POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS, ASPECTOS LEGAIS E CONCEITUAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202411240552


PLOTEGHER, Beatriz Rodrigues1 
PLOTEGHER, Herialdo Marcos Rosário2


Resumo 

As primeiras deliberações, que incluíram o direito à educação aos grupos minoritários, tiveram início com a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 e se intensificaram a partir da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, da Declaração de Salamanca e da Convenção da Guatemala. Os anos finais do século XX e os seguintes do século XXI foram de mudanças profundas na sociedade brasileira, com a promulgação da Constituição Federal em 1988, do Estatuto da Criança e do Adolescente, da LDB, 9.394/96, da consolidação da Lei Brasileira de Inclusão e de outros documentos, que passaram a assegurar o direito à educação de crianças e adolescentes como dever da família e do Estado e o direito a todos os educandos, a acessarem sem discriminação. 

Palavras-chave: Educação Especial. Educação Inclusiva. Políticas Públicas Educacionais. 

1. INTRODUÇÃO

As primeiras deliberações, que incluíram o direito à educação aos grupos minoritários, tiveram início com a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) e se intensificaram a partir da Conferência Mundial sobre Educação para Todos (UNESCO, 1990), da Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) e da Convenção da Guatemala (Brasil, 2001). 

Os anos finais do século XX e os seguintes do século XXI foram de mudanças profundas na sociedade brasileira, com a promulgação da Constituição Federal (Brasil, 1988), do Estatuto da Criança e do Adolescente (Brasil, 1990), da LDB, 9.394/96, (Brasil, 1990, 1996), da consolidação da Lei Brasileira de Inclusão (Brasil, 2015) e de outros documentos, que passaram a assegurar o direito à educação de crianças e adolescentes como dever da família e do Estado e o direito a todos os educandos, à acessarem sem discriminação. Assim, a Educação Especial, no Brasil, difundiu-se como uma modalidade transversal de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, da Educação Infantil ao Ensino Superior (Brasil, 1988, 1999). 

Foi a partir da adoção da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI) (Brasil, 2008), que o país delineou a proposta do Atendimento Educacional Especializado (AEE) para os alunos com deficiência (aqueles que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial), com transtornos globais do desenvolvimento ou com altas habilidades/superdotação, e que estes passaram a ser identificados como alunos Público-Alvo da Educação Especial (PAEE) (Brasil, 2008). Prevendo a matrícula na classe comum, com mudanças de natureza política, cultural e prática no âmbito da escola, com a oferta do AEE e das Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) para esses alunos, com prioridade na complementação e suplementação curricular. 

Para isso, deve-se garantir a utilização de materiais didáticos e pedagógicos específicos, com espaços acessíveis, contando com mobiliários e equipamentos adequados, com sistemas de comunicação e informação pertinentes. Os documentos ainda presumem a disponibilização de transportes e dos demais serviços adaptados, para a plena participação dos alunos PAEE na escola e na sociedade. Além de ser oferecido em SRM da própria escola, o AEE também pode se dar em centros de AEE da rede pública, instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos (Brasil, 2009; 2011), a partir de convênios firmados entre as partes. 

Os modelos tradicionais hegemônicos, pautados somente nos serviços de apoio à escolarização dos alunos PAEE, centram o problema no aluno e não nas condições educacionais, socioeconômicas e culturais impostas por um modelo social excludente (Santos; Mendes, 2019). Deve-se assegurar e promover a inclusão desses alunos PAEE para além dos espaços restritos. É necessário apontar alternativas que consigam oportunizar a aprendizagem nas classes comuns do ensino regular sem deixar de atender as diversidades. 

O AEE não se baseia apenas no diagnóstico médico, pois há estudantes com o mesmo diagnóstico que não precisam dos mesmos recursos. As estratégias e as intervenções pedagógicas são personalizadas, dois estudantes com um mesmo diagnóstico de deficiência ou transtorno, por exemplo, podem ter interesses, necessidades, formas de se expressar e estar no mundo muito diferentes. Embora possam estar dentro de um mesmo rol de características gerais que fazem parte de uma nomenclatura diagnóstica. A pessoa sempre está em primeiro lugar para a elaboração de qualquer plano e consequentes intervenções. 

É importante mencionar que a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, no que diz respeito ao atendimento a seu público-alvo, é respaldada por três paradigmas históricos que foram superados pelo paradigma da inclusão. São eles: exclusão, segregação e integração.

• Na exclusão, o direito à educação era negado. As pessoas com deficiência ou outra condição que as classificassem como incapazes, eram impedidas de acessar qualquer espaço ou atividade com essa finalidade.

• Na segregação, não podiam frequentar escolas ou salas de aula comuns, mas somente espaços segregados – as escolas ou classes especiais.

• Na integração, a seleção dos estudantes para a concessão restritiva do direito à educação, baseava-se na busca pela “normalização”.

Ao contrário da integração, na qual o aluno deve se adaptar às condições da escola, a inclusão prevê que as unidades de ensino devem garantir o acesso, a permanência e a aprendizagem de todos. Garantir esse direito implica que o sistema de ensino seja reestruturado no reconhecimento da diferença como característica inerentemente humana.

De acordo com Santos (2021), o Brasil frente às dificuldades no cenário da educação geral, para além das questões relacionadas ao campo da Educação Especial, como por exemplo, alto índice de analfabetismo, repetência, evasão escolar e precárias condições de ensino, sofreu adicionalmente pressão internacional, principalmente de agências multilaterais tais como a UNESCO, ONU, UNICEF, para a adoção das políticas educacionais inclusivas. Assim, documentos, os quais o Brasil é signatário, contemplam questões morais, éticas e filosóficas com o compromisso de que a diversidade seja respeitada e valorizada, uma vez que estas são intrínsecas à natureza humana.

Assim, se ao longo da história, a Educação Especial esteve organizada de forma paralela à educação geral ou atrelada a ela absorvendo suas insuficiências. A partir da década de 1990 passou a ser considerada no país como uma modalidade de ensino transversal, que perpassa todo o sistema educacional, como uma modalidade do ensino comum, que deve ser ofertada preferencialmente nas escolas comuns (BRASIL, 1996).  O acesso dos estudantes PAEE, às escolas comuns ocorreu de forma crescente. 

A proposta de Educação Inclusiva aborda conceitos como celebração e valorização da diferença e da diversidade, dos direitos humanos, da justiça social e da equidade entre as pessoas. Essa definição visa ampliar as possibilidades para o atendimento às necessidades de aprendizagem não só para os alunos PAEE, mas para todos aqueles que são segregados de uma educação de qualidade. Para a efetivação da inclusão, não só o oferecimento de práticas e recursos pedagógicos inclusivos são necessários, mas as atitudes em relação à inclusão escolar são condições a serem consideradas e avaliadas, atitudes que podem ser consideradas barreiras. 

De acordo com a LBI (Brasil, 2015), barreiras são impedimentos à participação das pessoas com deficiência nos diversos contextos. Não se restringem a obstáculos concretos, mas também são atitudes causadas pelo preconceito.

Se antes da PNEEPEI (Brasil, 2008) o debate residia sobre o acesso dos estudantes PAEE ao ensino comum, atualmente compreende-se que há a necessidade de se investigar como garantir condições de permanência, participação e aprendizagem desse alunado nas classes comuns, do ensino regular, bem como quais são os suportes necessários para uma escolarização de qualidade, temas que perpassam a questão da formação docente. 

2. MARCOS HISTÓRICOS INTERNACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL 

No campo da Educação Especial, alguns documentos internacionais gerados em diferentes momentos tornaram-se marcos históricos e nortearam as conquistas em diversos campos, tanto para as pessoas de uma maneira geral, como particularmente para aquelas que são público-alvo da Educação Especial (PAEE). Destacam-se, dentre esses marcos históricos: a Declaração Universal dos Direitos do Homem pela ONU (1948); a Conferência Mundial Educação para Todos (1990), com a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990); a Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: acesso e qualidade, com a Declaração de Salamanca (1994); a Convenção de Guatemala (1999). 

Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) 

O primeiro, e talvez o mais importante, acontecimento da história no campo dos direitos do ser humano foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU), no dia 10 de dezembro de 1948. Apesar de não constituir uma lei, esse documento é utilizado para nortear boa parte das decisões tomadas pela comunidade internacional. É um texto de referência ética, que estabelece os direitos naturais de todos os seres humanos, independentemente de nacionalidade, cor, sexo, orientação religiosa e política.

O mundo vivia o pós-guerra em 1948. Cerca de 50 milhões de pessoas morreram em combate, cerca de 6 milhões de judeus foram exterminados em campos de concentração nazistas, e um sem-número de pessoas mutiladas e deficientes voltavam para seus países de origem. Nessa época, essas pessoas que, por diferentes motivos, se sentiam prejudicadas na convivência em sociedade, começaram a reivindicar seus direitos.

A Declaração surge, então, da união dos governos para a criação de mecanismos capazes de “proteger o homem contra o homem, as nações contra as nações e sempre que homens e nações tomem o poder de violar direitos” (BRASIL, 1990, p. 7). Este documento garante a educação para todos, indistintamente, quaisquer que sejam as origens ou condição social. É dentro desse contexto da Declaração Universal dos Direitos Humanos que a Secretaria de Educação Especial do MEC (Seesp/MEC), desde 1994, destaca e tem sempre presente em suas decisões os seguintes princípios dessa Declaração: – Todo ser humano é elemento valioso, qualquer que seja a idade, sexo, nível mental, condições emocionais e antecedentes culturais que possua, ou grupo étnico, nível social e credo a que pertença. Este valor é inerente à sua natureza e às potencialidades que traz em si.

A Declaração, com 30 artigos, considera que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na sua Carta, sua fé nos direitos humanos fundamentais, de liberdade, de justiça e da paz no mundo, reconhece a dignidade e o valor da pessoa humana e a igualdade de direitos dos homens, das mulheres, e que o desrespeito aos direitos humanos resulta de atos bárbaros contra a humanidade. A Assembleia Geral proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações e cada indivíduo, e órgãos da sociedade, tendo em mente essa Declaração, se esforcem por meio do ensino e da educação para promover o respeito a esses direitos e liberdades. 

Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade (1994) 

Essa conferência foi outro acontecimento importante no cenário internacional e aconteceu em Salamanca, Espanha, entre os dias 7 e 10 de junho de 1994. Nessa oportunidade, os delegados representantes dos 92 governos e de 25 organizações internacionais reafirmaram, por meio de um documento denominado Declaração de Salamanca, o compromisso com a Educação para Todos, reconhecendo a necessidade e a urgência de ser o ensino ministrado, no sistema comum de educação, a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades educativas especiais e apoiaram a Linha de Ação para as Necessidades Educativas Especiais, cujo espírito refletido em suas disposições e recomendações deve orientar organizações e governos.

Declaração de Salamanca (1994)

A Declaração de Salamanca é, portanto, o documento resultante da Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais. E, por isso, ela é outro marco internacional no contexto da garantia dos direitos das pessoas com necessidades educacionais especiais e deficiência. Essa Declaração unifica os princípios, a política e as práticas da integração das pessoas com necessidades educativas especiais. O documento da Declaração de Salamanca (1994) proclama que: 

  • Todas as crianças têm direito fundamental à educação e deve ser dada a oportunidade de obter e manter um nível adequado de conhecimentos;
  • Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias;
  • Os sistemas educativos devem ser projetados e os programas aplicados de modo que tenham em vista toda a gama dessas diferentes características e necessidades;
  • As pessoas com necessidades educativas especiais devem ter acesso à escola regular, que deverá integrá-las numa pedagogia centrada na pessoa, capaz de atender a essas necessidades;
  • As escolas regulares, com essa orientação inclusiva, constituem os meios mais eficazes de combater as atitudes discriminatórias, criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos, além de proporcionar uma educação efetiva à maioria das crianças e melhorar tanto a eficiência como a relação custo-benefício de todo o sistema educacional (BRASIL, 1995). 

A Declaração de Salamanca traz, ainda, novas ideias sobre necessidades educativas especiais e diretrizes de ação no Plano Nacional, que incluem: 

  • A política e as formas de organização;
  • Os aspectos escolares;
  • A formação do pessoal docente;
  • Os serviços externos que servirão de apoio;
  • As áreas prioritárias (educação pré-escolar, preparação para a vida adulta, educação continuada de adultos e de meninas);
  • A participação da comunidade e os recursos necessários.

A Convenção da Guatemala (1999) 

Um outro acontecimento importante, ainda no final do século XX, foi a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, que aconteceu na Guatemala em maio de 1999, conhecida como Convenção da Guatemala. 

Essa Convenção foi promulgada pelo Brasil, por meio do Decreto n. 3.956/2001, que afirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas e define discriminação com base na deficiência toda diferenciação, exclusão ou ainda restrição que possa impedir ou anular os direitos humanos e suas liberdades fundamentais. 

A importância desse Decreto, para a educação, é que ele exige uma reinterpretação da educação especial compreendida no contexto da diferenciação e orienta procedimentos no sentido de tomar medidas de caráter legislativo, social, educacional, trabalhista e de qualquer outra natureza no sentido de eliminar a discriminação e proporcionar a integração da pessoa com necessidades especiais à sociedade.  

Na Convenção da Guatemala, os Estados Partes reafirmaram que as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas e que esses direitos, inclusive o direito de não ser submetidas à discriminação com base na deficiência, emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser humano. 

Ainda os Estados Partes de diferentes regiões e organizações, presentes nessa convenção, com base em vários documentos internacionais, do período entre os anos de 1975 a 1996, concordaram em uma série de ações e encaminhamentos traduzidos em 14 artigos. 

Atualmente, para além do aspecto educacional, de certa forma nos é familiar começar a pensar na remoção de barreiras arquitetônicas e atitudinais com vistas à acessibilidade da pessoa com necessidades especiais ou com alguma deficiência. 

A Convenção da Guatemala (1999) acrescentou aos documentos anteriores a necessidade de se prevenir e de se eliminar todas as formas de discriminação.

3. MARCOS LEGAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL

Até meados do século XIX, não houve preocupação com o aspecto educacional dos deficientes e outros indivíduos que hoje fazem parte do PAEE. A história da Educação Especial no Brasil nos mostra que o período compreendido entre 1800 e 1950 foi marcado por iniciativas isoladas, tanto oficiais quanto particulares, como a fundação do Instituto Benjamin Constant (IBC) e do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). 

No Brasil, a Educação Especial foi construída separadamente da educação oferecida à população que não apresentava diferenças ou características explícitas que a classificasse como “anormal”. Dessa forma, a educação especial constituiu-se como um campo de atuação específico, muitas vezes sem interlocução com a educação comum. 

Esta separação materializou-se na existência de um sistema paralelo de ensino, de modo que o atendimento de alunos com deficiência ocorreu de modo incisivo em locais separados dos outros alunos da classe comum. A proteção e o cuidado com essas pessoas, nessa ocasião, faziam parte, ainda, do caráter assistencialista. 

A formação de uma educação especial brasileira deu-se dentro de um contexto de pouca atenção à educação pública em geral. Segundo Jannuzzi (2012), a educação em geral era para poucos, pois para a aristocracia rural, não era considerada necessária visto que a economia vigente no Brasil era a agrária e a oferta de mão de obra de trabalho era suprida pela exploração dos africanos e seus descendentes escravizados. Schwarcz (1998 apud VEIGA, 2008) informa que o recenseamento do ano de 1872 registrou 84% da população brasileira como analfabeta. 

A notória expansão das instituições privadas especializadas acarretou a isenção do poder público sobre a obrigação de oferecer o atendimento aos deficientes na rede pública de ensino, até que, em 1957, o governo federal iniciou oficialmente ações voltadas especificamente aos deficientes, tais como: Campanha para Educação do Surdo Brasileiro (CESB), em 1957; Campanha Nacional de Educação e Reabilitação dos Deficitários Visuais (CNERDV), em 1958; e Campanha Nacional de Educação do Deficiente Mental (CADEME), em 1960. 

De acordo com Mendes (2006), os fatores morais, lógicos, científicos, políticos, econômicos e legais contribuíram para que ocorresse uma mudança no sistema de ensino paralelo das pessoas com deficiência para o sistema de ensino unificado. Isto ficou conhecido como movimento da integração e que, ao longo das décadas de 1960 e 1970, gerou a “desinstitucionalização com a retirada das pessoas com deficiência das grandes instituições para reinseri-las na comunidade” (MENDES, 2006, p. 389).

A Constituição Federal de 1988 e a LDB de 1996 previram que os alunos PAEE teriam direito a frequentar uma classe comum, a fim de não prejudicar seu direito de participação plena e integral na mesma classe onde estão seus colegas. E adicionalmente previram também que esses alunos teriam que ter um atendimento educacional especializado (AEE) para responder às suas necessidades educacionais diferenciadas. Entretanto, a definição do que seria AEE somente viria na Política da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI), aprovada em 2008. A LDB previu, desde sua aprovação inicial em 1996, a necessidade de formar dois tipos de professores: o do ensino comum e os professores especializados. 

Em 2001, o Conselho Nacional da Educação aprovou as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica – Resolução CNE/CEB Nº 2 (BRASIL, 2001), os serviços de apoio pedagógico especializados deveriam atuar junto às classes comuns, destacando que se incluiria a esse serviço a atuação colaborativa do professor especializado com o professor do ensino comum. Para professores especializados foram definidas diferentes funções, como a identificação das necessidades educacionais do aluno, implementação de estratégias de flexibilização e adaptação curricular e o trabalho em equipe “assistindo o professor da classe comum nas práticas que são necessárias para promover a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais” (BRASIL, 2001, p. 05). Em relação aos professores da sala comum, estes devem ter como pressuposto o trabalho em equipe, sendo indicada a colaboração com o professor especializado.

Com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008) a proposta prevista na legislação brasileira preconiza que o AEE seria realizado no contraturno do período em que o estudante PAEE estudasse na classe comum. Além disso, o atendimento em contraturno deveria ser ofertado de modo complementar ou suplementar, a depender das demandas particulares de cada estudante, em um modelo de prestação de serviço, denominado Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) ou Centro de Atendimento Educacional Especializado, regulamentado pela Resolução Nº. 4, de 2 de outubro de 2009, que instituiu as diretrizes operacionais para o AEE na educação básica (BRASIL, 2009).

Cabe destacar que a Declaração de Salamanca, em 1994, por ser dedicada à educação inclusiva, deu início à conscientização da sociedade sobre o outro lado da inserção, qual seja, o lado da necessidade de se modificar a sociedade para atender as necessidades das pessoas, combatendo também a discriminação e exclusão e, dessa forma, pode ter sido o documento que mais explicitamente contribuiu para impulsionar a educação inclusiva. Desde então, vários documentos nacionais:

  • Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 – LDB (BRASIL, 1996); 
  • Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001 – PNE (BRASIL, 2001d); 
  • Resolução CNE/CEB nº 2, de 11 de setembro de 2001 – Educação Especial (BRASIL, 2001a); 
  • Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002 – língua brasileira de sinais (LIBRAS) (BRASIL, 2002b); 
  • Resolução CNE/CP nº 1, de 18 de fevereiro de 2002 – Diretrizes de formação de professores na educação básica para alunos com necessidades educacionais especiais (BRASIL, 2002a); 
  • Portaria nº 2.678, de 24 de setembro de 2002, do MEC sobre o uso do sistema Braile (BRASIL, 2002c); 

Bem como as políticas públicas:

  • Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, em 1999; 
  • Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, em 2003; 
  • Programa Brasil Acessível, em 2004; 
  • Implantação de Núcleos de Alta Habilidade/Superdotação, em 2005; 
  • Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, em 2006; 
  • Plano de Desenvolvimento em Educação, em 2007; 
  • Compromisso Todos pela Educação, em 2007; 
  • Viver sem Limites, em 2011;

Dentre outros, vêm sendo desenvolvidos na perspectiva inclusiva. Mas nenhum documento foi tão expressivo e importante quanto a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), pois foi decisiva para que as discussões que pairavam sobre o acesso à educação formal, no que se refere ao direito especificamente, fossem superadas. Em razão dos avanços legais, os alunos com deficiência têm assegurado o direito de frequentar a escola regular, em vez de permanecerem segregados em escolas especiais. Todavia, ressalta-se que a efetiva democratização do acesso à escola para todos, com qualidade, ainda é uma tentativa. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os marcos históricos internacionais e os marcos legais da Educação Especial no Brasil mostraram que o movimento em benefício dos estudantes PAEE, foi resultado de acontecimentos anteriores ligados ao desenvolvimento dos direitos do homem, dos direitos da criança e do direito à educação. O encaminhamento dessas discussões conduziu à concentração das reivindicações para as minorias, elaboradas em forma de carta, documentos e declarações, normalmente resultantes de conferências e convenções internacionais. O resultado é a proposta de um novo modelo de educação – centrada no indivíduo, um novo modelo de escola inclusiva e, consequentemente, de sociedade – que acolhe e respeita as diferenças e que elimina a discriminação contra as minorias e que promove o acesso e permanência. 

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência). Brasília, 2015.

_______. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008. 

_______. Resolução Nº. 4, de 2 de outubro de 2009. Institui as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Especial MEC/SEESP, 2008. Educacional Especializado na Educação Básica, na modalidade Educação Especial. Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica. 

_______. Decreto n°. 7.611, de 17 de novembro de 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7611.htm. 

_______. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, jul. 1990b.

_______. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP 009/2001. Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Brasília, DF, maio, 2001a.

_______. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2016].

_______. [Declaração de Salamanca (1994)]. DECLARAÇÃO DE SALAMANCA: Sobre princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais. Salamanca – Espanha, 1994.

_______. (1997). Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade. In Declaração de Salamanca e linhas de ação sobre necessidades educativas especiais. Brasília, DF: Corde, 2 J ed.

MAZZOTTA, M. J. da S. Educação Especial no Brasil: Histórias e Políticas Públicas. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2001. 

MENDES, E. G. A radicalização do debate sobre inclusão escolar no Brasil. Rev. Bras. Educ. [online]. 2006, vol.11, n.33, pp.387-405. ISSN 1413-2478.

UNESCO. Declaração mundial de educação para todos. Plano de ação para satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. Tailândia, 1990. 


1Professora de Educação Física da Rede Municipal de Ensino de Vitória/ ES, Especialista em Educação Especial e Inclusiva e Mestre em Ensino na Educação Básica pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica – PPGEEB, da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. Membro do Grupo de Pesquisas sobre Gênero, Ensino, Literatura e Relações Étnico-Raciais – GELRE. biaplotegher@gmail.com;
2Analista do Executivo do Governo do Estado do Espírito Santo, Graduado em Licenciatura em Música pela UFES, especialista em Gestão Pública pelo Instituto Federal do Espírito Santo – IFES. Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ensino na Educação Básica – PPGEEB, da Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. herialdomrp@gmail.com