O PAPEL DAS PRÁTICAS DE ESTÁGIO NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202410170818


Luiz Carlos de Souza; Ingraça Ferreira de Sousa; Vilma das Graças Britts de Souza; Fernanda Louzada Lence; Vaneska Maria de Melo Silva; Alex Abade Ferreira de Araujo; Leidiane Aparecida dos Santos; Ueudison Alves Guimarães.


RESUMO

O estágio supervisionado é uma prática vital para a aquisição de competências essenciais na formação docente, onde a teoria se alia à prática. Nesse sentido, destaca-se que o objetivo aqui é discutir a importância do estágio supervisionado e os desafios cada vez mais complexos que ele enfrenta no contexto educacional por meio de uma metodologia de caráter bibliográfico. O estágio supervisionado é um momento decisivo para que o universitário conecte teoria e prática, tornando-se uma atividade relevante no desenvolvimento de competências indispensáveis para uma atuação pedagógica responsável. Durante o estágio, o universitário tem a chance de superar suas deficiências refletindo sobre sua própria prática, promovendo a contextualização dos temas trabalhados e a formação de um pensamento crítico e reflexivo sobre questões científicas e sociais, pois o estágio supervisionado permite que o educando intérprete fenômenos biológicos e sociais de forma científica e crítica, propondo soluções. A práxis educativa, portanto, torna-se uma atividade relevante para uma atuação pedagógica comprometida com a formação cidadã e a equidade social. O estágio é, sem dúvida, uma etapa essencial e fundamental da graduação, uma ferramenta importante que estabelece relações entre teoria e prática, permitindo ao estudante construir sua identidade profissional.

Palavras-Chave: Estágio Supervisionado. Formação Inicial. Formação Docente.

ABSTRACT

Supervised internships are vital practices for acquiring essential skills in teacher training, where theory is combined with practice. In this sense, it is important to highlight that the objective here is to discuss the importance of supervised internships and the increasingly complex challenges they face in the educational context through a bibliographic methodology. Supervised internships are a decisive moment for university students to connect theory and practice, becoming a relevant activity in the development of skills that are indispensable for responsible pedagogical practice. During the internship, university students have the chance to overcome their deficiencies by reflecting on their own practice, promoting the contextualization of the topics worked on and the development of critical and critical thinking on scientific and social issues, since supervised internships allow students to interpret biological and social phenomena in a scientific and critical way, proposing solutions. Educational praxis, therefore, becomes a relevant activity for pedagogical practice committed to citizenship formation and social equity. The internship is, without a doubt, an essential and fundamental stage of graduation, an important tool that establishes relationships between theory and practice, allowing the student to build their professional identity.

Keywords: Supervised Internship. Initial Training. Teacher Training.

1 INTRODUÇÃO

A prática de ensino segundo Canário (2001) envolve inúmeros fatores complexos, e para desvendar esses elementos, o professor necessita de uma formação inicial robusta e abrangente, juntamente com uma formação continuada eficaz. Assim, os docentes devem ter um profundo conhecimento de sua área de atuação, familiaridade com métodos e técnicas para uma transposição didática eficaz, compreensão das transformações resultantes da evolução científica e tecnológica, consciência da diversidade socioeconômica e cultural, e um compromisso firme com a equidade social. Esses aspectos permitem que os alunos construam uma aprendizagem efetiva dos conhecimentos científicos e desenvolvam habilidades essenciais para uma atuação social que os capacite a propor soluções e serem protagonistas delas

A prática de ensino, mediada pelo estágio supervisionado, promove uma fusão dinâmica entre teoria e prática. O contexto relacional entre prática-teoria-prática é de extrema importância na formação docente, pois fomenta a compreensão da unidade conceitual, ou seja, a relação intrínseca e indispensável entre teoria e prática, em vez de sua simples justaposição ou dissociação.

Além disso, o conhecimento da realidade escolar impulsiona profundas reflexões sobre a prática dos estagiários, permitindo o desenvolvimento de uma prática inovadora e transformadora através da aplicação de teorias que fundamentam o trabalho pedagógico.

Dessa forma, a práxis educativa se concretiza através da aplicação de metodologias de ensino, planejamento meticuloso e verificação rigorosa da aprendizagem em um ciclo incessante de ação-reflexão-ação, revelando a educação como uma prática profundamente questionadora, fundamentada em aspectos relevantes: intencionalidade clara, natureza social inerente, ação conjunta indispensável e realização como trabalho humano eficaz.

Nesse contexto, o estágio supervisionado passa a ser encarado como um propulsor para a construção de atitudes críticas e reflexivas no processo de ensino e aprendizagem, fomentando concepções questionadoras e transformadoras que desafiam e reformulam o ensino tradicional.

Nesse contexto, o ensino na educação básica deve ser direcionado à formação cidadã, utilizando temas contextualizados que permitam ao educando desenvolver habilidades para interpretar cientificamente os fenômenos cotidianos.

Dessa forma, Freire (2003) acrescenta que o pensamento crítico sobre questões sociais começa a exercer uma influência positiva e decisiva na sociedade, capacitando o indivíduo a construir uma mentalidade crítica e reflexiva em relação às questões educacionais, o que conduz ao desenvolvimento de atividades investigativas em um contínuo processo de pesquisa, promovendo uma articulação robusta entre universidade e escola.

2 METODOLOGIA

Como metodologia, este estudo utilizou uma abordagem de pesquisa bibliográfica. Conforme Severino (2007, p.122), trata-se de uma pesquisa que se realiza a partir de registros disponíveis, resultantes de estudos anteriores, contidos em documentos impressos. Essa metodologia configura-se como um levantamento extensivo sobre um tema específico, colhido em bases de dados nacionais e internacionais, mediante a leitura criteriosa de livros, artigos de teses, revistas e outros tipos de documentos que tratam do tema em questão, proporcionando uma fundamentação teórica robusta e abrangente.

3 A PRÁTICA DE ENSINO NA LICENCIATURA

Dada a importância da teoria na formação docente, surge a indagação: como a atividade teórica compreende as realidades práticas das escolas em seus contextos específicos?

A teoria não se limita ao significado das realidades práticas observáveis; ela busca desvendar suas origens, as amplas determinações que as circundam, e investigar historicamente essas realidades. Examina como eram antes, a quais interesses e necessidades respondiam, e como se manifestam em outros contextos (diferentes locais, outras escolas em diversos sistemas de ensino). Isso é feito por meio do estudo de compreensões desenvolvidas por outros autores sobre realidades similares e pelos resultados de experiências e formas de intervenção efetivadas.

Imbernón (2014) afirma que esse conhecimento teórico das realidades e práticas permite fundamentar a definição de finalidades transformadoras na formação docente e para uma ação pedagógica que realmente transforme o real ou para a práxis do profissional docente.

Nesse sentido, o autor ressalta que para o materialismo histórico-dialético, o conhecimento efetivo se dá na e pela práxis. Sob essa perspectiva, a práxis é a atitude humana que une teoria e prática na transformação da natureza e da sociedade.

Portanto, não basta conhecer e interpretar o mundo teoricamente; é imprescindível transformá-lo (práxis). A relação entre teoria e práxis é tanto teórica quanto prática: a teoria, como guia da ação, molda a atividade humana, especialmente a transformadora; e é teórica na medida em que essa relação é consciente, criticamente pensada e refletida.

No materialismo histórico-dialético, é a atividade teórica que estabelece de modo indissociável o conhecimento crítico da realidade e as finalidades políticas de transformação.

Contudo, a atividade teórica por si só não transforma a realidade, ela proporciona sentidos e significados para essa transformação, que só ocorre na práxis, ou seja, na ação dos sujeitos historicamente situados.

Por isso, afirmamos que os estágios nos cursos de formação de professores podem constituir uma atividade teórica fundamental que capacita os estudantes, em sua futura práxis docentes, a transformar a realidade do ensino nos contextos em que atuarem, contribuindo para a emancipação, conforme destaca Formosinho (2001).

Para expandir essa compreensão, recorremos às contribuições do autor, que afirma que a práxis é a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, ao alterá-la, transformam-se a si mesmos.

É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, necessita da teoria; é a teoria que remete à ação, enfrentando o desafio de verificar seus acertos e desacertos ao confrontá-los com a prática.

Essa concepção também é encontrada em Leffa (2001), que afirma que a reflexão teórica sobre a realidade não é uma reflexão diletante, mas uma reflexão orientada para a ação com o propósito de transformar a realidade (práxis).

No campo da educação, a transformação das situações que fazem do ensino um instrumento da elite capitalista neoliberal dominante é decisivo. Portanto, definimos o conceito de professor a ser formado como um profissional crítico e reflexivo, um investigador de sua própria práxis docente e da práxis que ocorre nas escolas.

Para isso, os cursos de licenciatura devem prepará-lo teoricamente para que adote uma perspectiva transformadora da realidade. Assim, a lógica dialética, ao pressupor uma forma de ver o mundo e de situar-se nele para transformá-lo, se opõe veementemente à lógica formal.

Segundo Malglaive (1997), a perspectiva dialética, onde o trabalho historicamente situado constitui a categoria central, fundamenta seu método nas categorias da totalidade concreta: conhecer a realidade para compreendê-la e transformá-la, visando a emergência de uma realidade transformada. Ela examina os movimentos, a lógica que impera e que se supera (superação), ultrapassando os limites da lógica formal. Enfrenta as contradições (unidade e luta dos contrários) inerentes a esses movimentos, e aborda a categoria da alienação: a condição de ‘assujeitamento’, de falta de controle sobre o próprio trabalho, de desempenhar uma ocupação profissional apenas para obter salário, sem satisfação pessoal e profissional.

O conhecimento produzido, nesse contexto, serve à atividade humana, vinculado às necessidades práticas do homem social (daí a necessidade de conhecer para transformar), tendo como critério de verdade a prática social.

Como vimos destacando, em nosso entendimento, a atividade docente é práxis, uma unidade dialética entre teoria e prática. Por essa razão, a análise sobre a qualidade da formação de professores exige interpretações contextualizadas das racionalidades presentes nas ações de formação, além de críticas fundamentadas sobre a função social da escola na atualidade.

Segundo Leffa (2001), a teoria encontra sua fundamentação inesgotável na prática. Isolada da prática, a teoria não se materializa nem produz mudanças; pode transformar nossas ideias sobre os fatos, mas não os fatos em si.

A produção de mudança requer atividade prática, e os avanços do conhecimento científico estão intrinsecamente ligados às necessidades práticas da humanidade, funcionando como critério de verdade e validação das teorias.

Nesse contexto, a visão do senso comum reduz a dimensão prática a uma mera utilidade, dissolvendo a dimensão teórica. Desse modo, Leffa (2001) afirma que o movimento de ida e volta que ocorre no plano intersubjetivo, a atividade que leva os cidadãos a interferirem uns nas vidas dos outros, passa inevitavelmente pelo diálogo.

Jamais devemos esquecer que a palavra dialética é irmã gêmea da palavra diálogo: ambas se originam do prefixo dia (indicando reciprocidade) e do verbo lêgein ou do substantivo logos, que remetem ao discurso da razão. Dessa forma, entende-se que os estudos e atividades curriculares dos cursos, como os estágios, devem proporcionar aos alunos a análise, compreensão, crítica, conhecimento e a revelação de teorias conservadoras subjacentes à práxis escolar.

De acordo com Franco (2012), o conceito de ensinagem e pesquisa nos estágios como método de formação de professores fundamenta-se na valorização da realização de pesquisas durante os estágios, baseando-se na compreensão de ensinar e aprender como um processo de ensinagem.

Para a autora, o ato de ensinar transcende o momento da aula expositiva, não se esgota ali e deve considerar os contextos nos quais ocorre, visto que ensinar e aprender são indissociáveis, configurando-se como um fenômeno complexo, uma práxis social realizada por e entre seres humanos. Esse processo se modifica na ação e relação dos sujeitos (professores e alunos), situados em contextos institucionais, culturais, espaciais, temporais e sociais, que, por sua vez, transformam os próprios sujeitos envolvidos.

Ensino e aprendizagem formam uma unidade dialética, caracterizada pelo papel mediador do professor na relação aluno-conhecimento, onde o ensino existe para provocar a aprendizagem. Esse processo contínuo une alunos aos conhecimentos mobilizados, colocando-os frente a frente, mediado pela ação do professor, que planeja, define, propõe e dirige atividades e ações necessárias para que os alunos desenvolvam processos de mobilização, construção e síntese do conhecimento, ou mesmo para (re)construir, (re)significar e (re)elaborar conhecimentos historicamente produzidos, mediadores pelo mundo.

Chamamos de ensinagem o processo compartilhado de trabalhar conhecimentos, conteúdo, formas de ensino e resultados, mutuamente dependentes. Nesse processo, a pesquisa se constitui como método de apropriação, revisão e produção de novos conhecimentos.

A realização de pesquisas nos estágios surge como uma oportunidade para superar a dicotomia entre pesquisar e ensinar e a predominância da pesquisa sobre o ensino, tão fortemente presente nas universidades.

Segundo Almeida e Pimenta (2014), o estágio, enquanto eixo articulador do currículo dos cursos de licenciatura, manifesta em sua essência como campo de conhecimentos a possibilidade de manter todas as atividades teóricas e práticas dos cursos em constante conexão com a práxis educativa das escolas públicas em seus contextos histórico-sociais.

Nesse contexto, faz-se necessário que os cursos não se limitem a formar futuros professores, mas também proporcionem uma formação contínua para seus próprios docentes, visto que nem sempre a formação específica, seus estudos e suas pesquisas se inserem direta ou indiretamente na área da educação escolar.

Ainda segundo os autores supracitados, a mediação entre a universidade e as escolas-campo possibilita a contínua formação dos docentes que nelas atuam, visto que ela pressupõe uma troca e um diálogo crítico de conhecimentos e experiências, estudos, análises, reflexões, e uma compreensão aprofundada da complexidade da educação escolar, seus problemas, origens, causas e consequências.

Com isso, revela-se a importância de que os cursos garantam não apenas a formação dos futuros professores, mas também a contínua qualificação dos seus próprios docentes, já que suas formações específicas, estudos e pesquisas nem sempre se relacionam diretamente com a educação escolar.

Esse movimento se configura como uma verdadeira investigação da realidade. Nesse contexto, a práxis transformadora nos cursos de formação se torna explícita ao nutrir-se e transformar-se na relação com a práxis das escolas, mediada pelos estágios.

Essa relação se concretiza por meio de pesquisas conjuntas que visam a transformação de ambas as práxis – dos cursos de formação e das escolas-campo. Os estágios, portanto, se posicionam como espaços curriculares a serem realizados com e como pesquisa. Nesse processo, a pesquisa se estabelece como o método de formação.

Segundo Barreiro (2006), a formação de professores deve ser concebida de maneira holística, englobando tanto as dimensões iniciais quanto continuadas, em uma articulação incessante entre Universidade e Escola. Essa abordagem deve refletir os interesses dessas instituições, enfatizando as características intrínsecas do profissional docente: sua competência, o saber essencial, a aprendizagem profissional, bem como o currículo e a pedagogia, tudo isso permeado pela formação investigativa.

No campo da reflexão sobre o papel do professor no contexto social atual e como deve ser sua formação para atender às demandas sociais, destacam-se alguns pontos cruciais: o processo de formação é, na verdade, um processo de autoformação; a formação é contínua; a articulação entre ensino e pesquisa, ação e reflexão, deve ser o princípio fundamental tanto da formação inicial quanto da continuada; e o exercício da atividade profissional deve ser baseado na reflexão crítica constante do professor.

Gómez (2000) explica que a interação entre teoria e prática é fundamental na formação do professor, pois permite uma melhor interpretação dos conceitos. Assim, a combinação de aulas teóricas e práticas facilita um entendimento mais profundo dos conteúdos aplicados na sala de aula.

Por conseguinte, os agentes pedagógicos envolvidos na formação de professores frequentemente veem a Prática de Ensino, na forma de estágios supervisionados, como uma tarefa exclusiva da didática, com dificuldades em integrá-la dentro de um projeto político pedagógico mais abrangente.

Segundo Almeida e Pimenta (2014), na formação de professores (licenciatura), os estágios são integrados ao componente curricular da prática de ensino, com o objetivo de preparar o licenciado para atuar no magistério em áreas específicas do ensino fundamental e médio.

Contudo, a formação docente enfrenta inúmeros desafios, um dos quais é a desconexão entre disciplinas fundamentais e a prática pedagógica real nas escolas. Muitas dessas disciplinas oferecem pouca ou nenhuma contribuição prática, resultando em uma preparação inadequada para os futuros professores no contexto educacional efetivo.

Para Imbernón (2014), um problema crítico nos cursos atuais de formação de professores é que a disciplina de prática de ensino, vista como o principal elo entre teoria e prática, é oferecida apenas nos últimos semestres do curso. Para alguns pesquisadores, esse modelo tem se mostrado inadequado e insuficiente para a formação eficaz de professores, pois a atuação do professor está intrinsecamente ligada às ideias do cotidiano, e o conceito de professor está profundamente enraizado na vivência cultural de cada indivíduo.

Segundo Lima (2001), essa concepção, tanto do licenciado quanto do professor, resulta em uma familiaridade mínima com as contribuições da pesquisa e da inovação didática, levando-os a enxergar o ensino como uma tarefa simples que requer apenas o domínio da área específica e algumas práticas pedagógicas básicas.

O curso de licenciatura deve, por sua vez, proporcionar aos futuros professores um processo dinâmico de descoberta e aprendizagem, abrangendo diversas áreas de atuação profissional em situações reais. Dessa forma, o aluno pode conhecer, compreender e aplicar a integração entre teoria e prática na realidade escolhida.

Sendo um elo integrador entre todas as disciplinas do curso, abrangendo os núcleos temáticos da formação básica, como conhecimento do homem e sociedade, conhecimento científico-tecnológico, e conhecimento do corpo humano e desenvolvimento, e da formação específica, como conhecimento didático-pedagógico e a cultura do movimento, o estágio visa imergir o estagiário na dinâmica real do mercado de trabalho, permitindo a consolidação de sua profissionalização.

A formação inicial é um momento de grande relevância na trajetória do profissional da educação, pois é através da compreensão das necessidades dos futuros professores que os formadores podem oferecer uma formação inicial robusta e eficaz, pois permite alinhar as demandas formativas com as exigências profissionais, garantindo uma preparação que realmente atenda às exigências do campo educacional.

4 FORMAÇÃO INICIAL DOCENTE E PRÁTICA DE ENSINO

A prática de ensino, por ser uma disciplina única que integra teoria e prática na formação de professores, destaca-se por sua singularidade. Assim sendo, percebe-se que o contato direto com o ambiente educativo da escola é categórico, pois é dessa realidade concreta que devem surgir as propostas de ensino.

Entretanto, descobre-se que a falta de um vínculo efetivo entre os alunos e a realidade escolar tem limitado a experiência pedagógica a um cumprimento meramente formal das práticas de ensino, sem garantir uma reflexão profunda sobre as vivências.

Dessa forma, Franco (2012) explica que a reflexão sobre o cotidiano, especialmente a partir das dúvidas reais dos professores, mostra-se fundamental para promover uma formação mais integrada e coerente com a realidade educacional, visto que desafia o futuro professor a elaborar um projeto de ensino onde teoria e prática se fundam em uma unidade indissolúvel.

A discussão sobre o cotidiano dos alunos é de vital importância e frequentemente incorpora uma concepção sociológica fundamental: a noção de trabalho voltado para a construção de um reino de liberdade.

A prática docente é um trabalho inerentemente humano, moldado por indivíduos situados em um contexto histórico e social específico. Nessa perspectiva, urge-se entender o trabalho como uma dimensão essencial da vida humana, capaz de transformar qualitativamente o ambiente em seus aspectos objetivos e subjetivos.

Figura 1 – Formação Inicial Docente

Fonte: Observatório Movimento pela Base (2020)

Pimenta (2001) ressalta que a prática de ensino deve se preocupar em possibilitar o acesso profundo à realidade produzida, através da compreensão do sistema conceitual e da familiarização com as técnicas, procedimentos e normas que definem o conhecimento.

É evidente que as questões relacionadas ao ensino estão intrinsecamente ligadas a um processo maior e mais complexo de desmantelamento da escola pública brasileira. Esse desmonte se manifesta nos salários irrisórios pagos aos profissionais da educação, nas deploráveis condições de trabalho, no gerenciamento do sistema de ensino dominado por interesses corporativos e político-eleitorais, e na ausência de uma proposta educacional que vise à formação integral do cidadão.

A prática educativa deve ser direcionada para uma formação significativa para os alunos, promovendo uma inserção crítica e comprometida na sociedade.

Não obstante, para educar com eficácia, Leffa (2001) elucida que os professores devem dominar métodos e técnicas de ensino avançadas, permitindo aos alunos uma compreensão profunda dos conhecimentos científicos e o desenvolvimento das atitudes e habilidades necessárias para participar ativamente em uma sociedade em constante transformação. Devem ter um conhecimento abrangente da realidade global e do campo de atuação, aceitar a diversidade socioeconômica e cultural, e estar firmemente comprometidos com a equidade social.

Dessa forma, entende-se que o estágio representa um momento crucial na formação do professor, introduzindo o universitário à realidade escolar sob a orientação de profissionais experientes, que fornecem assistência e orientação na resolução de questões complexas do processo de ensino e aprendizagem.

Motta (2005) afirma que o estagiário se transforma em um elo vital de comunicação entre a escola e a instituição de ensino superior, trazendo para as aulas de prática de ensino os problemas e desafios enfrentados em suas atividades de estágio.

O estágio supervisionado é o momento decisivo para que o estagiário desenvolva competências e transforme seu estágio em uma atividade profundamente reflexiva, visando uma educação de alta qualidade. Este é o início da jornada para cumprir seu verdadeiro papel como professor: tornar a escola um agente de cidadania e promotora da transformação social.

É a fase em que o estagiário começa a refletir sobre sua própria prática pedagógica, participando de um ciclo contínuo de ação-reflexão-ação, essencial para uma formação continuada e para a constante evolução da aprendizagem.

Pimenta (2001) destaca que o estágio supervisionado serve como uma atividade teórica que instrumentaliza a práxis do futuro professor, o qual é considerado como um momento decisivo na trajetória do universitário, já que esse espaço proporciona um terreno fértil para o diálogo, a superação de dificuldades e a descoberta e construção da prática educativa.

Período esse em que se visa a aprendizagem efetiva dos alunos, marcando um ponto de inflexão na formação do docente, onde teoria e prática se fundem em uma experiência transformadora.

O estágio supervisionado é vital para a formação docente, pois cria uma ponte essencial entre a teoria e a prática, impulsionando o desenvolvimento profissional através da práxis educativa.

A imersão na realidade escolar proporcionada pelos estágios deve estimular reflexões profundas sobre práticas críticas e transformadoras, permitindo a reconstrução e redefinição das teorias que fundamentam o trabalho pedagógico (Malglaive, 1997).

Portanto, o estágio supervisionado não deve ser visto apenas como uma fase em que o aluno aplica os conhecimentos teóricos adquiridos durante a formação inicial, mas sim como um momento central e fundamental no curso de formação de professores, plenamente integrado com todos os componentes curriculares e experiências prévias.

Gómez (2000) esclarece que o estágio deve ser encarado como um período de intensa produção reflexiva de conhecimentos, onde as ações são problematizadas e analisadas no contexto presente e, posteriormente, discutidas com orientadores e colegas da área. Este processo envolve uma crítica profunda e colaborativa, promovendo uma compreensão mais rica e detalhada das práticas educativas.

Nesse contexto, o estágio supervisionado se destaca como o eixo vital na formação acadêmica do futuro professor, pois é durante esse período que o educando tem acesso aos conhecimentos cruciais para moldar sua identidade profissional e compreender os saberes cotidianos.

Este período é absolutamente essencial na formação inicial do universitário, pois o estagiário imerge na realidade escolar, aplicando observações críticas e identificando problemas reais. Através da prática reflexiva, ele constrói seu próprio conhecimento, enquanto interage e troca experiências valiosas com professores experientes.

Dessa forma, compreende-se que esse intercâmbio além de potencializar a formação do estagiário, também promove um entendimento mais profundo e dinâmico das práticas pedagógicas, tornando o estágio um ponto de transformação e crescimento na jornada educativa.

5 DISCUSSÕES

A formação do professor, tanto inicial quanto continuada, segundo Lima (2001) deve ser profundamente enraizada nas necessidades formativas específicas desse profissional. Considerando as valiosas contribuições da pesquisa educacional, torna-se imprescindível superar o reducionismo habitual que foca exclusivamente na formação científica e numa superficial qualificação pedagógica.

O desenvolvimento do professor praticante é impulsionado não apenas pelos encontros e troca de experiências com colegas, mas, especialmente, pela interação direta com sua turma e as variadas situações enfrentadas na sala de aula. Esse ambiente dinâmico e vivo serve como um laboratório contínuo para o crescimento profissional e a evolução pedagógica, transformando a prática docente em uma jornada de aprendizado e aprimoramento constante.

Aprofunda-se no entendimento dos alunos e de si mesmo através de um contínuo processo de formação. Leffa (2001) explica que para que essa formação realmente se integre à práxis educativa, é imprescindível que a formação inicial se ajuste às demandas específicas trazidas pelos alunos, reforçando os conhecimentos e competências já adquiridos, enquanto procura preencher lacunas e evoluir constantemente a partir desse processo.

Dessa forma, busca-se fomentar competências profissionais que se alinhem com as representações da prática docente. Malglaive (1997)) destaca essa preocupação ao afirmar que se trata de direcionar a formação dos professores como uma pesquisa orientada, contribuindo assim, de maneira funcional e efetiva, para a transformação de suas concepções iniciais. Nesse contexto, torna-se evidente que essa abordagem visa não somente a aquisição de habilidades, mas a profunda reconfiguração das ideias e práticas pedagógicas desde a raiz.

O educador é um praticante reflexivo, continuamente revisitando mentalmente seu trabalho e as situações que organiza e experiencia, através do ciclo ação-reflexão-ação, em que a reflexão não se limita a sustentar o progresso, mas também resulta dele.

A práxis, enquanto atividade teórico-prática, combina um componente ideal e teórico com um lado material e prático, onde o objetivo final, concebido inicialmente como um resultado ideal, inevitavelmente enfrenta discrepâncias em sua execução real, refletindo as complexidades inerentes à prática educativa.

Assim sendo, ressalta-se que a consciência não pode se limitar à imprevisibilidade do processo, visto que exige também um dinamismo ativo de percepção, segundo (Canário, 2001). A reflexão do praticante sobre seu trabalho, que inclui uma introspecção profunda, representa um comprometimento crítico com a autoavaliação. Desse modo, revela-se que com um conhecimento mais profundo da realidade pessoal e profissional, essas reflexões instigam mudanças significativas, além de exigir a renúncia a antigas imagens, valores, crenças e convicções.

6 CONCLUSÃO

A prática educativa deve focar na formação de alunos cidadãos comprometidos com a transformação social. Como mediador do processo de ensino-aprendizagem, o educador deve contextualizar os conteúdos em sala de aula, tornando o conhecimento significativo para o aluno.

Para alcançar esse objetivo, o projeto de ensino precisa ser centrado na interdisciplinaridade essencial, já que o trabalho coletivo melhora a atuação pedagógica. No entanto, isso só é possível devido à troca de experiências sistematizadas por meio de uma formação contínua, preenchendo as lacunas da formação inicial.

Em contrapartida, a sua efetivação só se tornará uma realidade quando a formação continuada se transformar em um processo incessante de reflexão e ação sobre as questões vivenciadas em sala de aula. Dessa forma, o ensino na educação básica deve estar direcionado para a contextualização profunda dos conhecimentos, desmistificando a percepção dos alunos sobre os conteúdos estudados, que frequentemente são vistos como distantes de sua realidade.

Dentro dessa perspectiva, os alunos começarão a entender esses conteúdos como conhecimentos historicamente construídos, que podem ser extremamente úteis na resolução dos problemas sociais contemporâneos. Assim, o educador deve revolucionar o pensamento do aluno, fomentando a construção de um pensamento crítico e reflexivo sobre as questões sociais e científicas.

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