EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO: O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) COMO INSTRUMENTO DE IMPLEMENTAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11305040


Anna Karinne de Castro Neves Matos1
Fabiana Oliveira Canavieira2
Kaciana Nascimento da Silveira Rosa3


RESUMO

No campo dos direitos humanos existe uma diferenciação explícita entre a igualdade material e a igualdade formal. Adota-se a isonomia como um norte a ser atingido, buscando-se assim equilibrar as relações entre os sujeitos, para que haja igualdade de oportunidade e de condições, uma vez que existem desigualdades que precisam ser sanadas ou pelo menos amenizadas, para que exista uma igualdade no acesso a direitos fundamentais, como é o caso da educação. Nesse contexto, o Atendimento Educacional Especializado torna-se um serviço essencial para a materialização de direitos humanos voltados ao acesso universal a educação, uma vez que se trata de uma tentativa de tornar as atividades escolares acessíveis aos educandos público-alvo da educação especial, que muitas vezes precisam de suporte para acompanhar as tarefas desenvolvidas na escola, como é o caso de acessibilidade de locomoção, acompanhamento em LIBRAS ou braile, bem como outras estratégias, inclusive tecnológicas que permitam a essas pessoas um pleno acesso a educação em sala de aula.

Palavras-chave: Acesso à educação; Direitos humanos; Educação inclusiva.

ABSTRACT

In the field of human rights there is an explicit differentiation between material equality and formal equality. Isonomy is adopted as a guideline to be achieved, thus seeking to balance relationships between subjects, so that there is equality of opportunity and conditions, since there are inequalities that need to be remedied or at least alleviated, so that there is equal access to fundamental rights, such as education. In this context, Specialized Educational Assistance becomes an essential instrument for the materialization of human rights aimed at universal access to education, since it is an attempt to make school activities accessible to students with physical or intellectual disabilities, who They often need support to follow the tasks carried out at school, such as mobility accessibility, monitoring in LIBRAS or Braille, as well as other strategies, including technological ones that allow these people full access to education in the classroom.

Keywords: Access to education; Human rights; Inclusive education.

1 INTRODUÇÃO

O preconceito contra pessoas com deficiência (qualquer tipo), ainda se apresenta como um problema enraizado na sociedade. Embora existam iniciativas que sejam bastante frutíferas buscando isonomia no tratamento dessas pessoas, o Brasil ainda se encontra distante de uma conjuntura que favoreça uma igualdade de oportunidades e de acesso a direitos fundamentais a pessoas que apresentam algum quadro de deficiência, seja essa física ou intelectual.

Nesse sentido tem-se políticas de direitos humanos com o propósito de nivelar as relações humanas, com igualdade formal e material, equilibrando o acesso a direitos e a participação de grupos minoritários na vida pública. É nesse contexto que surge a defesa da ideia de que “todas as pessoas tem direito à educação”.

Diante de tais tentativas de implementação de direitos humanos no Brasil no campo da educação, questiona-se: de que modo o acesso à educação, um direito universal, pode ser materializado dentro do contexto de sala de aula?

Para responder esse questionamento, adotou-se na presente pesquisa a hipótese de que um pleno funcionamento da figura do Atendimento Educacional Especializado (AEE) pode ser um potente instrumento de inclusão, permitindo a participação e aprendizagem de pessoas com deficiência nas mais diversas atividades desempenhadas no ambiente escolar. Este serviço identifica e elabora recursos pedagógicos e com acessibilidade, deixando de lado as restrições para a participação efetiva dos alunos de acordo com cada necessidade.

O método adotado durante a pesquisa foi o dedutivo, partindo-se de uma abordagem macro, para que depois fosse abordado o tópico específico a ser trabalhado. Foi adotada também a técnica da documentação indireta, fazendo-se uso de pesquisa bibliográfica para juntar informações acerca do tema, valendo-se de livros, produções acadêmicas, leis e outros documentos cabíveis.

Assim, este artigo apresenta, inicialmente, o histórico da educação inclusiva no sistema educacional brasileiro. Assim, o intento foi mostrar como a legislação e as políticas públicas voltadas para a educação inclusiva foram aplicadas no Brasil e que resultados foram obtidos. Por fim, a pauta versada foi sobre como o AEE contribui para a implementação de políticas de inclusão no sistema educacional brasileiro.

2 A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO

A educação, entendida como um direito de todos, é tida como resultado de uma luta histórica pelos direitos humanos, visando igualdade e oportunidades para todas as pessoas, independentemente de suas limitações ou classe social. Diante de tantos capítulos de exclusão e segregacionismo ao longo da história, esse tipo de luta passou a ser um grande impulsionador de conquista de direitos (Arcanjo, 2013).

Inicialmente, destacamos o envolvimento de grande parte da sociedade civil com algumas políticas inclusivas. As crianças com deficiência eram excluídas ou esquecidas, sem qualquer tipo de atenção. A criação da filantropia surgiu no final do século XIX com o Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, comandada por Benjamin Constant. Assim como, o Instituto dos Surdos-Mudos, criado em 1857, voltado para a educação de surdos e para um trabalho de reabilitação

Por volta de 1854, durante o Brasil imperial, começou-se a levantar certos temas para discussão, como os direitos relativos a pessoas com deficiência, de origem intelectual ou física. Foi nessa época que sugiram instituições para meninos cegos e surdos, como é o caso do Instituto Benjamin Constant (IBC). Essas iniciativas, conforme afirma Ferreira e Guimarães (2006), não eram políticas públicas, mas foram iniciativas importantes para a educação de crianças com deficiência.

Nesse contexto, não havia ainda o entendimento de que as crianças com deficiência poderiam se inserir num ambiente educacional regular. A diversidade ainda não era uma marca da sociedade. Tratava-se de uma conjuntura que era caracterizada pelo tratamento discriminatório, tanto em aspectos étnicos, religiosos e econômicos que não se encaixavam nos padrões estabelecidos na época.

Pessoas com deficiência ( eram alvo de discriminação, muitas das vezes chegando a sofrer maus tratos e isolamento social. A ideia que se tinha de que essas pessoas poderiam ser ajudadas em ambientes específicos acabou criando uma barreira que as separava do convívio com o resto da sociedade, permitindo a criação de estigmas de rejeição (Arcanjo, 2013).

A discussão sobre educação inclusiva só iniciou a partir da década de 1940, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que dizia que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, ao consagrar “o direito de todas as pessoas à educação” para que haja desenvolvimento das suas capacidades (Brasil, 1988).

Os pais de crianças com deficiência não conseguiam matricular filhos em instituições de ensino regular, por isso passaram a conduzir ações em busca do direito à educação, numa perspectiva jurídica. Foi então que surgiram as “escolas e classes especiais”, com o objetivo de atender essas crianças. Separava-se então em educação regular e educação especial (Ferreira e Guimarães, 2006).

Desde os anos 1960 o Brasil discute acerca dos princípios básicos que são a base da Educação Especial. A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) indicam que a educação de crianças com “necessidades educacionais especiais” (termos da época em que as referidas leis foram escritas, passou a permitir a inclusão de pessoas com deficiência em salas do ensino comum).

Em 1964 é criada uma unidade da APAE (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) que é o Centro Ocupacional Helena Antipoff. Neste Centro havia capacitação profissional para Deficientes Intelectuais.

Já em 1993, foi criado o Plano Decenal de Educação para Todos, que visava cumprir até 2003, conteúdos de aprendizagem adequados com o propósito de atender às necessidades básicas da vida de crianças, jovens e de adultos. Delimitou-se ao plano da educação básica e tinha como propósito “eliminar o analfabetismo e universalizar o ensino fundamental”.

As escolas encontraram assim um norte para educar de forma efetiva todas as crianças, inclusive aquelas que apresentavam algum tipo de deficiência. Em 1994 na Conferência Mundial de Educação Especial que ocorreu em Salamanca, na Espanha, governantes e organizações internacionais firmaram um documento que deixava em evidência o compromisso para com a “Educação para Todos”, garantindo direitos no campo educacional sem distinções.

Com base na Declaração de Salamanca passou-se a ter a garantia de que crianças com deficiência (estudantes com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento e com Altas habilidade/superdotação entre outras) podem ser matriculadas em escolas de ensino regular, recebendo educação de qualidade, contando com profissionais com uma formação adequada, que os habilite a lidar com todo tipo de diversidade, inclusive formas diferentes de aprendizado.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) assegurou que todo aluno tem direito à educação, de preferência, no ambiente regular de ensino. O texto deixa claro como finalidade da formação dos profissionais da educação que sejam atendidos os objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase de desenvolvimento do educando (Brasil, 1996).

Entretanto, mesmo com os avanços, ainda existe um preconceito latente que revela o quanto ainda é difícil para uma determinada parcela da sociedade lidar com a diversidade humana. Muitas vezes a diferença ainda é vista como algo que incomoda, causando desconforto e até mesmo desavenças quando a necessidade de lidar com essas questões é imposta por meio de leis (Arcanjo, 2013).

Há na atualidade um paradigma sobre aceitação social e individual na inclusão dessas pessoas, paralelamente ao preconceito que existe de forma clara ou velada (Maia, 2011). A luta pelos direitos humanos permitiu que fossem implementados direitos como o direito à igualdade de oportunidades no campo da educação, permitindo que os responsáveis pela política educacional lancem programas pautas na premissa de que “todas as pessoas tem direito à educação” (Brasil, 1988).

As pessoas com deficiência, de ordem cognitiva ou comportamental, eram segregadas em instituições fechadas, uma vez que eram vistos como uma ameaça para a sociedade. Há ainda uma nítida separação entre as pessoas com deficiência e o restante da sociedade, uma vez que infelizmente ainda permeia o ideário popular a noção de que pessoas com deficiências cognitivas ou comportamentais perturbam a ordem (Stainbeck, 1999).

Nas escolas privadas essas questões também devem ser consideradas, tendo em vista que estas são avaliadas e cobradas pela família, que além de pais ou responsáveis também são considerados consumidores. De acordo com o art. 7º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional tem-se que “o ensino é livre à iniciativa privada”, mas deve advir “o cumprimento das normas gerais da educação nacional e do sistema de ensino” (Brasil, 2001).

3 Políticas públicas pautadas na implementação de direitos humanos no campo da educação inclusiva

Com o advento da LDB, alterações significativas foram realizadas na educação, como propostas de gestão e financiamentos, dos programas de avaliação educacional, investimento na formação de docentes, para melhorar a qualidade da educação nos mais diversos níveis de ensino (Sá, 2018). Tendo como base as contribuições do Ministério da Educação entende-se que a base da busca foi a ideia de que a educação pode ser alcançada com a excelência de todos os níveis de ensino.

Sobre isso, entende a EC nº 59/2009:

(…) a condição do Plano Nacional de Educação (PNE) passou de uma disposição transitória da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) para uma exigência constitucional com periodicidade decenal, o que significa que planos plurianuais devem tomá-lo como referência. O plano também passou a ser considerado o articulador do Sistema Nacional de Educação, com previsão do percentual do Produto Interno Bruto (PIB) para o seu financiamento (BRASIL, 2009, p. 5)

Tem-se então que tais normativas passaram a ser o centro da discussão educacional no Brasil, servindo como norteadoras da implementação dos direitos humanos no campo da educação, trazendo a debate temas como diversidade, inclusão e valorização da docência, servindo como ponto de partida para a concretização de políticas públicas nas esferas estaduais, municipais e federais.

Essa aplicação se dá tanto no polo dos gestores e profissionais que trabalham na escola quanto no polo dos estudantes, pais e também de toda a sociedade onde essas relações estão inseridas. Por isso, de acordo com Sá (2018) é importante que todos os atores envolvidos nesse processo educacional participem ativamente na implementação dessas políticas públicas.

A educação não se resume apenas ao contexto escolar, uma vez que tudo o que é aprendido e repassado no âmbito social, nas mais diversas instituições que integram a vida em sociedade, é resultado do que é ensinado e observado nas relações interpessoais entre os agentes. Por esse motivo, a educação que está dentro do contexto escolar, precisa de políticas que não menosprezem todos esses fatores, tendo em vista que estão todos interligados (Oliveira, 2010).

Para que seja alcançado esse objetivo, se faz necessário tratar acerca do que o PNE trata acerca da educação inclusiva, tendo em vista que estabelece que os estudantes devem ser atendidos de uma forma especializada na rede pública, com metas a serem atingidas. A ideia do PNE é que as escolas tenham um perfil emancipador, oferecendo uma educação inclusiva que tenha por base uma integração que seja democrática e isonômica, sabendo como tratar a todos de acordo com suas particularidades, sejam elas pessoas com deficiências, pessoas pobres, idosos ou minorias étnico-raciais (Vizim, 2009).

Nessa toada, as mudanças nas políticas públicas que são voltadas à inclusão remetem ao direito da diferença, com igualdade de oportunidade para o acesso a educação, que deve ser entendido como um dos pilares para uma plena materialização dos direitos humanos no campo educacional, oferecendo escola de qualidade para todos (Vizim, 2009).

Nessa perspectiva, os efeitos visualizados nesse processo que se tem de descentralização são essenciais para a implementação de políticas públicas, pois passam a ser melhor trabalhadas de modo a visar especificamente cada localidade, com suas peculiaridades, podendo assim implementar projetos que sejam mais adequados aos anseios sociais de uma determinada comunidade (Silva, 2014).

Quando se fala em educação inclusiva, pensando nas minorias e nas suas diferenças, as políticas públicas devem ser formuladas tendo como objetivo promover educação em níveis de igualdade para todos, na medida de suas desigualdades, para que possa haver isonomia. Assim foi pensada a política nacional de educação especial na perspectiva da educação inclusiva, tendo como intento direcionar a participação e a aprendizagem de estudantes, nas mais diversas classes, de uma forma transversal (Sá, 2018).

Busca-se, através da mencionada política, que foi implementada pelo MEC no ano de 2003, a difusão de sistemas educacionais que sejam inclusivos, proporcionando um processo de formação de gestores e de docentes que sejam preparados para lidar com os diversos tipos de estudantes, ofertando um projeto educacional especializado onde se tenha garantia da acessibilidade.

O Brasil, em meado dos anos 2000, ocupava o 7º lugar no percentual de pessoas com deficiência. Cerca de 23,91% da população brasileira se declarava com algum tipo de deficiência. Houve um aumento de 107% de matrículas de alunos com deficiência no Brasil após a LDB de 1996, sendo um valor bastante expressivo para o que se espera de uma educação inclusiva (Laplane e Caiado, 2012).

A ideia central da educação inclusiva é que ela seja uma prática de cunho institucional e não político-partidária. Por isso, espera-se que seja aderida por todos os governos, contando com metas traçadas pelos mais diversos planos de governabilidade, independentemente do espectro ideológico vigente (Sá, 2018). Mede-se como êxito quando se vê que houve uma maior permanência de alunos nas escolas e, dentro desses números, leva-se em conta os números relativos aos alunos que se enquadram como pessoa com deficiência.

Garante-se, nesse contexto, a educação para todos como um direito que é público e subjetivo, expresso pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 208, III, sendo a base do atendimento educacional especializado para pessoas com deficiência. A abordagem nos sistemas regulares de ensino é tratada pela Lei 9.394/96, que trata sobre a educação especial no art. 59, ao dizer: “[…] os sistemas de ensino assegurarão a este grupo de educandos: currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica, para atender às suas necessidades”.

Assim, para que haja de fato inclusão, é urgentemente necessário que haja também uma transformação da escola, com novas perspectivas acerca dos rumos pedagógicos a serem adotados, visando métodos que permitam lidar com as diferenças apresentadas pelos estudantes.

4 A importância do Atendimento Educacional Especializado (AEE) nas políticas de inclusão para crianças com deficiência

É importante compreender o quanto é necessário o trabalho realizado por profissionais que desempenham o Atendimento Educacional Especializado (AEE). Num primeiro momento, isso somente se torna possível porque ocorre uma diferenciação entre a igualdade material e a igualdade legal. Ou seja, para que seja alcançada uma igualdade que amenize as desigualdades. E uma das figuras fundamentais nesse processo é o AEE (Mauro, 2018).

O profissional que atua nas funções atinentes ao apoio escolar tem a sua atividade disciplinada pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI ou Estatuto da Pessoa com Deficiência), de 2015, no art. 3º, XIII, ao dispor que:

(…) profissional de apoio escolar: pessoa que exerce atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência e atua em todas as atividades escolares nas quais se fizer necessária, em todos os níveis e modalidades de ensino, em instituições públicas e privadas, excluídas as técnicas ou os procedimentos identificados com profissões legalmente estabelecidas;

Esse profissional tem o exercício da sua função voltada aos cuidados com as crianças com deficiência, dentro da sala de aula, com o intuito de facilitar a experiência escolar. Quando a escola deixa evidente a necessidade de que haja um profissional de apoio escolar para que seja garantida a participação de crianças com deficiência em todas as atividades escolares com igualdade de condições.

Na LBI não está disposto, de forma específica, a formação exigida para o desempenho da mencionada função. Os Estados têm a liberdade de editar normas próprias sobre o assunto. Na prática, entretanto, acaba havendo muitas lacunas e muitas escolas acabam não fazendo a solicitação para que possa contar com um profissional para o atendimento educacional especializado (Mauro, 2018).

Um dos cenários observados, que já se tornou comum em muitas escolas (embora não haja previsão normativa sobre a pauta) é a seleção de estagiários de curso de licenciatura para desempenhar tarefas de apoio escolar. Entretanto, essa prática se mostra como problemática, uma vez que de um lado, na maior parte das vezes, se trata de estagiários que apenas querem aperfeiçoar o seu preparo para a vida prática e raramente, ou quase nunca, possuem a bagagem necessária para lidar com crianças com deficiência, cuidado este que demanda conhecimentos especializados para que a função seja plenamente exercida, atendendo às necessidades das crianças de forma efetiva.

No art. 208, III, da CF/88 tem-se a previsão acerca do atendimento educacional especializado. Combinando-se com a previsão disposta pela LBI tem-se a disposição sobre a necessidade de que o Estado assegure dentro das escolas o mesmo atendimento, seja na realização de projetos ou nos demais serviços que são promovidos dentro do cotidiano escolar, permitindo acesso dos mais diversos alunos a plena participação nas atividades educacionais que são ofertadas.

A organização de recursos voltados a acessibilidade deve ser levada em conta sempre que projetos escolares forem propostos. Espera-se que na hora de organizar o planejamento de atividades no âmbito escolar seja considerado o uso de tecnologia assistiva, de atendimento educacional especializado e outras práticas pedagógicas que sejam inclusivas.

Se uma escola assume o compromisso com o ensino regular, que é tido como um instrumento de difusão do acesso universal a educação, ela tem como dever lidar com as particularidades de cada um, para que de fato haja um pleno acesso a educação para todos. Por isso, é preciso que haja políticas públicas e projetos de inclusão para pessoas com deficiência, oferecendo o espaço e as condições necessárias que se sintam inseridas no ambiente escolar (Batista e Mantoan, 2006).

Nesse sentido, o atendimento educacional especializado corresponde a um grupo de pessoas capacitadas, que façam uso do seu conhecimento acerca de educação inclusiva para oferecer recursos e atividades de cunho pedagógico, dentro de uma instituição escola, com o propósito de atender alunos que tenham alguma deficiência, atendimento que deve ser garantido em todos os níveis de ensino. O AEE garante que haja suporte especializado para que as crianças com deficiência participem do processo de aprendizagem e das atividades realizadas na escola (Galery, 2017).

O Ministério da Educação (MEC) prevê, dentro do contexto do AEE, que deve haver o ensino da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) para pessoas com deficiências auditivas, bem como tecnologias assistivas, adaptação de material para pessoas com deficiência física, apoio e letramento para pessoas com deficiências intelectuais (Mauro, 2018).

O AEE deve ser executado, em regra, na sala de recursos multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino regular, não substituindo classes comuns, podendo ser realizado em “centros de atendimento” da rede pública ou de instituições comunitárias ou confessionais, que sejam vinculadas a Secretaria de Educação (Brasil, 2009).

O atendimento educacional especializado deve ocorrer de uma forma complementar ao ensino regular, devendo ser atendidas às particularidades das crianças com deficiência, auxiliando nas dificuldades que estas costumam sentir na classe regular, como ensino de LIBRAS, braile, mobilidade e educação física especializada (Mantoan, 2006).

Isso posto, o atendimento educacional especializado se apresenta como uma importante ferramenta de inclusão, que permite reduzir desigualdades e permite a educandos com deficiência um acesso mais amplo às atividades que são desenvolvidas em sala de aula. Esse tipo de política é um passo fundamental para a materialização de direitos humanos que estão previstos em convenções internacionais e que foram introduzidos no ordenamento jurídico brasileiro, em busca de uma educação mais eficaz e inclusiva.

5 CONCLUSÃO

O acesso à educação, sem distinção e com tratamento isonômico dado a todos, é um direito humano solidificado de forma expressa na Conferência Mundial de Educação Especial que ocorreu em Salamanca em 1994. As previsões realizadas nessa conferência, que foram compiladas num documento chamado Declaração de Salamanca, tiveram reflexo na legislação brasileira dos anos seguintes, como é o caso da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996), Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (2001), Estatuto da Pessoa com Deficiência (2015), dentre outras leis.

O que se busca através de tais convenções internacionais e leis nacionais é estabelecer um equilíbrio na relação entre os cidadãos e um acesso igualitário a direitos humanos, tendo em vista que existe toda uma gama de desigualdade que torna as atividades da vida pública mais acessíveis para uns e menos para outros. A ideia central é que essas desigualdades sejam sanadas ou reduzidas, permitindo a todos que desfrutem da vida em sociedade, tendo pleno acesso aos direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal, como é o caso de uma educação universal e inclusiva para todos.

Nessa conjuntura, o Atendimento Educacional Especializado (AEE) se apresenta como um potente aliado na implementação de direitos humanos no campo da educação. Trata-se de uma política que visa a acessibilidade, dentro do contexto escolar, para crianças, jovens e adultos com deficiência, que durante muitas atividades escolares precisam de ajuda para acompanhar as tarefas. Por isso, nesses casos, presta-se auxílio através de acessibilidade de locomoção, acompanhamento em LIBRAS ou braile, uso de softwares ou outras ferramentas tecnológicas que permitam a pessoas com deficiência uma participação mais efetiva nos projetos desenvolvidos na escola.

Dessa forma, uma vez previsto na legislação nacional e internacional a previsão de que o acesso a educação deve ser universal, pleno e inclusive, cabe a cada escola, pública ou privada, oferecer totais condições para que todos os alunos recebam uma educação de qualidade, que seja acessível a todos, através da implementação de políticas inclusivas e da redução de desigualdades.

REFERÊNCIAS

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1Autora e mestranda pela Universidade Federal do Maranhão

2Profa. Dra. e Orientadora pela Universidade Federal do Maranhão

3Profa. Dra. pela Universidade Federal do Maranhão, Especialista em Educação Especial