O CONTROLE COMO INSTRUMENTO DE GOVERNANÇA NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS BRASILEIRAS SOB O OLHAR DA LEI Nº 14.133/2021

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11317195


Alan Pablo Ribeiro Martins1
Thiago de Sousa Mendes2
Orientadora: Prof.ª Ma. Andreia Nádia Lima de Sousa Pessoa3


RESUMO

O presente artigo possui como tema o controle como instrumento de governança sob a égide da Lei nº 14.133/2021 – Nova Lei de Licitações e Contratos. Seu objetivo é analisar as ferramentas de controle através da governança, introduzida nesta normativa. Para alcançar os resultados, utilizou-se a pesquisa de caráter exploratório bibliográfico e abordagem qualitativa. Dentre as novidades vindouras, se enaltece a ênfase no controle, que nesta normativa ganha um capítulo exclusivo para tratar do tema, visto que este é de grande importância para a governança do processo de compras públicas. Neste sentido surge o questionamento central deste artigo: De que forma o controle atua como instrumento de governança nas contratações públicas brasileiras sob a perspectiva da Lei nº 14.133/2021? Observou-se que o processo de compras públicas incorporou característica gerenciais através de ferramentas de controle e gestão que passaram a ser basilares, como a introdução do Estudo Técnico Preliminar (ETP) e o Plano de Compras Anual (PCA), ainda na fase interna, e que a governança é estritamente ligada à eficiência e eficácia, e por esse motivo a Nova lei de Licitações busca, através do controle, melhorar cada vez mais o processo de compras públicas. Como resultados, percebe-se que o legislador privilegia o controle, tanto externo, como principalmente interno, através da exigência de procedimentos e criação de ferramentas que possibilita uma melhor governança.

Palavras-Chave: Governança. Compras Públicas. Controle.

ABSTRACT

The theme of this article is control as a governance instrument under the auspices of Law No. 14,133/2021 – New Tenders and Contracts Law. Its objective is to analyze the control tools through governance, influenced by this regulation. To achieve the results, an exploratory bibliographical research and a qualitative approach were used. Among the new developments, the emphasis on control is highlighted, which in this regulation has an exclusive chapter to deal with the topic, as it is of great importance for the governance of the public procurement process. In this sense, the central question of this article arises: How does control act as a governance instrument in Brazilian public contracts from the perspective of Law No. 14,133/2021? It should be noted that the public purchasing process incorporated managerial characteristics through control and management tools that became basic, such as the introduction of the Preliminary Technical Study (ETP) and the Annual Purchasing Plan (PCA), still in the internal phase , and that governance is aimed at efficiency and effectiveness, and for this reason the New Bidding Law seeks, through control, to increasingly improve the public procurement process. As a result, it is clear that the legislator favors control, both external and mainly internal, through the requirement of procedures and the creation of tools that enable better governance. 

Keywords: Governance. Public Purchases. Control.

INTRODUÇÃO

A Administração Pública tem sua essência atrelada à coletividade, ou seja, é quem executa a atividade estatal através dos atos e recursos que movem toda a estrutura pública. Nesse sentido, a Administração Pública pode ser entendida como um conjunto de pessoas e organizações que tem o intuito de agir através de atos para mover os recursos em prol coletivo adotando-se, portanto, o critério subjetivo para sua conceituação. Para Justen Filho (2023) a Administração Pública possui um caráter coletivo e pode ser considerada como os diversos sujeitos e entidades cujos poderes, deveres e direitos surgem a partir da função administrativa do Estado e tem como missão atender aos anseios da população de forma que disciplina todos os atos praticados dentro das organizações públicas.

Quando se trata de compras e prestação de serviços públicos, existe uma maior atenção da sociedade e por conta do grande volume de contratações realizadas. Segundo dados do site “Painel de Compras” mantido pelo Ministério da Fazenda, somente no ano de 2022 o volume de compras públicas chegou a mais de R$ 255.000.000.000,00 (duzentos e cinquenta e cinco bilhões de reais) (BRASIL, 2022).

Diante disto, foi necessário regulamentar o processo de contratações públicas no Brasil, inicialmente, regulada pela Lei nº 8.666/93. Com o avanço do tempo, as necessidades coletivas foram mudando e percebeu-se que a legislação se tornou obsoleta, tornando esse processo burocrático e ineficiente em suas práticas de governança e controle.

Em 2021 foi publicada a Nova Lei de Licitações – Lei nº 14.133, com desiderato de modernizar e desburocratizar as contratações públicas, assegurando maior segurança e eficiência nesse processo. Com o advento desta legislação, mudanças significativas ocorreram, em especial na fase interna dos certames licitatórios, através de ferramentas como a adaptação e implementação do Portal Nacional de Compras Públicas – PNCP, ferramentas de governança, controle, dentre outras. Referida lei foi publicada em 01/04/2021 com obrigatoriedade a partir de 01/04/2023. Seu adiamento se deu inicialmente através da MP 1167/2023 e depois pela Lei Complementar 198/2023, onde o marco temporal para a utilização da Lei 8.666/1993 se estendeu até o dezembro de 2023.

A pesquisa tem por objetivo analisar as ferramentas de controle das compras governamentais brasileiras através da governança introduzida pela Lei nº 14.133/2021 e para tanto questiona-se: De que forma o controle atua como instrumento de governança nas contratações públicas brasileiras sob a NLL?

O presente artigo está dividido em quatro sessões além da introdução e considerações finais. A primeira parte aborda o Estado Democrático de Direito e sua influência sobre o controle, a segunda aborda a governança e sua atuação no setor de compras públicas, a terceira aborda o papel do controle na aplicação da Lei nº 14.133/2021 e por fim, a quarta parte aborda a atuação do controle interno como instrumento de governança na Lei n° 14.133/2021

Para o presente artigo, foi utilizado o método de abordagem qualitativa, pois se buscou obter resultados através de interpretação de doutrinas, jurisprudências, artigos e leis obtidas por pesquisas na internet, revistas especializadas, fóruns e livros digitais e físicos. Tem caráter exploratório de temática recente e obteve os resultados através de método dedutivo.

2 CONTROLE COMO INSTRUMENTO DE GOVERNANÇA NA NOVA LEI DE LICITAÇÕES

2.1 O Estado Democrático de Direito e sua Influência sobre o Controle

A ideia moderna do Estado tem início no século XVI, como resultado de mudanças na estrutura e no exercício do poder. Nesse período, tornou-se cada vez mais aparente a necessidade descentralizar esse poder nas mãos de uma única autoridade, conferindo ao Estado o monopólio legítimo do uso da coerção para manter a ordem (Kammer, 2003).

É relevante observar que o Estado de Direito surgiu conceitualmente ligado ao liberalismo. Não alcançando a efetividade esperada na garantia dos direitos individuais durante a sua criação. Como resposta a essa situação, emergiu o Estado Social de Direito, impulsionado por movimentos sociais dos séculos XIX e XX, com o propósito de buscar justiça social e melhorar as condições de vida dos habitantes de um país (Kammer, 2003).

Com base nesse cenário, respaldado pela soberania popular e com a intenção de superar desafios sociais e regionais, surgiu o Estado Democrático de Direito. Este modelo, assim como o Estado Liberal de Direito, preconiza a submissão às leis, a divisão das funções estatais e a garantia dos direitos individuais. No entanto, prioriza, sobretudo, a busca pela justiça social e a participação democrática genuína do povo em seu processo político, sempre respeitando as diferenças estruturais entre as pessoas, como etnias, crenças, culturas e situações sociais (Kammer, 2003).

O Estado Democrático de Direito não se restringe apenas à obediência à legalidade em sua atuação, mas, sobretudo, busca legitimidade em suas decisões, obtida através do respaldo da vontade do povo. Essa legitimidade é alcançada por meio da participação na formulação das políticas estatais, seja de forma individual ou por meio de organizações sociais ou profissionais, possibilitando à população expressar livremente sua vontade.

A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988, instituiu o Brasil como Estado Democrático de Direito, estabelecendo os princípios e regulamentos que caracterizam essa forma de governo. A Carta Magna afirma que todo o poder emana do povo, podendo ser exercido diretamente por ele ou por meio de representantes, e fundamenta a nossa República Federativa nos princípios de soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho, livre iniciativa e pluralismo político.

Segundo Saes (2001) “com a aprovação da Constituição federal de 1988, abriu-se a possibilidade de as classes trabalhadoras desenvolverem, num quadro histórico em que foi restaurada a eficácia política prática do exercício do direito de voto”. A promulgação da Constituição federal de 1988 abriu caminho para que as classes trabalhadoras pudessem desenvolver experiências partidárias de grande alcance e independência dentro de um contexto em que o exercício prático do direito de voto recuperou sua eficácia política. No entanto, isso gerou dúvidas sobre o real desfrute da cidadania política, uma vez que houve novamente uma acomodação de interesses ligados a uma hegemonia política no âmbito da democracia presidencialista pós-1988.

A Constituição Federal de 1988 promoveu uma abertura política que visava à inclusão de novos atores sociais para desempenhar um papel efetivo no controle social, entendido como um indicativo de uma cidadania ativa. Segundo Marcello Baquero (2008), que destaca a necessidade da democracia contemporânea em ter uma cidadania ativa, envolvida na esfera política por meio de discussões, deliberações, referendos e plebiscitos, usando tanto mecanismos formais quanto informais. Isso não deve comprometer as instituições políticas convencionais, mas, ao contrário, deve fomentar uma sociedade civil ativa e participativa. Em suma, promover um engajamento político mais destacado por parte dos cidadãos e uma sociedade mobilizada e rica em capital social.

Em última análise, o controle social implica um avanço na consolidação de uma sociedade democrática, pois está relacionado às ações do Estado em promover uma relação transparente e de prestação de contas ao cidadão. Este é o objetivo final de suas atividades. Além disso, o controle social contribui significativamente para aprimorar a qualidade da democracia.

O exercício do Controle se mostra condição essencial para o correto funcionamento dos atos públicos, bem como sua utilização deve ser encorajada e fortalecida.

2.2 Governança e sua Atuação no Setor de Compras Públicas

A origem da governança vem da necessidade que proprietários de bens tinham de geri-los à distância e, para tanto, delimitavam essa tarefa a terceiros que eram responsáveis por cuidar desse patrimônio. O termo “Governança” foi citado pela primeira vez pelo Banco Mundial em meados dos anos de 1934 nos Estados Unidos com a criação da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos e primeiramente foi utilizado no setor privado (Maximiano e Nohara, 2017). A governança nesse contexto se deu por contada divergência de interesses entre acionistas e gestores, onde um tentava tirar vantagens do outro em cima de uma mesma situação, fato este que fez os acionistas ou proprietários contratarem pessoas especializadas para gerir seus negócios.

Com o ativismo societário dos fundos de pensão, em meados das décadas de 80 e 90, houve um acirramento nas discussões sobre governança, até que em 2002 foi criada a Lei Sarbanes-Oxley nos Estados Unidos, cujo intuito era o de proteger os investidores de erros contáveis e práticas fraudulentas. Esse instituto jurídico norte americano disciplinou os padrões de boa governança corporativa, prestação de contas e gerenciamento dos riscos combatendo e prevenindo as fraudes e implantando o compliance nas organizações. A Governança corporativa pode ser compreendida como um conjunto de mecanismos e ações que visam o fortalecimento e continuidade da organização, equilibrando, para isso, diversos agentes externos e internos desta (Maximiano e Nohara, 2017).

No Brasil, a Governança teve destaque com a Lei nº 6.404 de 1976 (Lei das S.A) na qual três organizações se destacam com a governança corporativa: a Comissão de Valores Mobiliários, a Bolsa de Valores e o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Além destas, foi regulamentada a Lei nº 12.846 de 2013 (Lei Anticorrupção) e através de multinacionais estrangeiras que atuam no país, bem como em multinacionais brasileiras que atuam no exterior. Para o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC, o instituo é o meio pelo qual as sociedades são dirigidas e controladas, diante da relação de usuários internos e externos, onde um bom gerenciamento da governança pode gerar um maior valor agregado e longevidade da instituição (Slomski, 2005).

Quando se fala em Governança pública, está muito ligada às reformas administrativas pregadas pelos governos brasileiros dos anos 90, onde na época qual se buscava uma solução inovadora para os problemas sociais e buscava uma alavancamento no desenvolvimento do país (Löfer, 2001). De acordo com Ribeiro Filho e Valadares (2017), as bases do conceito de governança no Brasil foram estabelecidas pela Emenda Constitucional (EC) nº 19, de 04 de junho de 1998. Essa emenda incluiu no artigo 37 da Constituição Federal de 1988 o princípio da eficiência, com o objetivo de reduzir os resquícios de patrimonialismo e burocracia presentes na administração pública brasileira.

No ordenamento jurídico brasileiro, com o intuito de difundir a filosofia da governança, foi editado o Decreto Federal nº 9.203 de 2017, no qual conceitua a governança como “o conjunto de mecanismos de liderança, estratégia e controle postos em prática para avaliar, direcionar e monitorar a gestão, com vistas à condução de políticas públicas e à prestação de serviços de interesse da sociedade (BRASIL, 2017).

De acordo com Camilo, Manenti e Yamaguchi (2018), é através desses princípios, estabelecidos pelo legislador, que o gestor público se compromete a adotar práticas de governança na administração pública. Isso permite que a sociedade possa conhecer, fiscalizar e apresentar demandas ao agente político que detém o poder. Essas diretrizes orientam o gestor público a administrar os assuntos públicos de acordo com as necessidades identificadas pela sociedade, proporcionando limitações que buscam garantir uma gestão eficaz e responsável dos recursos públicos.

A nova Lei de Licitações, Lei Federal nº 14.133 de 2021, trouxe uma importante inovação ao ordenamento jurídico ao introduzir, no parágrafo único do artigo 11, a exigência de desenvolvimento da governança nas contratações públicas. Essa responsabilidade é atribuída à alta administração, que deve garantir a execução de processos e estruturas adequados, incluindo gestão de riscos e controles internos.

Essa medida visa aprimorar a condução dos processos licitatórios e a gestão dos contratos resultantes, estabelecendo um ambiente íntegro e confiável. Além disso, busca-se assegurar o alinhamento das contratações com o planejamento estratégico e as leis orçamentárias, de forma a promover eficiência, efetividade e eficácia em todas as etapas das contratações públicas.

Nesse sentido, Cardoso e Alves (2021, p. 31) destacam que a governança pode ser aplicada em dois níveis distintos: no nível institucional, envolvendo todos os membros da organização e estabelecendo objetivos estratégicos comuns para todos os setores; ou em unidades intraorgânicas específicas, especialmente em casos que demandam expertise técnica, como é o caso das contratações públicas.

Segundo Camarão (2021), a governança, inerente à nova lei, impõe ao poder público a responsabilidade de estabelecer sua própria política de governança. Essa política deve garantir a seleção da proposta mais vantajosa, o tratamento isonômico entre os licitantes e a promoção de uma competição justa. Além disso, ela busca evitar contratações com sobrepreço, manifestamente inexequíveis ou superfaturamento, ao mesmo tempo em que incentiva a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

A Nova Lei de Licitações busca não apenas garantir a legalidade e transparência nos processos, mas também promover uma gestão mais estratégica e eficiente dos recursos públicos, beneficiando tanto a administração quanto a sociedade como um todo.

Nesse contexto, a governança pública tem como diretrizes a busca por resultados para a sociedade, com a adoção de soluções inovadoras para lidar com a escassez de recursos e a crescente demanda por atenção a prioridades. Isso inclui a desburocratização, o aumento do uso de meios eletrônicos nos procedimentos, o que facilita a transparência, a implementação de um plano estratégico e uma maior articulação entre as instituições. Além disso, é essencial a incorporação de altos padrões de conduta pela alta administração para orientar o comportamento dos agentes públicos, o aprimoramento dos níveis de controle interno e a gestão de riscos com foco na prevenção em vez da punição.

2.3 O Papel do Controle na Aplicação da Lei n° 14.133/2021

O controle na administração pública, segundo Maximiano e Nohara “é o mecanismo que permite a vigilância, a orientação e a correção da atuação administrativa para que ela não se distancie das regras e princípios do ordenamento jurídico e dos interesses públicos que legitimam sua existência”. Diante do entendimento doutrinário, depreende-se que é o instrumento que fiscalização, orientação e revisão dos atos administrativos com o intuito de garantir a eficiência e eficácia da prestação do serviço oferecido pela Administração Pública.

O controle possui previsão constitucional no artigo 74 no qual determina que os poderes devem manter um sistema de controle interno para fiscalizar seus atos. Falando mais especificamente dos gastos públicos, o mesmo artigo traz em seu inciso II que esse sistema deve fiscalizara legalidade e resultados, bem como a eficiência da aplicação desses recursos,

Em relação às contratações públicas, aborda a Nova Lei de Licitações (NLL)- Lei nº 14.133/2021 um capítulo inteiro acerca do tema. Para Di Pietro não se pode confundir controle com o Poder de Fiscalização que a Administração exerce sobre seus contratos, mas sim da fiscalização que o fiscal exerce sobre o contrato específico ao qual lhe é atribuído, vide:

A nova Lei de Licitações inova ao inserir capítulo específico sobre “controle das contratações”, nos artigos 169 a 173. Esse controle não se confunde com o poder de fiscalização que a Administração Pública exerce em relação aos contratos administrativos, como uma de suas prerrogativas. (Di Pietro, 2023).

De acordo com a NLL, devem ser adotados no âmbito do controle métodos de gestão de riscos e de controle preventivo com o intuito de aperfeiçoar com práticas de gestão o controle dos processos administrativos das compras governamentais através das linhas defesa do controle social.

A implementação de um controle interno mais incisivo reflete a urgência de um combate contínuo e eficaz às práticas de corrupção ou ineficiência que prejudicam a operação transparente e eficaz da Administração Pública. Essas medidas são fundamentais para garantir a prestação de serviços de qualidade e o desenvolvimento de políticas públicas direcionadas ao aprimoramento da qualidade de vida das pessoas, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade social.

O controle, juntamente com a liderança e a estratégia, representa um dos mecanismos essenciais na implementação da governança pública, conforme estipulado no artigo 5° do Decreto Federal n° 9.203/2017. Esse mecanismo abrange processos organizados para mitigar potenciais riscos visando alcançar os objetivos institucionais. Além disso, busca assegurar a execução ordenada, ética, econômica, eficiente e eficaz das atividades da entidade, mantendo a conformidade com a legalidade e promovendo a economia no uso dos recursos públicos.

No referencial básico de governança do Tribunal de Contas da União (TCU), o controle interno associado à gestão de riscos e controle é descrito como “um processo integrado e dinâmico conduzido pela liderança e pelos colaboradores, organizado para enfrentar riscos e oferecer um nível adequado de segurança […], na busca pela realização da missão da entidade”.

Os objetivos gerais que se buscam com a implementação do controle interno, incluem a realização ordenada, eficiente e eficaz das operações, a conformidade com as leis e regulamentos, bem como o cumprimento dos requisitos de accountability (BRASIL, 2014, p.58). Ao compararmos os incisos do artigo 169 da nova lei com o eixo de controle estabelecido como mecanismos e componentes de governança pelo referencial do TCU, é possível observar notáveis semelhanças.

Isso se deduz a partir da interpretação do artigo 169 e seus incisos da lei de licitações, que identifica a presença de diferentes formas de controles, exercidos por diversos agentes. Estes controles podem ocorrer de maneira independente e prévia, simultânea ou após a realização de determinada ação. A possibilidade de diversos tipos de controle (prévio, concomitante e posterior), como descrito na lei, é apoiada pela perspectiva de Medauar (2020, p.59), ao afirmar que “o controle interno pode ocorrer antes da existência ou efetivação deu ma ação (controle prévio), durante a realização do ato (controle concomitante) ou após a atividade (controle subsequente ou a posteriori).

Na verdade, evidenciou-se de forma mais clara o papel do controle interno e da assessoria jurídica no processo de monitoramento das contratações públicas, desde a fase inicial de planejamento – envolvendo a elaboração de rascunhos de editais e outros documentos (inciso IV, artigo 19) – até a fase de execução do contrato resultante da licitação (parágrafo 3°, artigo 117). Eles desempenham um papel crucial ao fornecer suporte para resolver questões ou ao auxiliar o fiscal do contrato.

O artigo 5° da Lei n° 14.133/2021, ao ser comparado à Lei n° 8.666/1993, que teve sua vigência encerrada em 31 de março de 2023, introduziu novos princípios explícitos, incluindo o da transparência. Este é um princípio de suma importância para a Administração Pública, considerando o impacto resultante do uso apropriado dos recursos, influenciado pela contribuição dos cidadãos, no dia a dia da população por meio das políticas públicas.

A participação da sociedade, para um efetivo controle dos atos da gestão pública, demanda informações precisas e confiáveis, as quais permitem ao cidadão construir um referencial da atuação do governo, e com isso, reivindicar que os representantes esclareçam as suas ações, melhorem a forma de agir, podendo até mesmo alterar os objetivos das políticas públicas (Rocha, 2011)

Dessa forma, o controle social, no âmbito desta legislação, surge como uma peça-chave para garantir a integridade, a eficiência e a conformidade dos atos do poder público. Sua interação direta com a transparência e a participação ativa da sociedade civil em todas as etapas dos processos licitatórios e na gestão dos contratos públicos promoveu ambiente mais idôneo, em consonância com os princípios democráticos e aprimorando a relação entre governo e cidadãos.

É por meio desse arcabouço de transparência e participação que se busca fortalecer a legitimidade e a eficácia das ações do Estado, reforçando a responsabilidade pública e contribuindo para a construção de uma gestão mais aberta, ética e alinhada com os anseios da sociedade. Envolvendo a participação ativa dos chamados “sujeitos ativos”, como: sociedade civil, organizações não governamentais, entidades, associações e cidadãos interessados em acompanhar, fiscalizar e interferir nos processos licitatórios e na execução dos contratos públicos.

O controle social visa às decisões já tomadas ou as que estão em vias de adoção com o “intuito de verificar ou provocar a verificação da sua legalidade, moralidade, impessoalidade, economicidade, conveniência e oportunidade” (Medauar, 2020, p. 195), essa forma de atuação se refere às verificações diretas realizadas em pessoas naturais ou associações civis, permitindo que a Administração possa exercer a autotutela, corrigindo eventuais inadequações em seus atos ou omissões, e também facilitando a atuação dos órgãos de controle. Esse método busca transcender uma visão limitada de participação, debate público e interação da população com seus governantes. Nesse sentido, esclarece Medauar (2020), que meras manifestações reivindicatórias – protestos ou passeatas – não representam controle social sobre o Poder Público, uma vez que devem respeitar diretrizes indicadas na legislação.

Neste sentido, a Lei de Acesso à Informação (LAI), juntamente com o controle social, surgiram como importante mecanismo de estímulo ao desenvolvimento da transparência no âmbito do Poder Público. É considerado inadequado apenas publicar atos finais ou resumos de contratos administrativos nos portais de transparência, sem possibilitar o acesso aos demais conteúdos do processo, como pareceres, despachos ou orçamentos. Esta prática é crucial para garantir que os cidadãos tenham acesso a uma transparência mais abrangente e completa.

Ainda neste sentido, a accountability é um mecanismo de controle social que impõe limites às ações do poder público na gestão, estabelecendo estruturas formais e institucionais que exigem transparência em suas atividades administrativas. Embora sua dimensão legal seja fundamental, é imprescindível ressaltar seu aspecto político. Isso demanda que a classe política reconheça a importância de uma comunicação eficaz com a sociedade. Essa interação não se restringe apenas à implementação das políticas públicas, mas também engloba a avaliação dos resultados de acordo com as expectativas da população.

Embora não haja uma tradução exata em português, pode-se conceituar a accountability como responsabilidade ética, já que está ligada à obrigação e à transparência dos membros de um órgão administrativo ou representativo em prestar contas às entidades de supervisão ou aos cidadãos que representam. Accountability é sinônimo de responsabilidade objetiva, ou seja, refere-se à responsabilidade de uma pessoa ou organização perante outra (Pinho e Sacramento, 2009). Em uma possível adaptação para o português, o termo também pode ser denominado como ‘responsabilização’.

Percebe-se que o controle é inerente à atividade da Administração Pública. É essencial para a busca da eficácia das ações do poder público, uma vez que este está sujeito ao controle de seus atos, portanto, todos os atos dos agentes públicos devem sofrer influência do controle, seja ele externo ou interno.

2.4 Atuação do Controle como Instrumento de Governança na Lei n° 14.133/2021

Conforme já constatado, Administração Pública anda lado a lado com o controle, uma vez que os atos de agentes público sofrem influência de controle externo e interno. Quando se fala em compras públicas, espera-se que os recursos sejam sempre bem aplicados, de forma que essa governança deve ser percebida pela população.

Nesse cenário a Lei nº 14.133/2021 fez com que o legislador mude drasticamente a maneira de planejar e executar os procedimentos de compras governamentais. A implementação da nova legislação exigirá dos órgãos um fortalecimento das ferramentas de controle visando uma maior eficiência do processo de compras. Sobre esse assunto, o Tribunal de Contas da União já começa a editar suas jurisprudências, onde podemos destacar o acórdão 1614/2023 onde o plenário destaca o cumprimento de metas, que devem ser controladas para que haja um acompanhamento da execução contratual,

O controle nesse contexto terá função muito importante ao introduzir mecanismos de transparência, prevenção e combate à corrupção e que atuarão para controlar melhor a destinação dos recursos. Todos os entes devem investir e é de responsabilidade da Alta Cúpula da Administração assegurar que essas ferramentas sejam executadas.

Neste sentido, os resultados da atuação dos gestores possuem um peso cada vez para a sua responsabilização e, por conta disto, observa-se um fenômeno conhecido com Administração Pública do Medo, no qual consiste no receio do gestor público em tomar decisões, pois a nova legislação, ratificada pela 13.655/2021 que alterou a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, aumentou-se consideravelmente a responsabilização dos atos praticados pelos agentes públicos e no qual ainda se pesa a falta de jurisprudência para pacificar determinadas situações.

Uma novidade introduzida na NLL vem explícita no artigo 169, o legislador traz as chamadas linhas de defesa bem como determina os pilares do controle da NLL. Esse ponto nos mostra uma grande mudança em relação à antiga legislação, uma vez que reservou um capítulo inteiro para falar de controle. A primeira linha de controle passa por agentes, servidores e empregados que atuam na governança do próprio órgão. A segunda linha passa pelo staff jurídico e de controle interno montado pelo órgão e a terceira linha atribui ao órgão central de controle interno da Administração e aos Tribunais de Contas. Esses órgãos não estarão desamparados e não criarão dê sua competência os casos em que atuaram, mas a própria legislação se encarregou de apontar os critérios que deverão ser observados em suas atuações.

Claramente percebe-se que o legislador  deu uma atenção maior ao tema do controle, pois nesta legislação editou um capítulo exclusivo para tratar do tema. O controle  introduz instrumentos visam claramente o alcance da eficiência e a correta aplicação dos recursos públicos atingindo sua finalidade coletiva. Outro ponto elencado pela nova legislação é o termo compliance, cuja ideia é a de se observar na prática o cumprimento das normas (Sarai, et al, 2021). Este termo é bastante utilizado na gestão privada e é um norteador da governança corporativa que se encontra introduzido na legislação de compras.

Através das ferramentas de controles aplicadas pela nova legislação, a NLL introduziu grande modernização e desembaraço nas compras públicas brasileiras. Esse processo de modernização está muito ligado ao conceito de governança, introduzido primeiramente pelo setor privado e com grande assertividade, ganhou espaço na Administração Pública.

Essa governança adota diretrizes e soluções inovadoras para o setor público, planos estratégicos, desburocratização, bem como o aumento do uso dos meios tecnológicos, a articulação entre as instituições, o aprimoramento do controle interno e a gestão de riscos (Amado,2021). O uso da tecnologia tornou-se um aliado para o controle efetivo dos processos que envolvem o consumo de verbas públicas, e, portanto, o controle contribui inevitavelmente para uma melhor governança do processo de compras.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todas as informações pesquisadas e demonstradas no presente artigo, depreende-se que a Administração Pública avança na busca de tornar o ato de compras públicas mais transparente, eficiente e por consequência, eficaz. A Nova Lei de Licitações reafirmou preceitos introduzidos no setor público nos tempos da implantação da administração gerencial e agora, percebe-se na prática, instrumentos de controle como a introdução de etapas como o Estudo Técnico Preliminar, Plano de Compras Anual, Portal Nacional de Compras Públicas dentre outras.

A busca pela melhora do processo de compras públicas sempre foi algo que desafiou agentes públicos e gestores, tanto que a Lei n° 8.666/1993 já se mostrava bastante burocrática e obsoleta. A NLL veio com o objetivo de melhorar esse aspecto, positivando o controle como verdadeiro instrumento de democracia e valorização dos recursos públicos. Essa normativa ainda é recente e não irá suprir todas as mazelas que poderão surgir com sua utilização, porém será sempre interpretada em prol do benefício popular através de portarias e normativas que serão editadas em sua base.

Diante do que se busca responder nesta pesquisa, é perceptível que a Lei nº 14.133/2021 trouxe ferramentas que profissionalizam e controlam de maneira mais eficiente o uso de recursos públicos para atender a população. O legislador privilegiou o controle como forma de promover e melhorar a governança nos processos de licitações permitindo que esse controle se aprimore externamente, através do controle social, e principalmente internamente, onde gestores serão os grandes responsáveis por controlar e planejar, através de ferramentas o procedimento de compras.

Neste sentido, uma das novidades é a introdução na legislação de um capítulo exclusivo para tratar de controle, disciplinando as práticas de gestão de risco e controle preventivo. Essas ações buscam maximizar a eficiência e consequentemente eficácia das compras públicas, uma vez que o volume de recursos nesses processos é vultoso.

Essas ferramentas de gestão profissionalizam e tornam o poder público mais produtivo e efetivo e da mesma forma, possibilita que o processo de compras públicas seja um processo transparente e auditável, uma vez que a NLL possibilita que o controle atue efetivamente para melhorar a governança desse processo.

Uma vez implantado, o controle proporciona métricas de governança, das quais se determinam como estão sendo executadas as contratações, bem como determinar os recursos que devem ser alocados e como esses recursos estão sedo mensurados.

Apesar de ser novidade e efetivamente ter sua utilização mais efetiva no ano de 2024, já existem jurisprudências que atestam a importância do controle na governança pública. Neste sentido, destacamos o já citado acórdão 1614/2023 do Tribunal de Contas da União. Nesta jurisprudência, o TCU deixa claro que deve ser feito um acompanhamento, para mensurar a prestação do serviço prestado, bem como seja feito um cronograma de cumprimento de metas e pagamentos.

Diante deste estudo, sugere-se que a presente pesquisa seja fomentada no intuito de analisar a atuação de cada ferramenta de controle na construção da governança e como cada órgão está lidando com a implementação dessa nova legislação.

REFERÊNCIAS:

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1Bacharelando do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA). E-mail: alan-pablo@hotmail.com
2Bacharelando do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA). E-mail: thiago.mendes.01@hotmail.com.
3Mestra em Direito – Universidade Católica de Brasília (UCB). Especialista em Parcerias Público Privadas- Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Especialista Concessões e Direito Processual Civil e Consumidor- Universidade Estadual do Ceará (UECE). Professora e Orientadora do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho (UNIFSA). E-mail: andreianadia@unifsa.com.br.