ASPECTOS JURÍDICOS RELACIONADOS AS PRISÕES DO 8 DE JANEIRO DE 2023

LEGAL ASPECTS RELATED TO THE PRISONS OF JANUARY 8, 2023

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202410251412


Erivelton Patrick Silva Fernandes1
Roger Taylor Silva Rodrigues2


Resumo

A prisão é uma medida considerada extrema. Inclusive a Lei Maior deste país a classifica como uma medida que deve preceder de vários ritos processuais, comprobatórios, probabilísticos, e observar vários parâmetros para ocorrer. Em 8 de janeiro de 2023 ocorreram prisões que são totalmente ao revés do que preceitua os Códigos Penais, Processuais Penais, e demais legislações que balizam o direito do Estado de exercer seu poder de restringir a liberdade e de punir. Além disso, a consequência destes atos foi trágica na vida de muitos, como é o caso de morte no cárcere de Clériston Pereira da Cunha que foi um dos presos durante as manifestações de 8 de janeiro em Brasília. Deste modo o objetivo deste artigo foi desenvolver uma análise sobre os potenciais erros, vícios, e consequências que houveram relacionados ao 8 de janeiro e suas repercussões. Concluiu-se que o que se percebeu na sequencia foi uma cascata de erros que se iniciam logo a competência dada ao STF em julgar os presos do 8 de janeiro. Espantando- se ainda mais na velocidade dada aos trâmites do tribunal que quase sempre são morosos, e neste caso em especial deu-se entre prisão, investigação, e julgamento em tempo recorde, totalmente atípico as práticas daquela corte. Não se respeitou os princípios de individualização da pena, proporcionalidade, e até mesmo pode-se falar que da dignidade da pessoa humana, ao passo que houve morte no cárcere de Clériston. Mesmo com parecer favorável a sua liberação em virtude da sua condição de pessoa com comorbidade.

Palavras-chave: Prisão. Erros. Vícios. Proporcionalidade.

1 INTRODUÇÃO

O direito a manifestação é explícito dentro da Constituição Federal Brasileira, sendo vedado o anonimato, de modo que as pessoas que estão cobertas pelo “Art. 5º[…] IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”. O que ocorre é a partir das prisões do 8 de janeiro surgiram uma gama de problemáticas, erros, vícios processuais, que colocam em cheque estas decisões e ações (BRASIL, 1988).

Contudo é cada vez maior o número de medidas judiciais, decisões, e demais questões que vem cerceando a voz da população e o direito livre de manifestar-se. É importante mencionar que nas democracias, há por característica admitir que os cidadãos tenha liberdade de pensamento, liberdade de expressão; e mediante os fatos ocorridos tanto nas eleições de 2022, decisões do TSE, perda de horário político em TV aberta (somente por alguns partidos), restrições de publicidades, como também pesquisas que apontavam o contrário ao que ocorreu nas urnas, fez com que houvesse revoltas populares em todo Brasil. Essas revoltas culminaram em motins, de protesto, como os que ocorreram em Brasília (pois atos ocorreram em todo país).

Estas revoltas iniciaram-se logo após a derrota de Jair Bolsonaro e deram sequencia até os atos de 08 de janeiro de 2023. Inicialmente estas revoltas se deram com bloqueios de rodovias, acampamentos em frente a quartéis, e culminaram com a invasão da praça dos três poderes em Brasília, com a destruição de patrimônio público e outros crimes. Até presente momento há muita discordância sobre as penas aplicadas, a imputação de culpa a cada indivíduo, e muitas outras questões, totalmente questionáveis frente ao arcabouço legal brasileiro.

Após a invasão da Praça dos Três Poderes em Brasília e a consequente destruição de alguns patrimônios públicos, manifestantes que estavam acampados em frente ao Quartel General do Exército de Brasília foram presos. No total houveram divulgações de 1.200 pessoas, que segundo as autoridades participaram do ataque aos três poderes em Brasília, contudo até o momento há muita dúvida sobre quem de fato praticou os crimes de destruição do patrimônio, se foram estes manifestantes ou outros indivíduos infiltrados querem deslegitimar o movimento.

Quanto a destruição de patrimônio público, e a responsabilização dos praticantes destes atos, este artigo que faz uma análise sobre os aspectos jurídicos não se debruça profundamente; e sim sobre fatos relacionados e que ocorreram nos desdobramentos, que vão desde o julgamento pelo STF, órgão considerado não competente para julgar pessoas consideradas “comuns” ou sem prerrogativa de Foro, e demais condenações, dosimetria da pena, considerada descabida em muitos casos e as consequências trágicas como a morte no cárcere de Clériston Pereira da Cunha, que até o momento foi a consequência conhecida mais complexa e vultuosa desta sequencia de erros do judiciário (RODRIGUES, 2023).

Assim nota-se que houveram atrocidades e penalidades que violam Direitos Humanos, erros e vícios processuais, e desfechos trágicos como é o caso de um dos manifestantes que morreu na prisão durante estas detenções e cumprimento das penas. Há ainda a necessidade de avaliar a proporcionalidade das penas já aplicadas há alguns destes manifestantes, que em alguns casos foram de 17 anos, sendo que outros crimes de muito maior repercussão e dano a sociedade são penas mais brandas; havendo inclusive alguns que afirmam que o julgamento teve o viés político partidário.

Dentro deste contexto é importante mencionar que dentro da classe jurídica há muitas críticas as últimas decisões (principalmente do STF); e tem se dividido nesta celeuma, afirmando que os manifestantes presos não deveriam ter sido julgados pelo STF, visto que “não possui competência, frente a falta de cumprimento de requisitos legais a estes manifestantes” (RODRIGUES, 2023).

O STF é a Suprema Corte Brasileira, e por assim o ser tem a competência de Julgar autoridades que possuem o chamado Foro Privilegiado, ou Prerrogativa de Foro, que são condições especiais, frente ao cargo que estes ocupam; e, no caso em questão não estão cobertos estes manifestantes por estes requisitos, havendo a necessidade de encaminhamento de cada um para a “Justiça Comum”, primeira instância que apuraria os fatos e julgaria cada um conforme seus ilícitos. E caso houvesse condenação haveria também a possibilidade dos recursos, e tramitações processuais que poderiam a seu tempo e trâmite finalizar no STF e não somente o que ocorreu, o STF julgar estas pessoas sem a prerrogativa de foro de modo primário (RODRIGUES, 2023).

O Direito Processual Penal tem em um de seus princípios o entendimento de que quando o processo tem vícios deve ser considerado nulo ou invalidado, e até mesmo ilegal. Isso porque macula o processo, perdendo a credibilidade e não se seguindo os passos corretos para uma busca de verdade processual plena. É, o que ocorreu com a prisão destes manifestantes, e foi justamente isso, na visão de alguns juristas: “um processo que inicia com sérios vícios” principalmente de competência.

Há ainda outros pontos a serem abordados, que durante o artigo a ser apresentado posteriormente serão abordados como os direitos dos detentos a uma pena digna, de modo que um preso o detento Clériston Pereira da Cunha morreu durante o cumprimento da prisão, o que é considerado algo bastante grave e deve ser analisado como uma consequência destes vícios processuais. Enfim, uma sequencia de erros que serão avaliados acerca dos manifestantes presos em 08 de janeiro de 2023.

A metodologia adotada é de Referencial Bibliográfico, com base em livros de Direito Processual Penal, Constituição Federal de 1988, posicionamento de juristas especialistas em ensaios, artigos, papers jurídicos, e demais matérias de jornais e fontes que forem comprovadamente seguras e possam ser utilizadas neste artigo.

Por fim, o objetivo deste artigo é desenvolver uma análise sobre os aspectos jurídicos acerca das prisões de 08 de janeiro de 2023, seus desdobramentos e eventuais erros e vícios processuais, como também as consequências destas ações, inclusive trazendo a superfície a morte de um dos condenados o senhor Clériston Pereira da Cunha.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA OU REVISÃO DA LITERATURA

O sistema prisional brasileiro é um dos maiores do Mundo (3º no Ranking Mundial – 322 pessoas privadas de liberdade a cada 100 mil habitantes) (NOTÍCIA PRETA, 2021). Divide-se em Sistema Federal e Estadual.

E, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2022, p. 396),

Em 2020, com o início da pandemia de Covid-19 no mundo, uma das principais preocupações dos governos e das entidades da sociedade civil eram as unidades prisionais. O alerta era justificável: locais insalubres, com baixas condições de higiene e sem a possibilidade de distanciamento social – as prisões são ambientes com altas possibilidades de disseminação do vírus. Em março de 2021, Phillip Meissner, especialista em reforma prisional da UNODC, colocou, em perspectiva mundial, que “a superlotação das prisões, (…) aumenta os desafios postos pela COVID-19 e a atual viabilidade de levar prevenção e medidas de controle da pandemia a esses locais”. Adicionou, ainda, que os presos são um segmento da população geralmente esquecido na hora de formulação das políticas públicas. No que diz respeito ao Brasil, contudo, o marco recente que mais impactou na piora das condições no sistema prisional vem de antes da pandemia de Covid-19. Em 24 de dezembro de 2019, foi publicada a Lei 13.964/2019, o conhecido Pacote Anticrime. A legislação muito discutida se tornou a grande bandeira do então Ministro da Justiça, o ex-juiz Sérgio Moro, que chegou a admitir à época que o pacote não resolveria todos os problemas, mas seria um “passo na direção correta”. Faltou apenas esclarecer que a direção correta, do seu ponto de vista, era se aproximar da marca de 1 milhão de presos no país. Dois anos após o início da vigência da lei, os dados confirmam o que especialistas já alertavam desde aquele momento: um dos pontos centrais da legislação era o aumento do prazo para progressão do regime o que significaria um cenário de maior tempo de pena em regime fechado e, em consequência, o aumento do encarceramento de um modo geral no país. Assim, se entre 2016 e 2019 a população carcerária cresceu em um ritmo menos acelerado que nos períodos anteriores, e, entre 2019 e 2020, houve praticamente estabilidade no total de presos – impulsionada pelas medidas de contenção de riscos em razão da pandemia de Covid-19 – em 2021, retoma-se a tendência de crescimento da população, atingindo o total de 820.689 pessoas custodiadas pelo Estado.

Para melhor entender o sistema prisional é oportuno mencionar que a pena é uma característica do ato de punir, responsável ao Estado. A teoria relacionada as penas têm muitos aspectos, sejam eles filosóficos, sociais, educacionais, religiosos, entre outros; apresenta-se um deles, na visão de Foucault (2011, p. 79),

[…] a reforma propriamente dita, tal como ela se formula nas teorias do direito ou que se esquematiza nos projetos, é a retomada política ou filosófica dessa estratégia, com seus objetivos primeiros: fazer da punição e da repressão das ilegalidades uma função regular, extensiva à sociedade; não punir menos, mas punir melhor; punir talvez com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade; inserir mais profundamente no corpo social o poder de punir.

Deste modo pode-se perceber que objetivo é a ressocialização, contudo o Direito, o Estado é o único que tem o direito de punir o indivíduo que comete crimes. O Estado enquanto detentor do poder, busca conter a criminalidade através das políticas públicas de segurança pública (polícias, sistema judiciário e etc), e uma das formas de otimizar esta condição é isolando o indivíduo da sociedade, através do encarceramento, e outras limitações, deixando do indivíduo em tese de ser um risco para a sociedade como um todo. Atualmente este é uma das únicas formas possíveis de buscar manter a paz (DAMÁZIO, 2010).

O sistema prisional é antes de tudo uma forma de controle social, ou seja, a sociedade possui certas regras, e algumas condutas quando cometidas por seus integrantes são reprováveis, e definidas legalmente, e imputadas penas. Estas penas são definidas também em Lei, e a forma de cumprimento também, na grande maioria dos casos com prisão (restrição de liberdade) (GARUTTI; OLIVEIRA, 2012).

O sistema prisional brasileiro está dividido em unidades de regime aberto (onde o apenado tem total liberdade em entrar e sair quando quiser, tendo algumas restrições); semiaberto (onde geralmente o apenado possui horários estabelecidos que pode se ausentar e horários específicos onde deve estar na unidade); e regime fechado (onde o apenado não possui possibilidade de se ausentar, precisando estar a todo momento em local apropriado, enclausurado e a disposição da justiça). O sistema prisional brasileiro ainda tem outras características relacionadas a sexo, como também grau de periculosidade dos presos, sendo que alguns estão totalmente incomunicáveis, salvo as possibilidades permitidas em lei (GARUTTI; OLIVEIRA, 2012).

A função do Sistema Prisional Brasileiro é a reabilitação. Deste modo o Estado assume a responsabilidade de receber este indivíduo e devolvê-lo a sociedade em condições de não mais incidir na prática criminosa. Contudo sabe-se que existe muita subjetividade no crime, intenção, fatores, sociais, econômicos, doenças mentais e outras questões, fazem com que este sistema nem sempre consiga atingir este objetivo (IPEA, 2015).

Não existe um consenso sobre o número atual de presídios no Brasil contudo o DEPEN, órgão que tem vinculação ao Ministério da Justiça, informou que o total de presos no país é de 811 mil pessoas. Destas 1.381 unidades prisionais, 997 têm mais de 100% da capacidade ocupada e outras 276 estão com ocupação superior a 200%. Sobram vagas em apenas 363 prisões em todo país (CÂMARA, 2021).

Muitos são os desafios encontrados pelo Ministério da Justiça relacionados ao Sistema Prisional Brasileiro, sendo os principais: tortura, falta de estrutura física, falta de pessoal habilitado (recursos humanos), políticas públicas que promovam o desencarceramento e reinserção do preso a sociedade, ambiente degradante e desumano, violação de direitos garantidos constitucionalmente, entre outros (FUNDAÇÃO FHC, 2021).

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2022, p. 397),

Após leve queda da população carcerária entre 2019 e 2020, o Brasil apresentou, em 2021, aumento de 7,3% na taxa da população prisional. A variação foi de 358,7 presos por 100 mil habitantes em 2020 para 384,7 em 2021, o que significa mais de 820 mil pessoas sob custódia estatal no último ano, dos quais, 141.002 são presos em prisão domiciliar. Em 2020, eram 753.966 pessoas privadas de liberdade no sistema penitenciário, número que chegou, em 2021, a 815.165. Em relação à quantidade de pessoas sob custódias das polícias, houve um leve recuo, passando de 5.552 pessoas em 2020 para 5.524 em 2021. Nas edições anteriores do Anuário, já se apontava a queda contínua na custódia de presos em delegacias, sendo um fator positivo de melhoria no sistema que merece destaque, ainda que a variação entre 2020 e 2021 tenha sido menor do que a verificada no período anterior (2019-2020).

Tem se visto um aumento da população carcerária nos últimos anos fazendo com que muitas discussões sejam levadas a tona sobre a possibilidade de ressocialização do Estado, além da forma com que estes indivíduos estão cumprindo as penas; se o objetivo das penas está sendo atingido. Em tese tem se percebido que o Sistema Carcerário em alguns momentos se resume a uma simples forma de punição.

A Constituição Federal de 1988 trouxe também previsões relacionadas aos direitos dos presos. Sendo lhe assegurados o direito à vida, à integridade física e moral entre outros que serão melhor abordados mais adiante (BRASIL, 1988).

Além destes existem outras leis específicas como a Lei de Execução Penal que garante ao preso uma proteção contra tratamento cruel ou degradante ou tortura, o direito a saúde e muitos outros (BRASIL, 1984).

Atualmente o sistema prisional é composto por presos provisórios e definitivos. Entende-se por preso provisório aquele que ainda não tem definida sua condição de “culpado” ou “inocente”. É aquele onde os trâmites judiciais ainda estão sendo realizados para verificação de “culpado” ou “inocente”. Uma das características do sistema prisional é a separação de presos provisórios dos presos definitivos.

Além disso as unidades prisionais brasileiras devem por obrigação ter locais onde possa ter assistência a saúde, possibilidade de trabalho e prática esportiva. Isso porque conforme já abordado o objetivo do sistema prisional brasileiro é reeducar e ressocializar os condenados. Além disso as unidades hospitalares que são dedicadas a mulheres precisarão contar com creches e berçários; além disso são unidades que contam com agentes do sexo feminino.

A média por 100 mil habitantes de indivíduos no sistema é de 338. Contudo acredita-se que no total haja mais de 812 mil presos no Brasil. Trata-se da terceira maior população carcerária do Mundo, perdendo somente para China e Estados Unidos.

Dados de 2019 que abordam o “Sistema Prisional em Números”, afirmam que a taxa de lotação no Brasil é de 166%. Além disso pouco mais de 50% da população prisional está encarcerada em virtude de “crimes contra o patrimônio”, como furto, roubo e receptação. Já 20% estão relacionados a crimes de drogas, e 18% de crimes contra a pessoa como infanticídio, aborto e homicídio.

É evidente que a saúde física e mental destes indivíduos está em cheque. Isso porque, muitas das prisões são ambientes insalubres, podendo-se falar até em proliferação de doenças infectocontagiosas nestes locais. Além disso, a alimentação não possui o rigor pedido em Lei, e muitas das rebeliões e insatisfações é pelo fato da comida vir “azeda”.

Nestes locais é comum ainda a falta de produtos de higiene e escassez de acesso a assistência judiciária, educacional, de saúde, trabalho e outros. Trata-se de um local que leva saúde física e mental do indivíduo ao extremo. Certamente são locais que trarão diversos traumas aos detentos. De acordo com a legislação vigente o preso tem direito à integridade moral, sendo imperativo que seja chamado pelo nome, tenha sua privacidade, imagem, e honra, preservado.

2.1 OS DIREITOS DO PRESO

Apresenta-se inicialmente alguns posicionamentos da Lei maior (BRASIL, 1988) do país quanto aos direitos do preso,

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
III – ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; (…)
XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; (…)
XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; (…)
L – às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; (…)
LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; (…)
LXXV – o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;”

Com este artigo nota-se a conotação de igualdade entre todos os indivíduos, não havendo distinção, de qualquer natureza entre homens e mulheres, negros e brancos, e qualquer outra natureza (MENDES, 2013).

O primeiro tema que aborda-se é a tortura e o tratamento degradante. Mas o que de fato seria a tortura? A tortura é a execução de algum meio, através de violência, de ameaça, de outros métodos, para fazer com que o preso, o detido, o investigado aja ou responda de forma favorável aos anseios do torturador. Seja através de confissão, através de informações, entre outras ações (SILVA, 2013).

A tortura é um método utilizado por muitos anos para obtenção de informações, entre outras necessidades. Contudo as sociedades modernas rechaçam qualquer tipo de violação dos direitos humanos não sendo aceito a tortura como meio investigativo, ou meio de obtenção de provas (BARROSO, 2011).

E o que seria um tratamento degradante? Trata-se de um tratamento desumano. Seja em qualquer esfera. Pode-se considerar um tratamento degradante um ambiente prisional insalubre, uma alimentação que não tenha o mínimo de higiene, de nutrientes, feita da forma adequada, com alimentos de qualidade, entre outras questões. Pode-se entender portanto que as penas degradantes se dão quando inexistem condições mínimas de saúde física e mental para sobrevivência, ou seja, em locais superlotados e insalubres (como exemplos) (BONAVIDES, 2011).

O texto ainda afirma que a “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”. Isso significa dizer que os estabelecimentos prisionais deverão levar em consideração o nível do crime cometido, a idade do preso e o sexo. Neste nexo, é importante ressaltar que já houveram casos de mulheres que foram presas com homens e houve barbáries cometidas (SILVA, 2013).

É ainda comum o entendimento que os presídios tornaram-se para muitos escolas do crime; onde um apenado especializado em um crime de furto, ou roubo, em contato com um traficante de drogas, troca a ilicitude, e quando sair estará com todos os contatos e pleno para o cometimento dos crimes (SAPORI, 2021).

Após fazer uma importante menção sobre os dados da criminalidade no país debruça-se aos direitos que o preso detém sob a perspectiva constitucional. O Brasil não admite dentro de seu ordenamento jurídico penas que sejam cruéis e degradantes (BRASIL, 1988):

XLVII – não haverá penas:

  1. de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
  2. de caráter perpétuo;
  3. de trabalhos forçados;
  4. de banimento;
  5. cruéis;

No Brasil não se admite pena de morte em nenhuma hipótese salvo as descritas em Lei (guerra declarada). A pena de morte no Brasil só é aceita em caráter excepcionalíssimo, em caso de guerra declarada. Também não se admite prisão perpétua, com trabalhos forçados, e nem o banimento. Além disso, é importante salientar que a condenação no Brasil deve ser por autoridade competente, sendo respeitado o contraditório, ampla defesa e devido processo legal (BRASIL, 1988).

O ciclo de condenação no Brasil inicia-se a partir da investigação, da denúncia feita pelo ministério público (ou de forma distinta dependendo se a ação é pública ou privada), pela comprovação da autoria, materialidade, e julgamento pela autoridade competente, sendo disponibilizado direitos a recursos em todas as estâncias cabíveis, o acusado recebe a sentença e caso seja condenatória com transitado em julgado começa a cumprir a pena, seja ela em regime fechado, aberto, ou semiaberto, ou aberto (BRASIL, 1988).

Nestes termos é oportuno trazer alguns artigos da LEP – Lei de Execução Penal (7.210/1984)

Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

Art. 11. A assistência será:

  1. – material;
  2. à saúde;
  3. jurídica;
  4. educacional;
  5. social;
  6. religiosa.”

O preso portanto deverá ser assistido pelo Estado em suas necessidades básicas. Além disso deverá ter direito a assistência religiosa, condições materiais mínimas, assessoria jurídica, educacional. Deste modo pode-se concluir que ainda que o preso precise cumprir uma pena, esta não pode fugir ao fim a que se destina que é a ressocialização (SAPORI, 2021).

A pena deverá ser cumprida em estabelecimento adequado frente ao crime que foi cometido. Além disso o preso não poderá sofrer torturas, maus tratos ou outro tipo de dano, enquanto a pena estiver sendo cumprida. O preso ainda tem direito a mínimo de 3 refeições por dia. Ter acesso ao advogado para entendimento de como está o seu processo e eventuais recursos que estiverem sendo interpostos. Tem direito ao sistema de saúde. Tem direito a trabalhar de forma a abater o tempo da pena, entre outros direitos (BRASIL, 1988; BRASIL, 1984).

Uma questão muito importante relacionado aos direitos do preso está relacionado a prisão provisória. A prisão provisória é uma medida cautelar que objetiva a privação de liberdade do cidadão. Deve ser um ato muito bem pensado frente ao fato que além de atingir a liberdade do indivíduo pode atingir a moral, o patrimônio e muitos outros âmbitos (BRASIL, 1941).

E, a falta de fundamentação nessas medidas traz danos a toda sociedade que sente-se refém, de uma justiça que envergonha e desenvolve atos sem o real entendimento do dano que poderá causar caso sejam injustos e inapropriados (LOPES JR, 2012).

O preso ainda tem que ter sua integridade física e moral preservada. Estes são os entendimentos do artigo 5º da Constituição federal de 1988 nos incisos III e XLIX além do artigo 40 da Lei de Execuções Penais (BRASIL, 1988; BRASIL, 1984).

Não são admitidos ao preso coações morais e psicológicas (calúnias, ameaças, difamações, insultos, xingamentos, provocações e etc.); Além disso admite-se como violação da sua integridade (coações físicas, agressões, golpes, surras, tapas, crueldades, violência sexual, torturas, entre outros) (BRASIL, 1988; BRASIL, 1984).

De acordo com o Código Penal no artigo 38 (BRASIL, 1940):

Direitos do preso
Art. 38 – O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

É importante salientar ainda que toda autoridade que no exercício de suas funções usar da força ou outro meio de forma não justificada poderá estar passível de responder por abuso de autoridade.

Destaque ainda para a resolução Nº 14, de 11 de novembro de 1994 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciaria que afirma que o preso ou a pessoa presa tem direito a preservação da sua integridade física e moral, não devendo ser submetida a tortura, tratamento desumano ou degradante, e tampouco ficar exposta a execração pública,

Art. 3º. É assegurado ao preso o respeito à sua individualidade, integridade física e dignidade pessoal.
Art. 4º. O preso terá o direito de ser chamado por seu nome.
Art. 24. São proibidos, como sanções disciplinares, os castigos corporais, clausura em cela escura, sanções coletivas, bem como toda punição cruel, desumana, degradante e qualquer forma de tortura.
Art. 25. Não serão utilizados como instrumento de punição: correntes, algemas e camisas-de-força.

O preso tem direito também a assistência jurídica, caso não tenha condições financeiras de arcar o Estado direciona um profissional para assisti-lo. Está descrito este direito no artigo 5º inciso LXXIV. Esta assistência deverá ser plena, sendo que o defensor deverá participar do processo de execução da pena, devendo ser nomeado pelo Juiz conforme preceitua os artigos 15 e 16 da Lei de Execuções Penais:

SEÇÃO IV

Da Assistência Jurídica

Art. 15. A assistência jurídica é destinada aos presos e aos internados sem recursos financeiros para constituir advogado.

Art. 16. As Unidades da Federação deverão ter serviços de assistência jurídica, integral e gratuita, pela Defensoria Pública, dentro e fora dos estabelecimentos penais. (Redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010).

§ 1º As Unidades da Federação deverão prestar auxílio estrutural, pessoal e material à Defensoria Pública, no exercício de suas funções, dentro e fora dos estabelecimentos penais. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

§ 2º Em todos os estabelecimentos penais, haverá local apropriado destinado ao atendimento pelo Defensor Público. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

§ 3º Fora dos estabelecimentos penais, serão implementados Núcleos Especializados da Defensoria Pública para a prestação de assistência jurídica integral e gratuita aos réus, sentenciados em liberdade, egressos e seus familiares, sem recursos financeiros para constituir advogado. (Incluído pela Lei nº 12.313, de 2010).

É importante ressaltar que a ausência de um advogado pode ser considerada como prejuízo ao réu, podendo inclusive ser decretado a nulidade do processo:

Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: […] III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

  1. a denúncia ou a queixa e a representação e, nos processos de contravenções penais, a portaria ou o auto de prisão em flagrante;
  2. o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167;
  3. a nomeação de defensor ao réu presente, que o não tiver, ou ao ausente, e de curador ao menor de 21 anos;
  4. a intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos da intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública;
  5. a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa;
  6. a sentença de pronúncia, o libelo e a entrega da respectiva cópia, com o rol de testemunhas, nos processos perante o Tribunal do Júri;
  7. a intimação do réu para a sessão de julgamento, pelo Tribunal do Júri, quando a lei não permitir o julgamento à revelia;
  8. a intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, nos termos estabelecidos pela lei;
  9. a presença pelo menos de 15 jurados para a constituição do júri;
  10. o sorteio dos jurados do conselho de sentença em número legal e sua incomunicabilidade;
  11. os quesitos e as respectivas respostas;
  12. a acusação e a defesa, na sessão de julgamento;
  13. a sentença;
  14. o recurso de oficio, nos casos em que a lei o tenha estabelecido;
  15. a intimação, nas condições estabelecidas pela lei, para ciência de sentenças e despachos de que caiba recurso;
  16. no Supremo Tribunal Federal e nos Tribunais de Apelação, o quorum legal para o julgamento;

Os presos também possuem direito a saúde, a assistência médica, farmacêutica e odontológica. De acordo com a legislação de execuções penais no artigo 14, os estabelecimentos prisionais deverão ter um serviço médico eficiente e adequado para atender as necessidades cotidianas da população. Caso isso não seja possível o apenado vai ser encaminhado a um local para atendimento. Esta autorização é feita mediante o juiz.

Segundo o que preconiza a ONU os estabelecimentos prisionais deverão ter pelo menos um médico com conhecimento nas áreas de psiquiatria; além disso que os presos provisórios possam receber de tempos em tempos a visita de um médico ou dentista. Além disso os presos doentes crônicos devem ter direito a acesso a medicamentos e atendimento. Aos presos também é garantido o acesso aos programas preventivos de colo de útero, câncer de reto, câncer de pele, câncer de próstata e câncer de mama.

O trabalho também é um direito dos presos. É tanto um direito como um dever. Neste sentido entende-se como trabalho qualquer atividade legal exercida pelo sentenciado, dentro ou fora do estabelecimento prisional. Está descrito no artigo 39 do Código Penal que o trabalho do preso é remunerado: “Trabalho do preso – Art. 39 – O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os benefícios da Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

No mesmo sentido os artigos 29 e 41 inciso III da LEP:

Art. 29. O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a 3/4 (três quartos) do salário mínimo.
§ 1° O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
b) à assistência à família;
c) a pequenas despesas pessoais;
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.
§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em Caderneta de Poupança, que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.
[…]
Art. 41 – Constituem direitos do preso:
I – alimentação suficiente e vestuário;
II – atribuição de trabalho e sua remuneração;
III – Previdência Social; […]

Quanto a remuneração do preso não pode ser inferior a ¾ do salário mínimo vigente, podendo sofrer descontos mediante o dano causado pelo crime, a assistência a família, as despesas pessoais de ressarcimento ao Estado pelos gastos com a manutenção do condenado; já o que sobrar irá ser depositado em uma poupança e entregue ao sentenciado quando posto em liberdade.

O trabalho do preso não é regulamentado pela CLT contudo o preso tem direito aos seguintes benefícios (caso trabalhe): aposentadoria, salário família, acidente de trabalho e auxílio reclusão. É importante ressaltar que não existe regulamentação para aposentadoria e salário família do preso. Além disso a LEP não prevê a possibilidade de descontar a previdência, ficando a critério do mesmo o pagamento.

O auxilia reclusão é garantido aos dependentes do segurado preso. Ou seja, na época da prisão recolhia ao INSS, tanto como registro em carteira como autônomo.

A remição também é um direito do preso. A remição é o ato de abater um dia de pena quando cumpre três dias de trabalho. Segundo preconiza o artigo 33 da LEP:

Art. 33. A jornada normal de trabalho não será inferior a 6 (seis) nem superior a 8 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados.

Parágrafo único. Poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal.

É importante ressaltar que a remição pode ser revogada caso o apenado incidir em falta grave. O preso ainda tem direito a visita. Tanto de familiares como da esposa, companheira, ou namorada. Conforme preconiza o artigo 41 inciso X: “X – visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;” As visitas intimas também são direitos, contudo deverá ter procedimento prévio.

Segundo o artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos do Homem o sigilo de correspondência e liberdade de informação é direito também do preso. O artigo 41 incisos VI e XV ensinam:

VI – exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
XV – contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.

Com base nesta abordagem inicial apresenta-se o início de tratativa sobre o Massacre. Mais adiante será abordada com maior profundidade como a lei de execuções penais traz as principais situações relacionadas a forma com que a pena deve ser cumprida no Brasil, principalmente no que tange aos direitos do preso em regime fechado.

2.2 AS PRISÕES DO 8 DE JANEIRO DE 2023

Muito se tem discutido sobre a legalidade das prisões de 08 de janeiro de 2023. Inclusive já há uma CPI em andamento que causou grande comoção quando uma senhora idosa, condenada a mais de 15 anos de prisão (dosimetria e proporcionalidade totalmente ao revés ao que se entende por justiça) entra com uma tornozeleira e uma bíblia na mão. Pessoa sem qualquer antecedente criminal e uma conduta ilibada.

Dentro desta órbita outras questões vêm sendo discutidas de forma ferrenha sobre estes casos. Inclusive se o STF é o Tribunal adequado para julgar estas pessoas. E também quais foram os crimes que cada um dos indivíduos presos cometeram (RODRIGUES, 2023).

Além disso, para determinar a legalidade das prisões, é necessário verificar se foram respeitados os procedimentos legais adequados, como a existência de mandados de prisão válidos, a observância dos direitos constitucionais dos indivíduos detidos, e se as prisões foram realizadas dentro dos limites estabelecidos pela lei brasileira. Tudo isso é questionado em muitos artigos e demais publicações levantadas para a pesquisa.

Em qualquer caso de prisão, é importante que os direitos fundamentais dos indivíduos sejam respeitados, incluindo o direito à assistência de um advogado e o direito a um julgamento justo. Se houver dúvidas sobre a legalidade de uma prisão específica, é recomendável buscar orientação jurídica adequada para avaliar o caso em questão.

Talvez a maior dificuldade deste caso é tanto provar a tipificação dos casos, como o cometimento de cada um nos crimes imputados e a questão da jurisdição. Além disso a morte de Clériston Pereira da Cunha ocorrida dentro do cárcere, um dos manifestantes que foi preso nos atos de 08 de janeiro de 2023, foi considerado o ápice de consequências e barbárie judicial.

Foram presos em 8 de janeiro de 2023 1.166 pessoas, sendo dos 1.166 presos: 673 são homens, encaminhados ao CDP 2 (Centro de Detenção Provisória 2), no Complexo Penitenciário da Papuda; e, 493, mulheres, levadas à Penitenciária Feminina do DF. Estes manifestantes, que posteriormente alguns foram chamados de terroristas, estavam acampados em frente ao QG de Brasília.

De imediato surgiu a dúvida sobre de quem seria a competência de julgar estas pessoas, mais precisamente se estava correto nas competências e critérios para que o STF tenha sido a corte julgadora, a proporcionalidade das penas aplicadas, e as consequências destas penas como é o caso da morte na prisão. Será abordado ainda eventuais abordagens anormais que o STF tenha tomado nestes casos, levando em consideração outros crimes com potencial ofensivo muito maior e que tiveram uma pena totalmente distinta da aplicada a estes manifestantes.

2.3 COMPETÊNCIA

A competência em julgar estes crimes é uma indagação perene neste caso. Antes de abordarmos este tema sobre a competência em julgar é importante avaliar o que seria a jurisdição. Jurisdição está relacionado a dizer o Direito, o Poder de dizer o Direito. O Estado que o titular do jus puniendi, tem a jurisdição, o poder de dizer em caso concreto qual o direito deve ser aplicado, fazendo com que a vontade do Estado seja soberana a vontade de uma das partes (REBOUÇAS, 2022).

A competência é a limitação do exercício da jurisdição; quem diz o direito é o Estado na figura do juiz, mas é impossível que dentro do território nacional um só juiz julgasse todas as matérias. Nesse contexto a CF 1988 dá a competência de quais juízes, tribunais, órgãos, julgam determinados temas, assuntos e matérias. A limitação do exercício da jurisdição (RANGEL, 2021).

Assim a Jurisdição é considerada como um Direito Fundamental, o direito de quando demandante, ou demandado como é o caso do Direito Penal, onde o autor da ação é o Ministério Público o acusado tem o direito fundamental de ser julgado por um juiz, natural (cuja competência está prefixada em lei), imparcial e no prazo razoável, respeitando inclusive a celeridade, sendo também um poder-dever do Estado (LOPES JR, 2016).

Como também que tipo de pessoas podem ser julgados, como é o caso de pessoas por prerrogativa de função são julgados por tribunais especiais como é o caso dos militares, dos membros do poder legislativo, juízes, desembargadores, do presidente da república e muitas outras autoridades (LOPES JR, 2016).

Dentro deste contexto a competência seria as condições necessárias para atendimento da Justiça para se buscar a eficácia para a garantia da jurisdição (juiz natural e imparcial). Definir a competência de quem deverá julgar avaliar verificar as provas e tomar uma decisão é antes de tudo dar qualidade e legitimidade da jurisdição (NUCCI, 2024).

Assim a competência deriva da Jurisdição. A competência pode ser entendida como um conjunto de regras que asseguram a eficácia da garantia da jurisdição e, que o processo seja dirigido por um juiz natural. E, a partir do segmento das regras, dos atributos, dos requisitos necessários haja o seu exercício (NUCCI, 2024).

A regra da competência é que a partir da delimitação da jurisdição, condiciona-se o exercício. Assim um juiz, ou tribunal, somente poderá julgar o caso se for competente na matéria, em razão da pessoa e do lugar.

O Código de Processo Penal no artigo 69 traz quais são os critérios de competência.

Traz o seguinte entendimento:

Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:
a) – o lugar da infração:
b) – o domicílio ou residência do réu;
c) – a natureza da infração;
d) – a distribuição;
e) – a conexão ou continência;
f) – a prevenção;
g) – a prerrogativa de função.

Nota-se portanto que são 7 requisitos a serem preenchidos e levados em consideração para que a competência seja determinada. A sequencia é a seguinte:

Tabela 01. Critérios relativos à matéria e pessoa

Justiças EspeciaisJustiça EleitoralJustiças Comuns
Justiça Militar Justiça Comum Federal
Justiça Militar Federal Justiça Comum Estadual
Justiça Militar Estadual  

Fonte: próprio autor, 2024.

Assim apresenta-se um fluxograma a seguir com os níveis de jurisdição de Justiça Comum, a que em tese os praticantes dos atos do 8 de janeiro deveriam seguir o rito (LOPES JR, 2016):

Fluxograma 01. Níveis de Jurisdição da Justiça Comum

Fonte: Adaptado de Auri Lopes Jr, 2016.

Assim a regra é de que considera-se uma justiça competente quando o caso se dá em razão da matéria, pessoa e lugar. A doutrina majoritária ainda afirma que com base no princípio da indeclinabilidade da jurisdição, a competência em razão da matéria e pessoa é absoluta, enquanto que o critério local do crime seria relativo. Contudo esta posição não é uníssona (NUCCI, 2024).

A doutrina majoritária também entende que em relação ao lugar também é absoluta, ainda que alguns juristas a relativizem, e, nós neste artigo concordamos com esta posição (NUCCI, 2024).

Dentro da análise da competência faz-se alguns posicionamentos:

– I – o lugar da infração: quanto ao lugar da infração a competência entendida como adequada seria a justiça do Distrito Federal, ou de Brasília, visto que os atos supostamente cometidos por este grupo de manifestantes, foi cometido em Brasília, na praça dos 3 poderes.

II – o domicílio ou residência do réu: levando por este critério haviam manifestantes de toda parte do país, podendo portanto alguns serem julgados em seus próprios estados e cidades; III – a natureza da infração: a natureza da infração está relacionada a qual Justiça irá ser competente em julgar o caso. Neste caso a nosso ver poderia ser a Justiça Federal pois o Distrito Federal é considerado um território Federal, e como o crime de dano ao patrimônio público, e vandalismo foi o cometido, quem deveria julgar seria a Justiça Federal.

Aqui surge uma importante abordagem sobre este caso, pois segundo o art. 74 do Código de Processo Penal a competência pela natureza é regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência do Tribunal do Júri, que já abordada na própria Constituição Federal.

Além disso existem especialidades como a justiça que julga indivíduos com foro por prerrogativa de função trazido exclusivamente por Constituição Estadual não prevalece em relação ao Tribunal do Júri, exatamente porque o último tem previsão na Constituição Federal.

Relacionada a distribuição, é um é um conceito fundamental no direito processual que define qual órgão judiciário (juízo ou tribunal) é o competente para processar e julgar determinada causa. Essa definição é crucial para garantir a correta aplicação da lei e a efetividade da tutela jurisdicional.

Pode-se levar em conta a matéria e natureza da causa, ou seja, o tipo de direito material envolvido (civil, penal, trabalhista, etc.); o valor da causa; e até mesmo relacionado a pessoa (por exemplo, funcionário público); e por fim o território.

Ainda que muitos aceitem a realização dos trâmites pelo Superior Tribunal Federal, nenhum dos manifestantes presos do 08 de janeiro tinham prerrogativa de foro. Sem prerrogativa de foro não se acha cabível admitir que o tribunal adequado fosse o que realizou todos os passos processuais, sendo um processo já eivado de ilegalidade por início.

3 METODOLOGIA

Considera-se como um estudo de referencial bibliográfico, baseado em documentos obtidos nas bibliotecas físicas e digitais da FIMCA, Âmbito Jurídico, Jusnavegandi, Sites públicos e de notícias como o STF, STJ e demais fontes que possam embasar a argumentativa e posicionamentos sobre o tema.

É sabido que o tema está sob judicie do STF, de modo que ainda nem todos os processos tiveram um desfecho, portanto as apresentações de posicionamentos aqui apresentados são fundamentados em conhecimentos de doutrinas, de pensadores, e de catedráticos já consagrados nos campos de direito existentes e abordados.

Além disso não existem conflitos éticos para realização da pesquisa e a pesquisa também não trará qualquer malefício, e poderá contribuir com uma discussão sobre a problemática abordada.

Não haverá necessidade de apreciação do Comitê de Ética e Pesquisa visto que não trabalha com seres humanos de forma direta e sim com Direitos. Não haverá qualquer utilização de questionários e outros instrumentos.

A pesquisa primará por questões consideradas primárias do direito, como a competência do Supremo em julgar indivíduos sem prerrogativa de foro; as penas que foram arbitradas, consideradas desproporcionais; o julgamento político apresentado por muitos doutrinadores; a falta de critérios e provas do real cometimento do ilícito de cada um, entre outras questões.

Deste modo entende-se que a pesquisa é jurídica de cunho bibliográfico, com enfoque dedutivo, partindo de um entendimento geral de que os presos do 8 de janeiro de 2023 não tem foro privilegiado, sendo necessário que a justiça comum os julgue, não sendo portanto competência do supremo os julgar; inclusive levando em consideração que muitos juristas tem afirmado que trata-se de um julgamento político, com penas desproporcionais ao dano.

Ainda considera-se a pesquisa como qualitativa pois irá adentrar dentro do contexto do direito processual penal, constitucional e demais ramos do direito que possam abordar. Inclusive levará em conta o fato de um destes presos ter morrido no cárcere.

As bibliografias selecionadas pairam no campo do Direito Constitucional, Direito Processual Penal, Teoria Geral do Direito, entre outros artigos, papers, e demais fontes que sejam tecnicamente utilizáveis e de fonte confiável e tenha condições de ser citada conforme a ABNT.

RESULTADOS E DISCUSSÕES OU ANÁLISE DOS DADOS

A pena de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro precisa ser proporcional. Isso significa dizer que um peso de um crime contra a vida não pode ser o mesmo peso de uma pena relacionada a crimes contra o patrimônio. São bens distintos, onde a ameaça a um é o maior bem que existe: a vida, e o outro diz respeito a coisas, bens materiais.

No caso do 8 de janeiro houveram casos de penas de 17 anos. Inclusive pessoas sem qualquer tipo de vida pregressa com a justiça. E será que a manifestação realizada pelos participantes era uma ação capaz de atentar contra a democracia.

É importante deixar a visão política de lado e atentar-se ao que a lei diz. Segundo o princípio da proporcionalidade no direito penal a pena deverá ser proporcional ao dano causado. Além disso cada pena deve ser individualizada, e não poderá ultrapassar a figura do réu.

No caso do 08 de janeiro, há muitas críticas que não houve uma investigação adequada, não houve uma ordem processual correta, visto que todos os presos e posteriormente condenados não detinham prerrogativa de foro e deveriam ter sido julgados pela justiça comum, e até mesmo o argumento de que não houve uma individualização das penas.

São complexos os argumentos de cada um visto que a questão da proporcionalidade das penas aplicadas aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro é totalmente reversa, pois: não houve uma morte; não há uma real noção de quem praticou qual ato ilegal; o patrimônio público atingido foi restituído. E de todo modo a Constituição Federal brasileira garante o direito à proporcionalidade da pena, ou seja, a punição deve ser adequada à gravidade do crime cometido.

Isso vai de encontro a diversos princípios, conceitos e bases do direito. Muitas críticas foram feitas as decisões do supremo, pois outros casos podem posteriormente julgados com os mesmos critérios. Inclusive há muitos que afirmam que houve um posicionamento político do tribunal.

Houve uma falta de garantia da justiça pois um dos fundamentos do Direito Constitucional e Penal é que as penas sejam aplicadas de forma justa, considerando as circunstâncias de cada caso e os direitos dos acusados.

Em contrapartida há outros que são favoráveis afirmando que houve uma gravidade dos crimes, afirmando que as ações foram consideradas graves ataques à democracia e às instituições brasileiras, justificando penas mais severas. Além disso alegam um risco à ordem pública, visto que a turba, o movimento colocou em cheque a manutenção da ordem pública e a prevenção de novos atos de violência são argumentos utilizados para justificar a necessidade de penas mais rigorosas.

Estes favoráveis as penas aplicadas ainda afirmam que o rigor foi necessário frente a natureza dos crimes, de modo que o que foi atingido foram danos ao patrimônio público, ameaça à segurança nacional e atentado contra a democracia, o que justifica penas mais severas.

Contrário a estas posições, estão uma corrente considerada mais forte, e que afirma que as penas aplicadas foram extremamente severas, e até mesmo constituídas em muito de caráter político. Foi totalmente oposto ao princípio da individualização da pena, visto que é grande o grupo de juristas que afirmam que as penas aplicadas não consideram as particularidades de cada caso, como o grau de envolvimento de cada indivíduo nos atos.

Inclusive os críticos as prisões afirmam que em muitos casos houve ilegalidades frente as prisões preventivas prolongadas, de modo que a prisão preventiva de um grande número de pessoas por um longo período sem julgamento final tem sido questionada, pois pode violar o princípio da presunção de inocência.

Haviam por fim uma grande gama de o outras medidas cautelares, inclusive os próprios defensores de direitos humanos argumentam que outras medidas cautelares, menos restritivas à liberdade, poderiam ser utilizadas em alguns casos.

Não existe em direito penal analisar o caso de forma coletiva, sem um crime individual. Sendo assim no Direito Penal cada caso é único e a análise da proporcionalidade da pena deve ser feita de forma individualizada, considerando as particularidades de cada caso.

Conclui-se portanto que é fundamental que o sistema jurídico brasileiro garanta que as penas sejam aplicadas de forma justa e proporcional, respeitando os direitos dos acusados e a necessidade de garantir a ordem pública e a segurança da sociedade.

Infelizmente o julgamento, e a prisão de muitos do 8 de janeiro trouxe gravíssimas consequências. Uma delas diz respeito ao manifestante Clériston Pereira da Costa. Clériston era um empresário, e estava se manifestando no 8 de janeiro.

Foi preso, julgado e começou a cumprir pena. Clériston tinha comorbidades. Clériston era doente crônico de diabetes e de hipertensão. Entre janeiro e maio de 2023 Clériston teve 6 momentos de atendimentos ao Hospital Regional da Asa Norte.

Inclusive a própria PGR – Procuradoria Geral da República tinha dado parecer favorável a sua soltura. Ibnclusive a mídia tem divulgado diversos outros casos semelhantes (17) com casos semelhantes de apenados com comorbidades e doenças relacionadas.

Segundo nota emitida no relatório de atendimento do apenado teve um mal súbito e foram feitas reanimações mas sem sucesso. Contudo a mídia tem divulgado versões conflitantes.

A Defensoria Pública do Distrito Federal trouxe em seu relatório que Cleriston Pereira da Cunha, réu do 8 de janeiro com morte confirmada no Complexo da Papuda nesta segunda- feira (20/11/2023), esperou cerca de 40 minutos para receber os primeiros atendimentos médicos após passar mal durante banho de sol. De acordo com os agentes, a equipe de saúde chegou quando o empresário de 46 anos já tinha morrido, e a área de saúde da unidade estava fechada por ser ponto facultativo em função do feriado da Consciência Negra(NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023).

Há inclusive relatos anteriores de outros atendimentos a Clériston de “falta de ar”.

Testemunhas que viram o momento afirmam:

“Contaram que estavam reunidos no pátio, durante o banho de sol, quando Sr. Cleriston Pereira da Cunha começou a passar mal. Contaram, ainda, que a policial penal, que tomava conta deles, entrou em desespero por não saber como apoiar e passou a enviar mensagens, solicitando ajuda. Informaram que os próprios colegas de ala tentaram reanimá-lo, pois um deles é médico ************ e o outro é dentista ************, oportunidade em que o senhor Cleriston conseguiu, por duas vezes, respirar”, diz trecho do documento (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023).

Inclusive estas testemunhas afirmaram aos defensores públicos que apenas vinte e cinco minutos depois de conseguir ser reanimado pela segunda vez é que a ajuda médica chegou ao local, carregando aparelhos que consideraram incompatíveis ao atendimento (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023; NOIA, 2023).

Estas testemunhas informaram que a médica chegou ao local apenas com um estetoscópio e um aparelho de pressão, e que a unidade prisional não tinha desfibrilador nem cilindros de oxigênio disponíveis (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023; NOIA, 2023). Contrária a esta versão os policiais penais responsáveis pelo CDP II, afirmaram que o atendimento do réu no dia da morte foi “célere” e realizado com o “chamamento imediato” de equipes do Samu e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, além de atuação de médicos no local. Uma versão totalmente conflitante ao que os demais presos trouxeram.

Podendo inclusive poder enquadrar estes policiais em crimes como a omissão de socorro (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023; NOIA, 2023).

Há inclusive relatos dos próprios colegas de Clériston, no relatório da defensoria de que Clériston chegou a passar mal em mais de dez ocasiões desde que foi preso, em janeiro, em que foi atendido ou pediu atendimento médico dentro do Complexo da Papuda. Eles informaram ainda que o réu precisava ser levado pelos colegas para tomar banho de sol diante de seu estado “fragilizado” (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023; NOIA, 2023).

Inclusive com este evento trágico a Defensoria Pública do Distrito Federal identificou outros 18 casos de presos que alegam terem condições de saúde, mas não receberam atendimento dentro da unidade prisional. Há relatos de todos os tipos como de: alterações na tireoide, depressão e suspeitas de câncer que não teriam sido tratadas ou que sequer teriam recebido atendimento médico (NOIA; MERGULHÃO, MARZULLO, 2023; NOIA, 2023).

O que ocorre é que Clériston tinha família e filhos, e que o ocorrido pode ter altíssima relação com a prisão, o julgamento, e a execução da pena. Infelizmente tudo demonstra que o réu não tinha condições de cumprir a pena em regime fechado e muito está relacionado ao evento trágico. E nem qualquer restituição em dinheiro, indenização, pedido de desculpas, ou questão correlata poderá restituir Clériston a sua família.

As prisões e condenações do 8 de janeiro são eivadas de erros e totalmente ilegais segundo alguns juristas. O primeiro diz respeito ao princípio da individualização da pena que não foi respeitado.

Segundo preceitua o princípio deve ser garantindo que a punição aplicada a cada indivíduo seja justa e proporcional à gravidade do crime cometido e às circunstâncias particulares de cada caso. Além deste entendimento atrelado ao princípio está a personalização da pena, não sendo portanto aplicada de forma genérica, mas sim adaptada às particularidades individuais de cada caso, levando em consideração a personalidade do agente, as circunstâncias do crime, os motivos, as consequências e a culpabilidade.

Com este entendimento não se pode haver uma padronização de penas, reconhecendo que cada caso é único e requer uma análise individualizada. Além disso as penas deverão ainda respeitar a dignidade da pessoa humana, evitando punições cruéis e desumanas, garantindo que a pena seja aplicada de forma proporcional ao crime cometido. A pena ainda deverá cumprir a sua função de ressocialização, não somente de punir o réu.

Além da questão relacionada a individualização da pena, muitos questionaram e perguntaram sobre prisão preventiva em excesso. É sabido que a prisão preventiva é uma medida excepcional, e deve ser utilizada apenas quando houver risco de fuga ou de obstrução à justiça. Neste sentido o STF utilizou a alegação de risco à ordem pública de forma generalizada, levando a prisão pessoas com qualquer ameaça concreta as investigações e desfechos. Uma alegação totalmente cabível ao habeas corpus e outros remédios que não foram aceitos e admitidos processualmente.

Outro erro apontado pelos juristas foi o da violação ao princípio da presunção de inocência, ao passo que a prisão preventiva prolongada sem um julgamento célere pode violar o princípio da presunção de inocência, que garante que toda pessoa é considerada inocente até que se prove o contrário em um processo judicial.

Havia ainda uma grande violação relacionada a provas. Muitos foram acusados de vandalismo e outros tipos de crimes sem vídeos, fotos, testemunhos ou outro tipo de prova que ligasse o agente ao ato, podendo se considerar como uma prisão injusta.

Há ainda muitas alegações de violação ao direito de defesa, pois alguns dos presos alegaram que sequer seus advogados tiveram acesso ao processo. E alguns sequer tiveram acesso a advogado e não puderam apresentar sua defesa de forma adequada.

E por fim a questão política que muitos alegam ser um fator determinante tanto para a prisão, o julgamento a condenação e as penas serem tão severas e não proporcionais. Há inclusive uma corrente que afirma que já houve em outros momentos ações do mesmo tipo,

como da invasão da praça dos três poderes por membros do MST e nada ocorreu na época. São portanto dois pesos e duas medidas.

4 CONCLUSÃO/CONSIDERAÇÕES FINAIS

Infelizmente o que ocorreu no dia 8 de janeiro foi uma resposta a uma invasão que até o momento não tem uma real certeza de como foi orquestrada, por quem foi realizada, e quem de forma individual promoveu o vandalismo, o dano ao patrimônio público e outros danos.

Em verdade o que se percebeu na sequencia foi uma cascata de erros que se iniciam logo a competência dada ao STF em julgar os presos do 8 de janeiro. Espantando-se ainda mais na velocidade dada aos trâmites do tribunal que quase sempre são morosos, e neste caso em especial deu-se entre prisão, investigação, e julgamento em tempo recorde, totalmente atípico as práticas daquela corte (RODRIGUES, 2023).

Não se respeitou os princípios de individualização da pena, proporcionalidade, e até mesmo pode-se falar que da dignidade da pessoa humana, ao passo que houve morte no cárcere de Clériston. Mesmo com parecer favorável a sua liberação em virtude da sua condição de pessoa com comorbidade.

Nota-se que há uma tendência bastante grande da justiça em punir quem está sendo contrário ao governo vigente. E não somente neste caso em questão, mas em outras decisões. É bastante triste frente a necessidade de termos um sistema judicial imparcial, que se baseie nas leis, nas normas e nos estatutos e não parametrize o réu com base em suas posições ideológicas e políticas.

Infelizmente o que parece ter acontecido no caso das prisões do 8 de janeiro. Vimos uma grande quantidade de réus sem qualquer passado judicial, sendo penalizado a penas acima de 15 anos. Idosos, e pessoas de boa índole e considerados pessoas de bem em seus meios, mas que estavam manifestando-se contrária a realidade presente, alegando fraude nas urnas e outras reivindicações.

Espera-se que a justiça possa rever estes atos aos que no momento estão sendo injustiçados, pois para a família de Clériston, sequer essa possibilidade existe mais, pois sua vida já foi ceifada, e qualquer ressarcimento será capaz de o trazer a vida.

REFERÊNCIAS

ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Fórum Brasileiro de Segurança Pública. 2019. Disponível em:< https://www.forumseguranca.org.br/wp- content/uploads/2019/10/Anuario-2019-FINAL_21.10.19.pdf> Acesso em 19 out 2024.

BRASIL. 2005. Lei n. 7210, de 11-07-1984: Lei de Execução Penal. In : BRASIL. Código Penal, Código de Processo Penal, Constituição Federal. São Paulo : Saraiva.

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Decreto-Lei/Del3689.htm>. Acesso em 19 out 2024.

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Manual de prevenção e combate à tortura e maus-tratos para audiência de custódia / Conselho Nacional de Justiça, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime; coordenação de Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi … [et al.]. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2020.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Senado Federal: Brasília, 2008.

BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 31 dez.

BRASIL. Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Senado Federal: Brasília, 2009. BRASIL. Lei de Execução Penal de 1984. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm>. Acesso em 19 out 2024.

BRASIL. Resolução nº 14, de 11 de novembro de 1994. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), Brasília, 1994.

CÂMARA. ONU vê tortura em presídios como “problema estrutural do Brasil. 2021. Disponível em:< https://www.camara.leg.br/noticias/809067-onu-ve-tortura-em-presidios- como-problema-estrutural-do- brasil/#:~:text=O%20Depen%2C%20%C3%B3rg%C3%A3o%20do%20Minist%C3%A9rio,c om%20ocupa%C3%A7%C3%A3o%20superior%20a%20200%25>. Acesso em 19 out 2024.

DAMÁZIO, Daiane da Silva. O sistema prisional no Brasil: problemas e desafios para o serviço social. 2010a. 91 f. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, 2010. Disponível em:<http://tcc.bu.ufsc.br/Geografia283197.pdf>. Acesso em 19 out 2024.

FORUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública., Ano 16, 2022. Disponível em:< https://forumseguranca.org.br/wp- content/uploads/2022/06/anuario-2022.pdf?v=5>. Acesso em 19 out 2024.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: Nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 39. ed. Petrópolis: Vozes, p.79, 2011.

FUNDAÇÃO FHC. A crise nas prisões brasileiras: os desafios do desencarceramento e da ressocialização. 2021. Disponível em:<https://fundacaofhc.org.br/iniciativas/a-crise-nas- prisoes-brasileiras-os-desafios-do-desencarceramento-e-da- ressocializacao#:~:text=O%20sistema%20penitenci%C3%A1rio%20brasileiro%20est%C3% A1,2018%2C%20apenas%20agrava%20esse%20quadro>. Acesso em 19 out 2024.

GARUTTI, Selson; OLIVEIRA, Rita de Cássia da Silva. A prisão e o sistema Penitenciário – uma visão histórica. Maringá, 07 maio 2012. Disponível em: <http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2012/trabalhos/co_02/036.pdf>. Acesso em 19 out 2024.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

IPEA. Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas. Atlas da violência 2020. São Paulo: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2020.

IPEA. O desafio da reintegração social do preso: Uma pesquisa em estabelecimentos prisionais. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 2015.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de Metodologia Científica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia do Trabalho Científico. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

MARZULLO, Luísa; MERGULHÃO, Alfredo; NOIA, Júlia. Preso do 8 de janeiro que morreu na Papuda relatou quadro de desmaios e falta de ar; vídeo. O Globo. 2023. Disponível em:< https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2023/11/22/preso-do-8-de-janeiro- que-morreu-na-papuda-relatou-quadro-de-desmaios-e-falta-de-ar-video.ghtml >.Acesso em 19 de outubro de 2024.

MIGALHAS. Quais crimes foram cometidos no 8 de janeiro? Criminalistas analisam. 2023. Disponível em:<https://www.migalhas.com.br/quentes/379743/quais-crimes-foram-cometidos-no-8-de-janeiro-criminalistas-analisam> Acesso em 08 mar. 2024.

NOIA, Júlia. Réu do 8 de janeiro que morreu na Papuda demorou 40 minutos para receber atendimento, diz relatório. O Globo. 2023. Disponível em:< https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2023/11/23/reu-do-8-de-janeiro-que-morreu-na- papuda-demorou-40-minutos-para-receber-atendimento-diz-relatorio.ghtml >.Acesso em 19 de outubro de 2024.

NOTICIA PRETA. Brasil ocupa a 3ª posição no ranking de países com mais presos no mundo considerando o número absoluto de detentos. 2021. Disponível:<https://noticiapreta.com.br/brasil-ocupa-a-3a-posicao-no-ranking-de-paises-com-mais- presos-no-mundo-considerando-o-numero-absoluto-de- detentos/#:~:text=detentos%20%2D%20Not%C3%ADcia%20Preta-,Brasil%20ocupa%20a%203%C2%AA%20posi%C3%A7%C3%A3o%20no%20ranking%20 de%20pa%C3%ADses%20com,o%20n%C3%BAmero%20absoluto%20de%20detentos&text=Com%20322%20pessoas%20privadas%20de,o%20n%C3%BAmero%20absoluto%20de%2 0detentos>. Acesso em 19 out 2024.

NUCCI, Guilherme de Souza. Direito Processual Penal. São Paulo: Forense, 2024.

RODRIGUES, Eliandro. A incompetência do STF para julgar pessoas comuns pelos atos de 8 de janeiro. 2023. Disponível em:< https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a- incompetencia-do-stf-para-julgar-pessoas-comuns-pelos-atos-de-8-de- janeiro/1972824634>.Acesso em 19 de outubro de 2024.

REBOUÇAS, Sérgio. Curso de direito processual penal. Editora Dplácido, 2022.

SAPORI, Luiz Flávio. A reincidência criminal. 2021. Disponível em:<https://fontesegura.forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2021/06/91-Multiplas- vozes-A-reincidencia-criminal.pdf>. Acesso em 19 out 2024.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2013.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2013.

SILVA, Patrick Luiz Martins Freitas. A competência do STF para julgar atos do 8 de Janeiro alcança cidadãos comuns? Conjur, 2023. Disponível em:< https://www.conjur.com.br/2023- set-17/patrick-silva-competencia-stf-julgar-cidadaos-comuns/>.Acesso em 08 mar. 2024.

TJDFT. Dever do Estado de proteção da integridade física e moral do preso. 2021. Disponível em:< https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em- temas/dano-moral-no-tjdft/sistema-prisional/sistema- prisional#:~:text=Tema%20atualizado%20em%2016%2F11,%C3%A0%20dignidade%20da%20pessoa%20humana>.Acesso em 19 out 2024.