CONSTRUÇÃO DE UMA ONTOLOGIA PARA TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) UTILIZANDO PROTÉGÉ 5.6.7 E OWL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202512240645


Prof. Msc. Henderson Matsuura Sanches1
Profa Dra. Marilia Miranda Forte Gomes2


Resumo: Este artigo técnico explora o processo de desenvolvimento de uma ontologia para o Transtorno do Espectro Autista (TEA), com foco na utilização da ferramenta Protégé 5.6.5 e da linguagem Web Ontology Language (OWL). Abordaremos os conceitos fundamentais do TEA, a importância das ontologias na representação do conhecimento médico, as características do Protégé e da OWL, e as metodologias para a construção de ontologias. O objetivo é fornecer um guia abrangente para pesquisadores e profissionais interessados em aplicar tecnologias semânticas para organizar e inferir informações complexas no domínio do TEA.

Palavra Chave: OWL, Ontologia, TEA, Protégé, Metodologia

Abstract: This technical paper explores the process of developing an ontology for Autism Spectrum Disorder (ASD), focusing on the use of the Protégé 5.6.5 tool and the Web Ontology Language (OWL). We will address the fundamental concepts of ASD, the importance of ontologies in representing medical knowledge, the characteristics of Protégé and OWL, and methodologies for building ontology. The goal is to provide a comprehensive guide for researchers and practitioners interested in applying semantic technologies to organize and infer complex information in the ASD domain.

Keywords: OWL, Ontology, ASD, Protégé, Methodology

1. Introdução

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição complexa do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação social, a interação e o comportamento. Com a crescente quantidade de informações e pesquisas sobre o TEA, torna-se crucial desenvolver métodos eficazes para organizar, integrar e analisar esses dados. As ontologias, como representações formais e explícitas de um domínio de conhecimento, emergem como uma solução promissora para esse desafio. Elas permitem a padronização da terminologia, a inferência de novos conhecimentos e a interoperabilidade entre diferentes sistemas de informação.

Este artigo visa detalhar o processo de construção de uma ontologia para o TEA, utilizando o Protégé 5.6.5 como ferramenta principal e a linguagem OWL para a formalização do conhecimento. Serão abordados os conceitos essenciais do TEA, a relevância das ontologias na área da saúde, as funcionalidades do Protégé e as características da OWL, além de apresentar as etapas metodológicas para o desenvolvimento de ontologias. Por fim, será discutido um exemplo prático de aplicação de uma ontologia para TEA, demonstrando o potencial dessas tecnologias para avançar a pesquisa e o cuidado no campo do autismo.

2. Desenvolvimento

2.1 Transtorno do Espectro Autista (TEA)

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por um desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits persistentes na comunicação social e na interação, e por uma gama estreita de interesses e atividades que são únicas para o indivíduo e realizadas de forma repetitiva [1]. O TEA começa na infância e tende a persistir na adolescência e na idade adulta. Na maioria dos casos, as condições são aparentes durante os primeiros cinco anos de vida.

Indivíduos com TEA frequentemente apresentam outras condições concomitantes, incluindo epilepsia, depressão, ansiedade e Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). O nível de funcionamento intelectual em indivíduos com TEA é extremamente variável, estendendo-se de comprometimento profundo até níveis superiores [1].

2.1.2 Ontologias e sua Aplicação na Área da Saúde

Ontologias, no contexto da ciência da computação, são especificações formais e explícitas de uma conceituação compartilhada. Elas fornecem um vocabulário comum para pesquisadores e sistemas de software que precisam compartilhar informações em um domínio. Uma ontologia inclui definições de conceitos básicos do domínio e as relações entre eles, que são úteis para processamento computacional [2].

Na área da saúde, as ontologias desempenham um papel crucial na organização e representação do vasto e complexo conhecimento médico. Elas permitem a padronização de terminologias, a integração de dados de diferentes fontes, a inferência de novos conhecimentos e o suporte a sistemas de decisão clínica. Exemplos de aplicação incluem a ontologia de anatomia e radiologia para diagnósticos mais precisos, e a utilização de ontologias para organizar vocabulários existentes na área da saúde [3].

2.1.4 Protégé 5.6.5: Ferramenta para Construção de Ontologias

Protégé é um editor de ontologias e um framework de código aberto desenvolvido pela Stanford University. A versão 5.6.7 oferece um ambiente robusto e flexível para a criação, edição e gerenciamento de ontologias, com suporte total à linguagem OWL 2.0. Suas principais funcionalidades incluem [4]:

  • Conformidade com padrões W3C: Suporte completo ao OWL 2.0, essencial para a Web Semântica.
  • Interface de usuário personalizável: Permite a configuração da interface de acordo com as necessidades do usuário.
  • Suporte à visualização: Ferramentas interativas para navegar em relacionamentos de ontologia.
  • Refatoração de ontologia: Facilita a manutenção e evolução das ontologias.
  • Integração com raciocinadores: Permite a verificação de consistência e inferência de novos conhecimentos.
  • Arquitetura plugável: Suporta a adição de diversos plugins para estender suas funcionalidades.
  • Melhorias de desempenho: A versão 5.6.7 apresenta melhorias notáveis em desempenho e atualizações na API OWL.

Na Tabela 1 tem-se uma comparação entre o Protégé 5.6.4 e a 5.6.7.

Tabela 1: Comparação Detalhada entre Protégé 5.6.4 e 5.6.7.

Recurso/MelhoriaProtégé 5.6.4Protégé 5.6.7
DesempenhoDesempenho bom, mas com otimizações limitadas.Desempenho significativamente melhorado, especialmente em grandes ontologias.
Correções de BugsCorreções de bugs anteriores.Correções adicionais de bugs para maior estabilidade e confiabilidade.
Melhorias em serializadoresVersão anterior da OWL APIAtualização da OWL API 4.5.24. Mudanças em serializadores, como o OBO serializer, que podem resultar em grandes diferenças ao salvar arquivos de ontologia.
Compatibilidade com Hardware AppleO pacote OS X depende de emulação x86_64.O pacote OS X agora roda nativamente em CPUs arm64, melhorando drasticamente o desempenho em computadores Apple com chips da série M.
Melhorias de usabilidadeMelhorias anteriores.Melhorias adicionais na interface do usuário e no fluxo de trabalho.
Processamento de caracteres de escape na busca de entidadesProblemas com alguns caracteres de escapeCorreção no processamento de caracteres de escape ao buscar entidades.
Salvamento de objetos equivalentes em OWLCellRendererProblemas ao salvar objetos equivalentesCorreção no salvamento de objetos equivalentes.
Renderização de stringsProblemas com alguns caracteres especiaisMelhoria na renderização de strings, especialmente para barras invertidas e aspas duplas.
Ordenação de asserções de propriedades de dados/objetosOrdenação inconsistenteOrdenação de asserções de propriedades de dados/objetos nas visualizações de indivíduos.
Opção “Mostrar entidades depreciadas”Não persistenteOpção “Mostrar entidades depreciadas” agora é persistente.
Migração JavaVersão anterior do JavaMigração para Java 11.

2.1.5 Web Ontology Language (OWL)

A Web Ontology Language (OWL) é uma linguagem de representação de conhecimento desenvolvida pelo World Wide Web Consortium (W3C) para a autoria de ontologias. Ela permite descrever taxonomias e redes de classificação de forma formal, definindo a estrutura do conhecimento para diversos domínios. As principais características da OWL incluem [5]:

  • Semântica Formal: Permite que máquinas processem e entendam o conteúdo da informação.
  • Baseado em RDF: Construída sobre o Resource Description Framework (RDF).
  • Expressividade: Oferece maior expressividade que o RDFS, permitindo ontologias mais complexas.
  • Perfis: OWL 2 introduz perfis (OWL 2 EL, OWL 2 QL, OWL 2 RL) para escalabilidade e diferentes níveis de expressividade.
  • Sintaxes: Suporta diversas sintaxes, como OWL Functional Syntax, OWL/XML, RDF/XML, Manchester Syntax e Turtle.
  • Raciocinadores: Compatível com raciocinadores como Pellet, RacerPro, FaCT++ e HermiT para verificação de consistência e inferência.

2.1.6 Metodologia para Construção de Ontologias

A construção de uma ontologia é um processo iterativo que envolve várias etapas. A metodologia “Ontology Development 101″ [6] é um guia prático e amplamente utilizado, que descreve as seguintes fases:

  1. Determinar o domínio e escopo da ontologia: Definir o propósito, o domínio de conhecimento a ser coberto, as perguntas que a ontologia deve responder e o público-alvo.
  2. Considerar a reutilização de ontologias existentes: Verificar se ontologias ou vocabulários existentes podem ser adaptados ou estendidos, economizando tempo e promovendo a interoperabilidade.
  3. Enumerar termos importantes na ontologia: Listar os termos-chave do domínio e suas definições.
  4. Definir classes e hierarquia de classes: Organizar os termos em classes e subclasses, estabelecendo relações de herança.
  5. Definir propriedades das classes (slots): Descrever os atributos e características de cada classe.
  6. Definir restrições para as propriedades (facets): Estabelecer regras e restrições para os valores das propriedades.
  7. Criar instâncias: Adicionar indivíduos específicos às classes e preencher os valores de suas propriedades.

Na Figura 1 temos o diagrama de blocos mostrando as fases de desenvolvimento de ontologia[9].

Figura 1: Diagrama de Bloco.

Na Tabela 2 é apresentada a explicação de cada fase do diagrama de bloco da Figura 1[9].

Tabela 2: Explicação das Fases de Desenvolvimento de Ontologia.

2.1.7 Exemplo Prático: Ontologia para TEA e Inferência de Fenótipos

Um exemplo prático da aplicação de ontologias no domínio do TEA é o estudo “An ontology for Autism Spectrum Disorder (ASD) to infer ASD phenotypes from Autism Diagnostic Interview–Revised data” [7]. Este trabalho demonstra como uma ontologia pode ser utilizada para integrar dados e inferir novos conhecimentos sobre o TEA. Os autores estenderam uma ontologia de autismo existente, adicionando conhecimento sobre instrumentos diagnósticos, fenótipos de TEA e fatores de risco, utilizando definições de classes OWL e regras semânticas. Um plugin personalizado do Protégé foi desenvolvido para enumerar axiomas OWL combinatórios, suportando as relações entre os itens do ADI-R e as categorias diagnósticas do DSM. A aplicação de um raciocinador permitiu inferir diagnósticos de TEA com alta precisão, demonstrando o potencial das ontologias para auxiliar clínicos e pesquisadores na caracterização de indivíduos com TEA, facilitando o diagnóstico automatizado e a subtipagem para decisões terapêuticas personalizadas.

3 Conclusão:

A construção de ontologias para o Transtorno do Espectro Autista (TEA) utilizando ferramentas como o Protégé 5.6.5 e a linguagem OWL representa um avanço significativo na organização e no processamento do conhecimento complexo associado a essa condição. Ao formalizar a terminologia e as relações entre os conceitos do TEA, as ontologias facilitam a integração de dados, a inferência de novos conhecimentos e a interoperabilidade entre sistemas de saúde e pesquisa. O processo iterativo de desenvolvimento de ontologias, guiado por metodologias como a “Ontology Development 101”, permite a criação de modelos robustos e adaptáveis às necessidades específicas do domínio. O exemplo prático de inferência de fenótipos de TEA demonstra o potencial transformador dessas tecnologias para o diagnóstico, a pesquisa e o desenvolvimento de terapias personalizadas, contribuindo para uma compreensão mais profunda e um manejo mais eficaz do TEA.

4 Referência Bibliográfica:

[1] Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS). Transtorno do espectro autista. Disponível em: <https://www.paho.org/pt/topicos/transtorno-do-espectro-autista> Acessado em 01 de julho de 2025.

[2] Noy, N. F., & McGuinness, D. L. (2001). Ontology Development 101: A Guide to Creating Your First Ontology. Stanford University. Disponível em: <https://protege.stanford.edu/publications/ontology_development/ontology101.pdf> Acessado em 

[3] SciELO. Significados e sentidos das práticas de saúde: a ontologia fundamental e a reconstrução do cuidado em saúde. Disponível em:<https://www.scielo.br/j/icse/a/NWsyzPTnFJT4P8QJCsG7NLp/> Acessado em 20 de junho de 2025.

[4] Stanford University. Protégé. Disponível em: <https://protege.stanford.edu/> Acessado em 19 de junho de 2025.

[5] W3C. Web Ontology Language (OWL). Disponível em: <https://www.w3.org/OWL/> Acessado em 10 de junho de 2025.

[6] Noy, N. F., & McGuinness, D. L. (2001). Ontology Development 101: A Guide to Creating Your First Ontology. Stanford University. Disponível em: <https://protege.stanford.edu/publications/ontology_development/ontology101.pdf> Acessado em 08 de junho de 2025.

[7] Mugzach, O., Peleg, M., Bagley, S. C., Guter, S. J., Cook, E. H., & Altman, R. B. (2015). An ontology for Autism Spectrum Disorder (ASD) to infer ASD phenotypes from Autism Diagnostic Interview–Revised data. Journal of Biomedical Informatics, 56, 333-347. Disponível em:<https://pmc.ncbi.nlm.nih.gov/articles/PMC4532604/> Acessado em 15 de junho de 

[8] Revista FT. Protégé 5.6.5 Ferramenta Open-Source para Criação de Ontologia em Web Ontology Language (OWL). Disponível em: <https://revistaft.com.br/protege-5-6-5-ferramenta-open-source-para-criacao-de-ontologia-em-web-ontology-language-owl/> Acessado em 01 de julho de 2025.

[9] Revista Atena Editora. REQUIREMENTS ENGINEERING IN THE DEVELOPMENT OF ONTOLOGY ENGINEERING IN BIOMEDICAL ENGINEERING. Disponível em: <https://atenaeditora.com.br/catalogo/artigo-revista/engenharia-de-requisitos-no desenvolvimento-de-engenharia-de-ontologia-na-engenharia-biomedica> Acessado em  02 de julho de 2025.


1ORCID: 0000-0003-2354-3393, Faculdade do Gama (FGA/UnB), hendersonmatsuura@yahoo.com.br;
2Faculdade do Gama (FGA/UnB). mariliamfg@unb.br