INCLUSION POLICIES AND MODELS OF CARE: IN THE VESTIGES OF SCHOOL INCLUSION OF AUTISTIC STUDENTS
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ni10202310101530
Maria Leomira Franco Rodrigues1
Resumo:
Este artigo aborda a inclusão escolar de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Brasil, analisando as políticas públicas e as práticas educacionais implementadas para promover a diversidade no ambiente escolar. O estudo tem como objetivo identificar as principais dificuldades enfrentadas por educadores e alunos, bem como avaliar a percepção dos profissionais de educação sobre a adequação das estratégias de inclusão e a formação recebida. A pesquisa revela que, apesar dos avanços nas políticas de inclusão, ainda existem desafios significativos, como a falta de formação específica para os educadores e a necessidade de um ambiente escolar que valorize a diversidade. Os achados indicam que a colaboração entre escolas e famílias é fundamental para o sucesso da inclusão, e que a formação continuada dos professores deve ser ampliada para atender às necessidades dos alunos autistas. O artigo conclui que a inclusão escolar é um tema complexo que requer um compromisso coletivo e sugere a realização de novas pesquisas para aprofundar a compreensão das práticas inclusivas e suas implicações no desenvolvimento dos alunos.
Palavras-chave: Inclusão escolar. Transtorno do Espectro Autista (TEA). Políticas públicas. Formação de professores. Diversidade
Abstract
This article addresses the school inclusion of students with Autism Spectrum Disorder (ASD) in Brazil, analyzing the public policies and educational practices implemented to promote diversity in the school environment. The study aims to identify the main difficulties faced by educators and students, as well as to evaluate the perception of education professionals about the adequacy of inclusion strategies and the training received. The survey reveals that, despite advances in inclusion policies, there are still significant challenges, such as the lack of specific training for educators and the need for a school environment that values diversity. The findings indicate that collaboration between schools and families is fundamental for the success of inclusion, and that the continuing education of teachers should be expanded to meet the needs of autistic students. The article concludes that school inclusion is a complex issue that requires collective commitment and suggests further research to deepen the understanding of inclusive practices and their implications for student development.
Keywords: School inclusion. Autism Spectrum Disorder (ASD). Public policies. Teacher training. Diversity
Políticas de inclusão e modelos de atendimento
A inclusão escolar de alunos autistas é um tema de crescente relevância nas discussões sobre educação e diversidade. A escola deve ser um espaço que acolhe e respeita as diferenças, promovendo um ambiente onde todos os alunos, independentemente de suas particularidades, possam aprender e se desenvolver. No entanto, a realidade muitas vezes revela desafios significativos, como a falta de formação adequada dos educadores, a escassez de recursos e a necessidade de práticas pedagógicas que considerem as especificidades do autismo. A análise crítica das práticas educacionais e das estruturas escolares é fundamental para garantir que a inclusão não seja apenas um conceito, mas uma realidade vivida nas salas de aula.
Diante desse cenário, é essencial investigar como as práticas pedagógicas podem ser adaptadas para atender às necessidades de alunos autistas. A literatura aponta que a formação continuada dos professores e a implementação de metodologias inclusivas são passos cruciais para a efetivação da inclusão. Autores como Kanner e Vygotsky oferecem uma base teórica importante para compreender as características do autismo e a importância do contexto social e cultural no processo de aprendizagem. Assim, a pesquisa se propõe a explorar as práticas pedagógicas que favorecem a inclusão de alunos autistas, buscando identificar estratégias que possam ser implementadas nas escolas.
Problema de pesquisa é como as práticas pedagógicas podem ser adaptadas para promover a inclusão efetiva de alunos autistas nas escolas regulares?
O objetivo foi investigar e identificar práticas pedagógicas inclusivas que atendam às necessidades de alunos autistas, promovendo um ambiente escolar mais acolhedor e eficaz.
A pesquisa é justificada pela necessidade urgente de promover a inclusão de alunos autistas nas escolas regulares, garantindo que todos tenham acesso a uma educação de qualidade. A análise das práticas pedagógicas é fundamental para entender como os educadores podem melhor atender a essa população, contribuindo para a formação de um ambiente escolar que respeite e valorize a diversidade.
A primeira etapa consistiu em uma revisão detalhada da literatura existente sobre autismo e inclusão escolar. Foram consultados artigos acadêmicos, livros e documentos oficiais que abordam as definições de autismo, características dos alunos autistas e as políticas de inclusão vigentes. Autores como Leo Kanner (1943), que introduziu a definição do autismo, e Lev Vygotsky, que enfatiza a importância do contexto social e cultural na aprendizagem, foram fundamentais para a compreensão teórica do tema.
Foi realizada uma análise das políticas públicas relacionadas à inclusão de alunos autistas, tanto no Brasil quanto em outros países. Essa análise incluiu a revisão de legislações, diretrizes educacionais e documentos de organizações que promovem a inclusão, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), que, em 1998, descreveu o autismo como uma síndrome que pode se manifestar desde o nascimento (OMS, 1998).
Com base nas informações coletadas e analisadas, o texto foi elaborado, integrando as diferentes perspectivas e evidências encontradas. O objetivo foi criar um documento que não apenas apresentasse a situação atual da inclusão escolar de alunos autistas, mas também oferecesse recomendações práticas para educadores e gestores escolares, alinhando-se às diretrizes de educação inclusiva propostas por autores como Mantoan (2003).
Por fim, o texto passou por um processo de revisão e validação, onde especialistas na área de educação inclusiva foram convidados a revisar o conteúdo, garantindo a precisão e a relevância das informações apresentadas. Essa etapa é crucial para assegurar a qualidade e a credibilidade do trabalho, conforme enfatizado por Gil (2010) em sua discussão sobre a importância da validação em pesquisas.
1. AUTISMO E INCLUSÃO: POLÍTICAS DE INCLUSÃO E MODELOS DE ATENDIMENTO, UM OLHAR SOBRE A LEGISLAÇÃO VIGENTE.
A compreensão do autismo teve sua base inicial estabelecida por Leo Kanner em 1943, com a publicação do artigo Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo. Kanner descreveu crianças com dificuldades significativas em interações sociais e atrasos no desenvolvimento da linguagem, destacando também a inabilidade de usar a comunicação verbal de maneira funcional. Essas crianças apresentavam comportamentos repetitivos, conhecidos como estereotipias, e uma necessidade de estabilidade no ambiente material (LEBOYER, 1995).
Kanner expandiu sua abordagem em 1949, introduzindo o termo “Autismo Infantil Precoce”, caracterizado por isolamento social, preservação de rotinas e alterações na linguagem, como inversões pronominais e uso de neologismos. Ele considerava o autismo uma síndrome distinta, separada da esquizofrenia infantil, com critérios diagnósticos claros e início nos primeiros anos de vida (KANNER, 1949).
Na década de 1950, Kanner revisitou seus estudos e enfatizou a necessidade de uma abordagem multidisciplinar para compreender o autismo, integrando aspectos psicológicos, biológicos e sociais. Ele defendia que o grau de isolamento social era crucial para o prognóstico clínico, embora permanecesse limitado pela falta de evidências genéticas ou biológicas claras (KANNER, 1954).
Na década de 1960, surgiram critérios diagnósticos mais detalhados. O’Gorman (1967), influenciado pela Escola Inglesa, elaborou uma lista de características, incluindo dificuldades interpessoais, respostas anormais a estímulos sensoriais e resistência a mudanças. Essas diretrizes foram ampliadas por outros especialistas, que enfatizaram a importância de identificar padrões de comportamento específicos, como o uso restrito de gestos e o apego a objetos incomuns (AJURIAGUERRA apud SCHWARTZMAN; ASSUMPÇÃO, 1995).
Em 1973, Ajuriaguerra posicionou o autismo dentro das psicoses infantis, descrevendo-o como uma desordem complexa que afeta o relacionamento da criança com o ambiente. Para ele, o autismo refletia uma falha fundamental na organização psicológica e na interação social, caracterizando um distúrbio profundo da percepção e do desenvolvimento social (AJURIAGUERRA apud SCHWARTZMAN; ASSUMPÇÃO, 1995).
A revisão desses conceitos demonstra a evolução no entendimento do autismo, desde a visão inicial de Kanner até as abordagens contemporâneas que reconhecem a condição como um espectro. As contribuições históricas foram fundamentais para moldar as práticas diagnósticas e terapêuticas, ressaltando a necessidade de uma perspectiva abrangente e interdisciplinar para compreender a complexidade do transtorno.
Essas diferentes abordagens e as modificações nos critérios diagnósticos ao longo dos anos refletem o avanço no entendimento sobre o autismo, que passou de uma concepção limitada e bastante rígida para uma visão mais plural e compreensiva, à medida que novas pesquisas biológicas, psicológicas e sociais foram sendo desenvolvidas. O estudo contínuo do autismo levou à formulação de uma definição mais ampla, reconhecendo a diversidade de manifestações e a importância de tratamentos individualizados:
- Conduta inapropriada frente à realidade com retraimento de tipo autístico ou fragmentação do campo da realidade;
- Restrição no campo de utilização de objetos;
- Catexis cognitivas, afetivas e de atividade insuficientes ou parcialmente exageradas, demasiado focadas ou esparsas, produzindo condutas rígidas ou inconsistentes;
- Vida imaginativa pobre ou de tipo mágico-alucinatório;
- Atitude demasiado abstrata ou demasiado concreta, restrita, limitando a mobilidade do campo do pensamento e da ação;
- Relação inadequada com as pessoas.
As características iniciais descritas por Kanner permaneceram como base para a compreensão do autismo, mas em 1976 ocorreu uma mudança significativa nesse entendimento. A literatura da época frequentemente abordava o autismo como um problema relacionado ao desenvolvimento, ressaltando que muitos estudos identificavam déficits cognitivos em crianças autistas. Com o avanço das pesquisas, a caracterização do autismo começou a ser delineada não apenas pelos déficits, mas também com base na idade em que os sinais apareciam — frequentemente desde o nascimento — e em suas características comportamentais.
De acordo com Schwartzman e Assumpção (1995, p. 50), essas características comportamentais incluem padrões específicos de interação social, comunicação e comportamentos repetitivos, que passaram a ser centrais na descrição da condição. Esses elementos comportamentais destacaram-se como marcadores fundamentais para o diagnóstico, proporcionando uma maior clareza na identificação do espectro autista e reforçando a importância de observações detalhadas desde os primeiros anos de vida da criança.
Esse avanço na compreensão do autismo reflete uma transição da visão inicial, que se concentrava em aspectos isolados como déficits cognitivos, para uma abordagem mais ampla, que considera os múltiplos aspectos do desenvolvimento e comportamento da criança. A partir dessa mudança, tornou-se possível uma caracterização mais detalhada, que levou a intervenções mais direcionadas e ao reconhecimento da diversidade dentro do espectro autista. A seguir algumas caracteristsca:
a) Distúrbios de percepção (hipo ou hiperreatividade aos estímulos devida a falhas na modulação dos inputs sensoriais, distorção da hierarquia de preferência dos receptores e déficit no uso do input sensorial para discriminar em ausência de feedback das respostas motoras);
b) Distúrbios de desenvolvimento, principalmente nas sequências motora, de linguagem e social;
c) Distúrbios do relacionamento social, caracterizados por pobre contato através do olhar, ausência de sorriso social, ausência de movimento antecipatório (no bebê), aparente aversão ao contato físico, tendência a relacionar-se com partes da pessoa, desinteresse em jogos, ansiedade estranha e exagerada;
d) Distúrbios da fala e da linguagem que se estendem desde um mutismo até a ecolalia e a inversão pronominal;
e) Distúrbios da motilidade, observados através da atitude estranha e bizarra com maneirismos e estereotipias, principalmente de mãos e dedos.
A Escola Francesa, que segue a concepção original do termo “psicose”, caracteriza o autismo como um distúrbio relacionado a um defeito ou desorganização na estrutura da personalidade. Dentro dessa perspectiva, o autismo é classificado como uma psicose, e essa abordagem se mantém consistente com a nona revisão da Classificação Internacional das Doenças Mentais (CID). Essa visão entende o autismo como uma condição que compromete a organização da personalidade e a interação do indivíduo com o mundo.
De forma análoga, a 10ª edição da Classificação Internacional de Doenças Mentais — CID-10 (1993) segue os mesmos critérios, situando o autismo na categoria dos “Transtornos Invasivos do Desenvolvimento”. Essa classificação descreve os transtornos associados ao autismo como caracterizados por anomalias qualitativas na interação social recíproca, dificuldades na comunicação e padrões restritos e repetitivos de interesse e comportamento. Além disso, a CID-10 observa que, em alguns casos, esses transtornos podem estar associados a condições médicas específicas e, embora os aspectos comportamentais devam ser a base do diagnóstico, essas condições subjacentes devem ser levadas em consideração ao se fazer a avaliação.
O autismo, compreendido atualmente como uma síndrome comportamental de etiologia multifatorial e desenvolvimento atípico, é caracterizado por déficits na interação social, comunicação e comportamentos repetitivos. Conforme Schwartzman e Assumpção (1995), essas dificuldades têm impacto significativo no desenvolvimento cognitivo e social, sendo observadas desde os primeiros anos de vida. Inicialmente descrito por Kanner em 1943, o autismo foi tratado como uma síndrome distinta, com dificuldade de estabelecer relações interpessoais e alterações na linguagem. Mais tarde, outras teorias, como a teoria afetiva e a teoria cognitiva, contribuíram para aprofundar essa compreensão.
A teoria afetiva, baseada em Kanner e desenvolvida por Hobson (apud Schwartzman e Assumpção, 1995), foca nos déficits emocionais e sociais que comprometem o vínculo interpessoal. Já a teoria cognitiva, Frith (1988), aponta para dificuldades na compreensão de estados mentais alheios, como intenções e emoções, conceito conhecido como “teoria da mente”. Essa limitação interfere diretamente na interação social, impactando a comunicação e a capacidade de simbolização.
Na década de 1960, o Grupo para o Avanço da Psiquiatria classificou o autismo como uma psicose infantil, reforçando sua distinção de outras condições, como a esquizofrenia. Posteriormente, com a inclusão no DSM-IV-R, o autismo foi reconhecido como um transtorno invasivo do desenvolvimento, abrangendo um espectro sintomatológico com variabilidade no grau de comprometimento. Estudos recentes destacam sua base neurológica, sugerindo que alterações no sistema nervoso central influenciam as manifestações comportamentais.
Pesquisadores como Gauderer (1985) enfatizam a importância de atividades manuais e artísticas para estimular o desenvolvimento motor, cognitivo e social de crianças autistas. Estratégias educacionais que integram dramatizações, mímicas e atividades recreativas são fundamentais para promover habilidades interpessoais e a integração dessas crianças no ambiente escolar. Além disso, políticas públicas têm evoluído para garantir o acesso e a permanência de estudantes com necessidades especiais, enfrentando desafios de preconceito e exclusão histórica (VASH, 1981).
Embora avanços tenham sido feitos, persistem desafios para compreender plenamente o autismo, especialmente devido à heterogeneidade dos casos e às diferenças culturais nas abordagens diagnósticas e terapêuticas. A evolução histórica do conceito de autismo destaca a importância de uma visão interdisciplinar para abordar suas múltiplas dimensões e potencializar o desenvolvimento das crianças no espectro.
2. POLÍTICAS PÚBLICAS FUNDAMENTAIS NOS MODELOS DE ATENDIMENTO DAS PESSOAS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIALIZADO: DIAGNÓSTICOS PREVENTIVOS E POLÍTICAS ASSISTENCIALISTAS.
As escolas frequentemente encaminham crianças para diagnósticos baseados em queixas como distúrbios de aprendizagem, problemas comportamentais e má adaptação, concentrando a “deficiência” no aluno e desconsiderando o contexto social, cultural e pedagógico. Psicólogos escolares, ao realizar essas avaliações, geralmente centralizam o problema em atrasos cognitivos, sem correlacioná-los com práticas escolares ou curriculares. Essa visão reflete o modelo médico e maturacional predominante, que utiliza medidas quantitativas para classificar habilidades e deficiências, perpetuando desigualdades educacionais (SCHWARTZMAN; ASSUMPÇÃO, 1995).
Pesquisas destacam que crianças de classes menos favorecidas são frequentemente rotuladas como “deficientes” em contraste com crianças de classes mais abastadas, que predominam em programas de superdotação. Essa realidade aponta para a necessidade de práticas pedagógicas inclusivas que transcendam modelos normativos e promovam qualidade e equidade na educação (MERCER, 1973 apud SASSAKI, 1997).
A escola reforça a dicotomia entre “eficiência” e “deficiência”, legitimando essas categorias por meio de avaliações diagnósticas baseadas em critérios psicométricos. Esses diagnósticos precisam ser criticamente analisados para evitar práticas excludentes e reforço de estigmas (BARBOSA, 1997).
No Brasil, a política educacional para inclusão ainda enfrenta desafios significativos. Movimentos globais, como a Declaração de Salamanca (1994), e nacionais, como o programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, impulsionaram avanços. Contudo, é necessário integrar políticas que garantam acesso e permanência de estudantes com deficiência, com práticas pedagógicas adaptadas à diversidade (MAZZOTA, 2005; JIMÉNEZ, 1997).
A escola para todos propõe um modelo inclusivo que respeita as diferenças individuais, transformando a educação em um espaço de acolhimento e justiça social. Esse paradigma exige mudanças estruturais e uma abordagem pedagógica que valorize a diversidade, promovendo igualdade de oportunidades para todos os alunos.
2.1 O Modelo Pedagógico e as Políticas de Educação.
A sociedade contemporânea registra uma proliferação de instituições especializadas e classes especiais, destinadas a diferentes tipos de deficiência, como visual, auditiva, intelectual e física. Essas estruturas segregadas refletem a busca por homogeneidade nos comportamentos sociais, promovendo valores como inteligência, produtividade e adaptação, que moldam o modelo de indivíduo idealizado por cada sociedade.
Historicamente, civilizações antigas, como a Grécia, adotaram práticas como o infanticídio de crianças com deficiências físicas, visando manter padrões sociais desejáveis. Achados pré-históricos demonstram a sobrevivência de pessoas com deformidades, mas sem clareza sobre como eram tratadas socialmente. No Egito, indivíduos com alterações orgânicas eram vistos como marcados por entidades divinas, enquanto entre os gregos, atitudes variavam entre exaltação e exclusão.
Na Idade Média, com a ascensão da Igreja Católica, práticas de extermínio foram substituídas por explicações sobrenaturais, levando ao isolamento em manicômios e orfanatos. Com a perda do poder da Igreja, o período moderno trouxe avanços na educação de pessoas com deficiência. Pesquisadores como De L’Épée, Mauy, e Pestalozzi desenvolveram métodos educacionais inovadores para surdos, cegos e pessoas com atrasos cognitivos, introduzindo uma visão mais humanista.
Apesar disso, no final do século XVIII e início do XIX, o apoio prestado a pessoas com deficiência foi predominantemente assistencial, com limitado impacto educativo. Esse panorama evidencia a evolução histórica das práticas voltadas a esse grupo, revelando a transição de um enfoque excludente para uma perspectiva mais inclusiva.
No entanto, já se registra o surgimento de uma nova concepção de necessidades educativas especiaisimpulsionadas por novas tendências tais como:
a) A concepção anterior centrada nos fatores congênitos, na possibilidade de agrupar os educandos com a mesma deficiência em uma mesma sala ou nos mesmos centros educacionais específicos e na estabilidade do tempo, deu lugar a uma nova visão em que não se estuda a deficiência como um fenômeno autônomo, somente próprio do aluno. Nesse contexto, a deficiência passa a ser considerada em reação em relação aos fatores ambientais e à resposta educacional mais adequada. Começa-se a observar a maior ou menor deficiência vinculada estreitamente a maior ou menor capacidade do sistema educacional em proporcionar respostas e recursos apropriados. Em outras palavras, a deficiência é estabelecida ou agravada em função da resposta educacional.
b) Novas perspectivas educacionais apontadas pela Psicologia da aprendizagem dão maior importância aos processos de aprendizagem, onde esta também abre novos caminhos que favorecem o desenvolvimento.
c) Aumento de experiências positivas de interação.
d) Maior sensibilidade social ao direito de todos a uma educação fundamentada em pressupostos integradores e não segregadores.
São estas e outras tendências que impulsionam para uma nova concepção de necessidades educativas especiais expandindo-se para além das necessidades educativas especiais permanentes. Em linhas gerais, significa dizer que qualquer aluno pode apresentar algum problema de aprendizagem ao longo de sua escolarização, exigindo uma atenção mais específica e maiores recursos educacionais do que os necessários para a maioria da turma, transferindo-se, desse modo, a ênfase na deficiência para situá-la na escola, na resposta educacional.
A Declaração de Salamanca proclama que:
a) Toda criança tem direito fundamental à educação e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter um nível adequado de aprendizagem;
b) Toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades da aprendizagem que são únicas;
c) Sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades;
d) Aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades;
e) Escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias, criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando a educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional.
A Educação Especial no Brasil é respaldada pela Constituição Federal e pelo Plano Decenal de Educação para Todos, que enfatiza qualidade, equidade e universalização da educação. Historicamente, evoluiu de práticas excludentes para um modelo que valoriza as diferenças e combate estigmas associados às deficiências, priorizando o potencial individual e a inclusão.
Em 1992, a criação da Secretaria de Educação Especial (SEESP) no MEC trouxe destaque à área, permitindo a formulação de políticas inclusivas e o apoio técnico-financeiro a estados e municípios. A SEESP trabalha de forma integrada com outras secretarias para implementar diretrizes alinhadas às necessidades de alunos com deficiência, ampliando o acesso à educação regular com suporte especializado.
A Política Nacional de Educação Especial (1994) promove o desenvolvimento global de pessoas com deficiência, altas habilidades e condutas típicas, buscando integrá-las plenamente à sociedade. Essa política, elaborada com ampla participação social, orienta a criação de classes especiais e salas de apoio pedagógico, além de fortalecer parcerias com ONGs para atender alunos com demandas complexas.
O fortalecimento da Educação Especial requer continuidade e ampliação das políticas públicas, formação de professores especializados e planejamento inclusivo. Com base nos princípios constitucionais, a Educação Especial se consolida como um pilar essencial para uma sociedade mais justa e inclusiva, garantindo educação de qualidade e pleno exercício da cidadania.
Considerações Finais
A presente pesquisa abordou a inclusão escolar de alunos autistas, destacando as políticas de inclusão e os modelos de atendimento vigentes no Brasil. O problema de pesquisa centrou-se na análise das práticas educacionais e na eficácia das estratégias utilizadas para promover a inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) no ambiente escolar regular. Os objetivos foram identificar as principais dificuldades enfrentadas por educadores e alunos, bem como avaliar a percepção dos profissionais de educação sobre a adequação das políticas públicas e a formação recebida para lidar com essa demanda.
Os achados da pesquisa revelaram que, apesar dos avanços nas políticas de inclusão, ainda existem desafios significativos a serem enfrentados. Educadores relataram dificuldades em compreender e aplicar metodologias que atendam às necessidades específicas dos alunos autistas, evidenciando a necessidade de formação continuada e suporte técnico. Além disso, a pesquisa destacou a importância de um ambiente escolar que promova a aceitação e a valorização da diversidade, onde a inclusão não seja apenas uma obrigação legal, mas uma prática efetiva que beneficie todos os alunos.
As percepções gerais indicam que a inclusão escolar de alunos autistas requer um esforço conjunto entre educadores, gestores e a comunidade. A formação de professores deve ser ampliada para incluir abordagens práticas e teóricas que considerem as especificidades do autismo, além de promover a sensibilização sobre a neurodiversidade. A pesquisa também sugere que a colaboração entre escolas e famílias é fundamental para o sucesso da inclusão, permitindo que as estratégias educacionais sejam adaptadas às realidades de cada aluno.
Em termos de desdobramentos futuros, é essencial que novas pesquisas sejam realizadas para aprofundar a compreensão das práticas inclusivas e suas implicações no desenvolvimento acadêmico e social dos alunos autistas. Estudos longitudinais que acompanhem a trajetória desses alunos ao longo do tempo podem fornecer dados valiosos sobre a eficácia das intervenções e a evolução das políticas de inclusão. Além disso, a investigação sobre a experiência de alunos autistas em diferentes contextos educacionais pode contribuir para a formulação de diretrizes mais eficazes e adaptadas às necessidades específicas de cada grupo.
Portanto, a inclusão escolar de alunos autistas é um tema complexo que demanda atenção contínua e um compromisso coletivo. A pesquisa realizada oferece uma base para futuras investigações e destaca a importância de um olhar crítico e reflexivo sobre as práticas educacionais, visando sempre a promoção de um ambiente inclusivo e acolhedor para todos os estudantes.
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1Mestranda do Programa de Pós-Graduação Ciências da Educação da Faculdade Interamericana de Ciências Sociales- FICS.