OS EFEITOS PSICOSSOCIAIS DO REBITE SOB UMA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICA DO INDIVÍDUO EM SUA ATIVIDADE PROFISSIONAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6875990


Autoras:
                                                           Isabella Guimarães Lemes1
Josiane Oliveira Arantes2


RESUMO

O uso de rebites para o exercício da profissão de caminhoneiro é comum no Brasil, uma vez que os rebites mantém o indivíduo acordado por mais tempo e isso possibilita o caminhoneiro percorrer longas distâncias em um menor período de tempo. Isto influencia em aspectos tanto sociais como psicológicos a quem faz o uso do psicotrópico. Esta pesquisa visa compreender a experiência do profissional e como este lida com o uso de rebites e os efeitos sentidos em seu organismo, como a alteração do comportamento, insônia e perda de apetite. Trata-se de uma perspectiva fenomenológica sobre o estudo de um caminhoneiro que deixou de fazer o uso de rebites recentemente e de como este lida com sua experiência, como são as mudanças sentidas em seu organismo depois de utilizar rebites durante muitos anos e as situações das quais enfrentou durante o exercer da profissão sob o efeito do psicotrópico.

Palavras-chave: Rebite. Caminhoneiro. Psicotrópicos.

ABSTRACT

The use of rebites for the exercise of truck driver profession is common in Brazil, once rebites keeps the person awake longer and make possible truck drivers travel for long distants in a short period of time. This influences in social and psychological aspects by the person who use this psychotropic. This study aims to understand the experience of this professional and how truck drivers deal with the use of rebites and the effects felt in their organism, like behavior changing, insomnia and loss of appetite. It is a phenomenological perspective about a truck driver who left to make the use of rebites recently, how he deals with his experience and which changes he felt in his organism after use rebites for a long time and the situations he faced in his profession under the effect of this psychotropic.

Keywords: Rebite. Truck driver. Psychotropic.

1. INTRODUÇÃO

O uso de anfetaminas conhecidas popularmente como rebites faz parte da atividade profissional de caminhoneiros, uma vez que seu uso se torna comum em uma realidade da qual percorre-se grandes distâncias e há prazos para cumprir. O rebite é um medicamento controlado e consumido para moderar o apetite, no entanto também gera a perda de sono por parte do indivíduo, fazendo com que este fique acordado por mais tempo.

Nesta pesquisa busca-se compreender como é a experiência de um caminhoneiro que faz uso de rebites, desde o exercer da atividade profissional até os efeitos biológicos sentidos no organismo do mesmo. A maneira que o indivíduo consume o medicamento também foi um assunto levado em consideração, uma vez que muitos profissionais utilizam cafeína e drogas ilícitas para potencializar o efeito dos rebites.

Os aspectos psicológicos e sociais também foram uma problemática, pois nota-se arrependimento por parte do usuário, que relatou colocar muitas vezes sua vida em risco e acredita que não recebeu nenhum tipo de retorno por isto. Também nota-se  uma preocupação por parte do indivíduo com o término do efeito dos rebites, pois há a perda instantânea de energia fazendo com que este durma ao volante podendo acarretar em um acidente rodoviário e pode ocorrer queda de pressão do usuário, pois os rebites levam a perda de apetite, logo, os indivíduos ficam longos períodos sem alimentarem-se.

Os acidentes de trânsito, ou perigos da estrada como roubos e condições precárias do asfalto são uma preocupação constante de quem realiza esta atividade profissional, o que os torna mais dependentes dos anfetamínicos. No entanto o uso de rebites também pode levar a acidentes de trânsito. “Qualquer quantidade de substâncias psicoativas SPA é sugerida como capaz de provocar alterações cognitivas que não são condizentes com o desempenho de uma direção segura, seja através de seus efeitos agudos, seja por meio de seus efeitos residuais ou de abstinência.” (Takitane, Garcia, Góes, Gruber, Muñoz, Yonamine & Leyton, 2013, p. 1248).

Verificamos como o paciente lida com o uso do medicamento atualmente, quais as mudanças que ocorreram em sua vida com o uso de rebites e se isso levou ao consumo fora do exercer da profissão, que pode levar a dependência do mesmo. Também buscamos compreender qual o olhar que este tem acerca de sua experiência com as anfetaminas.

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1 O Rebite

 No Brasil é comum o uso de substâncias psicotrópicas entre os profissionais de transporte de carga, sendo esta atividade de fundamental importância para a movimentação econômica no país. Segundo Takitane (2013) o rebite é um medicamento composto por uma substância chamada ANFETAMINA, a qual se trata de um estimulante do sistema nervoso central que faz com que o cérebro trabalhe mais depressa e cause nas pessoas aimpressão de diminuição da fadiga – já que consegue executar uma atividade qualquer por mais tempo- com menos sono, perda de apetite e de aumento da capacidade física e mental.

Os anfetamínicos apresentam um alto potencial de abuso, propiciando o desenvolvimento de farmacodependência. A tolerância (necessidade de maiores doses para se obter os mesmos efeitos) aos efeitos subjetivos e anorexígenos é instalada rapidamente; o usuário pode apresentar disforia, confusão mental, depressão, fadiga e mostrar-se agitado, desconfiado, ansioso, sendo que alguns tornam-se hostis e agressivos. Nos casos de overdose, a toxicidade é uma extensão dos efeitos farmacológicos ocorrendo disritmias cardíacas, hipertensão, hipertermia, falência aguda renal, acidose metabólica e coma (Leyton, Carvalho, De Jesus e Muñoz 2000-2002, p. 33).

Zeferino (2003) traz outras informações dizendo que as anfetaminas não exercem somente efeitos no cérebro. Assim, agem na pupila dos olhos produzindo dilatação (midríase); esse efeito é prejudicial para os motoristas, pois à noite ficam mais ofuscados pelos faróis dos carros em direção contrária. Elas também causam aumento do número de batimentos do coração (taquicardia) e da pressão sangüínea. Também podem haver sérios prejuízos à saúde das pessoas que já têm problemas cardíacos ou de pressão, que fazem uso prolongado dessas drogas sem acompanhamento médico, ou ainda que se utilizam de doses excessivas. Os rebites mais utilizados são: Dietilpropiona ou Anfepramona, Fenproporex, Mazindol, Metanfetamina e Metilfenidato.

Os rebites são utilizados principalmente entre os motoristas que precisam dirigir durante várias horas seguidas sem descanso, a fim de cumprir prazos predeterminados, também sendo conhecido como “bola” por estudantes que passam noites inteiras estudando, ou por pessoas que costumam fazer regimes de emagrecimento sem acompanhamento médico. Takitane (2013) entende-se que embora o efeito dos rebites possa ser compreendido como uma vantagem ao condutor, à medida que a concentração plasmática de anfetaminas aumenta menor é o desempenho do condutor na direção. Sobretudo, preocupa o fato de que, finalizado o efeito estimulante das anfetaminas, o condutor estará submetido a um efeito “rebote” sobre o SNC (Sistema Nervoso Central), que envolve a indução de depressão, fadiga e sono. Assim, em conjunto, os efeitos agudos e residuais das anfetaminas submetem o condutor a situações de risco no trânsito, impedindo-o de realizar uma direção considerada segura. A periculosidade dessa associação entre motoristas de caminhão foi apontada por um estudo brasileiro que encontrou que 27% dos entrevistados relataram envolvimento em acidentes nas estradas devido ao uso de anfetaminas.

2.2 O uso do rebite na atividade profissional

O rebite tem sido usado cada dia mais por caminhoneiros que almejam o sucesso e o aumento de horas trabalhadas em suas cargas horárias, pois os mesmos manipulam seus organismos para que consigam manter-se acordados por longos períodos de tempo, sem ao menos pararem para alimentar-se e/ou higienizar-se.

Segundo a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) existem cerca de quatro milhões de pessoas que trabalham no setor de transporte de cargas no Brasil. Ou seja, 4,8% de todas as pessoas trabalhando no País. A frota nacional de veículos possui mais de 1,9 milhões de caminhões. O número exato de caminhoneiros é desconhecido, mas estima-se que mais de um milhão de pessoas trabalhem no transporte rodoviário de cargas. Dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) apontam para a existência de quase 700 mil caminhoneiros autônomos ou cooperativados. (Ela pediu de onde tirou esse dado)

Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o setor de transportes é composto por cerca de 93% motoristas do sexo masculinos e 7% do sexo feminino, ambos enfrentando a mesma realidade. As condições de trabalho colocam os caminhoneiros em situações de perigo, como acidentes nas rodovias e assaltos, fazendo com que permaneçam em constante vigilância e temor. As condições de trabalho dos caminhoneiros podem ser consideradas muito perigosas e estressantes. Essas condições de trabalho podem levá-los a ter sentimentos de isolamento e solidão, chegando até mesmo a casos de depressões e transtornos de ansiedade.

Os caminhoneiros permanecem vários dias, semanas e até meses longe de sua casa, dormindo na estrada (geralmente em seus próprios caminhões em pátios de postos, transportadoras ou até na própria estrada- quando acontece de o veículo estragar), o que gera muito desconforto físico e psicológico e conflitos familiares.

Incentivos e/ou pressão por parte das empresas contribuem para que o motorista tenha longas jornadas diárias de trabalho e permaneça muito tempo sem dormir. Os caminhoneiros apresentam consumo elevado de cigarros, bebidas alcoólicas e bebidas cafeinadas, além de fazerem uso de anfetaminas, como o rebite, ou até mesmo de entorpecentes, como a cocaína.

Como já dito anteriormente, os caminhoneiros enfrentam um grande problema com o tempo, pois tudo deve ser cronometrado, cada carga possui seu período de validade, ou seja, um deslize, e tudo pode estar perdido, gerando assim um enorme prejuízo ao proprietário do caminhão. O foco da pesquisa será compreender estritamente quais os fatores psicossociais gerados pelo uso do psicotrópico, já que se trata de um medicamento controlado, que não pode ser vendido sem receita médica. Por se tratar de um remédio utilizado em casos de autismo, congestão intestinal e estomacal, entre outros. Portanto, podemos supor então que quase sempre ou sempre ele é adquirido de forma clandestina em postos ou vendedores particulares (Camelôs).

O conhecimento da prevalência do uso de anfetaminas por motoristas de caminhão é uma informação imprescindível para o melhor conhecimento da magnitude do problema em nosso país, bem como para fornecer dados às autoridades públicas e competentes para planejar e programar ações no sentido de melhorar as condições de trabalho dessa população, prevenindo o uso de drogas, o acontecimento de acidentes de trânsito e seus desdobramentos. Sobretudo, a importância dessa informação é que as conseqüências desses acidentes tem afetado toda a sociedade. A importância de se compreender esses fenômenos equivale-se a estimar os efeitos psicossociais e até neurológicos que levam o indivíduo a se envolver em problemas de saúde devido ao uso dessas drogas durante sua atividade profissional.

Portanto, entende-se que os rebites tem sido cada vez mais usado entre motoristas de todo o Brasil e que os prejuízos dessa droga são inúmeros. O mais preocupante é que em grandes casos, os usuários dessa droga não possuem conhecimento da gravidade de seus efeitos, e costumam pensar que se trata apenas de um estimulante. Vale afirmar que muitas pessoas estão se dedicando a estudos sobre esses casos, para que assim as pessoas adquiram o conhecimento dos efeitos psicossociais e físicos gerados por tal medicamento, para que assim seja cada dia mais menos consumido ilegalmente essas tão poderosas anfetaminas.

3. PROCEDIMENTO METODOLÓGICO

Esta pesquisa objetivou explicar e entender o fenômeno de quais são os efeitos psicossociais do Rebite do indivíduo em sua atividade profissional, será usada a pesquisa qualitativa com enfoque fenomenológico.

Segundo Moreira (2002) a pesquisa qualitativa é aquela focada no ser humano aqui é a sua visão de mundo é o que realmente interessa. A pesquisa qualitativa usa a interpretação das variáveis e invariáveis apresentadas pelo sujeito. Trabalha-se com dúvidas e não hipóteses prévias, o pesquisador interroga o sujeito para obter a resposta, tornando-se assim, um processo às vezes longo à procura do fenômeno, pois a resposta só se manifestará pelos relatos das experiências apresentadas pelo sujeito entrevistado.

Foi escolhido o método fenomenológico, que possui técnicas e características de coletas de dados da pesquisa qualitativa, em que procura chegar à essência de qualquer dado que seja experienciado, este, porém é o fenômeno, que será interpretado pelos sentidos e significados das experiências relatadas sobre a intencionalidade da consciência pelo indivíduo. O indivíduo neste processo é sujeito e objeto de investigação em sua totalidade e em seu contexto, relatado pelas suas experiências e pelo significado que as mesmas trazem aqui-e-agora.

A pesquisa será qualitativa de enfoque fenomenológico, serão realizadas as seguintes etapas, conforme Motta (2005):

a) a descrição fenomenológica utiliza a linguagem a fim de articular objetos da consciência dentro de uma evidência intuitiva. Esta subdivide-se em: 1) Estimulativa  é a fala ingênua da experiência pelo participante partindo da pergunta disparo do pesquisador do qual irá estimular o participante a falar; 2) Reflexiva onde o pesquisador reescreve a experiência em um saber/linguagem científica, construindo as unidades temáticas de sentido ou de significado, que deverão ser submetidas à nova reflexão pelos participantes.

b) A redução fenomenológica é a construção da estrutura da experiência vivida do sujeito através de componentes mais precisos desta experiência, identificando as unidades temáticas de sentido em duas categorias variáveis e invariáveis. Na redução fenomenológica são verificadas duas unidades: 1) Unidade de sentido variante é ocasional, não está presente em todos os momentos; 2) Unidade de sentido invariante está presente em todos os momentos, em toda a fala do indivíduo.

c) Interpretação fenomenológica é a avaliação de como os significados encontrados estão subjacentes à conduta estudada, ou seja, o mundo fenomênico determina a conduta da pessoa.

A identidade do participante será mantida sob sigilo, haverá ausência total de informações pessoais que revelem sua identidade, como endereço e dados pessoais relevantes. Os resultados obtidos serão publicados e apresentados à professora orientadora da pesquisa.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Fase redutiva da participante: elementos variantes e invariantes nas estruturas das unidades de sentido do sujeito estudado.

Experiência VividaUnidades Temáticas VariantesUnidades Temáticas Invariantes
Uso de Rebites na atividade profissional• Dificuldades provenientes a obtenção do tratamento;
• Medo da morte;
• Dificuldades financeiras;
• Conscientização da prevenção;
• Sentimento de empatia;
• Receio da filha desenvolver o câncer;
• Sentimento de culpa;
• Segurança;                                                       • Coragem ;
• Sentimento de prejuízo ao corpo;                         
Total:0604

Os resultados foram analisados seguindo os três passos fenomenológicos: Descrição, redução e interpretação a fim de compreender o fenômeno. Neste artigo as unidades de sentido invariantes são de suma importância para esse estudo, pois através destas temos o fenômeno em sua essência, podendo captar a experiência vivida pelo sujeito.

4.1 Unidade temática de sentido: Arrependimento de usar o medicamento.

Descrição fenomenológica:

E1:“Eu vi que era só prejudicar a saúde mesmo, eu acho assim as vezes a pessoa fica até mais velha mais rápido, você já pensou passar uma noite de sono o tanto que é ruim no outro dia?  Como você amanhece? Você já pensou trocar o dia todo a noite toda, qual ser humano que aguenta uma coisa dessa? É difícil. Eu vi que não tinha futuro aquilo.”

E2: “Não, se fosse hoje. Hoje pela minha idade, mesmo se eu fosse um cara novo igual a idade que eu tomava, eu acho que não tomaria mais não, porque não valeu a pena sabe?”

E3: …“Hoje, pra começar eu não gosto nem de rodar a noite mais, eu posso rodar, se eu deveria estar chegando em casa, eu sou assim, hoje por exemplo se eu chegar em Goiânia eu paro e vou dormir, eu não tomaria hoje mais não.”.

Redução fenomenológica:

O participante relata o arrependimento por ter usado a substância em sua juventude, também reforça constantemente a ideia de que hoje não usaria mais, que inclusive não possui mais idade para aguentar os efeitos dos rebites, como sentir-se aéreo, tremores, também relata não precisar dirigir por longos períodos de tempo sem descansar mais.

Interpretação fenomenológica:

Para Knauth, Pilecco, Leal, Seffner, & Teixeira (2012) as condições de trabalho dos caminhoneiros podem levá-los a sentimentos de isolamento e solidão, pois passam longos períodos longe de casa. Também há a pressão por parte das empresas que determinam prazos e levam a tensão dos profissionais, tudo isso influencia ao consumo de rebites e outras drogas lícitas e ilícitas para maior rendimento no exercer profissional.

4.2 Unidade temática de sentido: Sentimento de segurança.

Descrição fenomenológica:

E1: “Vamos supor que você está perto de casa, aparece uma pessoa e você tem que ir, ai você toma ele. Da mais uma segurança se você tomar ele.”

E2: “E fica bom, você trabalha a noite todinha, não tem aquele medo, porque se rodar a noite sem o Rebite você fica com medo né?”

E3: “Eu achei assim, pelo que eu tomei, eu acho bom quando eu tomava, hoje não, mas quando eu tomava achava bom, dava mais segurança pra mim dirigir.”

Redução fenomenológica:

O participante relata sentimento de segurança ao referir-se ao uso do medicamento, afirmando que ao toma-lo conseguia manter-se acordado e assim perdurar a noite toda dirigindo, reforça que sob os efeitos do psicotrópico não sentia medo de prosseguir dirigindo.

Interpretação fenomenológica:

Segundo Knauth, Pilecco, Leal, Seffner & Teixeira (2012), os caminhoneiros estão em situação de vulnerabilidade decorrente das suas condições de trabalho, portanto entende-se que as emergências em cargas os levam ao uso desse psicotrópico que os mantém acordados, gerando assim uma segurança neles em dirigir por toda a noite sob o efeito do medicamento.

4.3 Unidade temática de sentido: Sentimento de coragem

Descrição fenomenológica:

E1: “eu rodava assim, começava 4 horas da manhã, rodava até meia noite, uma hora da manhã dormia, quatro horas eu levantava sem tomar nada. Mas vai ficando mais velho não vai aguentando isso”

E2: “Então você toma parece que enxerga mais. E fica bom, você trabalha a noite todinha, não tem aquele medo, porque se rodar a noite sem o Rebite você fica com medo né? Aí vem ladrão, aqueles trem, parece que da até uma coragem na gente.”

E3:” A gente acha que tudo é novidade, mesma coisa de adolescente. Tomava ali estava dois, as vezes estava sozinho. Ai da mais coragem na gente, é uma droga mesmo, eu acho que é um efeito parecido com esses da maconha, cocaína, faz o mesmo efeito, não da igual né?”

Redução fenomenológica:

O participante relata sentir-se corajoso mediante o uso do medicamento, afirma que fez muitas coisas pelo efeito do medicamento, reforça que a coragem é um sentimento que o leva a fazer coisas que sem o medicamento não faria.

Interpretação fenomenológica:

Segundo Nascimento, Nascimento & Silva (2007), o uso de anfetaminas leva os caminhoneiros a realizarem atividades de riscos, como dirigir a noite toda, correndo o perigo de dormir na direção e acontecer um possível acidente de trânsito, mas entende-se eu é como se a anfetamina os encorajasse a continuar nessas condições.

4.4 Unidade temática de sentido: Sentimento de prejuízo ao corpo

Descrição fenomenológica:

E1: “Eu vi que era só prejudicar a saúde mesmo, eu acho assim as vezes a pessoa fica até mais velha mais rápido, você já pensou passar uma noite de sono o tanto que é ruim no outro dia?  Como você amanhece? Você já pensou trocar o dia todo a noite toda, qual ser humano que aguenta uma coisa dessa?”

E2: “Hoje as vezes por você ter tomado aquilo, as vezes qualquer coisinha você cansa mais, envelhece mais rápido, então assim, eu acho que não vale a pena não.”

E3: “o Rebite vai indo da uma coisa no intestino da pessoa, sabe? No estômago da ferida, porque vai indo ele machuca né? Porque o comprimido ele não engole ele, mastiga ele né? Coloca ele num pilãozinho e coloca no copo de café e toma. Só para mascar o Rebite, eu tomava, amassava ele também e vai indo da ferida no estômago da pessoa.”

Redução fenomenológica:

Nas três entrevistas o participante declarou prejuízos ao corpo mediante o uso do medicamento. Vale dizer que através dos relatos dele entende-se que os efeitos são nítidos e prejudiciais ao corpo.

Interpretação fenomenológica:

Segundo Knauth, Pilecco, Leal, Seffner & Teixeira (2012), o uso de rebite acarreta inúmeros problemas ao organismo do usuário, ele retrata mudanças sexuais, depressão, DST (doenças sexualmente transmissíveis) acarretadas pela pratica sexual sem segurança, sem falar nas alterações do sono (insônia), falta de apetite, entre outros. Portanto percebe- se que essas anfetaminas são prejudiciais ao corpo do usuário.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho, a priori, foi desenvolvido com o intuito de expor os efeitos psicossociais do rebite sob uma perspectiva fenomenológica do indivíduo em sua atividade profissional, pode-se perceber que através da descrição, redução e interpretação fenomenológica foram levantadas unidades temáticas que demostraram suscintamente esses tais efeitos.

É de suma importância destacar que a pesquisa qualitativa conduziu as entrevistas e mostrou o mundo fenomênico no indivíduo, onde o fenômeno (uso do rebite) e a intencionalidade (o que levou o uso do rebite) foram emergidos, e assim pode-se compreender a fundo os aspectos subjacentes ao uso do psicotrópico.

De início realizamos a análise dos relatos e percebemos que o participante demostrou aspectos de arrependimento do uso do medicamento, ou seja ela conscientizou-se de que esse uso não foi benéfico para seu organismo, por muitas vezes afirmou esse sentimento de arrependimento, outrora afirmava que era como uma necessidade que ele encontrava de poder dirigir, é como se o medicamento funcionasse como um estimulante em suas jornadas de trabalho fazendo-o enfrentar situações, as quais sem o uso do medicamento não faria.

Vale dizer que a experiência do participante o levou a inúmeras reflexões, por muitas vezes ele cita o isco que corria nas estradas com sua família na cabine no caminhão, ou seja, a família foi um dos fatore que o levou a interromper o uso do psicotrópico. Mas o fator determinante para esse término, foram justamente as questões legislativas, pois, no decorrer dos anos foram implantando-se leis como a lei número 12.619/12 afirma que é vedado ao motorista dirigir por mais de 5 horas e meia ininterruptas. A cada 6 horas na condução do veículo, estão previstos 30 minutos para descanso. Que retrata uma grande melhora nas condições de trabalhos desses caminhoneiros (BRASIL, 2012 – art. 235 D, inciso I).

Portanto sintetiza-se o quão nocivo é uso dessas anfetaminas, e como seus efeitos são nítidos e prejudicais ao usuário. Sabe-se que a venda desses psicotrópicos são ilegais, mas que o mercado negro sempre encontra formas de expor esse medicamento à sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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LEYTON, Vilma.; Carvalho, Débora Gonçalves. De; Jesus, Maria das Graças Silva & Muñoz, Daniel Romero. (2000-2002) Uso de anfetamínicos por motoristas profissionais brasileiros: aspectos gerais. Saúde, Ética & Justiça, 5/7(1-2), 32-6

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ZEFERINO, MT. (2005). Acidentes de trânsito e os estimulantes do tipo anfetaminas: estudo de caso junto às empresas de transporte rodoviário de cargas no estado de Santa CatarinaTexto & Contexto – Enfermagem14(3), 439-440.


1Mestre em Psicologia Experimental pela USP.

2Psicóloga. Graduada pela Universidade de Rio Verde (UniRV – 2019). Especialista em Educação pela Universidad de la Empresa e Mestranda em Educação pela mesma instituição. Analista comportamental MAPA, DISC e ENEAGRAMA.