O DIREITO NA ERA DIGITAL E OS CRIMES VIRTUAIS: AS PRÁTICAS DE  CYBERBULLYING E OS IMPACTOS DA LEI PENAL 

LAW IN THE DIGITAL AGE AND VIRTUAL CRIMES: CYBERBULLYING  PRACTICES AND THE IMPACTS OF CRIMINAL LAW 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11395137


Silvana Barbosa Pinto1;
João Paulo de B. Freitas2;
Rebeca Dantas Dib2


 Resumo 

O estudo em tela apresenta como principal objetivo analisar as implicações e consequências jurídicas  do delito de cyberbullying, envolvendo a perseguição sistemática contra os adolescentes nas redes  sociais e mídias digitais. A finalidade é contribuir com a ampliação dos debates no campo jurídico,  construir diálogos com a sociedade e formulação de políticas públicas, a partir da compreensão das  consequências das práticas de cyberbullying em ambiente virtual, e o impacto da perseguição sistemática  nas redes sociais que ameaça a vida dos adolescentes. Consideramos ainda as metamorfoses das redes  sociais, os engendramentos e o jogo de dissimulação dos agressores como hater e cyberbullie que  produzem ataques sistemáticos e ação persecutória contra as vítimas menores de idade. Ao exercer poder  e controle sobre os adolescentes, produzem gatilhos para desencadear a síndrome do pânico, ansiedade,  induzindo a automutilação e instigação, levando o adolescente a atentar contra a própria vida. Devido  as graves ameaças para a segurança e vida dos adolescentes, a sociedade entra em combate contra essas  práticas de discursos de ódio e violência nas redes sociais, e exige do poder público através do judiciário,  uma ação mais efetiva para o enfrentamento do fenômeno social caracterizado como cyberbullying.  Desse modo, a Lei 14.811/2024, publicada em 15 de janeiro de 2024, inclui o cyberbullying no Código  Penal quando o crime for praticado por pessoa maior de idade. Também a Lei 14.811/2024 fez  alterações no Estatuto da Criança e do Adolescente, pois quando a conduta for praticada por menor de  idade será caracterizada como ato infracional. Desse modo, a pesquisa foi construída a partir da  metodologia baseada na pesquisa bibliográfica e documental, seguindo a abordagem qualitativa que  permite ao pesquisador caracterizar cenários e refletir sobre a temática em discussão.  

Palavras-chave: adolescente. cyberbullying. código penal. redes sociais. violência. 

1 INTRODUÇÃO 

A temática central do estudo sustenta a discussão sobre o fenômeno do cyberbullying e a proteção do direito dos adolescentes, e como a perseguição dos menores nas redes sociais é  prejudicial à sua formação psicológica, moral e física. Assim, observamos que os adolescentes  estão cada vez mais vinculados as plataformas digitais, produzindo uma geração de habitantes  do mundo virtual, consumidores de cultura hipermidiática em um mundo interativo e complexo. 

 Compreendemos que os adolescentes se envolvem no imbricamento das redes sociais para  publicar acontecimentos divertidos e engraçados sobre o seu cotidiano. No entanto, percebemos  que ao publicizar sua rotina, experiências e atividades lúdicas nas redes sociais despertam o inte resse de hater e cyberbullie, o que pode trazer implicações negativas, por desencadear consequên cias adversas como os ataques sistemáticos, constrangimento, coação e violência, prejudicando o  desenvolvimento e a segurança dos menores.  

 Desse modo, diversos desafios surgem nesse momento histórico do avanço tecnológico, a  partir da utilização dos recursos e tecnologias desenvolvidas pelas big techs, em que as redes  sociais são incorporadas na rotina dos adolescentes como objeto de ludicidade e convivência social  com os pares. No entanto, os praticantes de cyberbullying tem acesso livre as plataformas como  TikTok, Instagram, WhatsApp, Facebook, Youtube, e passam a perseguir os adolescentes, visando  controlar o comportamento, causando pânico e tortura psicológica. 

 Diante desse cenário, o presente estudo tem como principal hipótese de pesquisa refletir  sobre a seguinte problemática: o Estado, enquanto responsável pela criação, implantação e fisca lização das normas jurídicas, deve atuar com austeridade para evitar desencadear uma crise social  de autoridade, principalmente diante do fenômeno das redes sociais digitais que são espaços flui dos, permeados de multiplataformas.  

 Nesse desdobramento, quando o Estado não atua com a devida severidade e afasta-se do  cumprimento da responsabilidade legal na proteção do direito dos menores, caracterizando a sua  omissão, deixa de efetivar o ordenamento jurídico eficiente e eficaz, desarticulando a rede de pro teção que é importante para resguardar o menor. Assim sendo, ausentando-se da fiscalização e  punição dos criminosos que praticam o cyberbullying contra os adolescentes, favorece e reforça a  cultura da violência na sociedade contemporânea. 

 Nessa perspectiva, apresentamos como objetivo geral, analisar as implicações e conse quências jurídicas do delito de cyberbullying, envolvendo a perseguição sistemática contra os  adolescentes nas redes sociais e mídias digitais. Na tratativa dos objetivos específicos, indicamos  os seguintes caminhos: pesquisar a legislação que consigna a proteção dos adolescentes nas 

situações de violência em ambiente virtual; apresentar dados sobre as práticas de cyberbullying  envolvendo os adolescentes; investigar casos concretos referentes as práticas de intimidação sis temática contra os adolescentes nas redes sociais. 

Diante desse quadro, para a proteção dos interesses dos adolescentes, temos a Constituição  Federal, o Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n°. 8.069/90, bem como a  Lei 14.811/2024, publicada em 15 de janeiro de 2024, que tipifica o cyberbullying como crime  gravíssimo. Também é importante destacar a Lei Geral de Proteção de Dados – Lei n°  13.709/2018, que confere o rigor na utilização de dados dos menores. 

Nesse sentido, o aplicador do direito deve atuar com austeridade, sendo rigoroso nas puni ções cabíveis quando pessoa física ou jurídica causar prejuízo de qualquer natureza aos adolescen tes. No caso das instituições públicas ou privadas, receber a devida penalidade quando publicar  dados, imagens e informações sobre os menores que possam ser utilizadas por manipuladores,  perseguidores e agressores. 

 Desta forma, a prática do cyberbullying está sujeita a aplicação de penalidades mediante o  Código Penal Brasileiro, expresso no artigo 146-A, parágrafo único. Ainda quando apresentar as  características de crimes contra a honra como calúnia, difamação e injúria, conforme o Artigo 138  a 145 do Código Penal. Também nos crimes de injúria racial configurando ataques racistas, se 

gundo o Artigo 140 do Código Penal Brasileiro. Do mesmo modo, citando o Artigo 218-C do  Código Penal, incluído pela Lei 13.718, de 2018, quando o agressor realizar a exposição de ima gens de conteúdo íntimo, erótico ou sexual, implicando no cometimento de crime contra a digni dade sexual.  

 Pelos motivos expostos, é urgente e decisivo estabelecer discussões mais amplas envol vendo toda a coletividade, sociedade, educadores, o que motivou e determinou a cobrança de uma  lei penal mais rígida por parte dos sujeitos sociais, pais, professores, cientistas sociais, psicólogos  e aplicadores do direito para a devida tipificação dos crimes específicos de cyberbullying.    

2. O FENÔMENO DO DISCURSO DE ÓDIO NAS REDES SOCIAIS 

 O avanço da tecnologia, o aparato, estrutura e configuração das multiplataformas, fluidez  das redes sociais são espaços movimentados para as conexões dos diversos grupos sociais.  Portanto, a agilidade na comunicação também propicia situações de extrema violência entre  pessoas dos mesmos grupos, classes sociais e etárias diferentes. Esse fenômeno mundial de  violência nas redes sociais tem uma amplitude global, pois a internet permite as interconexões  e relações sem fronteiras.

 Segundo o professor Gilberto Lacerda , da Universidade de Brasília (UnB), “associamos  esse crescimento à facilidade de acesso e também porque, assim, os agressores se sentem mais  seguros e de certa forma anônimos”. O fenômeno é mais crítico devido as pessoas se sentirem  protegidas muitas vezes pelo ambiente virtual, produzindo discursos de ódio, calúnia e  difamação, bem como matérias enganosas, trazendo contexto manipulado como no caso das  fakes news.  

Primeiramente, entendo ser pertinente explicar, logo de início, que discurso de ódio  se caracteriza pelas manifestações de pensamentos, valores e ideologias que visam  inferiorizar, desacreditar e humilhar uma pessoa ou grupo social, em função de  características como gênero, orientação sexual, filiação religiosa, raça, lugar de  origem ou classe. Tais discursos podem ser manifestados verbalmente ou por escrito.  Sendo assim,é possível compreender que discursos de cunho racista veiculados nas  redes sociais (sejam eles de forma explícita e sem maquiagem, ou camuflados em  piadas) se enquadram na categoria de discursos de ódio.(Trindade, 2022, p.9) 

 Na perspectiva do professor Gilberto Lacerda , indivíduos e grupos se reúnem para  destilar a violência sobre pessoas, comunidades e coletividades em uma onda de ofensas que  reverbera nas redes sociais, pois “a internet é um palco amplo para manifestação de indivíduos  e, por isso, ela amplia as possibilidades de ataques” (Lacerda, 2012). 

 De acordo com a advogada Ana Vasconcelos Negrelli, na abordagem sobre o crescimento  dos ataques de ódio produzidos nas redes sociais, é importante considerar que: 

O cyberbullying pode ser mais perigoso. “Primeiro, porque você tem uma plateia  muito maior. Segundo, porque o agressor pode estar atuando de forma anônima. E,  terceiro, porque ele não tem fronteiras espaciais. Aquele conteúdo pode ter uma  repercussão grande e depois parar, mas, depois de um tempo, pode aparecer em outro  lugar, e tudo recomeça. A vítima não tem para onde fugir”, […] ( Negrelli,2021) 

 Nessa perspectiva, a verbalização e manifestações de ódio de certo modo atrai a  visibilidade para o agressor, pois procura engendrar nos ataques o favorecimento das pessoas  que comungam do mesmo perfil psicológico, demostrando a incapacidade cognitiva de refletir  sobre a realidade de outras pessoas e grupos sociais diferentes, de sentir empatia e respeitar o  direito do próximo. Assim, o agressor arrebanha um grupo de semelhantes, ganhando likes se  promove, recebe curtidas, e aumenta a legião de seguidores violentos e agressivos. Essa  violência se configura a partir de diversas estratégias, concentrando as características da  manifestação de ódio nas redes socais, abrangendo o cyberbullying, cyberstalking, hater,  sexting e Revenge Porn.

2 METODOLOGIA  

 Para sustentar o percurso metodológico da pesquisa no campo jurídico, a direção que o  conhecimento percorre conduz o pesquisador para a construção de referências conceituais e  bases epistemológicas, possibilitando superar a aparência, e alcançar a compreensão do  fenômeno pesquisado. 

Desse modo, na área jurídica surge a conjugação de várias problemáticas, sustentadas  por debates, encadeamentos e controvérsias, como consequência da pluralidade das questões  da sociedade contemporânea, em constantes conflitos, lutas e disputas. 

Nesse caso, temos o imbricamento de pensamento e ação, desafios e possibilidades na  realização de pesquisas no contexto do direito na era digital, principalmente sobre à proteção  dos adolescentes na sociedade midiática, que requer um trabalho intelectual com amplitude de  compreensão dos cenários em constantes mudanças. Assim, o estudado será conduzido  mediante o método dialético, seguindo os procedimentos da pesquisa bibliográfica e a  abordagem qualitativa.  

Para a construção das etapas da pesquisa acompanharemos o percurso do objeto de  investigação, analisando o cenário na conjuntura da internet, redes sociais e mídias digitais.  Observaremos o objeto delimitado pelo fenômeno midiático que reflete a comunicação  instantânea na sociedade das mídias de relacionamento virtual. 

A pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências  teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como  livros, artigos científicos, páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador  conhecer o que já se estudou sobre o assunto. (Fonseca, 2002, p. 32). 

 Para seguir a trajetória do objeto de pesquisa, realizaremos as técnicas da pesquisa  exploratória que traz consigo a característica da utilização de levantamento bibliográfico. De  acordo com Gil (2008), a pesquisa bibliográfica constitui publicações em forma de artigos,  livros, vídeos, documentários, fotos, entrevistas e relatos, na qual teremos estudiosos  experientes na área do Direito Penal, Direito Civil, Direito Digital e Redes Sociais. Assim  como, na utilização de recursos próprios da Internet, especificamente em análises de redes  sociais, plataformas e recursos virtuais, como bancos de dados, resultando em leituras no  formato digital de tutoriais, dissertações e teses.

 Quanto a abordagem, seguiremos a pesquisa qualitativa, que segundo Creswell (2007,  p.187), “os estudos de pesquisa qualitativa aparecem como visões amplas em vez de  microanálises. Quanto mais complexa, interativa e abrangente a narrativa, melhor o estudo  qualitativo”.  

Nesse sentido, a pesquisa qualitativa se apoia na percepção dos significados que surgem  da compreensão dos fenômenos, enquanto capacidade de interpretação, possibilitando ampliar  a compreensão do mundo concreto a partir das relações com os sujeitos. Assim sendo, é  importante desenvolver a investigação com precisão e confiabilidade, por isso utilizaremos as  fontes de informações secundárias (bancos de dados, livros e dicionários) e terciárias (portais e  mecanismos de buscas na internet).  

1º) A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como fonte direta dos dados  e o pesquisador como instrumento-chave; 2º) A pesquisa qualitativa é  descritiva; 3º) Os pesquisadores qualitativos estão preocupados com o  processo e não simplesmente com os resultados e o produto; 4º) Os  pesquisadores qualitativos tendem a analisar seus dados indutivamente; 5º)  O significado é a preocupação essencial na abordagem qualitativa […]. (Bogdan, 1982 apud Triviños, 1987, p. 128-130). 

Na perspectiva de Prodanov (2003), na construção do processo de investigação o  pesquisador segue etapas complexas para o alcance dos objetivos definidos nos caminhos  epistemológicos e metodológicos da pesquisa .  

Como procedimentos da pesquisa, após a coleta de dados será realizada a análise de  conteúdo, estabelecendo as categorias com maior relevância que surgem dos resultados. Para a  organização dos dados, será elaborada uma estrutura sistematizada seguindo três fases: 1)  Pré-análise; 2) Exploração do material, Categorização ou codificação; 3) Tratamento dos  resultados, Inferências e Interpretação (Bardin,2011). 

 Nesse sentido, o contexto em que o objeto se configura é demarcado por contradições,  conflitos e oposições entre os sujeitos e objeto da pesquisa. A aproximação entre o pesquisador,  sujeitos e objeto de investigação demanda a busca a partir do território movediço das redes  sociais, sucedendo diversas etapas. A análise do objeto é resultado da elaboração de  movimentos dinâmicos, envolvendo diferentes procedimentos para a construção de pistas em  um processo de compreensão da realidade social pesquisada. 

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES  

3.1.1 Cyberbullying 

 O cyberbullying é um ataque ampliado e amplificado do bullying, pois ocorre em ambiente  virtual, com grande alcance, não existindo fronteiras para as postagens de situações depreciativas,  intimidadoras e agressivas contra os menores nas redes sociais. A estratégia operada pelo agressor  é de intimidação sistemática em ambiente virtual, atacando a vulnerabilidade psicológica dos  adolescentes que imediatamente entram em sofrimento por considerar que a sua vida passou a  ser exposta em multiplataformas, abalando a autoestima e segurança pessoal.  

 O agressor se esconde através do anonimato das redes sociais, encobrindo a sua própria  personalidade, passando a ofender, agredir e denegrir os adolescentes, como objeto da sua  manipulação. As agressões podem ocorre de modo isolado, em grupos e comunidades digitais,  como no caso dos adolescentes que participam de jogos online. No ato de participar o  adolescente é agredido verbalmente, rotulado com diversos adjetivos humilhantes, o que passa  a confrontar a sua autoimagem, operando um profundo processo de desconhecimento de si  mesmo.  

 Segundo Eric Raue (2022), o cyberbullying se destaca como um fenômeno com maior  prevalência entre crianças de 9 a 14 anos de idade. Observamos que os dados apresentados no site  Cyber Bully 411, registram que 40% dos ataques de cyberbullying circulam em programas de  mensagem instantânea, 29% em arenas virtuais de jogos online, bem como 30% sofrem  ameaças nas plataformas de mídias sociais.  

3.1.2 Cyberstalking 

 O Stalking é caracterizado por uma ação fenomênica que objetiva a invasão e espionagem  sistemática da vida de uma pessoa. Essa conduta é animada por um perseguidor que procura  provocar a intimidação e dominação, violando a privacidade da pessoa perseguida, que passa a ser objeto de controle do perseguidor. A perturbação, intimidação e ameaças constantes  levam a vítima a uma ansiedade, medo e pavor, pois a sua intimidade e segurança foram  violadas pelo criminoso. 

 Adentrando o cenário do ciberespaço, temos a caracterização do cyberstalking que  encontra amplo campo de monitoramento nas redes sociais, produzindo a perturbação,  embaraço, assédio, desencadeando as situações que envolvem intimidação através do  cerceamento da liberdade e privacidade, procurando aterrorizar a vida da vítima. 

Para conceituar o cyberstalking, pode-se vislumbrar que ele advém da palavra  stalking, que na língua inglesa se traduz como “perseguir”. Com isso, avança-se na  tentativa de conseguir compreender a essência das práticas compreendidas nessa  perseguição que se dá no âmbito da internet, que se dá como o comportamento de  seguir de forma abusiva alguma pessoa que tenha acesso a redes sociais ou presença  no ambiente de rede. Isso se dá geralmente com comportamento obsessivo e  compulsivo, podendo gerar ameaças, sendo inerente a prática algum tipo de  necessidade de controle do perpetrador para com a vítima. É importante ressaltar que  essa perseguição obsessiva pode se dar, a princípio, em relação a pessoas públicas efamosas, sendo seu perseguidor algum anônimo que, obcecado pelo ídolo, planeja e  executa atos extremos, sendo necessário um grande cuidado por parte da Justiça para  coibir os atos ilegais. Porém, o cyberstalking também ocorre no mundo dos anônimos,  de quem não tem as preocupações e o fardo da fama para carregar, e que apenas  mantém perfis nas redes para contatos pessoais, negociais e entretenimento, sendo  nesse caso o infrator alguém conhecido ou mesmo outro anônimo completo, que por  algum motivo viu em sua vítima uma característica atrativa. (Fornasier; Spinato;  Ribeiro, 2022 ,p.4-5) 

 Nessa perspectiva, o cyberstalking produz seus efeitos ameaçadores mediante a  chantagem relativa a publicação de mensagens, imagens, áudios e vídeos, conversas e bate papo, com a intenção de revelar fatos da vida intima da vítima, o que leva o criminoso a exercer  poder e domínio sobre a pessoa que passa a ser monitorada constantemente. Para enfrentar  esse delito das redes sociais, no Brasil o cyberstalking é crime tipificado na Lei 14.132, de  2021, produzindo a alteração no Código Penal. 

3.1.3 Hater 

 O hater é classificado como um “odiador de pessoas”, praticante do comportamento de  engendrar o “ódio gratuito” em ambiente virtual. Destila seu ódio contra as ações, projetos e  atividades que as pessoas produzem sobre si mesma, sua vida, seus interesses, objetivos de vida  e trabalhos pessoais e sociais.  

 O hater tem o objetivo de espalhar o ódio, são criminosos dissimulados, pois ocultam-se  em perfis falsos criados nas redes sociais, com a intencionalidade de destruir a moral,  credibilidade, autoridade, confiabilidade dos sujeitos, levando a vítima ao descrédito,  difamando, ofendendo e destruindo a sua reputação. O hater comete crime de injúria, tipificado  no artigo 140 do Código Penal.  

 A internet através das suas infovias é bastante utilizada por esses criminosos que se  prevalecem da fluidez das redes sociais enquanto espaços abertos, acessíveis as diversas classes  sociais. Os ataques podem ocorrer mirando pessoas de diferentes faixas etárias, grupos sociais e  profissionais que vivem em espaços geográficos diferentes. 

 Desse modo, as vítimas são presas fáceis desses malfeitores que se prevalecem do  anonimato, utilizando contas fakes para atacar qualquer sujeito social, como no caso dos  adolescentes que não sabem como se defender, passam a sofrer hate.  

 Os atos operados são atentatórios contra a moral, pois os discursos de ódio causam impactos  profundos na pessoa agredida, levando a vítima a duvidar da sua própria capacidade de produção  criativa, técnica e intelectual, o que pode engendrar no comportamento dos indivíduos a  paralização das suas atividades escolares, artísticas e profissionais, por desenvolver um  comportamento de vergonha, incompetência, incapacidade, desacreditando da própria  capacidade intelectiva, estética. O hater provoca um fluxo contínuo, uma onda de ódio nas redes  sociais, influenciando diversas pessoas, e desencadeando comentários mal-intencionados para  denegrir e humilhar a vítima.  

3.1.4 Sexting 

 A formação da palavre sexting é resultado da junção de duas palavras como sex (sexo) e  texting (envio de mensagem). O sexting expressa um fenômeno da atualidade que envolve os  adolescentes, pois participam livremente da produção de fotografias e vídeos, utilizando o  próprio celular para criar conteúdos sexuais, se expressando em posição sensuais e eróticas (self  nude).  

Sexting é a expressão originada da aglutinação (união) de duas palavras em  inglês: sex (sexo) e texting (envio de mensagens)– palavra esta concebida  exatamente em razão de sua origem histórica – ao pé da letra, significa “sexo por  mensagem”. Apesar de atualmente os conteúdos terem se tornado menos textuais,  o nome manteve-se. O ato consiste em enviar conteúdos provocativos de caráter  sexual, nudismo ou seminudismo, através de textos, fotos, vídeos, via celular ou  computador. Resumindo: o termo abrange qualquer interação sexual no meio  digital. (Timachi, 2023) 

 Segundo dados do SaferNet (2019), 15% dos adolescentes brasileiros já participaram de  sexting como modo de vivenciar o início da sexualidade. Logo, esse fenômeno marca a  constituição das experiencias da sexualidade entre os adolescentes que enviam mensagens para  namorados (as), e parceiros com conteúdo da intimidade, e esses adolescentes em consenso  compartilham suas imagens com linguagem sensual, sexual e erótica.  

O Sexting descreve um fenômeno recente no qual adolescentes e jovens usam seus  celulares, câmeras fotográficas, contas de email, salas de bate-papo, comunicadores  instantâneos e sites de relacionamento para produzir e enviar fotos sensuais de seu  corpo (nu ou seminu). Envolve também mensagens de texto eróticas (no celular ou  Internet) com convites e insinuações sexuais para namorado(a), pretendentes e/ou  amigos(as) (SaferNet Brasil, 2009).

 No entanto, quando esse conteúdo é acessado por um colega do grupo ou pessoa estranha,  bem como o parceiro que recebeu o conteúdo erótico pratica a divulgação não consensual,  desencadeia o descontrole sobre esses materiais com cenas de sexo expondo o adolescente.  Assim, o agressor de posse do material, passa a agir com a intenção de gerar a importunação do  adolescente, fazendo insinuações, ameaças e aliciamento para a pratica de sexo sob ameaça,  comercialização e divulgação das imagens intimas nas redes sociais. Também o avanço  tecnológico possibilita as ferramentas para a edição dos materiais publicados como fotografias  e filmagens. 

 De acordo com a “Organização britânica de hospitais e clinicas de saúde mental” (The  Priory Group), as meninas são as maiores vítimas do vazamento de imagens, passando a sentir  medo, vergonha, pânico, desencadeando graves problemas mentais e psicológicos. Devido ao  problema de calamidade de saúde pública, os psiquiatras estão alertando governantes para  operacionalizar medidas mais enérgicas, a sociedade, pais e escolas para educar e coibir essa  modalidade de assédio que produz o risco da auto-aversão, auto-mutilação, bulimia e  anorexia.  

 Conforme a figura 1 – “Principais tópicos em 2017- Chat e E-mail”, o sexting ocupa a  terceira posição no ranking quando se trata de ocasionar o constrangimento e o assedio, fazendo  parte do perfil do agressor que é ostensivamente violento com as suas vítimas adolescentes.   

 Figura 1 – Principais tópicos em 2017 – Chat e E-mail 

 Nesse sentido, na atualidade da sociedade em redes digitais, o jogo da exposição  midiática provoca a grave crise psiquiátrica, afetando as adolescentes que atentam contra a  própria vida por causa da divulgação de fotos e vídeos íntimos por terceiros. 

Outro aspecto a ser ressaltado nos dados apresentados pela SaferNet (2019) é o gênero das vítimas de exposição de imagens íntimas. Em 65,8% dos casos  atendidos pela ONG em 2018, a vítima era mulher. Esse padrão também foi observado  em 2017, em que 70,6% das vítimas atendidas eram do sexo feminino. Tais dados  indicam que há diferença de gênero entre as vítimas de exposição de sexting e  funcionam como um alerta para a necessidade de proteção às mulheres e de  investigação acerca dos fatores que geram essa desigualdade. Nesta direção, observa se que o assunto tem gerado mais discussões, sendo alvo de campanhas  governamentais e de comunicações sociais. (Lordello; Coelho; Souza, 2019, p. 69) 

 De acordo com o Código Penal, registrado nos artigos 139 e 140, divulgar imagens eróticas  como fotos e vídeos sem a autorização do proprietário acarreta os crimes de difamação que  atinge a honra subjetiva ou injuria que ataca a honra objetiva. Nos casos dessa modalidade  criminal que envolve menores de idade, a base legal é o Estatuto da Criança e do Adolescente,  conforme o artigo 241, consignando um crime mais gravoso, ocasionando penas de 2 a 4 anos  de reclusão e multa. 

3.1.5 Revenge Porn 

 No caso do Revenge Porn ou pornografia de vingança, a vítima sofre um atentado a sua  intimidade pois ocorre a publicação de imagens e vídeos eróticos e sexuais sem o seu  consentimento, com o objetivo de vingança contra a adolescente para expor, humilhar, destruir  a sua reputação e dignidade.  

Ainda não há no ordenamento brasileiro uma lei específica tipificando o Revenge  Porn. No entanto, a Lei 13.718-18 incluiu o art. 218-C no Código Penal, que prevê  como crime a divulgação de cena de sexo, pornografia ou estupro, sem o  consentimento da vítima. Há ainda a previsão de aumento de pena se o crime for  praticado por pessoa que teve ou ainda tem relação afetiva com a vítima ou que  possua a intenção de vingança ou humilhação. (Argento, 2023) 

 Nessa modalidade criminal, as adolescentes e mulheres adultas são as maiores vítimas.  Comumente os ex-companheiros que mantiveram relacionamento íntimo com a vítima atuam de  modo a afrontar a ex-namorada, procurando sempre prejudicar a vítima com a vingança pelo  término do relacionamento amoroso.

Uma parte das fotos ou vídeos que geralmente são compartilhados na internet como  forma de cyberbullying são inseridos na internet pelos namorados/as, como forma de  chantagens ou vingança, ao fim de um romance. Outra forma utilizada pelos/as  agressores/as virtuais, é a invasão virtual de computadores alheios, vasculhando  alguma informação, foto ou vídeo, que poderá ser utilizada como moeda de troca,  tanto sexual ou financeira (Wanzinack, 2014, p.73) 

 Nesse jogo de manipulação e emaranhado de vingança o adolescente sempre se prejudica,  pois ainda não tem estrutura psicológica e mental para superar o ataque sistemático de violência  do agressor, a tortura moral e social passa a ser uma constante na vida da vítima que por  vergonha e medo não dialoga com os pais e responsáveis, entrando em uma zona de  embotamento da própria realidade, e perdem a oportunidade de buscar apoio no lar e escola  para buscar uma atuação efetiva da justiça. 

3.2 A onipresença das redes sociais na vida dos adolescentes: o contexto do crime de  cyberbullying 

A revolução das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs), o avanço  na produção das ferramentas tecnológicas, o acesso as multiplataformas e canais de mídias  digitais, impactaram profundamente as relações sociais, criando tempos sociais e modos  diferentes de produção econômica e cultural, desencadeando novas demandas na organização  da sociedade, implicando no surgindo do Direito Digital. 

O Direito Digital consiste na evolução do próprio Direito, abrangendo todos os  princípios fundamentais e institutos que estão vigentes e são aplicados até hoje, assim  como introduzindo novos institutos e elementos para o pensamento jurídico, em todas  as suas áreas (Direito Civil, Direito Autoral, Direito Comercial, Direito Contratual,  Direito Econômico, Direito Financeiro, Direito Tributário, Direito Penal, Direito  Internacional etc.). (Pinheiro, 2021, p. 49) 

De acordo com os estudiosos da contemporaneidade, nesse período do espaço-tempo  virtual, como participante ativo do contexto midiático, os adolescentes passaram a ter milhões  de registros como fenômeno estético e imagéticos no ciberespaço. No entanto, as práticas  frequentes de publicações expõem os adolescentes como alvo dos agressores nas redes sociais  que empregam estratégias conhecidas como “hater, sexting, nude e reverge porn”. Nesses  casos, como a segurança se apresenta comprometida, as vítimas correm riscos de ataques  sistemáticos nas redes sociais (Pinheiro, 2021).  

 Na perspectiva de Patrícia Peck Pinheiro (2021), 

O maior estímulo aos crimes virtuais é dado pela crença de que o meio digital é um  ambienta marginal, um submundo em que a ilegalidade impera. Essa postura existe  porque a sociedade não sente que o meio é suficientemente vigiado e que seus crimes  são adequadamente punidos. O conjunto norma-sanção é tão necessário no mundo  digital quanto no real. Se houver essa falta de crédito na capacidade punitiva da sociedade digital, os crimes aumentarão e os negócios virtuais serão desestimulados.  (Pinheiro, 2021, p. 225) 

 Segundo a legislação, a integridade do adolescente precisa ser sempre protegida, no  abrigo da casa, escola e espaços públicos. Porém, na arena virtual o cenário é caracterizado pela  incerteza das relações nas mídias sociais. De certo modo, os adolescentes, os pais e familiares  quando fazem publicações não cumprem as regras de segurança, e desrespeitam o direito à  privacidade dos menores.  

Na visão dos especialistas, esse cenário de fluidez e virtualidade compromete o  desenvolvimento físico, mental e social dos adolescentes. As tensões provocadas em uma  publicação que evidenciam aspectos da subjetividade, a procura incansável por atenção e  admiração, afetam a capacidade da percepção do eu, a compreensão de si mesmo, e a  construção das habilidades para refletir sobre a própria existência. 

 No espaço de virtualidade, a exposição imagética favorece as trocas rápidas, e os laços  sociais podem ser feitos e desfeitos. Nesse caso, os adolescentes são motivados pela expressão  da virtualidade dos conteúdos e imagens construídas pela aparência, facilitando o engajamento  imediato. Assim, a rede social produz uma falsa impressão de proximidade, amizade e relação  de confiança mútua, criando um paradoxo entre segurança e privacidade (Pinheiro, 2021).  

Ressalta-se que nas redes sociais as trocas de experiências e convivências é baseada na  virtualidade e simulação. Quando o adolescente faz a divulgação da expressão estética, bem  como das suas atividades nas redes sociais, coloca-se no limiar entre a apreciação e a rejeição.  Devido a fluidez nas relações midiáticas, o contexto é instável e sofre descontrole, gerando  tensões complexas. As postagens quando criticadas desencadeiam situações de violência,  pornografia, preconceito, racismo e importunação persistente produzindo o fenômeno do  cyberbullying. 

É preciso tomar muito cuidado com aquilo que se pública na internet. As pessoas  possuem uma necessidade de exibicionismo constante (padrão da sociedade  moderna), e esquecem, algumas vezes, que aquilo que gostariam de publicar, sem o  mínimo de bom senso, pode ser a base para uma ofensa. Outra questão relevante  que deve ser observada é o monitoramento da utilização da rede mundial de  computadores por crianças e adolescentes que ainda não possuem a  responsabilidade e o conhecimento adequado para utilizá-las. Acredito também na  importância da conversa entre os pais e seus filhos sobre os cuidados e  cautelas.(Posocco, 2016) 

A exposição da imagem dos adolescentes nas redes sociais entra em confronto com a  discussão sobre o direito e respeito a privacidade dos menores. Na contemporaneidade, é considerando um assunto relevante e que merece a atenção da sociedade. A exposição imagética  do corpo dos adolescentes nas mídias digitais segue o ritual da virtualidade, incluindo  compartilhamento de fotos e vídeos íntimos, exposição excessiva da vida privada e criação de  perfis falsos.  

Em um primeiro momento, a interação e envolvimento dos adolescentes na produção de  conteúdo para os canais de mídia digital pode parecer uma atividade divertida e lúdica. No  entanto, defendemos que a projeção dos adolescentes na internet pode trazer riscos à  privacidade, segurança e bem-estar dos menores. Segundo Truzzi (2006), a exposição excessiva  pode incentivar a criação do fenômeno do cyberstalking. 

O termo cyberstalking vem do inglês stalk, que significa “caçada”, e consiste no uso  das ferramentas tecnológcias com intuito de perseguir ou ameaçar uma pessoa. É a  versão virtual do stalking, comportamento que envolve perseguição ou ameaças  contra uma pessoa, de modo repetitivo, manifestadas através de: seguir a vítima em  seus trajetos, aparecer repentinamente em seu local de trabalho ou em sua casa, efetuar  ligações telefônicas inconvenientes, deixar mensagens ou objetos pelos locais onde a  vítima circula, e até mesmo invadir sua propriedade. O stalker, indivíduo que pratica  esta perseguição, mostra-se onipresente na vida da sua vítima, dando demonstrações  de que exerce controle sobre esta. No cyberstalking há uma certa “violência  psicológica”, violência esta que é muito sutil: a linha que separa uma amizade, um  elogio ou demonstração de carinho é muito tênue. (Truzzi, 2014) 

É importante lembrar que a exposição indevida engendra consequências graves na vida  dos adolescentes, como o uso indevido da imagem para fins de controle, manipulação, risco de  assédio, pedofilia, violência virtual como o cyberbullying. 

Quando o bullying atinge o mundo virtual, por meio de redes sociais, aplicativos de  mensagens, o agressor passa a enviar mensagens de ódio, ameaçar, xingar, espalhar  boatos, compartilhar imagens em que outro seja vítima de escárnio e sem  consentimento, isso é chamado de cyberbullying. Outras formas de cyberbullying  também podem ocorrer por meio de criação de conteúdo multimidia onde o outro seja  prejudicado moral e psicologicamente como perfis falsos a fim de enviar mensagens,  montagens de fotografias, criação de vídeos e compartilhamento por meios digitais.  (Bohrer, 2021,p. 5) 

O cyberbullying é uma prática intimidatória, que se manifesta mediante a tortura  psicológica e agressão em espaço virtual, ambiente digital, redes sociais, através do emprego  de equipamentos como tablets, computadores, smartfones. Os agressores utilizam as mídias  sociais, com postagem de textos, vídeos e mensagens com características violentas. A prática  de agressão é persistente, levando os adolescentes ao isolamento social, causando sofrimento  psicológico e transtorno de ansiedade. 

Assim, as consequências são também amplificadas, uma vez que as agressões podem  difundir-se facilmente e com uma enorme rapidez, mantendo-se infinitamente  presentes no espaço virtual dadas as suas singularidades de persistência,  pesquisabilidade, replicabilidade e invisibilidade, originando consequências rápidas e  alongo prazo. Tendo em conta as particularidades do ciberespaço, as agressões não  necessitam de ser realizadas repetidamente para obterem o efeito pretendido, uma vez  que o espaço virtual permite a replicação sucessiva da informação após a sua  publicação online, originando, assim, interações essencialmente unidimensionais do  agressor para a vítima em tempo não real (Santos, 2015, p.14) 

Segundo Verônica Fraidenraich (2022), no detalhamento dos estudos realizados nos  Estados Unidos pelo instituto de pesquisa McAffee Corp (2022), cerca de 6 a cada 10  adolescentes (67%), sofreram cyberbullying praticados por pessoas conhecidas. Segundo os  dados da pesquisa 5 a cada 10 adolescentes (51%), sofreram ataques de pessoas estranhas.  

Através da rede, o homem comete ilícitos, propaga mensagens de conteúdo  prejudicial, viola direitos fundamentais dos demais usuários. Essa problematização,  que não é essencialmente nova, porém mais complexa e potencializada por uma  roupagem tecnológica, exige atitudes adequadas por parte dos entes encarregados da  proteção do ser humano em sua dignidade, entre esses, o Estado. Seu papel é de suma  importância a fim de que se desfaça o ditame do senso comum de que a internet é um  ambiente à margem do Direito. Embora os fluxos informacionais da rede transcendam  as fronteiras nacionais, estando em todo e em nenhum lugar concomitantemente (daí  uma de suas características principais, a desterritorialização), permanece a  incumbência do Estado de intervir quando um indivíduo ou grupo pertencente ao seu  território tem seus direitos lesados por conteúdos publicados no ambiente virtual. […].
Genericamente, esse discurso se caracteriza por incitar a discriminação contra pessoas  que partilham de uma característica identitária comum, como a cor da pele, o gênero,  a opção sexual, a nacionalidade, a religião, entre outros atributos. (Silva et al., 2011) 

Conforme os registros da tabela 1 – Taxas de cyberbullying nas quatro principais mídias  sociais, conferimos os dados da pesquisa que revelam que o Brasil é considerado o segundo  país no mundo com mais casos de cyberbullying. Os adolescentes são as maiores vítimas dos  ataques e intimidações nas plataformas de mídias sociais, sendo que os agressores utilizam com  mais frequência o WhatsApp e Facebook.  

Tabela 1 – Taxas de cyberbullying nas quatro principais mídias sociais 

Mídias sociais Brasil Mundo
WhatsApp 45% 38%
Facebook 46%49%
Instagram 33%36%
Facebook Messenger 18%28%

 Fonte: McAffee Corp, 2022.

De acordo com a pesquisa McAffee Corp (2022), registramos as características do  fenômeno de cyberbullying nas redes sociais: 

Ofensas e agressões verbais na internet direcionadas a crianças e adolescentes;  divulgação de fotos, áudios e vídeos com o objetivo de constranger uma pessoa;  agressões psicológicas no mundo virtual; brincadeiras ofensivas, que possam se tornar  um tipo de humilhação pública; falar mal de uma pessoa para outras nos canais  digitais; tirar sarro da aparência de uma pessoa; marcar usuários em fotos e  publicações vergonhosas; ameaçar machucar, bater, difamar ou tirar a vida de alguém;  invasão de contas pessoais, como e-mail ou perfil nas redes sociais; fazer piadas com  a sexualidade de outra pessoa, entre outros. (McAffee Corp, 2022) 

Para a pesquisadora Paula Xavier (2022), a exposição dos adolescentes nas redes sociais  desencadeia um ciclo de controle, vigilância e extração de informações, comprometendo a  privacidade e a segurança, além de prejudicar seu desenvolvimento físico, psicológico, afetivo  e emocional. Desse modo, passamos a descrever o relato de quatro casos de cyberbullyings,  registrados no Blog do jornalista Marcus Pessoa (Mundo Digital). Nos casos apresentados os  adolescentes desenvolveram problemas emocionais como ansiedade, depressão, fobia social,  síndrome do pânico, e como consequência a perda da vida.  

A adolescência é uma fase do desenvolvimento cognitivo e emocional muito  vulnerável. Ao mesmo tempo que regiões do cérebro estão no máximo de sua  potência outras ainda estão buscando regulação, necessitando de desafios saudáveis e  continência afetiva. Logo o cyberbullying chega num momento muito delicado,  podendo gerar muitos danos. (Fóz, 2018) 

Nessa perspectiva, passamos a refletir sobre o caso da adolescente Júlia Rebeca, 17 anos,  que faleceu em 10 de novembro de 2013, na cidade de Parnaíba – PI. No relato do caso consta  que alguém publicou um vídeo com cenas de sexo em que Júlia participava com a colega  adolescente e um jovem. Após o vazamento do vídeo no WhatsApp, Júlia ficou constrangida e  envergonhada ao enfrentar a família e conhecidos. Devido ao impacto gerado, registrou a sua  despedida no Twitter, com um pedido de desculpas para os familiares e amigos.  

Na sequência, apresentamos a situação de Lara da Silva, que na época estava com 12  anos, moradora do município de Alto Jequitibá – MG. A situação ocorreu em novembro de  2015. Uma garota de nome Jéssica com ciúmes do namorado, agrediu Lara na saída da escola,  e vários colegas presenciaram a situação. No final da briga Lara pergunta: “Já acabou, Jéssica?”.  Além da violência física que Lara sofreu, os colegas fizeram filmagens e postaram nas redes  sociais. O vídeo foi veiculado na rede de televisão local, e se transformou no meme com maior  circulação em 2015, com a frase: “Já acabou, Jéssica?”. Esse acontecimento se transformou em um pesadelo para Lara, que abandonou a escola, passou a praticar automutilação e até hoje faz  tratamento psiquiátrico.  

A situação envolvendo Maria Luiza ocorreu em 2021, quando estava com 13 anos. A  adolescente usa uma órtese na perna esquerda, e foi vítima de cyberbullying quando fez a  postagem do ensaio fotográfico em que participou. O objetivo da postagem era demostrar que  se sentia empoderada e desejou publicar o resultado do trabalho no Instagram. Quando Maria  Luiza estava conversando com seus colegas em uma videochamada, começaram a fazer  comentários preconceituosos: “E aí Malu? Você sabe jogar futebol? Tem a perna biônica, né?”.  Segundo a mãe da Maria Luiza, o ocorrido desencadeou esgotamento físico e mental. 

 Apresentamos o caso do adolescente Lucas Santos, com 16 anos na época do  acontecimento fatídico. A mãe de Lucas Santos era a cantora de forró Walkyria Santos. Trata se de um fato ocorrido em Natal- RN, em 03 de agosto de 2021. Em certa ocasião, o adolescente  Lucas Santos realizou uma postagem no TikTok, em que brincava de beijar um colega. Após a  publicação do vídeo, recebeu uma quantidade extrema de comentários ofensivos questionando  a sua sexualidade. Os comentários agressivos, a intimidação e as ofensas homofóbicas levaram  o adolescente Lucas Santos a tirar a própria vida. 

Constatamos que no emaranhado das redes sociais, os acontecimentos ganharam  repercussão, divulgação extremamente rápida, viralizando na internet. Esses casos de  cyberbullying viraram casos de justiça, com enquadramento penal contra os agressores,  aumentando a pressão da sociedade sobre as redes sociais quanto a liberação das plataformas  para acesso pelos adolescentes.  

Diante desse quadro, conforme o Código Penal Brasileiro, a punição para as pessoas  que comentem o cyberbullying (cyberbullie), pode alcançar até 04 anos de reclusão. No âmbito  civil, os agressores devem pagar indenizações por dano moral, e quando o agressor é menor,  responde pelo ato infracional, devendo proceder a devida indenização para a vítima e família.  Segundo casos julgados nos Estados de São Paulo, Paraná e Minas Gerais, a justiça determinou  os valores referentes a indenização às vítimas de cyberbullying entre R$ 8 mil a R$ 50 mil.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Apresentamos a abordagem da problemática de cyberbullying seguindo como ponto de  ancoragem e reflexão que as medidas devem ser sempre enérgicas quando envolver agressão, per seguição sistemática contra adolescentes, invasão da privacidade dos menores e o abuso no uso  indiscriminado da imagem dos adolescentes que podem provocar casos de violência virtual. Desse  modo, mesmo em situações praticadas pela família, escola e grupos sociais, é fundamental consi derar em primeiro lugar a vida dos menores, devendo ser protegidos contra qualquer dano, preser vando a sua integridade física, moral e psicológica. 

No âmbito do ordenamento jurídico sobre a proteção dos adolescentes, a Constituição Fe deral, em seu artigo 227, estabeleceu que a proteção aos menores constitui um dos direitos sociais  fundamentais, e a intencionalidade é assegurar à criança e ao adolescente relevante igualdade jurídica.  

Entendemos que no artigo 4°, do Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n°. 8.069/90,  ressaltando o que consta no artigo 227 da Constituição, formalizou-se a garantia do atendimento  prioritário aos adolescentes, bem como a concretização dos direitos fundamentais, à vida, à saúde,  à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao  respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 

 Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n°. 8.069/90, no Capítulo II – Do  Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade, citando os artigos,15, 17 e 18, compreendemos  que é fundamental considerar o adolescente como sujeito de direito, cuidando e educando,  protegendo contra qualquer forma de abuso, perigo, maus-tratos e violência.  

 Nessa perspectiva, a responsabilidade de proteção do menor é compartilhada entre a  família, a sociedade e o Estado, cabendo aos entes estruturar as condições de convivência em  rede de amparo para crianças e adolescentes, de modo que jamais sofram qualquer tipo de  discurso de ódio, violência física, verbal, psicológica, moral, entre outras circunstâncias que  exponham os menores as situações de humilhação, acontecimentos vexatórios, piadas com teor  ofensivo, racismo recreativo, dentre outras formas de violência.  

 Outrossim, os adultos devem evitar qualquer tipo de comparação entre grupos,  comunidades e etnias, classes sociais e poder econômico, que possa colocar os adolescentes em  conflitos, que produza aversão e retaliação, impedindo os casos de cyberbullying e  cyberstalking. Ainda, jamais estabelecer situação de superioridade entre os adolescentes,  diferenciando moradores da zona urbana, rural, quilombolas e ribeirinhos, evitando caricaturas  e decalques, impedindo que ocorra a banalização da pluralidade e diversidade multicultural.

 Desse modo, a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n°.  8.069/90, determinam a imperatividade dos direitos da criança e adolescente. Nesse sentido, é preciso considerar a responsabilidade do Estado, dos adultos que compõe o grupo familiar, bem  como todos que convivem no ambiente escolar, que convergem para a formação e integração de  uma rede de proteção para resguardar os direitos dos menores, evitando a sua exposição,  controle, perseguição e ameaças. Assim sendo, enfatizando o rol de cuidados e segurança, o  papel efetivo do Estado e das instituições, pais e responsáveis, professores e comunidade escolar  que devem defender a personalidade, identidade, integridade e a vida dos adolescentes, jamais  faltando ao seu acolhimento e proteção.  

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1Discente do Curso Superior de Direito da Faculdade La Salle Campus Manaus e-mail: silvanabp2000@ yahoo.com.br;
2Docente do Curso Superior de Direito da Faculdade La Salle Campus Manaus. Especialista em Direito, e-mail:joao.freitas@faculdadelasalle.edu.br. Mestre em Direito pela UNIFOR e-mail: rebecadib@faculdadelasalle.edu.br