AS CONDUTAS DE REGISTRAR E DIVULGAR CENAS INTIMAS À LUZ DO ECA E DO CÓDIGO PENAL.

THE CONDUCT OF REGISTERING AND DISCLOSING INTIMAS SCENES IN THE LIGHT OF THE ECA AND THE CRIMINAL CODE.

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11181671


Isabel Cristina Araújo Sampaio


RESUMO

O Direito é uma ciência mutável e deve estar sempre atento às constantes mudanças da sociedade; por isto, são incessantes as inovações legislativas que influenciam diretamente na sociedade em que vivemos. Diante disto, é relevante o estudo e aprofundamento destas legislações, como foco de nosso trabalho, e temos as leis 13.718/18 e 13.772/18 que inseriram novos tipos penais no Código Penal Brasileiro e que merecem uma análise principalmente no que condiz a proporcionalidade da pena imposta. Portanto, a análise da proporcionalidade das penas aplicadas aos artigos 216-B, 218- C do Código Penal cotejada com o artigo 240 E 241- A do Eca, levará a um relevante estudo para comparar e perceber se realmente houve, ou não, uma proporcionalidade pelo legislador ao cominar as penas tendo influência direta no estudo do Direito. Primeiramente, faz-se uma análise de cada tipo penal contemplado no Código de Processo Penal em que as leis acrescentaram, e após a correspondente análise da proporcionalidade entre os artigos mencionados e o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Palavras-chave: Proporcionalidade; Artigo 216-B CP; Artigo 218- C CP; Artigo 240 Eca; Artigo 241-A Eca.

ABSTRACT

Law is a mutable Science and one should be aware of the constant changes of society, therefore, the legislative innovations that directly changes in society in which we live are incessant. In view of this, it is relevant to study and deepen these laws, as the focus of our work, we have the laws 13,718 / 18 and 13,772 / 18 that inserted new penal types in the Brazilian Penal Code and that deserve an analysis mainly in what respects the proportionality of the sentence imposed. Therefore, the analysis of the proportionality of the penalties applied to Articles 216-B, 218-C of the Criminal Code, which is compared with Article 240 of the Eca, will lead to a relevant study to compare and understand whether or not the to have the direct influence on the study of law. Firstly, an analysis of each criminal type contemplated in the Code of Criminal Procedure in which the laws have been added, and then the corresponding analysis of proportionality between the articles mentioned and the Statute of the Child and the Adolescent, is made.

KEY WORDS: Proportionality; Article 216-B CP; Article 218-CCP; Article 240 Eca 241- A; Eca.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem a função de estudar as leis n.13.718/18 e n.13.772/18 que recentemente entraram em nosso ordenamento jurídico e acrescentaram novos tipos penais, em foco em nosso trabalho os artigos 216-B e 218-C do Código Penal.

O estudo compreende a análise das condutas de registrar e divulgar cenas intimas à luz do Código Penal e do Estatuto da criança e do Adolescente, visto que iremos fazer um cotejamento das novas condutas típicas do Código Penal, e os artigos 240 e 241- A, tendo como assunto central as penas aplicadas a estes delitos.

A importância deste estudo está na análise da proporcionalidade das penas aplicadas a estes novos institutos, visto a grande quantidade de leis que tem sido criadas em nosso ordenamento jurídico.É portanto, de grande importância para o estudo do direito como estas novas leis virão a ser aplicadas e se serão eficientes à conduta que pretendem coibir.

Diante disto, o objetivo central deste trabalho é a identificação da proporcionalidade das penas pelo legislador especialmente nas condutas de registrar e divulgar cenas intimas.

O trabalho, em um primeiro momento, apresentará a análise isolada de cada figura típica a ser estudada, depois estudaremos os princípios da legalidade e da proporcionalidade aplicado na elaboração dos tipos penais, e por fim cotejaremos as condutas típicas para uma análise na aplicação de cada pena cominada.

Para tanto, a metodologia qualitativa bibliográfica apresenta-se como a mais adequada ao propósito desta pesquisa, haja vista tratar-se de um procedimento indutivo quanto à abordagem do tema e comparativo no que concerne ao desenvolvimento do projeto.

1. DA ANÁLISE DAS FIGURAS TÍPICAS DOS ARTIGOS 216-B, 218-CDO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO E ARTIGO 240 E 241-A DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

Um dos princípios basilares do direito éque este deve acompanhar a sociedade, posto que a mesma está em constante mudança. Portanto, a expressão “crimes contra os costumes”, antigamente constante no Título VI do Código Penal, em que estão inseridos nos dois primeiros tipos penais a serem analisados neste artigo, tem agora nova titulação e está grafado como “ Dos crimes contra a Dignidade Sexual”.

Esta diferenciação se fez necessária pelo fato que o foco dos tipos penais está em tutelar a dignidade sexual e não o comportamento das pessoas; razão pela qual há a constante necessidade de atualização do direito penal brasileiro.

Sendo assim, para que analisemos a proporcionalidade de cada figura típica que será aqui cotejada, é necessário que estudemos cada uma delas individualmente, pois ao serem criadas separadamente, possuem suas peculiaridades e, ao mesmo tempo, estão intimamente ligadas, visto que tutelam o mesmo bem jurídico.

1.1 A CONDUTA DO ARTIGO 216- B

A lei 13.772/2018 em seu artigo 3º, inseriu no Capítulo I-A – “Da exposição da intimidade sexual” do Título VI da Parte Especial do Código Penal Brasileiro, o crime intitulado de “registro não autorizado da intimidade sexual” que está devidamente tipificado no artigo 216-B do referido código:

Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo (BRASIL, 1940).

Conforme Cunha (2018, p. 7),“O tipo preenche a lacuna que existia em relação à punição da conduta de indivíduos que registravam a prática de atos sexuais entre terceiros”. Esta lei veio a ser consoante à sociedade que estamos vivendo hoje, visto que este tipo de conduta tem crescido e, sem um tipo penal incriminador, havia uma certa insegurança jurídica quanto a qual tipo deveria se encaixar ao caso concreto.

O registro não autorizado da intimidade sexual é tão sério que pode vir a afetar psicologicamente a vítima, como afirma Masson (2019a, p. 50)

É indiscutível que o registro não autorizado da intimidade sexual, comportamento que lamentavelmente se tornou comum em nossa sociedade representa, uma forma de violência psicológica à vítima, pois é apto a lhe causar dano emocional e diminuição da autoestima, a prejudicar e perturbar seu pleno desenvolvimento, mediante humilhação, ridicularizarão e violação da sua intimidade, prejudicando sua saúde psicológica e sua autodeterminação.

O bem jurídico tutelado é a dignidade sexual, ligado a intimidade do ser humano, de acordo com Nucci (2019b, p. 883):

O crime abrange, basicamente o bem jurídico dignidade sexual, envolvendo direitos à intimidade e a privacidade, bem como a honra (todos constitucionalmente assegurados). Pode-se sustentar, ainda, que indiretamente lesa a liberdade sexual, pois é uma forma de constrangimento a quem se vê devassado em momento sensual.

O objeto material do tipo penal étodo conteúdo que contem a cena de nudez ou do ato sexual ou libidinoso (caput), ou, conforme o parágrafo único do artigo, a montagem em fotografia, vídeo áudio ou qualquer outro registro (NUCCI,2019b);o núcleo do tipo, por sua vez é composto por 4 (quatro) sub núcleos, por assim dizer: produzir, fotografar, filmar ou registrar. Conforme explica Nucci (2019b), isso inclui produzir (criar) fotografar (registrar uma imagem na memória de uma máquina), filmar (registrar algo em filme) e registrar (manter na memória).

O alvo das condutas são cenas de nudez, ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado, sem a autorização dos participantes, como se refere no caput. Conforme explica Masson (2019, p.51)

A nudez pode ser total ou parcial (exemplo: fotografia indevida dos seios de uma mulher). Cuida-se de elemento normativo do tipo, razão pela qual a caracterização ou não do crime há de levar em conta os hábitos e tradições da pessoa e da localidade em que ela vive. De fato, é indiscutível a configuração desse delito quando uma pessoa é filmada nua no provador de roupas de uma loja, mas talvez não exista o crime definido no art. 216- B do código penal quando alguém fotografa indígenas caminhando nus pela floresta.

Quanto a configuração do ato sexual e do ato libidinoso, ele é mais amplo, como preleciona Nucci (2019b, p.882), “…esse ato – sexual ou libidinoso – é de caráter amplo, abrangendo qualquer espécie de volúpia (conjunção carnal, sexo oral, sexo anal, masturbação etc.)”.

Assim também complementa Gonçalves(2019,p.123):

A presente infração penal (de menor potencial ofensivo) pune a pessoa que, sem o consentimento da vítima, produz, fotografa, filma ou, por qualquer meio, registra cena com nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado. Não é necessário que o agente esteja envolvido no ato sexual.

É importante ressaltar que a descrição do elemento normativo do ato é de caráter íntimo e privado, só havendo crime quando a conduta for realizada sem autorização dos participantes. Conforme ensina Masson (2019a, p. 51), “… de igual modo, só há crime quando a conduta for realizada sem autorização dos participantes. Se todos os envolvidos, maiores de 18 anos e capazes, autorizaram a fotografia, filmagem ou registro do ato, o fato será atípico”.

Diante disto, é importante destacar também que, tanto o sujeito ativo quanto o passivo poderão ser qualquer pessoa;será um crime em que haverá um ou mais indivíduos em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso (NUCCI, 2019b).

Todavia, é importante ressaltar que se a vítima for criança ou adolescente o crime está devidamente tipificado no artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde serádevidamente aplicado ao caso concreto, conforme o princípio da especialidade (NUCCI,2019b).

Como ensina Gonçalves (2019,p.124):

Se esta pessoa for menor de idade, estará configurado, me regra, crime mais grave previsto no art. 240, caput, da Lei n. 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que pune com reclusão, de 4 a 8 anos, e multa, as condutas de produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente.

Além disto, o elemento subjetivo do tipo penal é o dolo, conforme explica Masson (2019a, p.53): “Destarte, pouco importa se a conduta foi realizada para satisfação da lascívia própria ou de terceiro, com finalidade de vingança ou para humilhar a vítima, entre outros motivos. Em qualquer hipótese, o delito estará caracterizado”.

Quanto à consumação, segundo o mesmo autor, é crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (MASSON,2019a, p. 53):Consuma-se no momento em que o agente produz, fotografa, filma ou registra, por qualquer outro meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual libidinoso e caráter intimo privado sem autorização dos participantes. […]. Basta a potencialidade lesiva.

A consumação é imediata, assim que o agente pratica um dos tipos objetivos elencados. Nas palavras de Nucci (2019b, p.883), “Consuma-se assim que o agente executa qualquer dos verbos previstos no tipo, independentemente de qualquer resultado naturalístico, consistente na efetiva lesão à imagem da vítima”. Do mesmo modo, o autor continua, o delito também será instantâneo, ou seja, sem continuidade no tempo ou permanente, quando a consumação se prolonga com o decorrer do tempo. A tentativa dessa prática também é passível de penalização.

Ressalte-se também o destaque que há no parágrafo único, do artigo 216-B, onde está estabelecido que:“na mesma pena incorre quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio, ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual libidinoso de caráter íntimo”. (Código Penal, parágrafo único. artigo 216- B). Com esta diretriz, ficam inclusos e tipificados igualmente como praticantes de crime os que realizam montagens feitas por softwares, por qualquer meio de fotografia, vídeo, áudio, ou qualquer outro meio, mesmo que não sejam cenas verdadeiras, incluindo-os nas mesmas penas do caput.Assim como explica Masson (2019a, p. 54)

Ao contrário do caput, em que a cena é verdadeira, essa figura típica alocada no parágrafo único do artigo 216-b do código penal não diz respeito a exposição da intimidade sexual da vítima, pois ela não está efetivamente envolvida em cena de nudez ou ato sexual libidinoso de caráter intimo ou privado.

Portanto, é possível perceber que o crime tipificado no artigo 216-B,não está somente relacionado à produção de fotos, vídeos com caráter libidinoso, que são definitivamente imagens verdadeiras, mas também está incluso imagens montadas, que não revelam uma cena verídica, mas que também levam a inclusão da vítima em cena de nudez ou ato sexual libidinoso, concorrendo nas mesmas penas do caput.

1.2 A CONDUTA DO ARTIGO 218- C

A conduta tipificada no artigo 218- C do Código Penal está denominada como: “Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia”, vejamos sua literalidade:

Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia: (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018).

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.

§ 1º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação. (Incluído pela Lei nº 13.718, de 2018).

§ 2º Não há crime quando o agente pratica as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural ou acadêmica com a adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos(BRASIL, 1940).

Este tipo penal é decorrente do avanço da tecnologia e dos meios de comunicação, que popularizou e deu acesso, a grande parte da população, que tem acesso a estes recursos, como explica Masson (2019a, p. 92):

Se não bastasse, tem sido comum a “viralização” de imagens e vídeos contendo cenas de sexo, nudez ou pornografia, muitas vezes sem o consentimento (e sem o conhecimento) da vítima. Vidas e honra são destruídas em minutos, e o Direito Penal ficava de braços cruzados, pois não contava com um instrumento adequado para punir e prevenir condutas dessa envergadura.

Como explica Gonçalves (2019, p.139):

O dispositivo pune, outrossim, quem, sem o consentimento da vítima, divulga cena de sexo, nudez ou pornografia. A divulgação ou publicação pode ocorrer por qualquer meio, inclusive de comunicação me massa ou sistema de informática ou telemática.

O bem jurídico tutelado é a dignidade sexual, e o elemento subjetivo do crime é o dolo, conforme preleciona Masson(2019a, p.96):

É irrelevante o motivo que levou o agente a praticar o delito: promoção nas redes sociais, misoginia (ódio ou aversão a mulheres), hebefilia (interesse sexual de adultos por crianças e adolescentes) homofobia etc.

Nada obstante o tipo penal contenha os núcleos “vender “ou “expor à venda”, a intenção de lucro é dispensável, pois o delito admite diversas outras formas de execução, a exemplo da transmissão de vídeo gratuitamente me um sítio eletrônico, ou então da divulgação de fotografias me grupos de WhatsApp.

A dignidade sexual, é um princípio extremamente importante de ser tutelado, pois está diretamente ligado à privacidade do ser humano, direito fundamental estabelecido na Constituição Federal. Bitencourt (2019,p.165) explica:

Em outros termos, o presente tipo penal insere-se na finalidade abrangente de garantir a todo ser humano, que tenha capacidade de auto determinar-se sexualmente, que o faça com liberdade de escolha e vontade consciente, mas, principalmente, preservando sua privacidade, que é assegurada, inclusive, constitucionalmente.

Os elementos subjetivos do tipo penal são 9 ao todo; são eles: Oferecer; Trocar; Disponibilizar; Transmitir; Vender; Expor à venda; Distribuir; Publicar; Divulgar. Conforme explica Masson (2019a, p.94),o crime pode ser permanente ou instantâneo:No núcleo “expor à venda” o crime é permanente; no verbo “publicar”, pode ser instantâneo ou permanente (exemplo: publicação em website que permanece no ar por longo período, pela vontade do agente); nos demais núcleos o delito é instantâneo”.

Também ensina Capez (2019, p.144), “Trata-se de tipo misto alternativo. A prática de duas ou mais condutas descritas é irrelevante, consistindo em crime único. Os objetos materiais são: fotografia, vídeo, ou qualquer outro registro audiovisual”.

Há ainda as causas de aumento de pena, previstas no artigo 218- C, § 1º, e que podem variar de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços); a primeira é se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima, conforme Masson (2019a,p. 97):

A relação intima de afeto pressupõe elevado grau de confiança entre as pessoas nela envolvidas, sendo possível identificá-la no casamento, na união estável e no namoro sério e duradouro. Pode ser atual ou pretérita, pois o dispositivo legal utiliza a expressão “que mantem ou que tenha mantido relação intima de afeto com a vítima.

Pois, a dignidade sexual está relacionada tanto homem quanto a mulher no que se refere aos seus relacionamentos, conforme explica Bitencourt (2019,p.165):

Protege-se genericamente, a dignidade sexual individual, de homem e mulher, indistintamente, consubstanciada na liberdade sexual e direito de escolha, especialmente da mulher que é, com mais frequência, exposta nas redes sociais por ex- companheiros, namorados ou conjuges, inclusive por vingança ou apenas para humilhar.

E a segunda causa de aumento é se o crime for praticado com fim de vingança ou humilhação, esta causa de aumento está ligada à motivação do agente, em que não é apenas a divulgação da cena constante do núcleo do tipo penal, mas também com proposito de se vingar da vítima ou então humilhá-la(MASSON, 2019a, p. 98).

Estabelecido está também no parágrafo 2º do art. 218- C:

Art. 218-C.[…]

[…]

§2º. a exclusão de ilicitude, em que não há crime, quando o agente praticar as condutas descritas no caput deste artigo em publicação de natureza jornalística, científica, cultural, ou acadêmica, com adoção de recurso que impossibilite a identificação da vítima, ressalvada sua prévia autorização, caso seja maior de 18 (dezoito) anos (BRASIL, 1940).

Conforme Masson (2019a, p.96): “Trata-se de modalidade especial de exercício regular do direito, relacionada ao regular exercício da atividade jornalística, cientifica, cultural ou acadêmica. O fato é típico, porém acobertado por uma excludente de ilicitude”.

É importante destacar que a conduta do artigo 218- C do Código penal, em relação aos vulneráveis, deve ser interpretado de forma restritiva, conforme Gonçalves (2019, p. 140): “Assim, quando a imagem divulgada envolver cena de sexo explícito ou pornográfica com criança e adolescente, restará configurado o crime do art. 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente”

Masson (2019a, p. 93) também explica o porquê da interpretação restritiva:

Para o fim de abranger unicamente as pessoas que por enfermidade ou doença mental, não tem necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não podem oferecer resistência (CP, art. 217-A §1º), excluindo-se os menores de 14 anos.

Desta forma, observa-se que há uma figura típica específica se a conduta for praticada contra menor de 14 anos, tipificado na lei 8.069/1990- Estatuto da Criança e do Adolescente, não se aplicando, portanto, os dispositivos acima referidos.

1.3 A CONDUTA DO ARTIGO 240 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Essa figura típica insere-se no rol daquilo que é possível conceituar como pornografia infantil. Observa-se que um dos comportamentos peculiares da pornografia é exatamente mencionado na disposição penal mencionada, qual seja a captação e reprodução de cena de sexo envolvendo criança e adolescente.

Assim, o artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como da Lei nº 11.829 de 2008, que alterou a redação do art. 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente, passou a estabelecer, a partir deste tipo penal, o crime de pornografia infantil:

Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente:

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.

§ 1o Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena.

§ 2oAumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime:

I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la;

II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade;

ou

III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento (BRASIL, 1990).

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça definiu em RECURSO ESPECIAL No 1.543.267 – SC (2015/0169043-1) o que se segue:

É típica a conduta de fotografar cena pornográfica (art. 241-B do ECA) e de armazenar fotografias de conteúdo pornográfico envolvendo criança ou adolescente (art. 240 do ECA) na hipótese em que restar incontroversa a finalidade sexual e libidinosa das fotografias, com enfoque nos órgãos genitais das vítimas – ainda que cobertos por peças de roupas -, e de poses nitidamente sensuais, em que explorada sua sexualidade com conotação obscena e pornográfica (BRASIL, 2015).

Nas palavras de Machado(2013),explicita-se que “na essência o que se pune é a utilização de criança ou adolescente em cena pornográfica, de sexo explícito ou vexatório, nas peças de comunicação elencadas”.

A pornografia é “estudo ou descrição da prostituição ou representação de coisas consideradas obscenas, geralmente de caráter sexual qualquer coisa (livro, revista, filme, etc.), ação ou representação que ataca ou fere o pudor, a moral ou os considerados bons costumes”(AURÉLIO, 2010).

No tipo objetivo do §1º tem-se que:

Equipara as penas aplicadas as condutas do caput para quem agencia, diligencia com terceiros, torna mais fácil, recruta, angaria, coage,constrange, ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena (ou seja, que participa de cena representada), a última conduta ainda poderá se encaixar em crime mais grave quando, por exemplo a cena for de sexo explícito com o menor, encaixando-se em estupro de vulnerável (ROSSATO et al., 2018).

Noutro giro, nas majorantes do §2º, tem-se quea pena é aumentada de 1/3 para quem comete os crimes nas seguintes condições elencadas nos incisos do parágrafo 2º do artigo 240, desta forma:

Inciso I- exercício de cargo (cargo público são atribuições feitas ao servidor, por meio de lei,com função própria) ou função pública (nem sempre é um cargo público criado pode não ser criada por lei, mas opera em função pública, quando exercida por meio de contrato está sob a égide da CLT, ou também quando está pretexto de exerce-la.

Inciso II- prevalência de relações domesticas, de coabitação ou de hospitalidade: relações domesticas são pessoas que vivem no mesmo núcleo familiar, mesmo que não haja relação direta de parentesco, mas que tem uma rotina de família estabelecida. A coabitação refere-se a pessoas que vivem no mesmo teto, porém não compartilham amizade ou algum tipo de comunhão e relacionamento. Quanto a hospitalidade, há apenas um breve espaço de tempo de contato, como por exemplo as visitas. Esta majoração é assim justificada pois, nessas hipóteses há uma proximidade da vítima.

Inciso III- Prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento. Aqui, a conduta é punida de forma mais severa pois está relacionada a laços de parentesco, assim como relações de subordinação e proximidade do agente com a vítima. (ROSSATO et al.,2018)

Este tipo penal vai ser muito mais abrangente no que se refere ao sujeito ativo Conforme Amin et al. (2019, p.1281):

O crime antes praticável apenas por quem produzisse, dirigisse ou, nos termos do §1º, contracenasse com criança ou adolescente, tema agora sujeito ativo comum, a saber, qualquer pessoa que produza, reproduza, dirija ou fotografe, filme registre ou ainda, nos termos do §1º, agencie, facilite, recrute, coaja, intermedeie ou contracene com criança ou adolescente.

Já o tipo subjetivo é o dolo, pois é a vontade consciente do agente em praticar o ato. Enquanto que a consumação, conforme ensina Rossato et al.(2018, p.619), é “o momento consumativo do delito é atingido pela prática de qualquer das ações nucleares típicas. Tratando-se de crime plurissubsistente, admite-se a tentativa”.

Portanto, o ato de produzir, reproduzir, dirigir e fotografar, filmar ou registrar cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, possui um tipo penal próprio, que está devidamente grafado no artigo 240 do ECA, não se fazendo portanto confundir com o artigo 216- B do código penal, visto que o sujeito passivo é a criança e o adolescente.

1.4 A CONDUTA TÍPICA DO ARTIGO 241-A DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Este dispositivo penal preocupa-se com a difusão de material que já contenha cenas de sexo explícito ou pornográficas que envolvam crianças ou adolescentes também como forma de tutelar a intimidade e imagem desses menores, bem como censurar comportamentos nada adequados em sociedade.

Dessa forma, o Artigo 241- A, também fora incluso pela Lei n. 11.829/08, que está intitulado como “Difusão de Pedofilia”:

241- A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:

I – assegura os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo;

II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo;

§ 2º As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1º deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo(BRASIL, 1990).

Para Amin et al. (2019, p.1286), “a lei n.11.829/2008 busca centrar a criminalização na conduta daqueles que, de alguma forma, divulguem o material de cunho pornográfico”.

O tipo penal é misto alternativo conforme explica Rossato (2019,p.638) : “Trata-se de tipo alternativo, ou seja, se o agente, no mesmo contexto fático, incorrer em mais de uma ação nuclear típica ( dirigir e filmar, por exemplo) responderá por apenas um crime, embora isso possa se refletir na aplicação da pena”

O sujeito ativo é qualquer pessoa de modo que se considera crime comum, porém o sujeito passivo deve ser criança ou adolescente, sendo, então, apenas próprio quanto à sua subjetividade passiva. Mesmo não se exigindo qualidade especial do autor, ainda assim cinge- se à proteção específica dos menores de idade, pois no rol de ofendidos são considerados apenas aqueles que ainda não tenham adquirido a maioridade.

O tipo objetivo do crime, por sua vez, possui seis condutas típicas previstas, as quais se enunciam em seis núcleos verbais distribuídos de maneira alternativa na disposição penal, como é possível observar:

O caput traz sete ações nucleares típicas, todas associadas à difusão (especialmente pela rede mundial de computadores) do material pornográfico já produzido: oferecer (propor aceitação), trocar (permutar, substituir), disponibilizar (permitir o acesso), transmitir(remeter de um lugar a outro), distribuir (proporcionar a entrega indeterminada), publicar (tornar manifesto) e divulgar (difundir, propagar)”(ROSSATO et al., 2019,p.642).

As condutas previstas no §1º do artigo 241-A do Eca estão equiparadas ao caput, conforme explica Amin et al. (2019,p.1287):

No §1º estão condutas equiparadas às do caput, sujeitando o agente às mesmas penas, que variam de 3 a 6 anos. No inciso I está criminalizada a conduta daqueles que asseguram meios ou serviços que viabilizem o armazenamento de fotografias, vídeos ou registros, a exemplo de sócios de empresas que “hospedem” sites de Internet onde tal material será disponibilizado ao acesso, seja do público me geral, seja de grupo restrito de pessoas, posto que, me qualquer caso, basta para o crime que terceiros tomem conhecimento de seu conteúdo. Finalmente, no inciso II se pune aquele que viabilize o acesso ao aludido material na rede mundial, como é o caso dos provedores de acesso à Internet.

Assim também torna o entendimento mais claro quanto ao alcance desse delito, a seguinte explicação de Santos (2015):

Transmitir significa enviar ou encaminhar, muito utilizado com as mensagens de e- mail, por isso mesmo que o legislador entendeu que o meio para a prática do crime é livre, posto que abrange o sistema de telemática (que é o conjunto de tecnologias da informação e da comunicação resultante da junção entre recursos de telecomunicações – telefonia, satélite, cabo, fibras ópticas e etc) e informática ( que é o conjunto de conhecimentos e técnicas ligadas ao tratamento racional e automático de informação, que é associado à utilização de computadores e respectivos programas – sites de internet).

Como é possível observar as ações típicas recaem sobre fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente (ROSSATO et al., 2019, p.642)

Diante disto vê-se que o crime é doloso, porém como explica Amin et al (2019,p.1287,1288):

Nunca é demais lembrar, porém, que, extirpada da nossa legislação penal a responsabilidade objetiva, assim como se exigindo do agente, no setor psicológico, a sua atual dolosa, seja direta ou eventual, não se pode admitir a punição de alguém simplesmente porque, por exemplo, tenha um serviço de acesso à Internet, que tenha sido utilizado por um de seus assinantes para visitar sites com cenas como as que são aqui incriminadas. Sua punição dependerá da prova de que agia, seja conhecendo e querendo a realização do fato, no caso do dolo direto, ou, ainda conhecendo-o e assumindo-o como provável hipótese de dolo eventual.

Assim, segue-se o §2º do dispositivo, que traz uma condição ao responsável legal da prestação de serviço de Internet, assim ensina Rossato (2019,p. 642):

O §2.º do art. 241- A traz uma condição objetiva de punibilidade ao estabelecer que as condutas tipificadas nos incisos I e II do §1º são puníveis quando o responsável legal pela prestação de serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput. O pressuposto para a punição revela a adoção de prudência por parte do legislador, impondo àqueles que são competentes para a persecução penal que se certifiquem de que o agente tenha consciência de que armazena ou proporciona o acesso a produções pornográficas ou de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente, evitando-se, desse modo, a responsabilidade penal objetiva.

Por fim, o delito do artigo 241-A é consumado no momento que se tem a prática de alguma das ações nucleares tipificadas, porém a tentativa não é admitida.Portanto, tem- se na conduta do artigo 241- A, possui ações nucleares típicas que propagam a difusão de imagens

pornográficas que envolvem crianças e adolescentes e torna o direito penal mais atual quanto aos crimes que envolvem o Estatuto da Criança e do Adolescente.

2 PRINCÍPIOS NORTEADORES NA ELABORAÇÃO DE TIPOS PENAIS

Os princípios são verdadeiros fundamentos que dirigem o Direito como um todo, são o núcleo essencial das normas e, além disto, são norteadores tanto para o legislador quanto para quem aplicará a norma já elaborada. Eles podem ser constitucionais ou infraconstitucionais, mas sempre estarão presentes para dirigir os aplicadores do direito e garantir os direitos fundamentais do indivíduo.

Diante disto, é necessária uma análise dos princípios mais relevantes e a sua aplicabilidade na elaboração dos tipos penais, visto que estes tipificam uma conduta humana e devem estar pautados nos princípios que integram e norteiam o Direito Penal.

Dentre os princípios relevantes para a elaboração dos tipos penais, emergem a legalidade e a proporcionalidade. São, assim, vetores condicionantes tanto da atividade do legislador na definição das condutas tipificadas quanto do alcance hermenêutico do intérprete operador do direito. Por isso, neste instante da pesquisa, revela-se curial abrir a discussão do tema a partir da incidência destes dois preceitos fundamentais relacionados ao ordenamento penal.

2.1 PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE OU RESERVA LEGAL

O princípio da legalidade é um princípio que está presente em todos os ramos do direito, ele é pressuposto para a segurança jurídica em um Estado, e está diretamente relacionado tanto a liberdade de um indivíduo na sociedade quanto a atuação do Estado sob este indivíduo, é, portanto, basilar para o direito penal.

O princípio da legalidade está devidamente amparado pela Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso II que consagra: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.Além de ser um princípio explicitamente constitucional,a norma também se repete no artigo 1º do Código Penal Brasileiro: “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”.

Este princípio está presente em todas as esferas do direito, sendo de extrema importância para o direito penal, conforme explica Cunha(2019,p. 96):

Presente também em outros ramos do direito, a garantia da legalidade ganha ainda maior relevância na seara penal, ema vez que este ramo representa essencialmente exercício de poder e, me sendo assim, precisa ser limitado. A punição estatal não pode estar a serviço da tirania e da vilania de um administrador (intervenção penal autoritária), sendo indispensável restringir o poder de polícia de Estado, submetendo a sua vontade ao império da lei.

Diante disto, este princípio está intimamente ligado à elaboração de tipos penais incriminadores, visto serem exclusivos de lei, senão vejamos:

Isto é, nenhum fato pode ser considerado crime e nenhuma pena criminal pode ser aplicada sem que antes da ocorrência desse fato exista uma lei definindo-o como crime e cominando-lhe a sanção correspondente. A lei deve definir com precisão e de forma cristalina a conduta proibida(BITENCOURT, 2010,p.41).

O Princípio da legalidade, ou reserva legal, está relacionado à uma garantia individual, pois “a partir da Revolução Francesa, o princípio da legalidade- verdadeira pedra angular do Estado de Direito- converte-se em uma exigência de segurança jurídica e de garantia individual”(PRADO, 2019,p.38).

Conforme prediz o nome, o princípio da legalidade está adstrito diretamente à lei em sentido estrito, conforme explica Prado (2019,p.39):

Não há crime nem pena sem lei em sentido estrito elaborada na forma constitucionalmente prevista. O caráter absoluto de reserva legal impede a delegação por parte do poder legiferante de matéria de sua exclusiva competência, lastreado no princípio da divisão de poderes. Assim, só ele pode legislar sobre determinado assunto, tal como definir a infração penal, e cominar a respectiva consequência jurídica.

O princípio da reserva legal admite ainda dois fundamentos, um de natureza jurídica e outra de natureza política,o fundamento jurídico é assim definido por Masson (2019b,p.20), como:

A taxatividade, certeza ou determinação, pois implica, por parte do legislador a determinação precisa, ainda que mínima, do conteúdo do tipo penal e da sanção penal a ser aplicada, bem como, da parte do juiz, na máxima vinculação ao mandamento legal, inclusive na apreciação de benefícios legais.

Já o fundamento político está ligado à proteção do ser humano em face do poder arbitrário do Estado quando no exercício do seu poder punitivo, enquadrando-se nos direitos fundamentais de primeira geração (MASSON, 2019b,p.21).

Portanto, somente a lei formal é fonte criadora de crimes e de penas, de causas agravantes ou medidas de segurança, sendo inconstitucional a utilização em seu lugar de qualquer outro ato normativo, inclusive medida provisória, dos costumes, ou de argumentos analógicos (PRADO, 2019,p.40).

Assim, a legalidade é essencial na constituição dos tipos penais, visto não ser possível que um crime exista em uma sociedade se este não estiver devidamente tipificado me lei, é um direito fundamental constitucional, e deve, portanto, ser devidamente obedecido.

2.2 TIPO PENAL OU FATO TÍPICO

O fato típico ou tipo penal está associado diretamente à conduta do ser humano, podendo, alguma dessas condutas serem inadmissíveis no meio social.Portanto, o Direito Penal trata de discriminar tais comportamentos em fórmulas típicas, plotadas em lei como categorias normativas definidoras de ações ou omissões proibidas, para as quais caso sejam perpetradas ensejam eventual sanção também ditada em lei.

Nessa esteira conceitual, Masson (2019b, p. 225) aduz que “o tipo penal é modelo genérico e abstrato, formulado pela lei penal, descritivo da conduta criminosa ou da conduta permitida”.

Ainda, o tipo penal é o exemplo daquilo que é vedado ou permitido pela norma, conforme explica Prado (2019, p.162):

O tipo penal vem a ser modelo, imagem ou esquema conceitual da ação ou omissão vedada, dolosa ou culposa. É expressão concreta dos específicos bens jurídicos amparados pela lei penal.

O tipo – como tipo injusto- compreende todos os elementos e /ou circunstancias que fundamentam o injusto penal específico como figura delitiva(= de uma conduta). Serve de base à ilicitude particular de uma ação ou omissão típica”.

São, portanto, a materialização do princípio da reserva legal, conforme ensina Nucci (2019a,p.349), “o tipo penal é a descrição abstrata de uma conduta, tratando-se de Uma conceituação puramente funcional, que permite concretizar o princípio da reserva legal (não há crime sem lei anterior que o defina)”.

Os tipos penais possuem também espécies, como já vistas acima, as incriminadoras e as permissivas.As incriminadoras estão ligadas à conduta criminosa, pois conforme explica Masson, (2019b, p.225): “são os tipos penais propriamente ditos, consistentes nas síntese legal da definição da conduta criminosa”.

As condutas permissivas vêm expressamente definidas em lei, conforme também ensina Masson (2019b,p.225):“que são os que contem a descrição legal da conduta permitida, isto é me situações que a lei considera lícito o cometimento do fato típico. São causas de exclusão a ilicitude, também denominadas eximentes ou justificativas”

Além disto, importante notar que o tipo penal possui algumas funções,assim explica Prado (2019,p.162,163):

a) função seletiva, relacionada aos comportamentos que são protegidos pela norma penal, que interessam o Direito Penal;b)função de garantia e de determinação – diz respeito ao cumprimento do princípio da legalidade dos delitos e das penas, formal e materialmente, inclusive quanto ao quesito da taxatividade (lex escripta, lex praevia, lex sctricta e lex certa);c) função indiciária da ilicitude – é a tipicidade a ratio cognoscendi da ilicitude;d) delimitação do iter criminis – assinala o início e o fim do processo executivo do crime; e e)função motivadora ou determinação geral de condutas – “chamada de atenção”- diante dos cidadãos, destaca-se que Uma conduta se encontra desvalorada e proibida de modo geral sob ameaça de pena ( por isso não deve ser realizada) , e , assim procura motivar ou determinar a todos no sentido de não ser praticada.

Considera-se primordial também fazer uma diferenciação entre tipo penal e tipicidade, para Masson(2019b,p.225):

Tipo e tipicidade não se confundem. Como explica ZAFFARONI, tipo é uma figura que resulta da imaginação do legislador, enquanto juízo de tipicidade é a averiguação que sobre uma conduta se efetua para saber se apresenta os caracteres imaginados pelo legislador.

Assim também ensina Prado (2019, p.162): “A tipicidade, por sua vez, vem ser a subsunção ou adequação do fato ao modelo previsto no tipo penal. É um predicado, um atributo da ação, que a considera típica (juízo de tipicidade positivo) ou atípica (juízo de tipicidade negativo)”.

Assim, é possível observar que o tipo penal está intimamente ligado ao princípio da reserva legal, é ainda a convergência das condutas do ser humano que não são aceitas na sociedade em tipo penal, tornando-se crime e efetivando o princípio da legalidade.

2.3 PROPORCIONALIDADE NA ELABORAÇÃO DOS TIPOS PENAIS

Outro vetor muito relevante ao direito penal é o princípio da proporcionalidade, o qual exige do legislador na seleção e confecção das condutas típicas determinado comedimento para que ao mesmo tempo que não deixe a desejar na tutela dos bens jurídicos também não os exponha exageradamente à sufocação estatal a tal ponto de implicar incisiva intervenção na esfera de direitos do cidadão.

O princípio da proporcionalidade é um princípio constitucionalmente implícito, e no Direito Penal é de extrema importância, visto que está associado a elaboração das sanções e tipos penais, conforme explica Cunha (2019,p.117):

Trata-se de um princípio constitucional implícito, desdobramento lógico do mandamento da individualização da pena. Para que a sanção penal cumpra sua função, deve se ajustar à relevância do bem jurídico tutelado, sem desconsiderar as condições pessoais do agente.

Assim também, o princípio da proporcionalidade não é algo atual,mas vem sendo usado no Direito penal ainda na época do Iluminismo:

Embora sua origem remonte à Antiguidade, foi só com o Iluminismo, me especial com a obra de Cesare Beccaria,que o princípio da proporcionalidade se afirmou como verdadeiro pressuposto penal. Para esse autor, as penas previstas em lei devem ser proporcionais aos delitos e, de certo modo, ao dano causado à sociedade. O dano à sociedade é a verdadeira medida dos crimes (PRADO, 2019,p.49).

O princípio da proporcionalidade deve ser seguido primeiramente pelo legislador, mas também atinge ao juiz e aos órgãos que executaram a pena:

Em outras palavras, o princípio da proporcionalidade possui três destinatários: o legislador (proporcionalidade abstrata), o juiz da ação penal (proporcionalidade concreta) e os órgãos da execução penal (proporcionalidade executória)” (MASSON, 2019, p.45).

Este princípio subdivide-se em três outros subprincípios, conforme ensina Prado (2019, p.49):

Considerando-se as três vertentes ou subprincípios da proporcionalidade lato senso (adequação ou idoneidade; necessidade ou exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito), pode-se afirmar que uma medida é razoável quando apta a atingir os objetivos para os quais foi proposta; quando causa o menor prejuízo entre as providencias possíveis, ensejando menos ônus aos direitos fundamentais, e quando as vantagens que aporta superam a suas desvantagens.

Assim, ao falarmos em elaboração dos tipos penais, o legislador é o primeiro a observar a proporcionalidade a ser aplicada, conforme ensina Nucci (2019a, p. 114):

O primeiro objetivo deve ser seguido pelo legislador, quando cria um novo tipo incriminador ou quando pretende alterar a espécie, forma ou quantidade de sanção penal. O segundo, voltando-se ao juiz, indica-lhe a razoável proporção entre o peso da sanção e o dano provocado pela infração penal.

Diante disto, quando se elabora um tipo penal ou um fato típico é necessário que o princípio da proporcionalidade esteja presente. Deve haver sempre um equilíbrio, adequação entre as condutas proibidas e as penas aplicadas, senão veja-se:

Aponta-se paralelamente, com perfeita identidade, devam as penas ser individualizadas, ao mesmo tempo que necessitam ser proporcionalmente aplicadas, conforme a gravidade da infração penal cometida. Por isso, há uma meta revelada em direção a dois objetivos:a)preservar a harmonia entre a cominação de penas e de modelos de condutas proibidas; b) fundamentar o equilíbrio entre a aplicação das e os concretos modos de realização do crime” (NUCCI, 2019,p.113,114).

A adequação da conduta típica e a sanção penal cominada também necessitam estar direcionadas a uma finalidade:

Para a cominação e imposição de pena, agregam-se, além dos requisitos de idoneidade e necessidade, a proporcionalidade. Pela adequação ou idoneidade, a sanção penal deve ser um instrumento capaz, apto ou adequado à consecução da finalidade pretendida pelo legislador (adequação do meio ao fim)” (PRADO, 2019, p.49)

Portanto, o princípio da proporcionalidade é junção de três pressupostos: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em si, que formam a base de constituição na elaboração de um tipo penal, visto que este não pode ser desigual ou desnecessário na sociedade, mas deve ser adequado ao que se pretende proibir.

3 (DES)   NECESSIDADE DA  PREVISÃO  DE QUATRO   FIGURAS TÍPICAS DISTINTAS.

3.1 DO COTEJO ENTRE AS FIGURAS TÍPICAS

Após anterior estudo específico de cada tipo penal aqui discutido, faz-se necessário a análise conjunta deles para um cotejamento da necessidade ou desnecessidade da elaboração de quatro condutas distintas, que, porém, tratam das mesmas ações nucleares típicas.

O tipo penal do artigo 216-B do Código Penal, traz como elemento subjetivo aos atos de produzir, fotografar, filmar ou registrar cenas de nudez ou ato sexual libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes e tem como pena prevista a detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.

Assim também, tem-se o artigo 240 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que tem como elemento subjetivo nuclear: produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, cena de sexo explícito ou pornográfico envolvendo criança ou adolescente. A pena aplicável é de reclusão de 4 (quatro) a 8 (oito) anos.

O sujeito passivo irá determinar qual tipo penal será aplicado ao agente. Nas palavras de Gonçalves(2019,p. 124):

As pessoas que foram filmadas, fotografadas etc. Se esta pessoas for menor de idade, estará configurado, me regra, crime mais grave previsto no art. 240, caput, da Lei n. 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que pune com reclusão, de 4 a 8 anos, e multa, as condutas de produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer outro meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente).

Diante disto, é possível perceber que uma figura típica apenas se diferencia da outra quando depender do sujeito passivo. Sendo a diferença de pena de detenção de 6 meses a um ano, e a outra, por sua vez, será de reclusão de 4 a 8 anos.

Além disto, faz-se necessária a comparação de dois outros tipos penais que também possuem os núcleos típicos muito parecidos, porém com aplicabilidade diferente, dependendo, entre outros, também do sujeito passivo.

O tipo penal do artigo 218- C tem como núcleo subjetivo os elementos: oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, fotos, vídeos ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a prática, ou sem o consentimento da vítima, cena de sexo nudez ou pornografia. A pena aplicada para este delito é de 1(um) a 5 (cinco) anos.

Por sua vez, o artigo 241-A do Estatuto da criança e do adolescente, tem como seus elementos subjetivos: oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, fotos, vídeos ou qualquer outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente. A pena é de reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Percebe-se portanto, que não há grande diferença dos núcleos de uma conduta típica (218-C do CP) e da outra (241-A do ECA), diferenciando-se pelo sujeito passivo, e a aplicação da pena, além de o artigo 218-C trazer também em seus elementos subjetivos, a cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que conduza a sua prática.

Capez (2019,p.145), chama atenção para isto quando descreve a conduta do artigo 218-C do Código Penal, “se a vítima for criança ou adolescente, poderá configurar a infração do art. 241-A do ECA”.

Portanto, as condutas apresentadas pouco se diferem uma das outras, porém é possível notar que o sujeito passivo poderá alterar a pena do agente, aplicada de forma significativa, e é, portanto, necessário fazer a análise da proporcionalidade destes tipos penais.

3.2 (DES) PROPORCIONALIDADE DAS PENAS NOS TIPOS PENAIS.

Sabe-se que o princípio da proporcionalidade possui três subprincípios, que são a necessidade, adequação e a proporcionalidade em sentido estrito, este, portanto, como já discutido, deve ser aplicado na elaboração dos tipos penais.

Desta forma, faz-se necessário a análise da proporção, principalmente no que condiz às penas aplicadas, nos tipos penais do art. 216-B, 218-C do Código Penal; 240 e 241- A do ECA.

Assim também explica Chagas (2009):

Necessário então que a pena imposta seja inferior ao benefício almejado, ou seja, uma ponderação entre os interesses protegidos pela medida e os bens jurídicos que sofrerão restrições com a adoção da mesma. (idem). Pois, o princípio da proporcionalidade no direito penal preocupa-se com a legitimidade da pena quanto a sua ponderação com a ofensa ao bem jurídico.

A conduta do artigo 216-B do código Penal, é idêntica à conduta do artigo 240 do Eca, a mudança se faz no sujeito passivo, em que passa de qualquer pessoa, para criança e adolescente. A pena que primeiramente é de detenção de 6 meses a 1 ano, no artigo 240 do Eca passa a ser de reclusão de 4 a 8 anos e, portanto, há uma substancial diferença na aplicação da pena.

Essa diferença é explicada por alguns doutrinadores:

Observe que a pena do delito do art. 240 do ECA é muito mais elevada que a pena do art. 216-B do CP, pois houve opção aparentemente acertada do legislador de se punir mais severamente os atos de produção que envolvam crianças e adolescentes, diante da vulnerabilidade e hipossuficiência desses sujeitos de direito. Além do mais, o art. 240 do ECA dispõe de causa de aumento de pena, enquanto o art. 216-B do CP nada traz. (JÚNIOR; OLIVEIRA, 2019a)

O Princípio da Especialidade também é um dos motivos do por que a pena ser tão desigual:

Aliás, é bom lembrar que se as práticas previstas no artigo 216 – B, CP tiverem por sujeitos passivos crianças ou adolescentes esse tipo penal comum fica afastado, prevalecendo a tipificação da Lei 8.069/90 por força do Princípio da Especialidade. Inclusive, corretamente, as penas previstas para esse tipo de conduta, envolvendo crianças e adolescentes são mais rigorosas (vide artigo 240 do ECA – Lei 8.069/90). (CABETTE,2019)

É certo que quando praticado contra crianças e adolescentes o crime presume-se mais grave, visto que estes são sujeitos de proteção especial, porém tratar a conduta do artigo 216- B como de menor potencial ofensivo (pena de detenção de 6 meses a um 1 ano), também torna-se brando demais visto o bem jurídico que esta norma pretende proteger, a dignidade sexual.

Assim explica Cabette (2019), que “[…] não nos parece que esse tipo de conduta devesse ser elencado como infração de menor potencial, seja em que caso for, seja quem for a vítima ou a circunstância. A violação da intimidade, da vida privada e da imagem são muito graves para um tratamento tão brando”.

Ainda em uma abordagem mais ampla, é possível perceber que a conduta do artigo 218-C, aqui também estudada, tem uma sanção muito mais rigorosa em comparação à conduta do artigo 216-B, vejamos:

Observe que a pena do delito do art. 218-C, CP é muito mais elevada que a pena do art. 216-B, CP, porque o legislador pune-se mais severamente o ato de divulgar que o ato de registrar. Além do mais, o art. 218-C, do CPB dispõe de causa de aumento de pena e hipótese de exclusão da ilicitude, enquanto o art. 216-B, do CPB, nada traz (JÚNIOR; OLIVEIRA, 2019b).

Diante disto, é possível perceber que apesar de a diferença de pena estar ligada ao sujeito passivo, sendo considerado muito mais grave a conduta quando praticada contra

criança e adolescente, ainda assim a pena do artigo 216-B, parece-nos ainda branda diante do bem jurídico tutelado neste tipo penal.

Além disto, é possível perceber também que o artigo 218-C e 241-A, ao serem cotejados, possuem uma desproporção quanto a pena a eles aplicada, visto que também tutelam bens jurídicos de grande importância.

Ao observar o núcleo do tipo do artigo 218-C, muito se assemelha ao artigo 241- A do ECA, as mudanças estão não só no sujeito passivo, já que este último é aplicado quando a vítima é criança ou adolescente, mas também, quanto ao tipo penal do artigo 218- C, que torna-se mais abrangente quando trata da conduta de registrar cenas de estupro, ou de estupro de vulnerável, ou que faça apologia ou induza sua prática.

Portanto, apesar da conduta do artigo 218-C apresentar-se muito mais grave que a conduta do artigo 241-A do Eca, aquele recebeu uma pena muito mais branda quando comparado a este, pois tutela um bem jurídico fundamental que é a dignidade sexual.Conforme expressa Bitencourt (2019, p.165):

Os danos morais à vítima, homem ou mulher, mas principalmente desta, são absolutamente irreparáveis, pois a destruição moral que referidas condutas produzem com tal exposição social nunca mais poderá ser consertada ou recuperada, por isso, talvez, fosse recomendável uma sanção ainda mais grave.

Ainda é possível observar que o princípio da proporcionalidade na elaboração dos tipos penais, inclusive no que condiz à pena aplicada aos tipos penais, tem sido violado, visto a grande quantidade de tipos penais surgindo sem uma adequada revisão, geram, como é o caso do artigo 218-C do Código Penal, uma certa ineficiência da pena empregada, assim também explica Júnior et al. (2018):

Em resumo, a parte do dispositivo do art. 218-C que trata da “divulgação de cena de estupro de vulnerável” é em certa parte nitidamente subsidiário e letra morta no que tange aos menores e adolescentes, primeiro, pelas condutas do art. 241-A do ECA englobar por completo a modalidade de vulnerável do caput do art. 217-A, CP; segundo, pela subsidiariedade expressa do art. 218-C. Do exposto, verifica-se, nitidamente, que o legislador desconhece por completo o emaranhado de leis penais que estão atualmente em vigência no nosso país. Analisando os trâmites legais do processo legislativo da lei em análise, e a quantidade de “revisões” etc. é de se pensar o que, de fato, fazem os “revisores” e os legisladores em seus gabinetes, tendo em vista a tamanha incongruência na elaboração dos dispositivos penais. Até mesmo para os estudiosos do assunto se torna complicado sistematizar e buscar uma aplicação lógica e coerente das Leis Penais. Pelo visto, em breve, se fará necessário um novo Vicente de Piragibe, para consolidar e melhor sistematizar as Leis Penais que se encontram atualmente em vigor no nosso país.

Ainda é possível observar o pensamento da aplicação das penas quando comparados os artigos 240 e 241 com o artigo 241-A, aqui me voga, todos do Estatuto da Criança e do Adolescente:

As penas são um pouco menores que as dos dois delitos anteriores, tanto nos limites mínimos quanto máximos, o que, me atenção ao princípio da proporcionalidade, revela o entendimento legislativo de que é maior o desvalor das condutas de realização (art.240) e comercialização (art. 241) deste material, me comparação a sua mera difusão” (AMIN et al., 2019, p.1287).

Portanto, apesar de algumas condutas parecerem mais graves que outras, com a grande diversidade de tipos penais vigentes, a pena de um tipo penal teoricamente mais gravoso à vítima que outro, como é o caso dos artigos 216-B e 218-C, acabam por serem mais brandas do que deveriam, gerando uma contradição na aplicação destas diante da sociedade, e consequentemente uma desproporção entre os tipos penais como fora aqui demonstrado.

CONCLUSÃO

Este artigo cientifico permitiu analisar a importância do estudo das novas leis que estão entrando em vigor no ordenamento jurídico brasileiro, e conhecer quais mudanças efetivamente produzirão resultados na sociedade.

A análise mais específica das leis n. 13.718/18 e 13.772/18, principalmente ao acrescentarem os artigos 216-B e 218-C no Código Penal, nos levaram a observar o critério da necessidade da introdução de dois novos tipos penais, e principalmente se a pena a eles aplicada é capaz de produzir efeitos reais na coibição destas ações típicas.

Ao serem cotejadas as condutas do artigo 216-B, 218-C do Código Penal, e 240 e 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, foi possível observar que em alguns aspectos as penas não foram obedientes ao princípio da proporcionalidade, deixando a desejar, muitas vezes principalmente, quando um fato típico pode gerar inúmeros danos morais e físicos vistos estarem relacionados diretamente à dignidade sexual, mas possuem mesmo assim uma pena muito branda.

Foi possível perceber também, que o emaranhado de leis novas em nosso ordenamento, muitas vezes não dispõe de um estudo sério e conhecimento das leis já existentes e acabam criando punições que tornam outros dispositivos letra morta de lei, ou no caso me análise penas insuficientes para condutas tão graves.

Este debate é de grande relevância também para a área do direito, visto estar diretamente relacionado ao dia a dia dos aplicadores do direito e dos estudiosos e, principalmente, da sociedade em que se aplicam estas leis e o efetivo resultado da criação de novos tipos penais. Por esta razão, inspirou a elaboração deste trabalho que se justifica como um primeiro passo a chamar a atenção da comunidade acadêmica para definir um marco de proporcionalidade na aplicação destes tipos penais.

Ainda é possível observar a desproporção entre as consequências penais imputadas abstratamente aos quatro delitos constantes dos diplomas legislativos referenciados. Tal desproporção

extrapola a tão só repetição de condutas típicas cujas diferenças encontram-se apenas na especificidade de deus sujeitos passivos, mas abrangem, e aqui é o ponto nevrálgico da crítica, penas desarrazoadamente cominadas.

Portanto, conclui-se que as condutas do artigo 216-B do Código Penal quando comparado ao 240 do Eca, possui uma estrutura punitiva desproporcional. Isto se da em função de que, apesar do sujeito passivo da conduta do 240 do Eca ser criança e adolescente, a mesma conduta quando aplicada ao sujeito passivo que não seja criança e adolescente, é evidentemente desproporcional quanto ao objeto jurídico que pretende proteger, pois a vítima pode sofrer inúmeras complicações físicas, morais e psicológicas, portanto a pena aplicada ao delito do artigo 216-B é totalmente desproporcional.

Também foi possível observar a mesma desproporção no que se refere às condutas típicas do artigo 218-C e 241-A do Eca, pois a primeira possui conduta muito mais grave, já que a captura, produção, entre outras condutas, de cena de estupro ou de estupro de vulnerável, e que quando comparada à pena do artigo 241-A do Eca torna-se ínfima, visto que, apesar de ter como objetivo proteger a dignidade sexual de crianças e adolescentes, tem uma pena muito maior do que o registro de estupro (218-C do Código Penal), que é evidentemente mais grave que a conduta do artigo 241-A, sendo portanto desproporcional e desnecessário ao bem jurídico que pretende proteger.

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