DIREITO DO CONSUMIDOR: UM ESTUDO ACERCA DA INADIMPLÊNCIA NO FINANCIAMENTO DE VEÍCULOS NO BRASIL¹

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8070401


Elaine Peixoto Rodrigues Almeida vasconcelos2
Jackson Cordeiro de Almeida3


RESUMO

A presente pesquisa discorreu acerca da inadimplência no financiamento de veículos à luz do Direito do Consumidor, que no decorrer dos últimos anos o mercado brasileiro vem estimulando aos consumidores a aquisição de automóveis. A partir do incentivo industrial e abertura de crédito houve um expressivo aumento de vendas, bem como, um crescimento de inadimplentes. Diante disso, foi elaborado o seguinte questionamento: o que leva o consumidor brasileiro ao inadimplemento de financiamento de veículo? Posto visto, seu objetivo geral buscou analisar as prováveis causas mais correntes para o inadimplemento de financiamento de automóveis à luz do Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8078/90. E seus objetivos específicos dedicaram em contextualizar a relação de consumo e a compra de veículos pela modalidade de financiamento, estudar a legislação que tutela as relações consumistas e seu posicionamento quanto aos casos de inadimplência e apresentar os abusos nos contratos de financiamento e as alternativas para viabilizar a redução dos casos de inadimplência. A metodologia adotada foi a pesquisa qualitativa através da associação dos métodos de procedimentos da pesquisa documental e bibliográfica, tendo por amostra o Código do Consumidor, a doutrina e a jurisprudência. Por conseguinte, ficou evidenciado que a inadimplência não pode ser tratada como um ato unilateral da vontade do devedor, precisando ser consideradas as situações de taxas de juros altos e práticas abusivas constantes em contratos de financiamento de veículos que impactam significativamente de forma negativa contribuindo para uma futura inadimplência.

Palavras Chave: Inadimplemento. Compras de Veículos. Financiamento. 

 1 INTRODUÇÃO

No Brasil, a economia tem passado por importantes mudanças que vêm facilitando e proporcionando ao consumidor inúmeras opções de consumo, dentre elas o financiamento de bens. Sendo, a busca de ascensão de status pela obtenção de bens cada vez melhores, uma marca do mercado consumidor que incentiva a disponibilização de crédito mais fácil para a aquisição de produtos. Desta forma, o objeto analisado neste estudo foi especificamente o financiamento de veículos automotivos e a situação de inadimplência do consumidor.

Considerando o alto custo de vida no país, o consumidor brasileiro possui enorme dificuldades para acumular capital para a aquisição de determinados bens móveis e imóveis, recorrendo com grande frequência alguma modalidade de crediário no mercado financeiro: compra através de cartão de crédito, parcelamento em cheques pré-datados (pouco utilizado), consórcio e o financiamento. 

Nos casos de compra de veículos, apesar das taxas de juros geralmente serem altas, há uma preferência pelo financiamento em detrimento do consórcio, pois nesta modalidade de crédito, o consumidor após a aprovação, realiza a compra e já sai com o bem nas mãos. Todavia, é muito comum que o sonho do carro próprio se torne um pesadelo e o consumidor, com dificuldades em quitar as parcelas vencidas do empréstimo, com frequência incorre ao inadimplemento, o que não apenas afeta as partes, mas todo o mercado consumidor.

Considerando que a problemática se centrou na questão do aumento da inadimplência do financiamento de veículos, que de acordo com dados divulgados pelo Banco Central do Brasil, em 2022 teve um aumento de 5,1%. Posto visto, o que leva o consumidor brasileiro ao inadimplemento de financiamento de veículo?

Neste contexto, seu objetivo geral buscou analisar as prováveis causas mais correntes para o inadimplemento de financiamento de automóveis à luz do Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8078/90. Seguido de seus objetivos específicos que dedicaram em contextualizar a relação de consumo e a compra de veículos pela modalidade de financiamento, estudar a legislação que tutela as relações consumistas e seu posicionamento quanto aos casos de inadimplência; bem como, apresentar os abusos nos contratos de financiamento e as alternativas para viabilizar a redução dos casos de inadimplência.

Para alcançar o que foi proposto em seus objetivos foi adotada como metodologia a pesquisa qualitativa e com procedimentos a pesquisa bibliográfica e a documental. Constituiu em sua amostra o Código do Consumidor. Sendo fonte de estudo a jurisprudência, a doutrina e publicações científicas nos últimos dez anos em base de pesquisas como SciElo, Google Acadêmico e repositórios de universidades.

Neste enredo, a realização deste estudo se justifica pela observância de reiteradas situações de abusos praticados pelas instituições financeiras face ao consumidor, enfatizando a importância do Código de Defesa do Consumidor, para saber quais as medidas a serem tomadas em casos de práticas abusivas realizadas pelas instituições financeiras que estão relacionadas ao financiamento de veículos. 

No empenho de realizar uma investigação minuciosa sobre a temática, o presente estudo está organizado em três etapas, que são: apresentação de principais conceitos e uma linha cronológica para colocar em evidência a contextualização do aumento do número de inadimplência quanto ao financiamento de veículos; depois, um breve estudo sobre o posicionamento da legislação que tutela as relações consumistas nos casos de inadimplência; e por último, debruçou sobre os abusos nos contratos de financiamento e as alternativas de soluções.

Por fim, a revisão literária permitiu aferir que a inadimplência mesmo sendo de responsabilidade do consumidor, precisam ser averiguadas as situações impostas nos contratos, evitando o abuso nas relações de mercado. Desta forma, remete ao desempenho da função do estado como ente regulador das relações sociais e de consumo, sendo necessário um maior controle estatal da situação posta, no desejo de resguardar e proteger a parte hipossuficiente, no entanto sem inviabilizar o crescimento de mercado.

2 METODOLOGIA  

A metodologia compreendida como um ramo do saber, é aplicada na construção do conhecimento científico, onde estabelece todos procedimentos de estudo com regras e técnicas bem definidas objetivando a obtenção de informações através da observação, leituras, formulação de suposições e realização de prática que geram conhecimentos novos (GIL, 2007). 

Desta forma, a metodologia definiu passo a passo o que foi necessário a ser seguido para a estruturação deste estudo. Sendo assim, foi adotada a metodologia da pesquisa qualitativa, que priorizou em todo o seu percurso o aprofundamento e explanação sobre a inadimplência em financiamento de veículos. A pesquisa qualitativa se caracteriza por práticas que transformam a realidade visível em informações representativas, incluindo notas, entrevistas, fotografias, registros e lembretes, sem centra-se em números e medidas (LAKATOS; MARCONI, 2017).

Como procedimento de estudo, foram adotadas práticas da pesquisa bibliográfica e documental. A primeira, realizou investigação e análise em artigos, livros e demais documentos já publicados sobre a temática, de forma descritiva, conforme contribuição de Prodanov e Freitas (2013).  Enquanto a pesquisa documental voltou para a análise do Código de Defesa do Consumidor e demais escritas oriundas da jurisprudência e da doutrina.

A amostra foi retirada de artigos e materiais online contidos em sites como a Google Acadêmico, SciElo e demais repositórios de instituições superiores, sendo as palavras chave utilizadas: Financiamento de automóveis e inadimplência; abuso contratual e direito do consumidor, além do próprio Código de Defesa do Consumidor, estando em consonância com o ensinamento de Gil (2007, p. 30): “Amostra é a parcela de arquivos e artigos que forneceram os dados […]”. 

Desta forma, atendendo critérios de seleção foram definidas as publicações utilizadas, além das normas e materiais da jurisprudência e da doutrina, sendo selecionadas 12 publicações que contemplaram os seguintes filtros de pesquisa: escrito em português, publicados nos últimos dez anos e na íntegra, que ofereceram contribuições relevantes e pertinentes como o tema objeto de estudo. Após a escolha, foram realizadas leituras interpretativas e críticas, fichamentos e finalizando com a presente exposição dos resultados alcançados. 

3 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DAS RELAÇÕES DE CONSUMO 

Esta seção vem tratando de um levantamento de alguns fatos históricos relevantes para as relações de consumo, tendo por marco inicial a Revolução Industrial, mais especificamente aquela ocorrida na Inglaterra no século XVIII até a atualidade e finaliza sua exposição com a apresentação de alguns conceitos necessários para o desenvolvimento das ideias que aqui apresentadas neste estudo.

A partir da Revolução Industrial Inglesa ocorrida no século XVIII, a atividade econômica iniciou um crescimento em proporções ainda não vistas até então, avançando na linha do tempo até os dias atuais, com a criação de um mundo globalizado como concebido pela presente sociedade por todas as partes do planeta. Todavia, a partir da primeira Revolução Industrial inglesa, o capitalismo trouxe novas formas de relações jamais assistida pela humanidade.

Desta forma, de lá para cá, passando por diversas fases o capitalismo veio estabelecendo novas formas de relações interpessoais, comerciais e financeiras, caracterizadas cada vez mais pela redução de fronteiras físicas e facilitando a aquisição tanto de produtos como serviços, que antes não eram possíveis devido ao fator artesanal dos produtos e serviços da época. 

A Revolução Industrial não teria começado na Grã-Bretanha e se espalhado para o restante do mundo sem o desenvolvimento simultâneo de uma sociedade de consumo dinâmica. A sustentabilidade da industrialização fez os trabalhadores se tornarem, ao longo do tempo, também consumidores. Diferentemente dos escravos e dos servos, que não faziam compras de roupas, tendo apenas uma peça de vestimenta, os assalariados acabaram comprando um guarda-roupa! (FERGUSON, 2012 apud COSTA, 2014, p. 4).

Então, como exposto acima o grande salto do capitalismo não reside apenas nas transformações na linha de produção, mas também no entendimento que ele gerou uma parcela de população de consumidores, que agora detentores de algum capital poderia consumir, o que era antes impossível para a população escrava, ou até mesmo, dos servos. Esta nova realidade gerou demanda de mercado e surgimento de uma nova classe socioeconômica popularizada, “consumidores”.

Entretanto, esta nova classe, “os consumidores”, esteve por longos anos desprovida de proteção diante da classe dos empresários, que a duro custo passaram a reivindicar seus direitos e ser visto pelo estado.  E é nos Estados Unidos da América que ocorreram os primeiros movimentos em defesa do direito do consumidor, ainda no final do século XIX foi promulgada a Lei Sherman ou “Sherman Anto Trus Act”, que entre outras coisas reprimia as fraudes do comércio e monopólios (SOUZA, 2018).

Desta forma, na história norte-americana em defesa do interesse do consumidor a Lei Sherman foi a primeira legislação neste sentido; depois dela foram surgindo uma série de leis caracterizaram a sociedade norte-americana como uma daquelas que primeiro buscou proteger os consumidores como forma de equilibrar as forças entre a classe empresária e os cidadãos norte-americanos: 

Os primeiros movimentos consumeristas de que se tem notícia originaram-se nos EUA, no final do séc. XX […] 1891 – surgimento da New York Consumers League, primeiro órgão de defesa do consumidor, fundado por Josephine Lowell; 1907 – Criação do Meat Inspect Act, a fim de inspecionar e controlar a comercialização de carne. Em 1914, foi a Criação do Federal Trade Comission; em 1936, foi criado o Consumers Union, que tornou-se o maior órgão de proteção do consumidor do mundo (GUGLINSKI, 2019, p. 5).

Posto visto, a sociedade norte-americana logo cedo procurou se proteger contra as investidas do capitalismo presentes nas relações de consumo, procurando prevenir e erradicar tais práticas, sendo que ações acima descritas não foram as únicas, havendo mais medidas efetivas nessa direção. Todavia, o que precisa ser considerado é o fato dos Estados Unidos ser a maior nação capitalista e comitantemente, também é a nação com maiores medidas de proteção ao consumidor.

Enquanto nos Estados Unidos a proteção ao consumidor já estava bem avançada, na Europa ela só foi estabelecida após a Segunda Guerra Mundial, graças à necessidade de cooperação internacional para a recuperação do continente, na qual a presença americana foi fundamental para desenvolver relações consumeristas mais seguras para os cidadãos europeus (GUGLINSKI, 2019), o que atendia as perspectivas das instituições financeiras norte-americanas que tinham comprometidos com a recuperação do velho continente.

Com a globalização dos mercados e aumento dos tratados de comércio nas últimas décadas, houve a necessidade de elaborar leis que reforçassem a proteção ao consumidor. A Resolução nº 39/248 de 1985 da ONU foi um expoente mundial para reconhecer a vulnerabilidade do consumidor e incentivar a criação de leis em diversos países.

 No Brasil, o marco fundamental foi a Carta Magna de 1988, que positivou o direito do consumidor em seu artigo 5º, XXXII, e a competência concorrente de legislar sobre o assunto no artigo 24, VIII. Atualmente, as relações de consumo podem servir de instrumento para a realização de diversos interesses, comerciais ou pessoais, e a definição de fornecedores e consumidores está presente no Código de Defesa do Consumidor.

Importante salientar que a realidade atual permite que as relações de consumo sirvam de instrumento para a realização dos mais diversos interesses, sejam comerciais ou pessoais. Assim, verifica-se que tiveram vários momentos históricos dos tratos consumeristas na relação comercial, que figura de um lado os fornecedores e de outro os consumidores. A definição destas duas figuras está atualmente presente no Código de Defesa do Consumidor.  

Art. 1° O presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social, nos termos dos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias. Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista (BRASIL, 1990, online).

A Lei nº. 8078/1990, denominada como Código do Consumidor, veio representar o maior avanço da legislação brasileira na regulação das relações consumeristas no país na contemporaneidade, onde a figura do consumidor ficou assegurada como parte hipossuficiente, sendo necessário está sob a tutela do Estado. Sendo assim, o Código do Consumidor veio inaugurar uma nova forma de tratamento com o consumidor, como pessoa de direito nas relações de consumo.

Além dos conceitos acima apresentados, também é necessário abordar outros que são pertinentes ao tema, como financiamento, consórcio entre outros. Por conseguinte, o financiamento é conceito econômico que pode integrar vários contratos, sendo o mútuo o principal deles, mas não é uma categoria jurídica. O financiamento para a compra de veículos automotivos pode ser dividido em três categorias, as quais serão tratadas de maneira respectiva: 

Consórcio: A espécie de contrato denominada consórcio, tem, por sua natureza, a ideia de possibilitar que consumidores possam realizar a aquisição de veículos por meio do autofinanciamento. Isso significa que são formados grupos, pelas administradoras de consórcio, que se interessem pela aquisição da mesma espécie de bem, contemplando cada integrante conforme os ditames do contrato. Regido pela Lei nº 11.795 de 08 de outubro de 2008, a modalidade de contrato consórcio é definida da seguinte maneira: 

Art. 2º Consórcio é a reunião de pessoas naturais e jurídicas em grupo, com prazo de duração e número de cotas previamente determinados, promovida por administradora de consórcio, com a finalidade de propiciar a seus integrantes, de forma isonômica, a aquisição de bens ou serviços, por meio de autofinanciamento (BRASIL, 2013). 

Nota-se que esta espécie de contrato possui como finalidade propiciar a aquisição de bens ou serviços. Para efeitos deste estudo o objeto de tais contratos são os veículos automotivos, de forma isonômica. Ou seja, as obrigações dos integrantes são equivalentes e o interesse do grupo prevalece sobre o individual. 

Crédito Direto ao Consumidor – CDC: O Crédito Direto ao Consumidor é uma modalidade de financiamento automotivo que se dá entre uma financeira e a pessoa interessada, não envolvendo a fornecedora do veículo em questão. O Crédito Direto ao Consumidor é uma espécie de alienação fiduciária, portanto, que visa a compra de determinado bem em prestações. Isso significa que ao realizar esse tipo de negócio jurídico está sendo acordado um contrato de financiamento. 

A alienação fiduciária em garantia foi instituída na lei que disciplinou o mercado de capitais. A alienação fiduciária em garantia tem como função principal garantir as operações realizadas pelas empresas de financiamento e investimento, popularmente conhecidas como ‘financeiras’, interessando-nos em especial o chamado ‘crédito direto ao consumidor’. (OLIVEIRA, 2014, p. 7). 

A criação da modalidade contratual de alienação fiduciária foi efetuada pela Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965. Entretanto, tal legislação é específica para o mercado de capitais e, por isso, o Decreto-Lei nº 911, de 01 de outubro de 1969, estabeleceu normas particulares para o procedimento de alienação fiduciária, alterando alguns dispositivos da norma precedente. Ademais, é fundamental que esse acordo siga as regras previstas no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor.

Importante ressaltar que, nesse tipo de relação, o comprador participa de dois contratos: um contrato de compra e venda firmado com o vendedor do veículo e outro contrato de financiamento estabelecido com o banco que financia a aquisição do veículo. Dessa maneira, o bem objeto do acordo fica alienado ao banco, pois o veículo é dado como garantia para quitação do crédito em caso de inadimplência.

Destaca-se que nesse tipo de relação, o consumidor participa de dois contratos. Um é de natureza de compra e venda, firmado com a revendedora do veículo e o outro é de natureza de financiamento, junto ao banco que fornece o crédito para realização daquele. Por conseguinte, há alienação fiduciária do bem em garantia. Ou seja, o veículo objeto contratual fica alienado ao banco, assim, o carro é dado em garantia para a quitação do crédito em caso de inadimplemento. 

Porém, é preciso ficar atento ao caput do artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece critérios e garantias em relação às parcelas já pagas, impedindo a perda total das prestações quitadas em benefício do credor, reconhecendo que este não pode ser expropriado do montante do valor já pago, o que de certa forma daria deveras grandes vantagens econômicas as instituições credoras:

Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado (BRASIL, 1990). 

Portanto, a Lei nº 8.078 de 1990 se apresenta no cenário em que ocorrem os financiamentos automotivos para gerar um equilíbrio entre as partes. A condição de lado vulnerável do consumidor poderia estimular que os credores agissem de forma arbitrária, injusta e imoral, favorecendo o enriquecimento ilícito. 

4 ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO E AS RELAÇÕES DE CONSUMO 

A relação jurídica de consumo é o assunto desta seção que tece aspectos importantes para a compreensão deste tipo de relação no mercado de consumo e a forma como o Direito vem a regulamentando; traz as principais teorias contemporâneas que versam a respeito, em especial, nos contratos de financiamento de veículos, com destaque para a situação de inadimplemento.

A relação jurídica que existe em razão do vínculo de duas partes, onde de um lado está o fornecedor e do outro o consumidor, passa a ser regida por meio de lei ou mesmo vontade humana, vindo a se concretizar pelo fornecimento de um determinado bem ou pela prestação de determinado serviço, visando à satisfação de interesses. Assim, apenas a relação jurídica realmente tem interesse no direito, sendo o vínculo por ele resguardado.  

 A relação jurídica de consumo possui três elementos: o subjetivo, que são as partes envolvidas (consumidor e fornecedor); o elemento objetivo, que é denominado produto ou serviço; e o elemento finalístico, onde o consumidor adquire ou utiliza o produto ou serviço como destinatário final (CASTRO, 2018). 

Para que ocorra a relação de consumo devem estar presentes todos elementos subjetivos (Os elementos subjetivos fornecedor e consumidor somente poderão se constatados, quando um se encontrar em contraste com o outro, ou seja, caso a pessoa física ou jurídica esteja em situação jurídica contraposta à de outro sujeito que se enquadre na concepção de fornecedor, à luz do Código de Defesa do Consumidor, e vice-versa), e dessa forma a norma jurídica possa incidir na relação. Assim, em uma parte da relação jurídica deve estar presente o fornecedor, e, na outra, o consumidor.

Segundo Filomeno (2005 apud CASTRO, 2014) a relação de consumo abrange duas partes, o que adquire o produto ou serviço (consumidor), e, o fornecedor ou vendedor de um produto ou serviço (produtor / fornecedor). No que diz respeito à satisfação de uma necessidade do consumidor, esta abrange a produção de bens de consumo e também a prestação de serviços, de forma a se submeter às condições dos produtores dos bens e serviços. 

Deste modo, entende-se que por esta razão o consumidor é visto como vulnerável.  Tendo o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor definido como consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, tal enfoque pode perder um elemento essencial, que no fundo, é o que justifica a existência da própria disciplina da relação de consumo: a subordinação econômica do consumidor.   

Deste modo, surge a Teoria da Vulnerabilidade que admite que o consumidor é a parte vulnerável na relação de consumo e, por isso, deve receber proteção especial do direito, inclusive em relação ao seu inadimplemento quando for o caso. Sendo amplamente aplicada nas diversas áreas do direito, incluindo o direito do consumidor, para explicar a relação desigual entre as partes envolvidas em uma negociação ou transação. 

Essa teoria parte do princípio de que, em qualquer relação de consumo, é o consumidor que está em uma posição mais fraca e vulnerável, enquanto o fornecedor ou produtor possui um maior poder econômico e informacional. Em caso de inadimplemento do consumidor, o fornecedor passa a justificar medidas mais restritivas de cobrança, como a imposição de multas, juros elevados e até mesmo a rescisão do contrato. Em resumo, busca equilibrar a relação de consumo e garantir a proteção dos consumidores em um mercado cada vez mais complexo e desafiador.

Da interpretação do art. 6°, inc. V, do CDC, surgiram duas teorias: a teoria da imprevisão e a teoria da base objetiva. Em relação a teoria da imprevisão, entende-se que abre a possibilidade de resolução ou revisão do contrato quando da ocorrência de fatos novos e imprevisíveis às partes, alheios à vontade. Esta teoria, então, busca resguardar e proteger o consumidor em situações em que o inadimplemento ocorre em razão de acontecimentos imprevisíveis ou inevitáveis, como desastres naturais ou crises econômicas.

Deste modo, a teoria da imprevisão é um importante instrumento para a revisão e resolução de contratos diante de eventos extraordinários e imprevisíveis que impactam na execução do pacto. Ela é baseada na cláusula rebus sic stantibus e está intimamente ligada ao princípio da boa-fé objetiva. É aplicável aos contratos de execução contínua, de trato sucessivo ou de execução diferida, mas não aos contratos de execução imediata. 

Embora se assemelhe ao inadimplemento por caso fortuito e força maior, a teoria da imprevisão difere desses institutos. O Código Civil de 2002 prevê a teoria nos artigos 478, 479 e 480, exigindo a ocorrência de eventos extraordinários e imprevisíveis que ensejam a onerosidade excessiva para a aplicação da teoria. O artigo 479 possibilita a modificação equitativa do contrato para evitar sua resolução, e o artigo 480 prevê a aplicação da teoria em relação a contratos unilaterais. 

A validade de cláusulas que limitam ou proíbem a aplicação da teoria é discutível, já que pode ser considerada violação à função social do contrato. Já a teoria da base objetiva do negócio não leva em conta as condições externas que, de forma não previsível, culminam com o inadimplemento, assim leciona Leonardo de Medeiros Garcia: 

Assim, na teoria da base objetiva do negócio jurídico formulada por Karl Larenz não interessa se o fato posterior era imprevisível, o que realmente interessa e se o fato superveniente alterou objetivamente as bases pelas quais as partes contrataram alterando o ambiente econômico inicialmente presente. Isto é, para essa teoria, não interessa se o evento era previsível ou imprevisível, não se pretendendo, então, a aspectos subjetivos. 

A teoria da base objetiva do negócio jurídico foi adotada pela corrente majoritária da doutrina jurídica brasileira, bastando que seja caracterizada a onerosidade através da alteração das circunstâncias intrínsecas às finalidades contratuais e sem ser necessária a análise da previsibilidade do fato. A Corte Superior se pronunciou nesse sentido sobre o assunto: 

Comercial e Processual civil. Arrendamento mercantil. Indexação em moeda estrangeira (dólar) – Crise cambial de janeiro de 1999. Aplicabilidade do art. 6º, inciso V, do CDC. Onerosidade excessiva caracterizada. Boa fé objetiva do consumidor e direito de informação. Necessidade de prova da captação de recurso financeiro proveniente do exterior. Cobrança antecipada do valor residual garantido. Descaracterização do contrato. Aplicação do CDC. – O preceito insculpido no inciso V do artigo 6º do CDC dispensa a prova do caráter imprevisível do fato superveniente, bastando a demonstração objetiva da excessiva onerosidade advinda para o consumidor. […]- O Código de Defesa do Consumidor aplica-se às operações de leasing. Recurso Especial a que se nega provimento. (grifo nosso) (SALES, 2017, p. 47).

Sendo assim, a revisão judicial só é possível em situações em que a alteração das circunstâncias seja tão grave e imprevisível que torne a execução do contrato excessivamente onerosa ou impossível para uma das partes. É necessário que a mudança seja alheia à vontade das partes contratantes e que comprometa o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Assim, por exemplo, se as condições econômicas do país mudam drasticamente e isso afeta a capacidade do devedor de cumprir suas obrigações, pode haver motivo para revisão judicial. Da mesma forma, desastres naturais, mudanças climáticas, crises econômicas globais, epidemias e outras situações imprevisíveis e extraordinárias podem autorizar a revisão dos contratos (CESTARI, 2018).

No entanto, cabe ressaltar que a revisão judicial é uma medida excepcional e que deve ser aplicada com cautela, a fim de preservar a segurança jurídica e os princípios da boa-fé e da liberdade contratual. É importante que os contratos sejam cumpridos, salvo em casos realmente excepcionais em que a revisão judicial se torne necessária para evitar prejuízos graves a uma das partes.

A teoria da pressuposição no inadimplemento de financiamento de veículo é um argumento jurídico utilizado pelos credores em casos de não pagamento do financiamento pelo devedor. A teoria afirma que, ao aceitar o financiamento do veículo, o devedor pressupõe que terá capacidade financeira de cumprir com as obrigações assumidas no contrato. Assim, caso haja inadimplemento, o credor pode alegar que o devedor agiu com má-fé ao pressupor que teria condições de pagar as parcelas do financiamento (CESTARI, 2018).

A teoria da pressuposição é uma forma de responsabilizar o devedor pelo não cumprimento do contrato, apesar de existirem outras circunstâncias que possam ter levado ao não pagamento das parcelas do financiamento.

A teoria do adimplemento substancial é de construção jurisprudencial, não tendo previsão expressa na legislação. Esteia-se na boa-fé objetiva e na função social do contrato para sustentar a manutenção do vínculo contratual válido, ainda que o devedor não tenha cumprido perfeitamente com todas as obrigações do contrato, contentando-se com o adimplemento da maioria das disposições contratuais. Por esta teoria, é incabível a proposição de ação de busca e apreensão por conta do inadimplemento de número pouco expressivo de parcelas, desde que o devedor. 

Em caso de inadimplemento, o devedor fiduciante poderá se valer de procedimentos extrajudiciais alternativas previstos em lei de modo a impedir preventivamente ou obstar a configuração da inadimplência e os consecutivos efeitos nocivos ao contrato. A cessão de crédito, alienação a terceiro e a renegociação de dívidas (GARBI, 2014).

 Nestas hipóteses, o devedor, percebendo-se inadimplente ou em sua iminência almeja fazer uso destes negócios jurídicos a fim de afastar a mora. É possível, por exemplo, o pagamento da dívida do devedor fiduciário por outrem, contanto que seja este avalista, fiador ou terceiro interessado, o qual se sub-rogará, de pleno direito no crédito e na garantia constituída pela alienação fiduciária (art. 6°, Decreto Lei no 911), Lei no 4.728/1965 e o Código Civil Brasileiro nos termos do art. 1368-A. 

Além disso, o devedor fiduciante também pode buscar a renegociação da dívida com o credor fiduciário, desde que este esteja disposto a fazê-lo. A renegociação poderá envolver a redefinição das condições de pagamento, ajustando-as às possibilidades financeiras do devedor, com eventual redução do valor da dívida, e a possibilidade de constituição de garantias adicionais, como fianças ou outros tipos de garantias reais ou pessoais.

Em caso de cessão de crédito, o devedor fiduciário poderá ceder a terceiro os seus direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária, desde que o credor fiduciário concorde expressamente com essa cessão, e que o terceiro cessionário seja capaz de assumir as obrigações decorrentes da operação fiduciária.
Todas essas alternativas, no entanto, estão sujeitas às condições previstas em lei e no próprio contrato de alienação fiduciária, devendo ser realizadas com cautela e com o acompanhamento de um advogado especializado na matéria. situação, além de preservar os direitos e garantias do devedor fiduciante e do credor fiduciário (GARBI, 2014).

Teoria da abusividade do contrato: de acordo com essa teoria, caso o consumidor não consiga arcar com as prestações do financiamento, é possível questionar a validade do contrato devido a cláusulas abusivas, que possam estar causando o desequilíbrio contratual e levando ao inadimplemento.

O Código de Defesa do consumidor veio estabelecer a possibilidade de controle judicial dos contratos com vistas ao equilíbrio nas relações de consumo. Garantindo ao consumidor a nulidade ou modificações de cláusulas contratuais que não garantam os direitos básicos do consumidor conforme é estipulado em seu art.  6°. CDC determina:  

Art. 6° São direitos básicos do consumidor: […] V – a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas (BRASIL, 1990). 

Na concepção de Humberto Theodoro Júnior é possível abstrair três hipóteses de revisão judicial: a) quando forem adotadas práticas e cláusulas abusivas pelo fornecedor; b) no caso em que ficarem acordadas prestações desproporcionais, gerando lesão ao consumidor; c) na superveniência de fatos posteriores a firma do contrato que tornem as prestações excessivamente onerosas. Observa-se que não se trata da mera desvantagem no contrato, mas é necessária a presença de uma disparidade significativa a configurar lesividade ou excessiva onerosidade. 

5. EM VIAS DE FATO O DIREITO NAS SOLUÇÕES DE IMPASSES E CONFLITOS NA SEARA CONSUMERISTA

As relações entre fornecedor e consumidor estão regulamentadas no Código de Direito do Consumidor, a Lei nº 8.078/90, que estabelece um conjunto de direitos e deveres que visam a garantir a proteção do consumidor no mercado de consumo. Por conseguinte, serão apresentadas algumas de relações de consumo, onde as instituições financeiras, mesmo sendo regulamentadas, algumas práticas por elas realizadas em contrato podem contribuir, e muito, para o advento da inadimplência do consumidor, bem como, algumas maneiras de solução à luz do Direito.

Pode-se citar as cláusulas abusivas, sendo aquelas que impõem aos consumidores ônus excessivo, desproporcionalidade na distribuição das obrigações ou limitação indevida de seus direitos e garantias. O Código do Consumidor apresenta um rol exemplificativo no artigo 51, como as que estabelecem obrigações excessivas ou iníquas para uma das partes, ou que impeçam o amplo exercício dos direitos e garantias conferidos pelo contrato.

Também pode ser citadas as cláusulas que preveem a renúncia por parte do consumidor de seus direitos ou que estabelecem a arbitragem compulsória como única forma de solução de litígios; ou ainda, cláusulas estabelecem a nulidade ou a redução proporcional do preço na hipótese de rescisão unilateral por parte do consumidor, ao passo que no caso de rescisão por parte do fornecedor, este mantém o direito ao recebimento integral da contraprestação, entre outras (THEODORO JUNIOR, 2011 apud SALES, 2017).

Por outro lado, o próprio artigo 51 do referido instituto prevê ainda que, na hipótese de constatação de cláusulas abusivas em contratos de adesão, o consumidor poderá se valer da via judicial para pleitear sua nulidade, bem como a restituição dos valores eventualmente pagos. Porém, a declaração de nulidade de uma cláusula abusiva não tem o condão de invalidar todo o contrato, a menos que a ausência da cláusula em questão decorra de ônus excessivo a uma das partes.

Os juros remuneratórios também constituem um fator que pode contribuir para o surgimento da inadimplência do consumidor. Para tanto, a fim de regulamentar as taxas de juros, estes são submetidos a SELIC – taxa média dos financiamentos diários apurados no Sistema Especial de Liquidação e Custódia. Todavia a jurisprudência não se limita a tal referência, como consta na Súmula nº 382/STJ que apenas à cobrança de juros superiores a 12% (doze por cento) ao ano não constituía em ilegalidade e nem tão pouco indicava abusividade (BRASIL/STJ, 2008).

A comissão de permanência, criada pela Resolução nº 15/1966 do Conselho Monetário Nacional, constitui um encargo com objetivo remunerar as instituições financeiras pelos custos adicionais que elas têm ao manter em suas carteiras os créditos vencidos e não quitados pelo cliente, como, por exemplo, aportes de capital que precisam ser realizados pelos bancos para que possam atender às exigências regulatórias de adequação de seus níveis de liquidez e solvência.

Por sua vez, é do entendimento de que a comissão de permanência só pode ser cobrada em caráter excepcional e quando houver previsão contratual expressa de sua incidência, sob pena de configurar enriquecimento sem causa por parte das instituições financeiras. Além disso, a cobrança desse encargo deve ser proporcional aos custos efetivamente suportados pelos bancos, sob pena de caracterizar abuso do poder econômico e violação dos princípios da transparência e boa-fé contratual (CESTARI, 2018).

Desta forma, a comissão de permanência também pode ser vista como uma penalidade imposta aos devedores que descumprem seus contratos, uma vez que, embora o valor desse encargo seja calculado sobre o saldo devedor atualizado, ele pode incidir de forma cumulativa sobre o montante devido originalmente, o que pode levar a um acúmulo de dívidas impagáveis ao longo do tempo.

Outros encargos que oneram o contrato de financiamento são as tarifas de cadastro e a tarifa de avaliação do bem, criadas em 2008 pela Resolução nº 3,158 do Conselho Monetário Nacional, todavia só poderá ser cobrada de acordo com os termos do CDC que estabelece sua realização a partir do conhecimento e da permissão do consumidor e está expressa no contrato.

Muitas vezes, as tarifas são incluídas de forma abusiva no contrato, sem que haja uma clara informação ao consumidor sobre as suas finalidades e valores.
A jurisprudência tem se posicionado no sentido de considerar que a tarifa de cadastro é devida apenas em casos em que há efetiva prestação de serviço por parte do banco, como análise de crédito, investigação cadastral e emissão de relatórios sobre a situação financeira do cliente.

Além disso, a tarifa deve ser informada ao consumidor de forma clara e precisa, permitindo que ele possa fazer uma escolha consciente sobre a contratação do serviço. Já a tarifa de registro, que é cobrada quando o veículo é registrado em nome do comprador, tem gerado muitas controvérsias, especialmente quando o banco cobra o valor integral da tarifa, mesmo que ela esteja inserida no contrato de financiamento como uma obrigação do devedor (SALES, 2017).

Nesses casos, o consumidor pode requerer a devolução do valor cobrado indevidamente. De modo geral, é importante que o consumidor esteja atento às tarifas cobradas pelos bancos e exija informações claras e precisas sobre o seu valor e finalidade. Em casos de dúvidas ou abusos, o cliente pode recorrer aos órgãos de defesa do consumidor e ao Poder Judiciário.

O contrato de seguro é uma outra possível forma de oneração, e tem sentido de venda casada é expressamente proibido pelo CDC em seu artigo 39: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos (BRASIL, 1990).

Caso o consumidor se sinta prejudicado pela exigência do seguro, ele pode recorrer ao Procon ou ingressar com uma ação judicial, requerendo a anulação da cláusula abusiva e a reparação dos danos eventualmente suportados. Além disso, é importante que o consumidor esteja atento aos seus direitos e faça uma pesquisa prévia sobre as condições do contrato de financiamento, bem como do seguro oferecido. O ideal é optar por empresas idôneas e transparentes, que respeitem o consumidor e ofereçam opções que atendam às suas necessidades e possibilidades financeiras.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A problemática da inadimplência é uma questão ainda muito presente na realidade da economia do país, que gera insegurança tanto para o mercado quanto para uma segurança jurídica. Todavia, o presente estudo evidenciou que é necessário considerar a questão a partir de uma relação tripolar: financeira, consumidor e o estado, pois cabe também ao controle estatal a responsabilidade por encontrar um equilíbrio para a questão. 

A pesquisa propôs analisar as prováveis causas mais correntes para o inadimplemento de financiamento de automóveis à luz do Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8078/90. Desse modo, constata-se tanto seu objetivo geral quanto os específicos foram atendidos, pois através sua metodologia de pesquisa, ficou evidenciado a inadimplência nos financiamentos de veículo é uma questão de uma relação tripolar: financeira, consumidor e o estado, pois cabe também ao controle estatal e à falta de transparência no acordo de vontades celebrado no financiamento.

A postura de muitas financeiras que oneram os contratos com situações abusivas, da conduta passiva do consumidor brasileiro na transação também contribui para a inadimplência, visto que muitos não buscam por conta própria maiores conhecimentos sobre o contrato ou não realizam prévio planejamento financeiro de seu orçamento pessoal.

O Estado, por sua vez, realiza função importante na garantia da legalidade das disposições e no equilíbrio contratual, assim como na criação de medidas de proteção ao consumidor e na imposição de sanções às instituições financeiras que desrespeitam as normas do CDC, todavia em diversas situações verifica-se que a tutela judicial tende atualmente a favor do direito da financeira, o que pode prejudicar o consumidor e ampliar a possibilidade de inadimplência. 

Por fim, é importante que sejam buscadas soluções extrajudiciais para prevenir o inadimplemento, tais como o refinanciamento, a cessão de direitos e a renegociação de dívidas, conforme tendência jurídica de soluções dos problemas de forma conciliatória. Desta forma, ganha o empresário, o consumidor e o Estado frente ao desgaste e às custas de um processo.

REFERÊNCIAS  

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BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providência. Brasília: Presidência da República. 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078compilado.htm. Acesso: 20 fev. 2023.

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1 Artigo apresentado à Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas, como parte dos requisitos para obtenção do Título de Bacharel em Direito, em 2023.
2 Graduanda em Direito pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA, em Itamaraju (BA). E-mail: lanerodrigues_1@hormail.com
3 Diretor e Professor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FACISA). E-mail: dr.jacksoncordeiro@gmail.com