EFEITOS DE FÁRMACOS PSICOTRÓPICOS NO TRATAMENTO DE DISTÚRBIOS COMPORTAMENTAIS EM CÃES (CANIS FAMILIARIS)

EFFECTS OF PSYCHOTROPIC DRUGS IN THE TREATMENT OF BEHAVIORAL DISORDERS IN DOGS (CANIS FAMILIARIS)

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202410311617


Leticia Ramos Viana1, Theresa de Moura Monteiro2, Jéssica Dorneles Torres3, Thamiris Silva dos Santos Vargas4, Lydia Mansur Ribeiro Correia5, Breno Garone dos Santos6, Coorientadora: Francimara de Araújo Mariano7, Orientadora: Fernanda Antunes8


RESUMO

Com o reforço da interação humano-animal e constatação científica da senciência, houve um aumento significativo sobre percepção da manifestação de atitudes atípicas dos animais de companhia sob a ótica dos responsáveis legais e médicos veterinários. Em termos gerais, tais alterações ocorrem em função da humanização excessiva, estresse, medo ou ambientes inapropriados, ocasionando variações de temperamento, dependência afetiva e/ou inibição de comportamentos naturais espécie-específicos. A classe dos medicamentos psicotrópicos oferece tratamento farmacológico sobre o estado mental desses animais através da modulação de neurotransmissores, como a serotonina e a dopamina. O objetivo do trabalho foi avaliar o impacto farmacológico de medicamentos psicotrópicos sobre o desenvolvimento social e blindagem emocional destes animais, atrelados a terapia comportamental. Para isso foram utilizados cães domésticos (Canis familiaris) diagnosticados com transtornos compulsivos secundários a outras disfunções comportamentais e tratados com cloridrato de trazodona (Grupo 1) e extrato de fungos da espécie Psilocybe cubensis (Grupo 2), comparados ao tratamento convencional com cloridrato de fluoxetina. Os animais foram diagnosticados e avaliados a partir de questionários direcionados ao diagnóstico e evolução do tratamento, desenvolvidos com base na literatura utilizada neste trabalho. Os comportamentos atípicos manifestados nos distúrbios primários e secundários foram atenuados ou extintos no Grupo 1 (n=4), no Grupo 2 (n=4) e no grupo de tratamento convencional. Todavia, o cloridrato de fluoxetina expressou redução de apetite como efeito colateral.  

Palavras-chave: Transtorno Compulsivo. Ansiedade. Agressividade. Trazodona. Psilocibina.

ABSTRACT

With the strengthening of human-animal interaction and the scientific recognition of sentience, there has been a significant increase in the perception of atypical behaviors in companion animals, as observed by legal guardians and veterinarians. In general terms, such changes occur due to excessive humanization, stress, fear, or inappropriate environments, leading to variations in temperament, emotional dependency, and/or inhibition of species-specific natural behaviors. The class of psychotropic drugs offers pharmacological treatment for the mental state of these animals by modulating neurotransmitters such as serotonin and dopamine. The objective of this study was to evaluate the pharmacological impact of psychotropic drugs on the social development and emotional resilience of these animals, in conjunction with behavioral therapy. For this purpose, domestic dogs (Canis familiaris) diagnosed with compulsive disorders secondary to other behavioral dysfunctions were treated with trazodone hydrochloride (Group 1) and extracts from Psilocybe cubensis mushrooms (Group 2), and compared to conventional treatment with fluoxetine hydrochloride. The animals were diagnosed and evaluated using questionnaires aimed at diagnosing and monitoring the evolution of treatment, based on the literature referenced in this study. Atypical behaviors associated with primary and secondary disorders were mitigated or eliminated in Group 1 (n=4), Group 2 (n=4), and the conventional treatment group. However, fluoxetine hydrochloride showed a reduction in appetite as a side effect.

Keywords: Compulsive Disorder. Anxiety. Aggression. Trazodone. Psilocybin.

1. INTRODUÇÃO

Durante muito tempo os animais eram considerados seres incapazes de manifestar sensações e sentimentos de maneira consciente, diferente da capacidade humana. Neste contexto, o comportamento de cães e gatos era julgado como uma atividade instintiva, e não uma atribuição da sua mente. Todavia, a senciência integra tanto as habilidades cognitivas quanto as reações emocionais coordenadas pelo sistema nervoso. Isto habilita o entendimento de atos efetuados por outros indivíduos em relação a si mesmo e a terceiros, a adquirir lembranças, assim como realizar avaliação de riscos e benefícios em dadas situações, detendo certo nível de consciência (DAL PONT et al., 2022).

O encéfalo é o principal responsável por este evento, onde o sistema límbico é encarregado pelas emoções, a área pré-frontal rege a razão e a cognição e ambos podem atuar em conjunto. Quanto maior a evolução do sistema nervoso em determinada espécie, maior a sua aptidão em demonstrar um comportamento mais elaborado. Com isso, os cães e gatos são capazes de experimentar estados afetivos positivos e negativos de maneira consciente. Os fenômenos físicos, psicológicos, a vida social e o contexto local interagem continuamente, de modo que quaisquer alterações nesses setores podem impulsionar uma resposta fisiológica ou comportamental (DE SIQUEIRA et al., 2020; DAL PONT et al., 2022).

Os distúrbios de comportamento dos animais de companhia estão comumente associados ao estresse de um ambiente sem estímulos, espaços inapropriados, sociabilização carente, dependência emocional, punições inadequadas, hiperatividade mal direcionada, introdução de um novo integrante na família ou dificuldade de comunicação entre tutor e animal. Este cenário resulta em sentimentos como ansiedade, medo e fobia que, frequentemente, antecedem à expressão de comportamentos inusitados. O tratamento requer uma combinação de manejo ambiental e terapia medicamentosa (LINHARES et al., 2017).

Estas alterações influenciam tanto a qualidade de vida dos animais como das pessoas que convivem com eles, sendo uma das causas mais comuns de abandono e de eutanásia (DE SIQUEIRA et al., 2020). Os fármacos psicotrópicos agem no Sistema Nervoso Central (SNC) sobre a função psicológica e o estado mental. Este grupo inclui antidepressivos, tranquilizantes (ansiolíticos e antipsicóticos) e/ou alucinógenos (QUEMEL et al., 2021). 

Este trabalho objetiva avaliar o impacto farmacológico dos psicotrópicos cloridrato de trazodona, extrato de fungos da espécie Psilocybe cubensis e cloridrato de fluoxetina na modulação psicossocial de caninos (Canis familiaris) diagnosticados com transtornos compulsivos secundários e disfunções comportamentais associadas.  

2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1. Comportamento animal

No passado, os animais foram apontados como seres incapazes de manifestar sensações e sentimentos conscientemente, de forma que seus atos eram considerados resultado de uma atividade instintiva (DAL PONT et al., 2022). Hoje, sua capacidade mental de sentir e transmitir emoções é comprovada cientificamente e intitulada como senciência. Logo, atribuições antes consideradas exclusivamente humanas foram reconhecidas nos animais, como a capacidade de raciocínio, consciência, linguagem, memória, sociabilidade, dor e sofrimento (SILVA & JUNIOR, 2020; DAL PONT et al., 2022). 

Apesar do vínculo homem-animal oportunizar benefícios para ambos, a hipervinculação intensifica os sentimentos de dependência emocional e predispõe o animal ao processo de humanização. Todavia, os seres vivos apresentam diferentes necessidades e formas de pensar, assim como dispõem de mecanismos distintos para lidar com a percepção de estímulos externos, de modo que o entendimento das carências e exigências espécie-específicas implicam significativamente na qualidade de vida e bem-estar dos mesmos. Portanto, atribuir-lhes conveniências humanas ocultam a manifestação dos seus hábitos naturais (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020).

Ainda que não apresentem habilidade de descrever de maneira verbal, as suas emoções são transmitidas através de uma linguagem corporal e vocal que, ligadas à sua fisiologia neurológica, oferecem indícios marcantes do seu estado mental e emocional (QUARANTA et al., 2020). Dessa forma, a visão é o principal sentido utilizado para captar informações, orientar-se no espaço e correlacionar as ações direcionadas tanto a si mesmo quanto a terceiros. Assim, tornam-se capazes de exibir suas reações através de movimentos de cauda, posicionamento das orelhas, emissão de sons, expressões faciais, entre outros (LINHARES et al., 2017; DAL PONT et al., 2022).

Em ambientes inapropriados, estes indivíduos não exprimem as suas ações de forma natural. Isto torna-os susceptíveis à alterações psicogênicas, sendo elas consideradas uma das razões mais recorrentes de abandono e de eutanásia. O isolamento é um dos principais eventos que impulsionam atitudes destrutivas, inatividade, ansiedade ou comportamentos estereotipados. Gestos como lambedura excessiva do flanco e/ou dos membros, automutilação, perseguição da cauda, caça compulsiva a insetos ou sombras e agressividade são os males mais relatados entre os proprietários. Estas atitudes são equiparadas aos sinais de depressão nos humanos (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020).

2.2. Neurofisiologia do comportamento animal

O encéfalo, estrutura associada ao Sistema Nervoso Central, detém a função de receber, processar e integrar informações sensoriais, assim como responder a estímulos externos ou internos com reações, impulsos, movimentos musculares, secreção de substâncias e elaboração de comportamentos. Para o contexto comportamental, o córtex pré-frontal é associado à tomada de decisões, atenção, planejamento, inibição de impulsos, memória e flexibilidade cognitiva; e o sistema límbico é envolvido no regimento das emoções e da memória. Neste último, o hipocampo rege funções de memória e aprendizado; a amígdala, sentimentos de medo, prazer e agressividade; e o giro do cíngulo regula emoções, comportamento e informações de dor, desconforto (JUNIOR et al., 2022).  

Na maioria dos casos, a manifestação do comportamento alterado está sob ação de neurotransmissores e hormônios como serotonina, dopamina, ácido gama aminobutírico, ocitocina, glutamato, cortisol, hormônios gonadais, entre outros. A serotonina e a dopamina são neurotransmissores que atuam na regulação do sono, prazer, apetite, ansiedade, impulsividade e reatividade. Os sistemas serotoninérgicos e dopaminérgicos estão conectados, visto que a ligação da serotonina aos receptores 5-HT2 do córtex cerebral inibe a atividade da dopamina, assim como a ausência intensifica seus efeitos (ALMEIDA et al., 2020). 

De maneira geral, a serotonina impulsiona estímulos inibitórios ou estimulatórios em função da região do cérebro envolvida e da sua concentração. Enquanto isso, a dopamina e o sistema mesocorticolímbico atuam estimulando ou reduzindo a impulsividade. Suas atividades no organismo estão intimamente associadas à ocorrência de transtornos compulsivos e distúrbios de ansiedade e agressividade. Diante do exposto, estima-se que a redução da concentração de serotonina induz reações impulsivas e agressivas nos animais, devido ao consequente aumento de dopamina, a qual se mantém elevada antes, durante e após o ato (CUNHA et al., 2021). 

2.3. Distúrbios Comportamentais

O comportamento individual dos animais é dependente de fatores hereditários, ambientais, sexo e características próprias, de modo que o entendimento dos hábitos normais da espécie auxiliam a diferenciar o habitual do patológico (DE SIQUEIRA et al., 2020). Linhares e colaboradores (2017), por exemplo, descreveram a relação entre o posicionamento da cauda com as emoções dos caninos, onde o movimento amplo e elevado indicam felicidade e abaixadas entre os membros relacionam-se com o medo. Retrataram, ainda, que diferentes tons de sonorização/vocalização podem ser exprimidos em situações de isolamento, transtornos ou brincadeiras, impondo certa complexidade na interpretação. 

Flint e colaboradores (2018) afirmam que os animais de companhia apresentam um período sensível à sociabilização que varia de 3 a 14 semanas de idade. Neste intervalo, exposições a diferentes fatores e ambientes desempenham uma função significativa na modulação do comportamento adulto. Quando há carência de estímulo social e ambiental enquanto filhote, disfunções de comportamento e medo persistente podem ser manifestados a longo prazo. Isto vale tanto para indivíduos domesticados que apresentam resistência a novas experiências, quanto para os de vida livre que não foram adaptados a ambientes internos ou estimulados à convivência humana e demonstrações de afeto, revelando estados indesejáveis submetidos a tal.

Erros de manejo na fase de sociabilização, ociosidade e confinamento predispõem à maioria das alterações comportamentais. Condições de agressividade, ansiedade e compulsividade estão entre as disfunções mais comuns (SCHÄFER et al., 2021; ISAZA, et al., 2021). 

2.3.1. Distúrbios Compulsivos (DCs)

O distúrbio compulsivo (DC) ou comportamento estereotípico se refere a um ato corriqueiro (cavar, lamber, caminhar) manifestado excessivamente, direcionado a si mesmo, a objetos ou estímulos inadequados. De acordo com a Tabela 1, inúmeras estereotipias podem ser apresentadas, sendo classificadas de acordo com o tipo de ação e o seu alvo. Em geral, tais alterações procedem a circunstâncias estressantes, conflituosas e frustrantes, assim como mudanças repentinas nos contextos físicos, emocionais e manejo inadequado (DE SIQUEIRA et al., 2020; ISAZA et al., 2021).  

Em muitos casos, estas atitudes objetivam reduzir o nível de ansiedade em função da separação entre o animal e a sua figura de apego. No entanto, ocorre mais comumente devido a sentimentos de frustração, ociosidade e estresse, independente da presença do tutor. Algumas estereotipias são secundárias a intercorrências médicas, como doenças dermatológicas, neurológicas, infecciosas, metabólicas, entre outros. Portanto, o diagnóstico requer a observação dos sinais clínicos, anamnese e histórico detalhados (CARAMALAC, CHIMENES & PALUMBO, 2020).

Tabela 1. Classes de distúrbios compulsivos conforme Siqueira et al. (2020) e Isaza et al. (2021). 

ClassificaçãoCaninosFelinos
LocomotoresAndar em círculos, perseguir a cauda, congelamento, sobressaltos, ataques a objetos.Andar em círculos, agitação súbita, marcha compulsiva.
AlucinatóriosMorder o ar ou capturar moscas, contemplar o céu, paralisação.Olhar fixo para luzes e sombras.
AutodirecionadosLambedura excessiva das patas ou flanco, mutilação, esfregamento.Auto higiene excessiva, alopecia psicogênica e automutilação.
OraisLambedura excessiva de objetos ou do proprietário, sucção, alotriofagia.Sucção de pêlos, alotriofagia.

Além da predisposição genética e enfermidades antecedentes, sugere-se que alterações nos sistemas serotoninérgicos e dopaminérgicos estão associadas à fisiopatologia dos distúrbios compulsivos, visto que a administração de agonistas dopaminérgicos em dose elevada impulsiona o comportamento compulsivo, enquanto os antagonistas deste sistema suprimem tais efeitos (CUNHA et al., 2021; NETO, SANTOS & ALE, 2022). Os bloqueadores da recaptação de serotonina e norepinefrina, como os antidepressivos tricíclicos, minimizam a ansiedade que precede o quadro. No entanto, alterações de manejo e enriquecimento ambiental devem ser adotadas para minimizar o estímulo causador (CARAMALAC, CHIMENES & PALUMBO, 2020). 

O enriquecimento ambiental está relacionado à promoção de um ambiente interativo e favorável ao bem-estar do animal, em especial aqueles que permanecem a maior parte do dia em confinamento doméstico e isolamento social, visando minimizar o estresse e a ansiedade. Isto requer mudanças convenientes em fatores alimentares, sensoriais, cognitivos, sociais e/ou físicos, a fim de mantê-los entretidos (NETO, SANTOS & ALE, 2022).

2.3.2. Distúrbios de Ansiedade de Separação Animal

Refere-se a um sentimento aflitivo caracterizado por ansiedade, medo, angústia, frustração e pânico apresentados na ausência do seu dono ou quando ambos se encontram no mesmo ambiente, mas o cão não consegue se aproximar dele (DE SIQUEIRA et al., 2020). A Síndrome da Ansiedade por Separação Animal (SASA), por exemplo, representa um dos transtornos comportamentais mais comum em cães, tendo causas relacionadas à separação materna precoce, traumas ocorridos em qualquer idade ou hiper apego com o dono. Em sua maioria, os animais que experienciam a hipervinculação sofrem da síndrome. Ademais, fatores como idade, raça e sexo podem estar associados à predisposição da SASA, bem como animais de rua ou que residiram em canis em função do abandono e traumas vivenciados nestes locais (MENDES et al., 2021). 

Os comportamentos envolvidos na síndrome incluem vocalização excessiva antes e/ou durante o período de isolamento; destruição de objetos do animal, do dono ou de itens estruturais e domésticos; e micção ou defecação em locais indesejados (FONSECA et al., 2022). No entanto, vômito, ofegação, salivação, depressão e distúrbios compulsivos podem estar associados (DE SIQUEIRA et al., 2020). Outros sinais comumente observados em função do hiper apego incluem acompanhar o dono em todos os lugares da casa e buscar atenção constantemente, organizando sua rotina de forma que a figura de apego esteja sempre dentro do seu campo de visão. Todavia, diferentes distúrbios de ansiedade podem compartilhar dos mesmos padrões clínicos, de forma que o diagnóstico exige de avaliação profissional minuciosa. Importa determinar a frequência, duração e intensidade destes sinais (MENDES et al., 2021; FONSECA et al., 2022). 

A constatação dos componentes da síndrome é fundamental, sendo avaliados através da observação direta, relatos do responsável ou registros audiovisuais obtidos através de câmeras de vigilância, em especial nos momentos de isolamento (FONSECA et al., 2022). No entanto, indícios de tentativa de fuga (arranhadura em locais de saída), presença de urina ou fezes em local inapropriado, objetos mordidos e/ou despedaçados ou marcas de automutilação são sinais comumente notados pelo responsável ao retornar a casa (KARIMATA, PIM & DOMINGUES, 2021). Geralmente o ato destrutivo é julgado como uma conduta vingativa, mas se refere à lembrança afetiva do proprietário mediante ao cheiro contido nos itens escolhidos (DE SIQUEIRA et al., 2020). 

Em casos leves, associar metodologias de manejo e enriquecimento ambiental tende a ser eficaz (LINHARES et al., 2017). O enriquecimento ambiental compreende outra forma de minimizar os efeitos da ansiedade através da oferta de brinquedos e recursos interativos que mantenham o animal distraído durante o isolamento (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020). Todavia, o tratamento farmacológico com ansiolíticos, antidepressivos ou fitoterápicos é acrescido em cenários de maior gravidade ou em pacientes que não responderam às técnicas de ambientação (KARIMATA, PIM & DOMINGUES, 2021).

2.3.3. Agressividade

A agressividade é uma disfunção de comportamento notoriamente indesejada, considerada a maior causa de abandono dos animais de companhia. Este fato se dá em virtude da dificuldade de manejo dos indivíduos afetados e, principalmente, em função do risco de ataques a humanos e outros animais. Em geral, os atos agressivos sucedem ao sentimento de raiva ou medo, ou ainda, territorialismo e luta por alimento. Embora os mecanismos neurais ainda não sejam claramente estabelecidos, considera-se o envolvimento da serotonina em baixa concentração, representando um fator predisponente (CUNHA et al., 2021). 

Para os cães, os motivos envolvem medo, dominância, proteção, predação e agressão idiopática, onde a manifestação característica é o afastamento dos lábios com exposição dos dentes, associados ou não à rosnados e latidos (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020). Todavia, antes de cometer o ataque o animal tende a manifestar sinais de desagrado, como lamber o focinho, bocejar ou manter a extremidade da língua para fora, inicialmente. Caso não haja distanciamento ou cessação do estímulo causador, os indícios seguintes envolvem rigidez muscular, levantar a pata, virar o corpo, colocar a cauda entre os membros, olhar fixo, latir, rosnar, avançar e morder. No entanto, existem casos de agressão que não seguem estes parâmetros, ocorrendo rápido e precisamente (DE LIMA, 2023). 

Outra categoria ocorre em resposta à dor, onde o animal torna-se intolerante ao contato e comete o ataque (DE SIQUEIRA et al., 2020; SCHÄFER et al., 2021). 

2.4.Tratamento Farmacológico

Os medicamentos utilizados no controle de comportamentos atípicos agem sobre os neurotransmissores impulsionando alterações no estado mental. Estas características definem a classe dos psicotrópicos, como fármacos de ação sedativa, anti-depressivos, ansiolíticos e/ou alucinógenos. Normalmente, as condutas terapêuticas envolvem a administração de antidepressivos tricíclicos (ATC), inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e tranquilizantes benzodiazepínicos durante um período pré-estabelecido ou continuamente, com o objetivo de minimizar a excitação, ansiedade e impulsividade (DA SILVA & SUYENAGA, 2019; QUEMEL et al., 2021). 

2.4.1. Cloridrato de Trazodona

O cloridrato de trazodona é um fármaco derivado da triazolopiridina com mecanismo de ação associado ao antagonismo de receptores 5-HT2A e 5-HT2B, assim como agonista parcial dos receptores 5-HT1A, impedindo a ação e recaptação desses neurotransmissores na fenda sináptica (STAHL, 2009; KARHU, 2011). As interferências nas concentrações de serotonina e diminuição do ácido gama aminobutírico no córtex cerebral, conferem propriedades ansiolíticas e antidepressivas ao medicamento. Ademais, este fármaco ocasiona o antagonismo de receptores α1-adrenérgicos, α2-adrenérgicos e histamínicos em diferentes intensidades, além do bloqueio de canais de cálcio (MITTUR, 2011).

Segundo Orlando et al. (2016), o uso da trazodona em humanos oferece efeito antidepressivo, ansiolítico e hipnótico, assim como sedativo e ansiolítico eficiente em caninos. Todavia, haviam poucos relatos na espécie felina. No manejo de pacientes estressados, medrosos e/ou agressivos, estes efeitos tornam-se aliados significativos durante o atendimento clínico, pré ou pós-operatório, coleta de materiais destinados à análises laboratoriais, execução de procedimentos ambulatoriais, entre outros (ORLANDO et al., 2016; MURPHY et al., 2017). 

A alternativa de administração via oral viabiliza o uso do cloridrato de trazodona no ambiente domiciliar. Murphy (2017) e colaboradores também asseguraram a utilização deste fármaco como medicação pré-anestésica (MPA) em cães saudáveis sob dosagens de 5 a 7 mg/kg, nas 2 horas que antecedem a indução associada a um opiáceo. Outro estudo com cães determinou a sua farmacocinética e a eficácia em aplicação única pela via retal. Cada animal recebeu 8 mg/kg, manifestando efeito de sedação moderada cerca de 30 minutos após a administração, mantido até 12 horas, sem efeitos adversos (O’DONNELL et al., 2020).

2.4.2. Psilocibina

A psilocibina (O-fosforil-4-hidroxi-N,N-dimetiltripta) é uma substância sintetizada por uma diversidade de fungos do gênero Psilocybe sp., amplamente reconhecidos como cogumelos mágicos. Os atributos psicoativos desta droga estão associados à fórmula estrutural do seu metabólito ativo, a psilocina (N,N-dimetiltriptamina), semelhante à uma molécula de serotonina. Este fato lhe confere habilidade para atuar efetivamente nos receptores serotoninérgicos. Em humanos, a psilocibina apresenta qualificação terapêutica ao transtorno depressivo maior resistente, ansiedade e depressão em pacientes oncológicos, transtorno obsessivo compulsivo e vícios (LINARTEVICHI et al., 2021; JEFSEN et al., 2021; PEDICINI & CORDNER, 2023). 

As ações sobre o sistema serotoninérgico abrangem modulação comportamental sobre as emoções complexas, sobretudo àquelas relacionadas com a depressão. Em indivíduos depressivos não medicados, os receptores 5-HT²A apresentam expressão acentuada, sendo a serotonina a principal responsável pela sua inibição. Logo, os psicodélicos atuam como agonistas destes receptores, reduzindo os sinais de debilidade psicogênica (LINARTEVICHI et al., 2021). Sob o conceito de micro-dosagem, o volume administrado encontra-se abaixo do limiar psicodélico, sendo comprovadamente suficiente para o melhoramento da flexibilidade cognitiva e emocional (ISSERA, DE GREGORIO & GOBBI, 2021).

Em doses convencionais, Jefsen et al. (2021) descreveu que a administração única manifestou efeitos comportamentais agudos nos animais. Nos humanos, foram apontadas mudanças de percepção, como distorções em imagem, sons, alucinações e ilusões. Estes efeitos foram bloqueados com cetanserina, risperidona e haloperidol, fármacos classificados como antagonistas serotoninérgicos (PEDICINI & CORDNER, 2023). Contudo, os resultados a longo prazo foram positivos e duradouros frente aos sinais psicológicos, unindo-se a transformações persistentes na conectividade cerebral (JEFSEN et al., 2021). 

Em experimentos comportamentais envolvendo roedores e pequenos carnívoros, foram administrados doses de 0,25 a 10 mg/kg. Na dose elevada, efeitos simpatomiméticos leves foram observados. Em felinos houve o aumento dos reflexos espinhais monossinápticos, como de estiramento. Em contrapartida, os roedores apresentaram inibição do comportamento locomotor com sinais de ataxia (TYLŠ; PÁLENÍČEK & HORÁČEK, 2014). Em 2021, um estudo de Donovan e colaboradores certificou que após a administração intravenosa de psilocibina na dose de 0,08 mg/kg na espécie suína, 67% dos receptores 5-HT²A sofreram ocupação, comprovando sua capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica.

2.4.3. Cloridrato de fluoxetina

O cloridrato de fluoxetina é um inibidor seletivo da recaptação de serotonina (ISRS), utilizado na medicina humana como antidepressivo. No entanto, apresenta menor efetividade em comparação aos antidepressivos tricíclicos e outros medicamentos utilizados em pacientes deprimidos (DE CASTRO et al., 2021). Além das suas aptidões farmacêuticas, o uso em tratamento de transtornos neurológicos tornou-se comum em virtude da relativa ausência de efeitos adversos graves e baixo potencial de abuso. Outrora, reações como cefaleia, diarreia, boca seca, sudorese, sonolência e insônia podem ser observadas (SALINAS et al., 2012).  

O mecanismo de ação corresponde ao bloqueio seletivo da recaptação da serotonina, estimulando e prolongando a ação serotoninérgica. Todavia, quase não apresenta afinidade por outros receptores como os serotoninérgicos, adrenérgicos, dopaminérgicos, muscarínicos, histaminérgicos H1 e receptores do GABA α1-α2- e β-adrenérgicos. Com vista disso, também apresenta aplicabilidade em tratamentos de transtornos obsessivo-compulsivos, síndrome do pânico e bulimia nervosa (EVARISTA, DE OLIVEIRA & FERRAZ, 2019; SOUSA, MOURA & JUNIOR, 2022). 

Com a administração via oral a absorção e distribuição é bastante efetiva, de modo a atingir o pico de concentração plasmática dentro de seis e oito horas. O metabolismo é realizado no fígado, onde é convertida em norfluoxetina e outros metabólitos posteriormente excretados na urina (EVARISTA, DE OLIVEIRA & FERRAZ, 2019).

3. METODOLOGIA

Para a realização do experimento, os fármacos psicotrópicos cloridrato de trazodona, extrato de fungos da espécie Psilocybe cubensis e cloridrato de fluoxetinaforam testados em função da capacidade de modulação psicossocial de cães (Canis familiaris) domésticos machos e fêmeas, com raça, idade e peso corporal variados, com escore corporal desejável. O critério de avaliação foi baseado na frequência e intensidade dos sinais clínicos característicos dos transtornos compulsivos secundários e dos distúrbios psicogênicos associados, tais como agressividade e/ou dos distúrbios da ansiedade por separação animal.  

Um questionário auxiliar foi desenvolvido com base na literatura deste trabalho, com o objetivo de direcionar a coleta de informações relacionadas ao ambiente físico, social e emocional que o animal habita, assim como seu histórico, hábitos e manifestação de posturas específicas. Para sugerir a ocorrência de transtornos compulsivos, comportamentos apresentados de forma excessiva e independente da presença do responsável foram considerados. Posteriormente, os dados foram avaliados para sugestão de diagnóstico e conduta terapêutica. 

O tratamento dos animais foi consentido pelos respectivos representantes legais através de um termo de autorização e responsabilidade. Os mesmos foram designados para realizar a administração do medicamento conforme a prescrição indicada e relatar quaisquer alterações comportamentais ou clínicas observadas. Foi disponibilizado um questionário de evolução do tratamento, contendo escalas com intervalos de 0 a 10 a fim de quantificar a intensidade de comportamentos atípicos antes, durante e após o término da terapia proposta. 

Os animais mantiveram suas rotinas íntegras nos âmbitos ambientais, físicos, sociais e alimentares. Todavia, iniciativas de manejo comportamental foram implementadas de forma complementar ao tratamento farmacológico.

3.1 Cloridrato de Trazodona

O cloridrato de trazodona foi adquirido em farmácia convencional mediante  receituário controlado, fabricado por NOVAMED FABRICAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS LTDA, registrado e embalado por EMS S/A, sob a apresentação de comprimidos revestidos contendo 50 mg. Foi utilizada a dose de 5 mg/kg, administrada pela via oral uma vez ao dia, durante 15 dias consecutivos. 

3.2. Cloridrato de fluoxetina

Sob os mesmos termos, o cloridrato de fluoxetina foi adquirido em farmácia convencional, fabricado por NOVAMED FABRICAÇÃO DE PRODUTOS FARMACÊUTICOS LTDA, registrado e embalado por EMS S/A, sob a apresentação de cápsulas duras contendo 20 mg. Foi administrada via oral em dose correspondente a 2 mg/kg, uma vez ao dia, durante 15 dias consecutivos. 

3.3. Extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis

Para a confecção do extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis, foram utilizados cogumelos da cepa True Albino Teacher (TAT), desidratados e embalados a vácuo, produzidos e comercializados por COGUMELOS BR LTDA. O material foi fragmentado com um moedor, pesado com balança de alta precisão e encapsulado de acordo com a demanda dos pacientes. Foi atribuída uma dose de 3 mg/kg, administrada via oral, uma vez ao dia, durante 15 dias consecutivos. 

3.4. Delineamento experimental

Foram selecionados 8 cães com diagnóstico sugestivo para transtornos compulsivos secundários à outras alterações psicogênicas, como agressividade e distúrbios da ansiedade por separação. Os sinais clínicos corresponderam à lambedura excessiva das patas; lambedura excessiva de outras regiões do corpo; destruição de brinquedos, cama, recipientes e outros tipos de pertences do animal; destruição de itens pertencentes ao proprietário e destruição de itens domésticos.

Estes animais foram separados em 2 grupos de tratamento distintos: 

  • Grupo 1: Cloridrato de trazodona (n=4);
  • Grupo 2: Extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis (n=4);

Os animais tratados no grupo 1 e 2 foram submetidos ao tratamento convencional com cloridrato de fluoxetina posteriormente para comparar a qualidade das terapias experimentais. Os efeitos foram avaliados através de observação direta e indireta de parâmetros comportamentais fundamentados na literatura e registrados em um formulário de avaliação evolutiva do tratamento, numa escala de intensidade com intervalo de 0 a 10, comparando a manifestação dos sinais antes, durante e após o término do tratamento. Foi formulada uma tabela de escores para avaliação dos parâmetros não quantitativos. A análise estatística foi realizada através do teste ANOVA One-Way e os gráficos adquiridos através do programa GraphPad Prism. 

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1. Fatores Predisponentes

A manifestação de comportamentos atípicos são consequência de sentimentos de estresse, ansiedade e medo originados em um ambiente desfavorável (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020). Informações obtidas através do questionário inicial demonstraram que entre os 8 animais selecionados, 75% foram adquiridos através de resgate (25%) ou adoção (50%), sugerindo um histórico de abandono, traumas, separação maternal e/ou de outra figura afetiva. Estes 25% de cães resgatados ainda encontram-se em abrigos, apresentando maior susceptibilidade à manifestação destes transtornos.  

Flint e colaboradores (2018) afirmam que caninos e felinos atravessam uma fase de sociabilização, onde devem ser expostos a diferentes estímulos sociais e ambientais, de modo que o costume o faça agir com naturalidade em situações semelhantes no futuro. Desse modo, indivíduos com sociabilização carente ou ausente, encontram-se em estado de estresse, medo e ansiedade constantes diante de alterações na sua rotina, fazendo-o exprimir comportamentos inusitados. Sob o mesmo ângulo, animais adotados ou resgatados não foram sociabilizados ao ambiente doméstico, implicando na sua adaptação. Isto justifica a maior incidência de transtornos comportamentais nestes casos. 

Os fatores ambientais também influenciam na ocorrência, onde ambientes inapropriados inibem a expressão de ações naturais como latir, brincar, correr ou caçar. Isto torna-os susceptíveis à ociosidade, ansiedade, frustração e depressão, impulsionando comportamentos estereotipados (LINHARES et al., 2017; DE SIQUEIRA et al., 2020).  Estes caracteres, de forma isolada ou não, contribuem para a construção de um universo significativamente prejudicial à saúde mental desses animais, tornando-os candidatos convenientes à terapia medicamentosa e comportamental abordadas neste trabalho. 

4.2. Análise Diagnóstica

Com base nos dados coletados, os animais foram diagnosticados de forma sugestiva com transtornos compulsivos secundários aos distúrbios da ansiedade por separação e/ou agressividade e selecionados para terapia comportamental e medicamentosa. Com o objetivo de estabelecer a associação da impulsividade com os demais distúrbios psicogênicos, os mesmos foram diagnosticados a partir das suas manifestações clássicas.

Para sugerir o diagnóstico de distúrbios da ansiedade por separação, foram considerados os sinais característicos do distúrbio conforme Mendes e colaboradores (2021) & Fonseca e colaboradores (2022), tais como vocalização excessiva antes e/ou durante o isolamento ou distanciamento da figura de apego; eliminação inapropriada; destruição de objetos do animal, do tutor ou de utilitários domésticos; observação de marcas de fuga no chão, paredes, portas ou janelas; e acompanhar o responsável de um local a outro da casa com necessidade de atenção constante. O nível de euforia do animal no momento de chegada do responsável e a postura adquirida por ele nestas situações também foram vistos.

Segundo Karimata, Pim & Domingues (2021), a observação do ritual de saída do tutor, o ato de se despedir do animal e de corresponder à sua euforia no momento do regresso influenciam negativamente na evolução do distúrbio e, em todos os casos analisados, os responsáveis admitiram praticar tais condutas. Os sinais clássicos do distúrbio incidiram de forma variável. No entanto, os comportamentos de vocalização excessiva, perseguição constante da figura de apego e euforia foram relatados com unanimidade. 

Em relação aos animais sugestivamente diagnosticados como agressivos, foram avaliados quanto aos níveis de reatividade diante da presença, aproximação e/ou contato físico com pessoas ou animais conhecidos e desconhecidos de ambos os sexos, diante de situações em que estes indivíduos tocam em seus pertences ou alimentos e sob estímulos sonoros desagradáveis. O termo “reatividade” foi atribuído a posturas como mostrar os dentes, rosnar, avançar e/ou atacar. Linhares (2017) e colaboradores descreveram diferentes motivações para agressividade em caninos. Dentre os casos avaliados, os cães apresentaram reatividade diante de objetos, indivíduos e situações desconhecidas, remetendo este comportamento ao instinto de defesa em resposta ao medo. Noutras situações, a reação foi manifestada sob estímulo de dominância ou agressão idiopática. 

Por fim, as estereotipias foram identificadas considerando o histórico do animal, o contexto ambiental em que ele vive e fatores como o tipo do comportamento e se ele ocorre apenas quando o responsável ou figura de apego está ausente (ansiedade por separação) ou se independe da presença do mesmo (compulsão). Os sinais de impulsividade mais recorrentes foram lambedura excessiva das patas ou de outras regiões do corpo, auto-higiene excessiva. Com menor incidência, foram observados coceira excessiva, esfregamento e caça a insetos e sombras. 

4.3. Tratamento

De acordo com Almeida e colaboradores (2020), os distúrbios psicogênicos estão correlacionados à atividades irregulares de neurotransmissores, especialmente serotonina e dopamina. De modo geral, níveis regulares de serotonina no córtex pré-frontal (CPF) e sistema límbico desencadeiam a redução dos sentimentos de angústia e medo presentes nos distúrbios da ansiedade por separação. Do mesmo modo, o comportamento agressivo é inversamente proporcional ao nível de serotonina no cérebro. Em contrapartida, a dopamina aciona a impulsividade e a sua concentração é maior durante o declínio da serotonina. Este fato explica a manifestação de comportamentos compulsivos secundários distúrbios psicogênicos que envolvem o sistema serotoninérgico. 

Os animais selecionados foram submetidos ao tratamento farmacológico com  drogas de diferentes mecanismos de ação: o cloridrato de trazodona atua um antidepressivo atípico; o extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis contendo psilocibina, um alucinógeno natural clássico que atua como agonista serotoninérgico; e o cloridrato de fluoxetina é um inibidor seletivo da recaptação da serotonina (ISRS). Após o término do tratamento, os resultados foram avaliados através do preenchimento do questionário de evolução do tratamento. 

4.3.1. Cloridrato de Trazodona

Os animais tratados com cloridrato de trazodona obtiveram êxito na redução de comportamentos clássicos dos distúrbios da ansiedade por separação, na agressividade e nos comportamentos compulsivos (Gráfico 1). Para este medicamento, as mudanças começaram a ser observadas ainda nos dias iniciais ao tratamento, evoluindo progressivamente para redução da frequência e intensidade. Foram observados efeitos de sedação leve 30 minutos após a administração, retomando à normalidade cerca de 1h e 30 minutos depois, mas mantendo efeitos de tranquilização e estabilização de comportamentos impulsivos durante as 24 horas seguintes. Com o término do tratamento, alguns parâmetros retrocederam imediatamente, sugerindo a necessidade de administração contínua deste fármaco. 

Gráfico 1: Efeito do cloridrato de trazodona sobre os transtornos compulsivos secundários, agressividade e distúrbios de ansiedade por separação em função do tempo. 

4.3.2. Psilocibina

Os animais tratados com extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis contendo psilocibina não apresentaram redução imediata dos sinais clínicos, mas os benefícios começaram a ser observados após 7 dias de tratamento, evoluindo progressivamente para a redução da frequência e intensidade (Gráfico 2). Houve uma resposta favorável para os sinais clássicos dos distúrbios da ansiedade por separação e transtornos compulsivos secundários à longo prazo. Para a agressividade, os resultados foram menos efetivos quando comparados ao cloridrato de trazodona. No entanto, não foram observados efeitos adversos. 

Embora apresente menor significância estatística em relação ao Grupo 1, não houve o retorno dos sintomas ao finalizar o tratamento, mantendo determinada estabilidade. Este fato sugere que houve a modulação persistente de tais comportamentos. Diante do exposto, acredita-se que com ajuste na dose e intervalo de tratamento, ocorra a obtenção de resultados ainda mais efetivos. 

Gráfico 2: Efeito do extrato de Psilocybe cubensis sobre os transtornos compulsivos secundários, agressividade e distúrbios de ansiedade por separação em função do tempo.

4.3.3. Cloridrato de Fluoxetina

Os efeitos do cloridrato de fluoxetina foram observados no início do tratamento, de forma quase que imediata. Os comportamentos estereotípicos foram atenuados, assim como os sinais característicos de seus distúrbios iniciais. No entanto, os animais agressivos obtiveram maior controle da reatividade com o cloridrato de fluoxetina do que com os demais tratamentos (Gráfico 3). 

Foram administradas doses de 2 mg/kg pela via oral, uma vez ao dia, durante 15 dias consecutivos (duas semanas). Assim como o cloridrato de trazodona, houve a regressão dos efeitos após o término do tratamento, evidenciando sua necessidade de uso contínuo ou por um maior período de tempo. Os pacientes apresentaram redução ou ausência de apetite como efeito colateral, sendo manifestado ainda nos primeiros dias de tratamento. Isto representou um fator limitante, induzindo à preferência pelo tratamento experimental. 

Gráfico 3: Efeito do cloridrato de fluoxetina sobre os transtornos compulsivos secundários, agressividade e distúrbios de ansiedade por separação em função do tempo. 

5. CONCLUSÃO

Houve a constatação de que sociabilização carente, humanização excessiva e ambientes físico, social e emocional desequilibrados são fatores-chave para desencadear os sentimentos de medo, angústia, estresse, ansiedade e ociosidade que antecedem distúrbios psicogênicos primários e secundários nos cães. O manejo comportamental associado a administração de medicamentos com propriedades ansiolíticas, antidepressivas e tranquilizantes foi eficiente para todos os animais (n=8) envolvidos. Entre eles, o cloridrato de trazodona apresentou resultados imediatos e efetivos quanto a redução da frequência e intensidade dos comportamentos indesejados, todavia a evolução retrocedeu ao cessar a administração, sugerindo a necessidade de uso contínuo do mesmo. Embora o extrato de fungos do gênero Psilocybe cubensis tenha expressado a redução dos comportamentos tardiamente e com menor significância, não houveram efeitos colaterais e seus impactos foram persistentes após o término da terapia, sugerindo que um ajuste de dose e tempo de tratamento ofereçam resultados ainda melhores e duradouros. Enquanto isso, o cloridrato de fluoxetina atuou eficientemente sobre os transtornos primários e secundários, com atuação semelhante ao cloridrato de trazodona. Contudo, expressou redução de apetite como efeito colateral. 

6. REFERÊNCIAS

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1Graduada em Medicina Veterinária pela UENF – e-mail: rviana.let@gmail.com

2Mestre em Ciência Animal pela UENF – e-mail: theresamouram@gmail.com

3Discente do Curso Medicina Veterinária na UENF – e-mail: dtorresjess@gmail.com

4Graduada em Medicina Veterinária pela UENF – e-mail: thamirisvargas@gmail.com

5Discente do Curso de Medicina Veterinária na UENF – e-mail: lydiamansur97@gmail.com

6Doutor em Ciência Animal pela UENF – e-mail: dr.brenogarone@gmail.com

7Coorientadora – Mestre em Produção Animal pela UENF – e-mail: famvet1996@hotmail.com

8Orientadora – Docente do Curso de Medicina Veterinária na UENF – e-mail: fernandaanest@uenf.br