REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202506121653
Viviane Kassner1*
Naissa Maria Silvestre Dias Hippler2
RESUMO
O processo de aprendizagem envolve várias ações para que ele obtenha êxito. Considerar bons aspectos metodológicos, boa fundamentação e motivação é fundamental para planejar as ações a serem realizadas. Desenvolver nos alunos novas competências e habilidades também está no rol de necessidades para se ter bons resultados neste processo, mas o que fazer quando todos são assolados por uma Pandemia repentina que nos isola em casa e rompe com todos os protocolos de ensino presencial? O colégio P. M. B. havia, neste ano, reformulado sua proposta pedagógica alinhando suas ações a novas perspectivas educacionais. Trabalharia com projetos, metodologias ativas e com resolução de problemas, porém, em meio a suspensão de suas atividades presenciais, obrigou-se a encarar uma realidade mundial muito distante daquilo que era comum: ter seus alunos diariamente na escola, sendo conduzidos a buscar soluções para problemas sociais, e podendo intervir em todos os contextos sociais dentro e fora da escola, ajudando o aluno a se tornar dono de seu saber. Apresentar essa nova realidade e todos esses desafios foi o objetivo desse trabalho, além de constatar se o ensino online seria ou não adequado a rede regular, por não termos ainda, no ensino oficial, adaptações já existentes nessa modalidade. Vários dados trouxeram informações relevantes quanto às dificuldades apresentadas por alunos, pais e docentes e que impactaram de forma relevante o aprendizado dos alunos e o sucesso no processo adaptativo, mostrando o baixo rendimento apresentado pelos alunos durante o primeiro período avaliativo do ano.
Palavras-chave: metodologias, ensino, online, aprendizagem, resultado.
Introdução
O ano de 2020 tem sido um grande desafio. O contexto Pandemia, uma novidade sem precedentes históricos, apresenta o distanciamento social de forma inquestionável e cruel. Para a educação então foi algo extremamente radical. Segundo Vigotsky (2001), o desenvolvimento cognitivo do aluno se dá por meio da interação social, seja com o meio ou com outros indivíduos. Esta interação possibilita a geração de novas experiências e ideias e faz com que a aprendizagem se torne ainda mais significativa. Ele afirma ainda que todos os seres humanos necessitam de interação e de troca para se desenvolver.
Ainda não há como desassociar a aprendizagem do ensino estruturado, que de acordo com Massi (2004) é aquele onde as aulas são planejadas antecipadamente e contemplam elementos auxiliadores como exercícios e atividades previamente preparados, assim como material didático complementar como livros, textos e há uma avaliação sistemática, e a escola, onde, obrigatoriamente, o aluno frequenta por pelo menos 12 anos de sua vida, ainda representa o ambiente preparado para estimular crianças e adolescentes a desenvolver competências e novas habilidades para lidar com a vida e com os desafios que ela traz.
Mas, se até hoje conhecíamos o processo de conhecimento desta forma, precisamos nos acostumar com uma nova realidade que pode depender do uso contínuo da tecnologia. O desinteresse dos alunos pelos conteúdos ensinados na escola tem feito com que os professores se mobilizem para tornar suas aulas mais atrativas, e o primeiro grande passo e começar a fazer uso de tecnologias que estão disponíveis, sejam elas em forma de aplicativos, dispositivos diferenciados, discussões em grupo e outros meios, para que os alunos se sintam como parte atuante no processo de aprendizagem. A partir da introdução do uso dessas ferramentas, com certeza irão sentir-se seduzidos e mais interessados neste novo modelo de aprendizado (Ribeiro, 2020).
A educação estruturada nas salas de aula precisou ser pausada, e novos meios de trabalho remoto precisaram ser desenvolvidos a fim de manter alunos e educadores conectados, produzindo conhecimento e desenvolvendo aprendizagens. Mas como trabalhar de forma emergencial com algo que tão poucos tinham tido contato? Como garantir o processo de aprendizagem pensando no uso de internet e de equipamentos tecnológicos como ferramenta imprescindível, mas de forma inclusiva a todas as pessoas, independente de condição social?
É possível escolher lidar com tal questão como um fator motivador, uma oportunidade para mudar a educação considerada por muitos até que ultrapassada, ou encarar que apenas a dificuldade vencerá.
Tal assunto levantou o interesse de pesquisar sobre as formas utilizadas por alguns professores e alunos para lidar com esse desafio, e encontramos o Colégio P. M. B. que nos possibilitou a observação de todos os seus processos e a análise de todos os resultados apresentados por seus alunos durante o primeiro período avaliativo de 2020, chamado de 1º Trimestre.
Material e Métodos
Esse estudo foi desenvolvido em um Colégio de Ensino Regular que contempla, como níveis de ensino, da Educação Infantil ao Ensino Médio, localizado na cidade de São Paulo. Foi elaborado através da observação dos dados coletados durante a implantação de uma proposta de ensino remoto frente a necessidade de afastamento social denominado quarentena.
A abordagem utilizada para o desenvolvimento deste trabalho foi de caráter qualitativo uma vez que pretendeu-se compreender as formas de conduta comportamental do grupo escolhido frente aos estímulos que foram submetidos a cada aula, diariamente. A natureza aplicada do trabalho utilizou como objetivo a pesquisa exploratória a partir do estudo de caso da escola escolhida, no agrupamento de alunos do Ensino Médio (uma turma por série do nível citado – idades entre 15 e 17 anos), considerando que o estudo de caso deseja entender um fenômeno do mundo real e assumir que esse entendimento provavelmente englobe importantes condições contextuais pertinentes ao caso que escolhemos (Yin, 2001).
A pesquisa realizou-se entre os meses de março e julho de 2020, desenvolvida no ambiente escolar virtual, de forma que todos os alunos e professores observados não se sentissem cobrados de nenhuma forma. Utilizamos também os resultados apresentados através de avaliações on-line realizadas no Google Forms, e de atividades apresentadas na plataforma de postagem de atividades utilizada pelo colégio. Vale ressaltar que todas as fontes utilizadas constam do banco de dados do Colégio P.M.B.
Resultados e Discussão
Apresentação da Proposta de mudança metodológica do Colégio
A escolha pela mudança da proposta pedagógica do Colégio P.M.B, localizado em São Paulo, deu-se a partir da necessidade observada de tornar o aprendizado dos alunos mais atraente e efetivo. A escola está localizada num bairro de classe média/baixa, e tem suas mensalidades com valores bastante acessíveis. Segundo a gestão, a missão desta escola consiste em oferecer educação de qualidade a um valor acessível, propiciando a classes mais carentes que tenham acesso a uma escola particular e a estrutura de ensino que ela propõe.
Todos os anos, ao final de cada período avaliativo, reuniões entre a gestão e os professores levantavam discussões em torno do mesmo assunto: Percebia-se, apesar do rendimento mediano, conforme demonstram os gráficos das figuras 1, 2 e 3, baixo interesse por parte dos alunos, pelo aprendizado. O foco principal destes era “apenas tirar nota” para obter promoção para o próximo ano letivo.

Fonte: Sistema Sophia – Colégio P.M.B.
Nota: *Gráfico em azul representa notas acima da média (6,0) e em vermelho representa notas abaixo da média.

Fonte: Sistema Sophia – Colégio P.M.B.
Nota: *Gráfico em azul representa notas acima da média (6,0) e em vermelho representa notas abaixo da média.

Fonte: Sistema Sophia – Colégio P.M.B.
Nota: *Gráfico em azul representa notas acima da média (6,0) e em vermelho representa notas abaixo da média.
Para levantar hipóteses sobre tal questão, discutiam incansavelmente o fazer pedagógico, que ainda trazia, ano a ano, ferramentas insuficientes para despertar no aluno o tão esperado interesse pelo saber. Tais resultados eram motivo de inquietação da equipe, principalmente de docentes, que mostravam muito claramente insatisfação com esse cenário, que, em alguns momentos, questionava de forma bastante direta a competência docente dos profissionais.
As questões relacionadas a manter o aluno motivado considerando o envolvimento dos professores de forma positiva ainda não são esclarecedoras. Embora se saiba como os alunos pensam diante do processo de ensino aprendizagem, os professores não conseguem apresentar uma mudança considerável (Pereira, 2008).
Ainda havia uma concepção educacional desassociada e desconectada da realidade e do tipo de aluno de hoje. Empregavam-se procedimentos metodológicos de ensino e de avaliação da aprendizagem como um fim em si mesmos, considerando-os instrumentos mecânicos, automatizados, coercitivos, seletivos, disciplinadores e discriminadores, sem relação com as situações de aprendizagem. O ato pedagógico era reduzido a uma automatização de comportamentos, atitudes e regras que impediam os alunos de reinventarem o conhecimento historicamente acumulado.
Segundo Torres et al. (2013) a escola acessível de hoje, não é capaz de realizar adequadamente as dimensões mais básicas a que ela se propõe: oferecer um espaço bem cuidado e seguro, no qual professores e alunos estejam presentes, os conteúdos façam sentido e as aulas aconteçam num contexto de respeito mútuo e de relativa atenção, conforme opinião de jovens participantes de uma pesquisa em São Paulo e Recife. Mesmo diante de um cenário de educação privada, faltava ainda o mais importante: o interesse dos alunos.
Ao final deste longo período de reflexão da equipe, a conclusão levou o Colégio a conceber a mudança de proposta para uma aprendizagem mais ativa, mas que aconteceria em conjunto com uma mudança fundamental e necessária no papel do corpo docente e de todos os envolvidos, tendo como objetivo maior trazer ao aluno a oportunidade de torná-lo protagonista de seu aprendizado, deixando-o mais envolvido e trazendo aplicabilidade real a cada habilidade desenvolvida.
Desde tal decisão, no final de 2019, várias formações foram realizadas para que todos os profissionais envolvidos no processo pudessem entender quais mudanças seriam realizadas e quais resultados buscariam. Utilizar as Metodologias Ativas deixou de ser apenas um processo a ser estudado e passou a ser implantado com nova proposta de recursos metodológicos no colégio, usado como referência nessa reorganização pedagógica.
Pensando de forma geral, os processos que envolvem a aprendizagem sempre necessitam, em algum aspecto, de postura ativa, ou seja, exigem diferentes formas de movimento interno e externo, de motivação, seleção, interpretação, comparação, avaliação, aplicação dos atores: professores e alunos (Moran, 2013).
No período de janeiro de 2020, durante o planejamento anual, várias capacitações trouxeram aos professores opções metodológicas e a aprendizagem significativa, através de projetos, também foi implantada como uma das opções de trabalho com metodologias ativas.
As aulas iniciaram-se em fevereiro deste ano, e algumas palestras aos alunos foram propostas para que eles também pudessem entender como funcionaria a nova metodologia, e houve, em algumas turmas, principalmente do Ensino Médio, certa resistência, por dois motivos: Exames como Enem ou o Vestibular exigiam uma maior bagagem, quantidade de conteúdos na opinião deles, e veio a tona a preocupação sobre o professor deixar de “dar” o conteúdo, de trazer coisas prontas, esperando também a mudança de postura do aluno, que seria obrigado a deixar sua posição passiva e se tornar agente de seu próprio desenvolvimento. Deverá ele transcender o papel de passivo, de escuta, daquele que lê, decora e se torna fiel repetidor das ensinanças do discente, tornando-se explorador e atuante, crítico e criativo, produtor de conhecimento (Moran et al., 2013).
O Colégio P.M.B preocupou-se com a aceitação e o entendimento dos pais, e para lhes dar maior segurança, manteve a adoção de livros didáticos para que não houvesse uma grande ruptura no processo educativo sem que os pais pudessem acompanhar.
A equipe pedagógica e docentes relatam que, de certa forma, os pais ainda não entendem o processo de desenvolvimento de Competências e Habilidades proposto pela nova BNCC e ainda se apegam muito a conteúdos, então havia uma insegurança na não adoção de livros nesse primeiro momento.
Quando se pensou em manter os pais informados e participantes, a escola tratou de aproveitar as oportunidades para esclarecer seus objetivos e as questões pedagógicas pontuais sobre a nova proposta, considerando os dados obtidos até hoje no cenário de rendimento dos alunos ano a ano, e a expectativa de que os alunos, envolvidos como protagonistas do processo, apresentem uma melhora em seu envolvimento com os conteúdos e como consequência, uma melhoria em seu rendimento. Desta forma o Colégio pretendeu sensibilizar os familiares a se comprometerem ainda mais com o desenvolvimento de seus filhos até mesmo como seres humanos melhores.
Além dos livros didáticos havia uma preocupação da escola em trazer o recurso digital para a sala de aula como mais uma ferramenta de ensino, o que foi efetivada com a adoção do Projeto Compartilha, comercializado pela Editora Moderna, que contempla, através de uma plataforma digital, ferramentas de atividades online, gamificação, simuladores 3D, e atividades avaliativas, que complementariam muito toda a nova proposta. O projeto Moderna Compartilha é, originalmente, mantido pela Editora Santillana, mantenedora da Editora Moderna, e já é utilizado há mais de uma década na Espanha, sede da Editora Santillana.
A Proposta sofre alteração devido a pandemia mundial
Após aproximadamente 30 dias de trabalho no período letivo, o Colégio, seguindo orientação do Governo do Estado de São Paulo, precisou fechar suas portas em 16 de março diante de um cenário de Pandemia Mundial decretado pela OMS.
A partir daí, o Colégio enfrentaria uma situação de incertezas e dificuldades, tendo em vista a inexistência de uma data para retorno das aulas presenciais, e a possibilidade de tornar o ensino remoto como definitivo durante esse momento de crise.
O ensino remoto sugere a existência de uma infraestrutura para a oferta desta modalidade de ensino, uma rede de professores preparados para o uso das plataformas e recursos, e por isso, podemos usar de um termo que a literatura recente em educação tem usado que é o ensino remoto emergencial.
Nas primeiras semanas, embora a gestão do Colégio tenha em mente algumas ideias de como direcionar o processo de ensino remoto, foi buscar meios de viabilizá-lo afinal, os profissionais do colégio, sem poder utilizar da estrutura e de recursos de tal necessitariam garantir o mínimo de equipamentos e recursos para que a proposta pudesse tomar forma. Para que houvesse tempo para a coleta desse tipo de informação, os professores prepararam uma série de atividades impressas e solicitaram que realizassem algumas páginas dos livros didáticos adotados para que os alunos não deixassem de ter atividades, mesmo que de fixação do que já havia sido trabalhado, e não fossem prejudicados até que a adaptação necessária pudesse acontecer, contemplando 20 dias de aulas.
A partir daí, a equipe de gestão do Colégio recolheu informações dos professores sobre computadores pessoais e qualidade de sinal de dados de internet para então comprovar condições de transmissão das aulas de forma remota, da residência de cada professor dos mais variados níveis de ensino. Após garantir que os professores teriam condições de acessar recursos tecnológicos variados, houve uma pesquisa em busca de plataformas de comunicação on line, para aulas presenciais, escolhendo o Hangouts Meet da Google, e adequou o uso da plataforma Moderna Compartilha, já adotada pelo Colégio para seu projeto de ensino, para o uso de postagens de atividades de fixação. E desta forma, munidos das plataformas que viabilizariam as atividades remotas, iniciaram as aulas. Mas, logo no início, começaram as dificuldades.
Fatores de interferência externa que impactam na aprendizagem
Os professores perceberam, em primeiro lugar, que não conseguiriam desenvolver o mesmo projeto de trabalho tendo em vista o primeiro fator de dificuldade: conectividade e recursos tecnológicos disponíveis aos alunos.
Segundo a equipe de gestão, a mesma novidade trazida aos professores também foi apresentada aos alunos, porém, embora a expectativa de adaptação fosse maior e resistência ao uso das plataformas pelos alunos fosse menor, por se tratarem de ferramentas muito intuitivas e semelhantes ao que se aplica à Rede Sociais, por exemplo, houveram dificuldades com qualidade da internet para manter a ferramenta on line logada durante as aulas, que inicialmente foram estabelecidas numa grade de 4 aulas de 50 minutos por dia, pensando em adaptá-los a ficar concentrados tanto tempo numa mesma ferramenta. Surgiu também a dificuldade de uso de câmeras ou microfones, pois muitos desses recursos nunca haviam sido utilizados e quando necessários, acabaram não funcionando.
Pela localidade do Colégio e pelo tipo de público que se propõe a atender, o tipo de equipamento para acesso às plataformas também foi um fator de dificuldade. Alguns alunos possuíam apenas um computador desktop, outros um notebook, alguns apenas o computador do trabalho de um dos membros da família, outros ainda nenhum deles, utilizando apenas o celular com menor capacidade tecnológica, o que nem sempre foi adequado para a participação nas aulas, uma vez que dois instrumentos foram a base do trabalho: A Plataforma Compartilha, e o Aplicativo Google Meet.
Devido a esse contexto, o Colégio P. M. B. relata ter perdido muito tempo em tentar engajar os alunos e os pais.
O período de adaptação inicial além de demorado, trouxe aos profissionais de linha de frente da coordenação pedagógica elevado nível de estresse, pois fatores relacionados a velocidade e pacote de dados de internet dos pais também eram fatores de crítica e resistência, pois pelo baixo esclarecimento de alguns, associavam esse tipo de dificuldade a má qualidade de prestação de serviços do Colégio. Lidar com e-mails, logins em Plataformas diferenciadas e uploads de conteúdo foi quase que o principal desafio relatado pelo Colégio.
Enquanto esse momento de “treinamento inicial de pais e alunos” era superado, havia um segundo desafio que era conseguir que os pais acompanhassem seus filhos em sua rotina, garantindo que executassem as atividades propostas de forma remota.
O decreto da Pandemia pegou a todos de surpresa. Assim como o Colégio P.M.B. foi obrigado a reformular seus processos pedagógicos para um ensino à distância, os pais certamente viveram momentos difíceis entre proteger seus filhos do mal iminente e lidar com suas tarefas laborais diárias, que precisavam continuar a ser realizadas mas num novo cenário: com a família toda em casa.
Segundo a Diretora do Colégio, várias situações onde pais não sabiam o que fazer com os filhos foram vivenciadas, pois muitos passaram a ter contato com uma rotina que há tempos não era vivida: Estabelecimento de regras de boa convivência e divisão de espaço, criação de rotinas e horários, delegação de responsabilidades, além de lidar com as tarefas domésticas diárias. E alguns acabaram por constatar que lidar com essas questões era muito mais urgente do que qualquer coisa, por terem se deparado com uma desordem não esperada.
A rotina de vida normal, pré Pandemia, era coberta de ausência de tempo. Todos viviam tão ocupados que sequer puderam perceber quanta desordem havia nas relações família, pais e filhos. Mal conheciam seus filhos, pois só os viam quando chegavam em casa cansados do trabalho prontos para cumprir a rotina doméstica ou tarde da noite, após a frequência do curso universitário que garantiria uma vida melhor a todos.
De acordo com a coordenação pedagógica do Colégio, os pais apresentaram dificuldade de acompanhar as atividades propostas e se seus filhos estavam ou não às realizando. Mesmo falando de alunos de Ensino Médio, maiores e mais conscientes, a dificuldade se apresentou.
Mais um fator de dificuldade relatado pelo Colégio foi o deficitário engajamento dos alunos nas aulas online no Google Meet e na entrega das atividades remotas na Plataforma Moderna Compartilha.
Os alunos do Ensino Médio das turmas observadas apresentaram características comportamentais muito semelhantes como pouco compromisso com evolução estudantil nesse período, pouco interesse por realizar as atividades assíncronas, como as que deveriam ser realizadas após período de aula, como proposta de fixação de conteúdo, e postadas na Plataforma Moderna Compartilha e quase nenhum interesse em participar das aulas através do “Google Meet”.
Na tentativa de obter mudança nesse comportamento após inúmeras conversas com os alunos, os pais foram contatados na busca de ajuda, e como resultado, houve mais acessos às aulas online, algum aumento nas atividades postadas na Plataforma, mas não o suficiente. Alguns professores que possuem um diálogo mais aberto com os alunos passaram a buscar os reais motivos desse baixo engajamento e as justificativas mais ouvidas foram de que os alunos passavam a noite acordados, portanto, não tinham condição física de acompanhar as aulas logo pela manhã, que não sabiam quanto tempo ficariam em casa, portanto quando retornassem recuperariam o rendimento perdido, ou que já sabiam que não haveria retenção neste ano letivo, portanto, não havia necessidade de grande esforço.
Durante o período de pandemia, as restrições causadas por intervenções como o distanciamento social tem impactado a educação em todos os níveis, uma vez que alunos e professores não conseguem se reunir fisicamente nas escolas e universidades. Essa proibição de se encontrar durante um período prolongado limita as oportunidades de aprendizagem dos alunos durante o período de isolamento. Sabemos que o tempo que se dedica ao estudo é um dos preditores mais confiáveis de oportunidades de aprendizado.
Nos Estados Unidos, pesquisadores têm documentado os efeitos da perda de aprendizagem nas férias de verão, e numa das análises da pesquisa, constatou-se que durante essa pausa, os estudantes perdem o equivalente a um mês de aprendizagem no ano letivo. Além disso, a diferença entre os alunos em relação ao apoio dos pais, a diferença na capacidade dos diferentes tipos de escolas de apoiar a aprendizagem de seus alunos remotamente, e a diferença entre os alunos em sua resiliência, motivação e habilidades para aprender de forma independente e online, são fatores agravantes nas lacunas de oportunidades já existentes (Reimers e Schleicher, 2020).
Para confirmar os relatos dos alunos quanto às dificuldades relacionadas a conectividade e a ferramentas de acesso às aulas e a Plataforma Moderna Compartilha, a gestão do Colégio P. M. B. realizou uma pesquisa com os alunos do Ensino Médio, conforme figura 4.

Fonte: Google Forms – Colégio P.M.B. – Maio 2020
Nota: *Questão 1
Os dados foram interessantes, pois pode-se perceber que embora as famílias tenham em casa dispositivos de comunicação, são equipamentos muitas vezes obsoletos. Constatou se que o celular está presente e a disposição dos alunos em quase 100% das famílias. Mas os demais equipamentos necessários para o desenvolvimento das atividades na Plataforma não estão tão presentes.
Na pesquisa, buscaram também informações sobre a conectividade dos alunos, com os seguintes dados constatados na figura 5 e 6.

Fonte: Google Forms – Colégio P.M.B. – Maio 2020
Nota: *Questão 3

Fonte: Google Forms – Colégio P.M.B. – Maio 2020
Nota: *Questão 4
Há uma oscilação da conectividade dos alunos, conforme os gráficos, e mesmo considerando que a maior parte dos alunos utiliza internet fixa, ainda sim, apenas 50% tem estabilidade nas conexões. Nos casos dos alunos que utilizam a internet móvel como forma de conexão, ainda temos a informação de dispositivos que quase não se conectam, ou seja, alguns alunos deixam de ter acesso às aulas e a Plataforma por falta de conectividade.

Fonte: Plataforma Moderna Compartilha – Editora Santillana – Relatório de B.I. Nota: *Gráfico representa acessos por nível de Ensino
Na figura 7 podemos constatar que o número de acessos dos alunos do Ensino Médio, nível observado em nossa pesquisa, é menor do que os demais níveis, considerando a condição de autonomia esperada para alunos com idade entre 15 e 17 anos, na expectativa de que sabendo de suas responsabilidades, acessem a plataforma para a realização das atividades propostas ou que façam upload de atividades de fixação de conteúdo em materiais de apoio como cadernos e livros sem a necessidade da interferência dos pais.
Até antes da Pandemia, o uso da internet para crianças e adolescentes em geral, sempre esteve associado a momentos de lazer. Os profissionais do Colégio P. M. B. concordam com essa afirmação, principalmente se considerarmos que as ferramentas digitais, até que se repensasse a proposta pedagógica do colégio, também não era uma ferramenta de uso contínuo como instrumento associado ao aprendizado. Quando a proposta sofreu, então, a alteração relatada, as ferramentas tecnológicas passariam a fazer parte da rotina de pesquisa diária dos alunos, mas com o fechamento da escola por conta do período de quarentena, esse uso não chegou a ser instituído, tendo ainda os alunos, mantido os hábitos antigos quanto o acesso aos recursos digitais.

Observamos conforme indicado na figura 8 que a Plataforma recebe o acesso dos alunos para resolução de atividades e uploads de arquivos, em média, a partir das 9h da manhã. Os horários de maior acesso demonstrados são entre as 12h e às 21h, tendo seu pico por volta de 17h. Claramente se percebe que os alunos iniciam sua produção pedagógica a partir do término do horário das aulas, por volta de 11h45, utilizando a parte da tarde para a maior parte de suas atividades. Porém, é importante ressaltar que após a 0h e durante a madrugada há atividade de acesso a Plataforma para postagem e realização de atividades, e essa atividade, exclusiva de alunos, demonstra a falta de rotina e confirmando os argumentos apresentados pelos alunos quanto a falta de condições de assistir às aulas online por terem ficado acordados durante a noite.
Além das informações discutidas acima, os resultados medidos no primeiro período de síntese avaliativa expressam claramente o reflexo de todas essas dificuldades, conforme demonstrado abaixo, na figura 9.

Fonte: Sistema Sophia de Gestão Escolar – Síntese avaliativa
Nota: *Tabela representa médias finais após o 1o Trimestre, obtidas através de variados instrumentos avaliativos.
A turma do 3º ano do Ensino Médio tem excelente resultado escolar. Segundo a equipe gestora, é uma turma que está junto há mais de 4 anos, com pouco trânsito de alunos novos, é que tem boa característica de autonomia e independência.
A equipe relata bastante preocupação com os resultados expressados, afinal, diante de todo o cenário já apresentado, o quadro de isolamento social afetou diretamente o rendimento apresentado durante o Primeiro Trimestre. Há várias notas abaixo da média, fato que não era frequente nesta turma, principalmente por estarem se preparando para o encerramento do período escolar regular e para prestarem diversos vestibulares e o Enem.
Segundo Bacich (2020) alunos presentes na escola, com frequência se sentiram excluídos principalmente quando ocorre uma queda de conexão que pode demorar para ser solucionada. Esses estudantes sentiram-se negligenciados uma vez que, mesmo com a queda na conexão, a aula tinha continuidade com os alunos que continuaram conectados, o que reflete no rendimento dos alunos. É importante ressaltar que Dias e PInto (2020) lembram que saúde física e mental andam juntas e que a duração prolongada do confinamento, a falta de contato pessoal com os colegas de classe, o medo de ser infectado, a falta de espaço em casa faz com que o aluno fique menos ativo do que se estivesse na escola.
Conclusão
É notório afirmar que o período de Pandemia trouxe vários desafios às escolas, principalmente as de Ensino Regular. Lidar com o ensino a distância ainda é algo a ser desenvolvido, uma vez que para o atendimento de crianças e adolescentes, o contato humano com toda a equipe escolar, desde pessoal técnico administrativo até equipe de gestão pedagógica e docentes é essencial, considerando que somos seres sociais. A falta de interação presencial traz grandes perdas, uma vez que o ensino a distância requer habilidades como autonomia e disciplina estudantil.
Outro aspecto constatado é de que a internet nunca havia sido encarada como instrumento de viabilização de estudos, mas de diversão e entretenimento, e mudar sua função tão repentinamente pode ser moroso. Por todos os dados apresentados podemos afirmar que o primeiro período avaliativo do ano para os alunos do Colégio P.M.B. realmente não propiciou um rendimento satisfatório. Além dos fatores interação social, autonomia e disciplina, a conectividade e a condição estrutural e de equipamentos interferiu diretamente em todos os resultados. A motivação dos alunos também se apresentou abaixo do indicado, mesmo utilizando recursos digitais diferenciados, gamificação e vídeos interativos.
Para que o rendimento dos alunos melhore numa situação de continuidade de afastamento social, há que se desenvolver em primeiro lugar maior consciência da necessidade de engajamento escolar à distância. Depois, considerar a condição individual de equipamentos e conectividade, adaptando tarefas a essas particularidades, e por último, oferecer mais treinamento e formação aos professores e demais profissionais envolvidos no processo educativo, para que a partir dos novos conhecimentos adquiridos possam estimular e motivar ainda mais os alunos. Esse comprometimento precisa ser de todas as partes, inclusive da família, que também é parte essencial no processo educacional a distância.
Referências
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Moran, J. 2014. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. Disponível em: <http://www2.eca.usp.br/moran/?page_id=29>. Acesso em: 15 set. 2020.
Reimers, F.M.; Schleicher, A. 2020. Um roteiro para guiar a resposta educacional à Pandemia da COVID-19 de 2020. Disponível em: <https://globaled.gse.harvard.edu/files/geii/files/um_roteiro_para_guiar_a_resposta_educaci onal_a_pandemia_da_covid-19_reimersschleicher_ceipe_30032020_1.pdf>. Acesso em: 14 set. 2020.
Pereira, P. 2008. Os processos de pensamento de professores e alunos em educação física. Tese de doutorado em Ciências da Educação. Faculdade de Motricidade Humana, UTL, Lisboa, Portugal.
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Torres, H.G., França, D.; Teixeira, J.; Camelo, R.; Fusaro, E. 2013. O que os jovens de baixa renda pensam sobre a escola. Cebrap. Disponível em: <https://www.compromissocampinas.org.br/wpcontent/uploads/2014/04/relatorio_jovens_pensam_escola.pdf>. Acesso em: 14 set. 2020. Vigotsky, L.S. 2001. Psicologia pedagógica. 1ed. Martins Fontes, São Paulo, SP, Brasil.
Yin, R.K. 2015. Estudo de caso – Planejamento e métodos. 5ed. Editora Bookman, Porto Alegre, RS, Brasil.
1Pedagoga, Psicopedagoga especializada em Neurociência da Educação. Rua Plínio Colas 278, apto 138A Mandaqui – São Paulo; 02435-030 – São Paulo, SP, Brasil
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2Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz – Universidade de São Paulo – Doutora em Ciências – Avenida Pádua Dias 11, CEP 13418-900, Piracicaba – SP, Brasil