PREVALÊNCIA DE ALTERAÇÕES COLPOCITOLÓGICAS DE MULHERES ATENDIDAS NUM HOSPITAL MILITAR DE GRANDE PORTE

PREVALENCE OF COLPOCYTOLOGICAL CHANGES IN WOMEN ATTENDING IN A LARGE MILITARY HOSPITAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8070695


Arleia Ribeiro da Silva1
Susana Cristina Aidé Viviani Fialho2
Caroline Alves de Oliveira Martins3
Amanda Milanezi Ramon4


Resumo 

Este artigo tem por objetivo estimar a prevalência de alterações colpocitológicas de mulheres atendidas no ambulatório de ginecologia de um hospital militar de grande porte; estimar a prevalência de alterações colpocitológicas com confirmação histopatológica (neoplasia intraepitelial cervical grau 2+); e avaliar o perfil epidemiológico (fatores de riscos) das mulheres atendidas no ambulatório de patologia cervical com alterações colpocitológicas. Foi realizado um estudo retrospectivo, transversal, com coleta de dados de prontuários de mulheres atendidas no ambulatório de ginecologia e encaminhadas ao ambulatório de patologia cervical desse hospital, no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2019. A população do estudo foi composta por mulheres militares, dependentes de militares e civis que trabalhavam no hospital. A amostra foi selecionada por conveniência. O Teste Exato de Fisher foi usado para avaliar a hipótese de associação entre as variáveis do estudo e a neoplasia intraepitelial cervical grau 2+. A associação foi considerada significativa quando o p-valor era igual ou menor que 0,05. A prevalência das alterações colpocitológicas foi de 1,98% – 217 mulheres. As alterações de lesão intraepitelial escamosa de baixo grau e células atípicas de significado indeterminado foram as mais prevalentes. Identificou-se associação de tabagismo com neoplasia intraepitelial cervical grau 2+. A prevalência das alterações colpocitológicas do hospital estudado corroborou os dados apresentados no Sistema de Informação do Câncer do Colo de Útero 2016. Não foram encontrados resultados de estudos com essa população. As campanhas contra o tabagismo e a vacinação contra o câncer de colo de útero devem ser estimuladas.

Palavras-chave: Câncer. Enfermidade. Ginecologia. Oncologia.

Abstract

This article aims to estimate the prevalence of pap smear changes in women treated at the gynecology outpatient clinic of a large military hospital; to estimate the prevalence of pap smear changes with histopathological confirmation (cervical intraepithelial neoplasia grade 2+); and to evaluate the epidemiological profile (risk factors) of women treated at the cervical pathology outpatient clinic with pap smear changes. A retrospective, cross-sectional study was carried out, with data collection from the medical records of women treated at the gynecology outpatient clinic and referred to the cervical pathology outpatient clinic of this hospital, from January 2016 to December 2019. The study population consisted of military women, military dependents, and civilians who worked at the hospital. The sample was selected for convenience. Fisher’s Exact Test was used to assess the hypothesis of association between the study variables and grade 2+ cervical intraepithelial neoplasia. The association was considered significant when the p-value was equal to or less than 0.05. The prevalence of Pap smear changes was 1.98% – 217 women. Low-grade squamous intraepithelial lesions and atypical cells of undetermined significance were the most prevalent. An association between smoking and grade 2+ cervical intraepithelial neoplasia was identified. The prevalence of Pap smear changes in the studied hospital corroborated the data presented in the 2016 Cervical Cancer Information System. No results were found from studies with this population. Campaigns against smoking and vaccination against cervical cancer should be encouraged.

Keywords: Cancer. Disease. Gynecology. Oncology.

Introdução

A identificação de alterações colpocitológicas em exames de rastreio é uma importante estratégia para a detecção precoce do câncer de colo de útero. De forma primária, a prevenção pode ser realizada através da vacinação contra o Papilomavírus humano (HPV). No entanto, a infecção pelo HPV é a condição necessária (BOSCH; SANJOSÉ, 2003), mas não suficiente para o desenvolvimento das lesões pré-malignas desse tipo de câncer. A infecção persistente, em especial com altas cargas virais, é considerado o principal fator de risco para o desenvolvimento da doença (MARTINS, 2017; VAN DER WEELE et al., 2016), seguido de outros fatores como a imunossupressão, o tabagismo, o uso de contraceptivos hormonais, a multiplicidade de parceiros, a idade, da sexarca precoce e a multiparidade (BOSCH; SANJOSÉ, 2003; ZUR HAUSEN; DE VILLIERS; GISSMANN, 1981) os quais parecem influenciar os mecanismos ainda incertos que determinam a regressão ou a persistência da infecção e a progressão para lesões precursoras ou câncer (INTERNATIONAL COLLABORATION OF EPIDEMIOLOGICAL STUDIES OF CERVICAL CANCER, 2007; 2009).

 Apesar de ser altamente evitável, o câncer de colo de útero é responsável pela morte de cerca de 35,7 mil mulheres a cada ano nas Américas, sendo que a maior parte desses casos (80%) ocorre na América Latina e no Caribe. As altas taxas de mortalidade ressaltam as desigualdades existentes em termos de renda, gênero e acesso aos serviços de saúde na região (Organização Pan-Americana da Saúde-OPAS, 2017).

No Brasil, o rastreamento do câncer de colo de útero é feito por meio do exame de colpocitologia (Teste de Papanicolaou) – que teve sucesso inequívoco na redução da incidência e mortalidade desse câncer no último século – deve ser oferecido às mulheres na faixa etária de 25 a 64 anos e que já tiveram atividade sexual, segundo recomendações do Ministério da Saúde.

Diante do exposto, os objetivos deste estudo foram estimar a prevalência de alterações colpocitológicas de mulheres atendidas no ambulatório de ginecologia de um hospital militar de grande porte; estimar a prevalência de alterações colpocitológicas com confirmação histopatológica (neoplasia intraepitelial cervical grau 2+ – NIC2+); e avaliar o perfil epidemiológico (fatores de riscos) das mulheres atendidas no ambulatório de patologia cervical com alterações colpocitológicas.

Metodologia

Trata-se de um estudo retrospectivo transversal, com coleta de dados retirados dos prontuários de mulheres (militares, dependentes de militares e funcionárias civis) atendidas no ambulatório de ginecologia de um hospital militar de grande porte no município do Rio de Janeiro, que apresentaram alguma alteração colpocitológica no exame de colpocitologia oncótica em meio líquido (exame de Papanicolaou) e encaminhadas ao ambulatório de patologia cervical, mesmo aquelas que se encontravam fora da idade prevista para o rastreio (25 a 64 anos).

A coleta de dados ocorreu no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2019 e os dados foram lançados em formulário elaborado para esse fim.

Na primeira etapa, foram avaliados: idade, paridade, tabagismo, uso de contraceptivo hormonal, uso de preservativo, sexarca, imunossupressão; além das seguintes alterações colpocitológicas: células atípicas de significado indeterminado, possivelmente não neoplásicas (ASC-US), células atípicas de significado indeterminado, não podendo excluir lesão de alto grau (ASC-H), células glandulares atípicas (AGC), células atípicas de origem indefinida (AOI), lesão intraepitelial escamosa de baixo grau (LSIL), lesão intraepitelial escamosa de alto grau (HSIL), HSIL não podendo excluir microinvasão (HSIL-micro), adenocarcinoma in situ (AIS), adenocarcinoma invasor, carcinoma invasor. As mulheres com indicação, de acordo com as diretrizes do Ministério da Saúde, foram submetidas à colposcopia, e aquelas com indicação no momento do exame foram submetidas à biópsia.

Em seguida, foram selecionadas as mulheres com resultados histopatológicos de neoplasia intraepitelial cervical grau 2 ou pior (NIC2+ = NIC2, NIC3 ou carcinoma invasor). A partir disso, criou-se um banco de dados no Microsoft Excel para posterior análise estatística dos dados. Excluíram-se as mulheres histerectomizadas (sem colo de útero) por doença benigna e mulheres sem sexarca.

A amostra foi selecionada por conveniência, não cabendo cálculo do tamanho amostral. A análise dos dados foi efetuada por meio da linguagem R (versão R 3.3.0+) no ambiente de desenvolvimento integrado RStudio (versão 2022.02.3+492). Inicialmente, realizou-se a análise descritiva das variáveis numéricas (n, média, desvio padrão [DP], mínima e máxima). Logo após, foi calculada a frequência das variáveis categóricas e a prevalência das alterações colpocitológicas das mulheres atendidas, analisando-se o perfil epidemiológico das mulheres citológicos + (equivalente a citologias alteradas), bem como a prevalência dos citológicos + com resultado histopatológico NIC2+. Finalmente, foi calculada a prevalência dos exames NIC2+. O Teste Exato de Fisher foi usado para avaliar a hipótese de associação entre as variáveis do estudo e NIC2+. A associação foi considerada significativa quando o p-valor era igual ou menor que 0,05.

Resultados

Inicialmente, foram identificadas 10.970 mulheres atendidas no ambulatório de ginecologia do hospital estudado, no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2019 (considerando-se apenas uma consulta por paciente). Todas as mulheres com alterações colpocitológicas (referidas como citológico +) foram encaminhadas e registradas em arquivo próprio no ambulatório de patologia cervical. No período analisado, 217 pacientes apresentaram alguma alteração colpocitológica, obtendo-se a prevalência de 1,98%. Foi realizada, então, a coleta dos dados desses 217 pacientes.

A análise indicou que a alteração citológica com maior prevalência foi a LSIL, 33,64%, em pacientes citológicos +, seguida de ASC-US, com 33,18% e, por último, de HSIL, com 21,20% do total de pacientes citológicos +. O carcinoma invasor apresentou prevalência de 4,61%. O laudo com ASC-H teve 4,15% no número de pacientes citológicos +, assim como houve 2,30% de prevalência de AGC em pacientes citológicos +. A alteração com menor prevalência neste estudo foi de HSIL-micro com 0,92% em pacientes citológicos + (Figura 1).

Figura 1 – Prevalência de alterações colpocitológicas na população total e na amostra estudada (citológicos +).


Gráfico, Gráfico de barras
Descrição gerada automaticamente

Legenda: AGC, Células glandulares atípicas; ASC-H, Células atípicas de significado indeterminado, não podendo excluir lesão de alto grau; ASC-US, Células atípicas de significado indeterminado; Cit, Citológicos +; HSIL, Lesão intraepitelial escamosa de alto grau; HSIL-micro, HSIL não podendo excluir microinvasão; LSIL, Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau.

Foi calculada a média, mínima, máxima e o DP dessas mulheres (citológico +). Entretanto, por ser uma pesquisa retrospectiva, não foi possível obter os dados de todas as pacientes. Foi encontrada uma média de idade de 40 anos (N 217), com idade mínima de 17 e máxima de 91 anos (DP 14,73). Das 172 mulheres com informações sobre o número de filhos, foi obtida uma média de 1,55 filhos com um número máximo de 7 filhos (DP 1,38). A sexarca foi um dos dados epidemiológicos com menor número (80), obtendo-se uma média de 18 anos, com idade mínima de 12 e máxima de 31 anos (DP 3,56) (Quadro 1).

Quadro 1 – Prevalência das variáveis numéricas da amostra estudada.

NMédiaDesvio padrãoMínimaMáxima
Idade (anos)21740.0314.731791
N° de filhos1721.551.3807
Sexarca8017.933.561231

Com relação à frequência das variáveis categóricas, identificou-se que 21,20% das pacientes com exames citológicos + faziam uso de contraceptivo hormonal. Quanto ao uso de preservativo masculino, 9,22% das pacientes citológicos + referiram uso. Nas pacientes com exames citológicos +, a prevalência de imunossuprimidas foi de 5,61%. De acordo com os dados colhidos, 5,99% das pacientes citológicos + eram tabagistas, e 17,05% das pacientes com exames citológicos + tinham mais de 3 filhos.

No que se refere à prevalência do perfil epidemiológico (uso de contracepção hormonal, uso de preservativo masculino, tabagismo, prole superior a três filhos, imunossupressão), foi observado que, em mulheres citológicos +, dentre as pacientes que usavam preservativos, 16,44% apresentaram LSIL. As pacientes imunossuprimidas obtiveram uma prevalência maior de AGC (20%). Foi avaliada também a prevalência desses perfis nas mulheres com confirmação histopatológica (NIC2+), tendo-se evidenciado como fatores de risco mais elevados o uso de contraceptivos (31,9%) e prole superior a três filhos (21,28%). Entre as mulheres tabagistas, 12,77% apresentaram NIC2+ (Quadro 2).

Quadro 2 – Perfil epidemiológico das variáveis: prevalência (%) em paciente citológico + e NIC2+.

LSILASC-USHSILASC-HCa invasorAGCHSIL-microNIC2+
Contraceptivo  hormonal17.8120.8326.6745.4510205031.91

Preservativo
16.448.334.4400004.26
Tabagismo5.482.788.8902005012.77
Mais de 3 filhos5.4819.4424.4436.3620205021.28
Imunossupressão4.116.9400102004.26

Legenda: AGC: Células glandulares atípicas; ASC-H: Células atípicas de significado indeterminado, não podendo excluir lesão de alto grau; ASC-US: Células atípicas de significado indeterminado; HSIL: Lesão intraepitelial escamosa de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau; NIC: Neoplasia intraepitelial cervical.

Foi observada chance de associação com NIC2+ em mulheres tabagistas (intervalo de chance [IC] 95% 1.12, 7.91), com alterações colpocitológicas HSIL (IC 95% 7.31, 34.73) e carcinoma invasor (IC 95%: 3.41, 81.68). Constatou-se também uma menor chance da ocorrência de NIC2+ em mulheres com citologias ASC-US (IC 95% 0.00,0.22) e LSIL (IC 0.03, 0.32) (Quadro 3).

Quadro 3 – Associação entre as variáveis de risco, citologias e ocorrência de NIC2+ – razão de chance e Teste Exato de Fisher.

Grupo x NIC2Razão de chanceIC 95% – Razão de chanceFisher – Pr>chi2
> 3 filhos+1.130.50, 2.590.831
Imunos+1.420.25, 7.910.652
Tabagismo +3.671.12, 12.070.035*
CH+2.030.88, 4.680.128
Preservativo masculino+0.270.05, 1.420.166
ASC-US+0.030.00, 0.22<0.001*
ASC-H+3.050.79, 11.850.106
AGC+0.880.10, 8.041
LSIL+0.090.03, 0.32<0.001*
HSIL+15.947.31, 34.73<0.001*
HSIL/MICROINV+3.550.22, 57.890.396
Carcinoma Invasor+16.73.41, 81.68<0.001*

Legenda: AGC: Células glandulares atípicas; ASC-H: Células atípicas de significado indeterminado, não podendo excluir lesão de alto grau; ASC-US: Células atípicas de significado indeterminado; CH; HSIL: Lesão intraepitelial escamosa de alto grau; LSIL: Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau; NIC2: Neoplasia intraepitelial cervical grau 2.

A prevalência de alterações colpocitológicas nas mulheres com confirmação histopatológica (NIC2+) é demonstrada no Quadro 4, onde se observa que HSIL foi a alteração com maior prevalência (61,70%).

Quadro 4 – Prevalência de alterações colpocitológicas nas mulheres com resultado histopatológico NIC2+

Alterações colpocitológicasTotalPrevalência
HSIL2961,70%
Carcinoma invasor919,14%
ASC-H48,50%
LSIL36,40%
AGC12,12%
HSIL-micro12,12%

Legenda: AGC: Células glandulares atípicas; ASC-H: Células atípicas de significado indeterminado, não podendo excluir lesão de alto grau; HSIL: Lesão intraepitelial escamosa de alto grau; HSIL-micro: HSIL não podendo excluir microinvasão; LSIL: Lesão intraepitelial escamosa de baixo grau.

A prevalência das alterações histopatológicas –  NIC2+ em mulheres com alterações colpocitológicas foi de 21,65% (47 mulheres).

Discussão

A partir das alterações colpocitológicas encontradas em exames de rastreio (Teste de Papanicolaou), pode-se diagnosticar e tratar o câncer de colo de útero a fim de diminuir a morbidade e a mortalidade dessa doença com taxa ainda tão elevada de mortalidade no Brasil e em todo o mundo, principalmente em países subdesenvolvidos.

Foi verificada a prevalência de alterações colpocitológicas de 1,98%, isto é, 217 pacientes com alguma alteração colpocitológica no Teste de Papanicolaou, de um total de 10.970 mulheres atendidas, enquanto um estudo realizado no Alto Uruguai, Rio Grande do Sul, apontou prevalência de 3,3%, correspondentes a 2.049 exames positivos para alguma alteração colpocitológica de um total de 62.280 exames avaliados (BACKES et al., 2014).

No presente estudo, o maior percentual de alterações foi de LSIL (33,64%) e ASC-US (33,18%) (Quadro 3), o que normalmente ocorre em serviços de atenção básica, como mostram os dados do Sistema de Informação do Câncer do Colo de Útero (2016), que indicaram uma prevalência de ASC-US (55%) e LSIL (23%) dentre as alterações colpocitológicas registradas da população brasileira em 2016.

No estudo de Backes et al. (2014) foi observada uma prevalência de 53,39% para LSIL. Além disso, demonstrou-se uma baixa associação entre ASC-US e LSIL com lesões NIC2+, em concordância com o que foi verificado pelas Diretrizes para o Rastreamento do Câncer de Colo de Útero (INCA, 2016).

Neste estudo, revelou-se alta prevalência de HSIL (21,20%) – considerado um percentual elevado –, o que corrobora pesquisa realizada no Instituto Fernandes Figueira (RUSSOMANO, 2019), hospital de referência em patologia cervical, no Rio de Janeiro, em que se obteve o valor de 51% para HSIL + HSIL-micro. Esse percentual elevado provavelmente se deve ao fato de ser o hospital militar estudado de alta complexidade, funcionando como referência para casos mais graves e que requerem intervenções em centros cirúrgicos, os quais dão entrada pelo ambulatório de ginecologia, sendo priorizado o encaminhamento de pacientes com alguma alteração colpocitológica para o ambulatório de patologia cervical.

A idade média da sexarca no presente estudo foi de 18,0 anos, dado compatível com os resultados de um estudo com 8.641 mulheres atendidas nos centros de Porto Alegre, São Paulo e Campinas, em que houve associação significativa entre idade da sexarca da média da população entrevistada e maior positividade para HPV (p<0.001) e maior percentual de alterações colpocitológicas (p<0.001). A idade média do início da vida sexual nessa população foi aos 18,5 (+ou- 4,0 anos) (ROTELI-MARTINS et al., 2007).

Cabe salientar que, embora o hospital militar procure seguir as Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer de Colo de Útero (INCA, 2016), como foram estudadas todas as pacientes recebidas no serviço, identificou-se a uma média de idade de 40,03; porém, a idade mínima foi de 17 e a máxima de 91 anos, em desacordo com as referidas diretrizes.

Neste estudo, houve associação entre tabagismo e lesões NIC2+, em conformidade com estudos de Bosch et al. (2002) e Castellsagué (2008). Em trabalho de revisão de 2021, Rojas-Cisnero e Ruíz-Saucedo (2021) apontaram uma forte associação de tabaco e contraceptivo oral com alterações de alto grau do colo do útero. Em uma metanálise que avaliou fatores de risco e outras considerações epidemiológicas para o rastreamento do câncer de colo de útero nos Estados Unidos, também foi confirmada correlação positiva entre tabagismo e desenvolvimento de NIC e a patologia invasiva do colo de útero (NAGELHOUT et al., 2021).

Não se observou associação de NIC2+ com fatores de risco como imunossupressão, contraceptivos hormonais ou paridade, como verificado em estudo de Martins (2017), que mostrou uma associação de imunossupressão com alterações pré-malignas e a doença invasiva do colo do útero.

Quanto às limitações da pesquisa, não foram encontrados dados brasileiros sobre a prevalência de alterações colpocitológicas ou os fatores de risco para que ocorram essas alterações nessas populações, que pudessem ser comparados com os dados deste estudo.

Conclusões

Houve baixa associação de alterações colpocitológicas, como LSIL e ASC-US, com lesões NIC2+. Não foi constatada associação de fatores de risco como idade, imunossupressão, uso de contraceptivos hormonais ou idade da sexarca com as lesões histopatológicas NIC2+. Revelou-se forte associação do tabagismo com essas lesões. Não foram encontrados dados de outros hospitais militares.

A população estudada, por sua variedade de origem, apresenta características culturais e regionais bem heterogêneas. Possui algumas peculiaridades, como frequentes mudanças de endereço, com transferências por todo o Brasil e até para o exterior, entretanto conta com um sistema de saúde próprio, o que facilita o acesso a tratamentos. 

A continuidade dos estudos é também de grande importância, dada a relevância do tema. Ademais, por se tratar de um serviço com residência médica reconhecida pelo Ministério da Educação e Cultura e com um Programa de Capacitação e Atualização Profissional dos Militares de Saúde, este estudo servirá de estímulo para os alunos que irão atuar em hospitais militares e na sociedade civil por todo o país.

Referências

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1 Médica especialista em Ginecologia e Obstetrícia, mestranda em Saúde Materno Infantil na Universidade Federal Fluminense. E-mail: arleia.ribeiro0@gmail.com
2 Médica, mestrado e doutorado em Medicina (Ginecologia). Professora Associada da Universidade Federal Fluminense. Professora do curso de Mestrado Profissional em Saúde Materno-Infantil da Universidade Federal Fluminense. E-mail: mailto:susanaaide4@gmail.com
3 Médica, Mestrado em Saúde da Mulher, Doutorado em Ciências Médicas, Professora Adjunta de Ginecologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense. E-mail: carololiveira100582@gmail.com
4 Médica, especialista em Ginecologia e obstetrícia. E-mail: mandisramon@gmail.com