objetiva:
Promover ações educativas destinadas à recuperação do atraso escolar e ao combate ao analfabetismo literal e funcional.
Promover o desenvolvimento das potencialidades dos indivíduos para a sua melhor integração social e profissional.
Dotar os indivíduos de capacidades técnicas para responder às exigências do desenvolvimento económico e social do País.
Promover a educação patriótica, moral, cívica e cultivando o espírito de tolerância, o respeito mútuo, o respeito pela diferença e a preservação do ambiente.
Garantir a valorização das línguas nacionais, da cultura local e da cultura nacional.
Desenvolver no indivíduo hábitos, habilidades, capacidades e atitudes para participar na transformação do meio familiar e social, de modo a contribuir para o desenvolvimento comunitário e rural.
Desenvolver e consolidar a orientação vocacional e profissional dos alunos com vista a auxiliar à adequada escolha de uma profissão. (ANGOLA, 2016a, p. 4.000-4.001).
Pela seção VIII, artigo 61º, é apresentado o subsistema do ensino superior que integra diversos órgãos, instituições, disposições e recursos para formação de quadros e técnicos de alto nível. Para frequentar o ensino superior, é necessário que se conclua o ensino secundário. As formações neste nível são ministradas em graduação e pós-graduação. A graduação compreende os níveis de bacharelado, formação no domínio profissional específico com a duração de três anos, ao passo que a licenciatura, como formação dentro de um ramo de conhecimento específico, tem a duração de quatro a seis anos.
No que concerne ao nível da pós-graduação, este corresponde ao mestrado e ao doutorado. A formação para o mestrado tem a duração de dois a três anos, aprofundando a competência científica e técnico-científica dos graduados, enquanto a formação para o doutoramento é todo um processo que propicia a capacitação científica e é realizada entre 4 e 5 anos. Tendo em conta sua especificidade, o ensino superior responde pelos seguintes objetivos:
Preparar quadros com alto nível de formação científica, técnica, cultural e humana, em diversas especialidades correspondentes a todas as áreas do conhecimento.
Realizar a formação em estreita ligação com a investigação científica orientada para a solução dos problemas locais e nacionais inerentes ao desenvolvimento do País e inserida nos processos de desenvolvimento da ciência, da técnica e da tecnologia.
Preparar e assegurar o exercício da reflexão crítica e da participação da atividade económica para o benefício da sociedade.
Ministrar cursos de graduação e pós-graduação para a formação de quadros e técnicos de nível superior.
Ministrar cursos de especialização, para a superação científica e técnica dos quadros de nível superior.
Promover a investigação científica, a divulgação e aplicação dos seus resultados, para o enriquecimento da ciência e o desenvolvimento multidimensional do País.
Promover a extensão universitária, através de ações que contribuam para o desenvolvimento da própria instituição e da comunidade em que está inserida.
Desenvolver e consolidar a orientação vocacional e profissional com vista ao exercício de uma profissão. (ANGOLA, 2016a, p. 4.002).
Os diferentes subsistemas de ensino são regidos por diplomas próprios. Na atual Lei de Bases do Sistema de Educação e Ensino, os princípios gerais vigoram entre o processo sistemático, a formação dos indivíduos, o papel das instituições e o processo educativo que promova uma educação que resulte em progresso.
A educação escolar e as eleições gerais de 2017
No período da contemporaneidade angolana, a educação ganha respaldo na LBSE nº 17/16, uma ampliação aludida por sua reorganização ante os antecedentes históricos desse setor.
A consolidação da paz foi fundamental para aspirar a novos horizontes na educação. Porém, o marco neste contexto são os discursos sobre educação, considerada a base do desenvolvimento de Angola.
As eleições gerais realizadas em 23 de agosto de 2017 (DISCURSO…, 2017) determinaram ao candidato João Manuel Gonçalves Lourenço a vitória pelo partido MPLA. Durante a investidura ao cargo de presidente de Angola, ele discursou sobre o papel da Constituição na democratização pela participação ativa da sociedade na concepção e execução das políticas públicas.
As políticas públicas, neste discurso, traduziram-se como a aposta do Estado para os setores, sobretudo o social, com vista à redução das desigualdades na educação, à assistência de base, à segurança social e à assistência a pessoas vulneráveis reforçadas como uma das tarefas prioritárias.
Sobre a educação, foi enfatizado o reforço do projeto de formação de quadros e o direito constitucional de garantir uma educação para todos os angolanos. O presente discurso foi marcado também pelas possíveis reformas, como a curricular, para atender às especificidades regionais, à valorização da carreira docente, equidade nos subsistemas de ensino e formação de quadros. Mudanças que visam à melhoria da qualidade da educação em Angola.
No entanto, este discurso não foi senão o reflexo da agenda de governo do partido no poder, para os anos 2017-2022, que focou na proposta de reforma do Estado, na diversificação da economia e na perspectiva da competitividade do mercado ao capital humano, a saber:
– Consolidação da paz e da democracia e preservação da unidade e da coesão nacional;
– Reforço da cidadania e construção de uma sociedade cada vez mais inclusiva;
– Concretização da reforma e modernização do Estado;
– Desenvolvimento sustentável com inclusão económica e social e redução das desigualdades;
– Desenvolvimento humano e bem-estar dos angolanos;
– Edificação de uma economia diversificada, competitiva, inclusiva e sustentável;
– Expansão do capital humano e criação de oportunidades de emprego qualificado e remunerador para os angolanos;
– Defesa da soberania e da integridade territorial do País e da segurança dos cidadãos;
– Desenvolvimento harmonioso do território, promovendo a descentralização e a municipalização;
– Reforço do papel de Angola no contexto internacional e regional. (ANGOLA, 2017a, p. 16).
Os objetivos acima estão transcritos no Plano de Desenvolvimento Nacional (2018-2022 [ANGOLA, 2018a]), visto que, o primeiro exercício relacionado ao desenvolvimento do país se espelha minuciosamente no PDN (2013-2017 [ANGOLA, 2012]). Sobre a educação, segundo o relatório apresentado pela Unicef (ANGOLA; UNICEF, 2017), de 2016 a 2017, o orçamento para o setor previu um aumento de 10% em termos nominais, em razão da inflação, que caiu a 5%. Em virtude disto, apelasse a partir do Orçamento Geral do Estado (OGE) a melhoria do setor, com o aumento de 20% reforçando o quarto objetivo de desenvolvimento sustentável, compromisso assumido em Dakar, em 2000.
O acima exposto tornou-se o exercício que passou a direcionar a educação para ações concretas, inicialmente pela Lei de Base, que trouxe evidências ao papel descartado em função do contexto verificado, negligenciando o direito à educação, a expansão das redes de ensino, a distribuição correta do orçamento entre as províncias e a resposta às grandes demandas estudantis verificadas em todo o país.
Porquanto, foram verificados o não cumprimento do acordo de Dakar, ou seja, 6,6% de investimento para o setor da educação, cortes no setor pelo fator crise, inadequação dos recursos para o ensino entre atrasos nos orçamentos fundamentam as incoerências do Plano de Desenvolvimento Nacional (2013-2017) que, segundo o relatório da UNICEF (2017) o mesmo PDN (2013-2017) não cumpriu com as prioridades do governo voltada ao setor da educação.
Considerações finais
O estudo buscou descrever por meio do processo histórico os aspectos da educação em Angola desde a era colonial 1482, até as eleições gerais em 2017. Entretanto, demarcando todo um cenário político sobre o qual a educação se desenvolvia. Para isso, foram pontuando quatro momentos, nomeadamente, a era colonial, 1482 chegada dos portugueses e a educação formal em Angola. A era pós-colonial, marcada pela independência em 1975. A era do acordo de paz, em 2002, e a realização das eleições gerais em 2017.
Pontuam-se nestes momentos exclusão de um direito, contexto emergencial da educação, ditames por reflexões profundas em consequência das novas configurações relacionadas às mudanças social e económica face aos ajustes nacional e internacional. Por outro lado, se acentuam as necessidades da formação do cidadão angolano, disposto pelo sistema educacional em detrimento do progresso da sociedade angolana.
Discorre-se também, com base em novos horizontes a democratização e o papel social reafirmado no direito constitucional. Em todo o caso, até a contemporaneidade recorte temporal do nosso estudo, o contexto entona discursos de mudanças e melhorias da educação, reforçados também no programa de governo, todavia, consideramos que os sentidos da educação seguem em construção.
²Divisão territorial e administrativa que imperava em Angola antes da chegada dos portugueses, constituída pelos reinos do Ndongo, Congo, Bailundo, Kassanje, Matamba, Chiaka, Chingolo e Ndulu. O poder monárquico reconhecia a figura do rei como responsável pelos tratados do reinado.
³Termo usado para se referir a um cidadão originário da terra.
4Estatuto dos indígenas portugueses das províncias da Guiné, Angola e Moçambique. Lei orgânica implementada para as províncias ultramarinas sob o domínio de Portugal, aprovada em Decreto-Lei n. 39.666, de 20 de maio de 1954.
5Termo usado para distinguir os negros que pertenciam à elite (mestiços) e detentores da nacionalidade portuguesa.
6A LBSE nº 13/01 definiu que a política era exclusividade do Estado, cabendo ao Ministério da Educação (MED) a coordenação de todo o sistema, tendo em vista a definição das normas gerais e os aspectos de ordem técnica e pedagógica.
Referências
ANGOLA. Assembleia Nacional. Lei de Bases do Sistema de Educação. Luanda, 2001a.
ANGOLA. Constituição. Luanda: Imprensa Nacional – E.P, 2010.
ANGOLA. Decreto Presidencial, n. 17/16, de 7 de Outubro de 2016. Lei de Bases do Sistema de Educação, que estabelece os princípios e as bases gerais do Sistema de Educação e Ensino. Diário Oficial da República de Angola, I Série – n. 170. Luanda: Imprensa Nacional – E.P., 2016a.
ANGOLA. Ministério da Economia e Planeamento. Plano de Desenvolvimento Nacional 2018 – 2022. Luanda, 2018a. v. 1.
ANGOLA. Ministério da Educação. Estratégia integrada para a melhoria do Sistema de Educação 2001-2015. Luanda, 2001b.
ANGOLA. Ministério do Planeamento e do Desenvolvimento Territorial. Plano Nacional de Desenvolvimento (2013–2017). Luanda, 2012.
ANGOLA. Programa de Governo 2017-2022. Melhorar o que está bem, corrigir o que está mal. Luanda, 2017a.
ANGOLA; UNICEF. Educação no OGE 2017. Orçamento Geral do Estado. Luanda, 2017b.
BITTENCOURT, M. As eleições angolanas de 1992. Revista TEL, Irati, Paraná, v. 7, n. 2, p. 170-192, jul./dez. 2016.
GOUVEIA, J. B. O constitucionalismo de Angola e a sua Constituição de 2010. Revista de Estudos Constitucionais, Hermenêuticas e Teoria do Direito (RECHTD), Rio Grande do Sul, v. 9, n. 3, p. 221-239, set.-dez. 2017.
IZAR, J.G. O ensino superior em Angola e no Brasil. 2016. 221f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.
LIBERATO, E. Avanços e retrocessos da educação em Angola. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 19, n. 59, out.-dez. 2014.
MENEZES, A. Um olhar à implementação da Reforma Educativa em Angola: estudo de caso nas províncias de Luanda, Huambo e Huíla. Luanda, 2010. Disponível em: <http://isced.ed.ao/assets/290/Azancot%20de%20Menezes-Reforma%20Educativa%20em%20Angola.pdf>. Acesso em: 19 fev. 2021.
NETO, M. B. História e educação em Angola: do colonialismo ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). 2005. 260f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2005.
NGULUVE, K. A. Política educacional angolana (1975-2005): organização, desenvolvimento e perspectivas. 2006. 218f. Dissertação (Mestrado) – Universidade de São Paulo: São Paulo, 2006.
PAXE, I. P. V. Políticas educacionais em Angola. 2014. 200f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014.
PORTUGAL. Decreto-Lei nº 39.666, de 20 de maio de 1954. Estatuto dos Indígenas Portugueses das Províncias da Guiné, Angola e Moçambique. Boletim Oficial da Colónia de Angola. Portugal, 1954. Disponível em: <https://www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/7523.pdf>. Acesso em: 03 dez. 2020.
SILVA, G. B. A educação colonial do Império Português em África (1850-1950). Cadernos do Tempo Presente, Sergipe, n. 21, p. 67-83 set./out. 2015. Disponível em: <http://www.seer.ufs.br/index.php/tempo>. Acesso em: 29 dez. 2020.
¹Mestre em Educação pela Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista – UNESP. ildacosta23@hotmail.com.