REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202501301917
Lucas Cemim
Angelo Nicola Neto
RESUMO
O policiamento de eventos futebolísticos é um grande desafio para as forças de segurança, devido à grande quantidade de torcedores e ao potencial de tumultos. A atuação policial deve ser eficiente e proporcional, garantindo a segurança dos torcedores e a ordem pública, respeitando os direitos fundamentais. Nesse contexto, os Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) são uma solução estratégica, permitindo o controle de distúrbios sem causar danos permanentes. A utilização de IMPOs é essencial para a manutenção da ordem, mas requer treinamento especializado e respeito a protocolos para minimizar riscos. Este artigo analisa a eficácia e as limitações desses instrumentos, demonstrando casos concretos de sucesso e insucesso. Os IMPOs estudados aqui são granadas policiais, munições de impacto controlado, espargidores químicos, armas eletroeletrônicas de incapacitação neuromuscular e bastões policiais, cada um com aplicações específicas e diretrizes de uso. Após a utilização de IMPOs, é crucial realizar procedimentos como socorro a feridos, detenção de infratores, verificação de materiais utilizados e feedback sobre a operação. O estudo conclui que o uso adequado dos IMPOs pode ser eficaz na restauração da ordem pública dentro dos estádios, desde que respeitadas as normas e técnicas estabelecidas.
Palavras-chave: Policiamento de eventos futebolísticos, forças de segurança, torcedores, tumultos, Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO), granadas policiais, munições de impacto controlado, espargidores químicos, armas eletroeletrônicas de incapacitação neuromuscular, bastões policiais, procedimentos.
ABSTRACT
Policing football events is a major challenge for security forces, both in Brazil and around the world, due to the large number of fans and the potential for riots. Police action must be efficient and proportional, guaranteeing the safety of fans and public order, respecting fundamental rights. In this context, Instruments of Lower Offensive Potential (IMPO) are a strategic solution, allowing the control of disturbances without causing permanent damage. The use of IMPOs is essential for maintaining order, but requires specialized training and respect for protocols to minimize risks. The article analyzes the effectiveness and limitations of these instruments, discusses the challenges faced by security forces and suggests strategies to improve agent training. IMPOs include indoor explosive grenades, controlled impact munitions, chemical spreaders and electro-electronic weapons, each with specific applications and usage guidelines. After using IMPOs, it is crucial to carry out procedures such as helping the injured, detaining offenders, checking the materials used and providing feedback on the operation. The study concludes that the appropriate use of IMPOs can be effective in restoring public order, as long as established standards and techniques are respected. Recommendations for public policies and operational improvements are presented, aiming for safer and more efficient policing at sporting events.
Keywords: Policing of football events, security forces, fans, riots, Instruments of Minor Offensive Potential (IMPO), indoor explosive grenades, controlled impact munitions, chemical sprayers, electro-electronic weapons, procedures.
1. INTRODUÇÃO
O policiamento de eventos futebolísticos representa um dos maiores desafios para as forças de segurança pública no Brasil e no mundo. As partidas de futebol, especialmente em competições de grande porte, atraem multidões apaixonadas e, em algumas situações, podem se transformar em cenários de tumultos, confrontos e desordens públicas. Nesse contexto, a atuação policial precisa ser eficiente e proporcional para garantir a segurança dos torcedores, preservar a ordem pública e respeitar os direitos fundamentais dos indivíduos.
Diante dessa realidade, a utilização de instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO) surge como uma solução estratégica para equilibrar a necessidade de controle e a preservação da integridade física dos envolvidos. Esses instrumentos, quando aplicados de forma correta e dentro dos protocolos estabelecidos, permitem a contenção de distúrbios sem causar danos permanentes, minimizando riscos tanto para os agentes de segurança quanto para os cidadãos.
O tema é de extrema relevância diante do crescimento das preocupações com a violência em eventos esportivos e a necessidade de adoção de medidas de segurança modernas e humanizadas. Além disso, a atenção à legalidade e à proporcionalidade no uso da força é fundamental para o fortalecimento da imagem institucional das polícias e para o cumprimento de diretrizes internacionais de direitos humanos.
Os eventos futebolísticos, especialmente no Brasil, atraem grandes multidões e exigem um planejamento de segurança pública altamente estruturado. Como todo evento futebolístico que envolve um número expressivo de pessoas, a presença da Polícia Militar é determinada pela Lei nº 14.597, de 14 de junho de 2023 – Lei Geral do Esporte – que estabelece a responsabilidade dessa força na garantia da ordem pública, bem como na proteção das pessoas e do patrimônio.
Nesse sentido, a atuação policial deve ser pautada pela legalidade, proporcionalidade, conveniência e moderação no uso da força. Os desafios incluem o controle de multidões e a contenção de tumultos que possam surgir durante as partidas ou em seus arredores. Para enfrentar essas situações, é indispensável o contínuo aperfeiçoamento do efetivo policial, tanto no que se refere à aplicação de técnicas de controle de multidões quanto no uso correto de instrumentos de menor potencial ofensivo.
Esses instrumentos são fundamentais para a manutenção e restabelecimento da ordem pública, especialmente no interior de praças desportivas. Entretanto, seu uso exige treinamento especializado, visando minimizar os riscos de ferimentos e garantir que sua aplicação seja proporcional à ameaça enfrentada. Assim, a capacitação constante e o respeito aos protocolos operacionais tornam-se elementos-chave para a eficácia das operações e para a preservação dos direitos fundamentais dos cidadãos envolvidos nos eventos.
Assim, este artigo tem como objetivo analisar a utilização de instrumentos de menor potencial ofensivo no policiamento de eventos futebolísticos, avaliando sua eficácia e limitações. Busca-se compreender como esses instrumentos podem contribuir para a manutenção da ordem pública e a proteção de pessoas e patrimônios, respeitando os princípios de proporcionalidade e legalidade.
2. Conceito de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) e legislação
De acordo com a Lei nº 13.060, de 22 de Dezembro de 2014, que disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, em todo o território nacional brasileiro, instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO) são aqueles projetados especificamente para, com baixa probabilidade de causar mortes ou lesões permanentes, conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas.
Dessa forma, os Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) são dispositivos, armas, munições e tecnologias desenvolvidas para serem utilizadas em ações policiais com a finalidade de preservar vidas e minimizar danos à integridade física das pessoas. Os IMPO visam incapacitar temporariamente um indivíduo, com baixa probabilidade de causar morte ou lesões permanentes, e são empregados de maneira seletiva, observando os princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.
Esses instrumentos incluem, entre outros, armas de condução elétrica, munições de impacto controlado, granadas policiais explosivas, granadas com agentes químicos, entre outros. Eles são considerados parte fundamental da abordagem de uso seletivo ou diferenciado da força, priorizando métodos menos lesivos antes da utilização da força letal. Diante disso, os IMPO são largamente utilizados pelas tropas de Choque do mundo todo.
No entanto, há que se pontuar que os instrumentos de menor potencial ofensivo, instrumentos menos letais, instrumentos não letais, dentre outras terminologias, não eximem o operador de segurança pública de responsabilizações quando do mau uso do material, pois apesar de estes terem sido desenvolvidos para não causar lesões graves, podem tornar-se letais quando utilizados fora da técnica ou sem seguir as recomendações do fabricante.
2.1 Legislação sobre Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo.
A utilização dos IMPO está regulamentada por uma série de normativas e legislações nacionais e internacionais. Entre os principais documentos, destacam-se:
2.1.1 Princípios Básicos Sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Responsáveis pela Aplicação da Lei.
Os “Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei” foi adotado em 1990 no Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Crime e Tratamento dos Delinquentes. Ele estabelece diretrizes internacionais sobre como as autoridades encarregadas da aplicação da lei devem utilizar a força e as armas de fogo de maneira ética e proporcional, respeitando os direitos humanos.
O texto reconhece a importância do trabalho desses profissionais e enfatiza a necessidade de condições de trabalho adequadas, segurança pessoal e treinamento contínuo. Ele destaca que o uso da força deve ser uma medida excepcional, aplicada apenas quando outros meios não forem eficazes. O uso de armas de fogo, por sua vez, deve ser restrito a situações de legítima defesa ou para proteger outras pessoas contra ameaças iminentes de morte ou ferimentos graves. É imprescindível que esse uso seja proporcional, visando minimizar danos e preservar vidas humanas.
O documento também orienta os governos a desenvolverem regulamentos claros sobre o uso da força, incluindo o fornecimento de equipamentos de proteção e armas menos letais, para reduzir a letalidade em operações policiais. As autoridades devem oferecer treinamento profissional que aborde direitos humanos, resolução pacífica de conflitos e alternativas ao uso da força. Além disso, prevê que incidentes envolvendo ferimentos ou mortes sejam prontamente comunicados e revisados por autoridades independentes, assegurando transparência e justiça.
Por fim, os governos são incentivados a promover a divulgação desses princípios, assegurando que sejam incorporados à legislação e prática nacional, e que haja mecanismos de supervisão, responsabilização e assistência médica para pessoas afetadas pelo uso da força. O documento reforça a importância de procedimentos de comunicação e revisão, incluindo o direito de investigação independente por parte das vítimas ou seus representantes, visando garantir a aplicação ética e responsável da força pelas autoridades.
2.1.2 Portaria Interministerial n° 4.226/2010
Portaria publicada em 31 de dezembro de 2010, pelos Ministérios da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos, que estabelece diretrizes para o uso da força pelos agentes de segurança pública no Brasil. A portaria fundamenta-se em normas internacionais de proteção aos direitos humanos, como o Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei e os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo, e busca promover uma atuação policial ética e responsável, com ênfase na redução da letalidade e no respeito à dignidade humana.
O documento determina que o uso da força pelos agentes deve observar os princípios de legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência. Ele restringe o uso de armas de fogo a situações de legítima defesa ou proteção contra ameaças iminentes de morte ou lesão grave, condenando práticas como disparos de advertência e ações contra pessoas desarmadas ou veículos que não representem risco imediato. Também estabelece que os agentes portem equipamentos de menor potencial ofensivo e priorizem técnicas não letais sempre que possível.
A portaria prevê uma capacitação rigorosa dos agentes, com treinamentos regulares sobre direitos humanos e uso adequado da força. Após incidentes que resultem em lesão ou morte, são determinados protocolos específicos, como a prestação de assistência às vítimas, a preservação do local e a elaboração de relatórios detalhados para assegurar a transparência. Além disso, os órgãos de segurança pública devem criar comissões internas para monitorar a letalidade e avaliar o cumprimento das diretrizes, promovendo mecanismos de controle e responsabilização.
Também trata do apoio psicológico aos agentes envolvidos em ocorrências graves e estabelece medidas para sua reabilitação em casos de sequelas adquiridas no cumprimento do dever. A vinculação do repasse de recursos federais à adoção dessas diretrizes reforça a obrigatoriedade de sua implementação, visando alinhar as práticas de segurança pública no Brasil aos padrões internacionais de direitos humanos.
2.1.3 Lei Federal n° 13.060/2014
A Lei nº 13.060, sancionada em 22 de dezembro de 2014, regula o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo o território nacional. O objetivo principal da lei é garantir que os agentes de segurança utilizem esses instrumentos de forma racional e responsável, com o intuito de conter ou incapacitar temporariamente indivíduos sem causar danos permanentes ou fatais.
A lei determina que os órgãos de segurança pública devem priorizar o uso desses instrumentos não letais, desde que isso não coloque em risco a integridade física ou psicológica dos agentes. Ela estabelece princípios como legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade para guiar a atuação dos policiais, proibindo, por exemplo, o uso de armas de fogo contra pessoas desarmadas ou em fuga, ou contra veículos que desrespeitem bloqueios policiais, salvo em situações de risco iminente de morte ou lesão grave.
A lei também exige que os cursos de formação dos agentes incluam treinamento sobre o uso adequado desses instrumentos de menor potencial ofensivo. Além disso, o poder público é responsável por fornecer aos policiais os equipamentos necessários para a utilização adequada e segura desses instrumentos.
2.1.4 Diretriz 004/2015 – PMPR
A Diretriz nº 004/2015 trata do uso seletivo ou diferenciado da força pela Polícia Militar do Paraná (PMPR), com foco em garantir a atuação da corporação de maneira legal, ética e respeitosa aos direitos fundamentais dos indivíduos. Ela enfatiza a necessidade de os policiais estarem cientes dos limites do poder de polícia, alinhando suas ações com os princípios da Constituição Federal, especialmente no que se refere à preservação dos direitos humanos. A diretriz reforça a importância de formação e capacitação contínua dos policiais, com destaque para o treinamento em técnicas e instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO). O objetivo desses treinamentos é garantir que os policiais utilizem a força de forma proporcional e adequada às situações que enfrentam, priorizando sempre a minimização de danos à integridade das pessoas.
Os principais pontos relativos à IMPO incluem a exigência de que os policiais portem, no mínimo, dois instrumentos de menor potencial ofensivo, como bastões ou espargidores. A utilização desses equipamentos deve ser baseada em um processo de decisão que analisa a habilidade, oportunidade e risco envolvidos. Embora os IMPO sejam recursos alternativos para lidar com resistência ou conflito sem recorrer imediatamente à força letal, é importante ressaltar que eles não são infalíveis. Em circunstâncias raras, podem resultar em lesões graves ou até em letalidade, o que torna fundamental a habilitação dos policiais para o uso adequado desses instrumentos. A conscientização sobre a responsabilidade no emprego dessas ferramentas e a supervisão rigorosa são essenciais para garantir que sua utilização se dê dentro dos parâmetros legais e éticos, respeitando a dignidade humana.
Além disso, a diretriz destaca a necessidade de programas permanentes de treinamento, visando reforçar a mentalidade de que o uso da força deve ser sempre pautado na legalidade e na minimização de danos. A implementação de comissões e treinamentos contínuos visa melhorar a eficácia operacional e prevenir abusos. A diretriz também sugere que os currículos dos cursos de formação incluam conteúdos sobre direitos humanos e o uso responsável da força, promovendo uma cultura de respeito à proteção dos direitos dos cidadãos.
3. Principais IMPOs utilizados e sua aplicação em eventos futebolísticos
Neste capítulo, abordaremos os principais Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) utilizados pela PMPR, com foco na sua aplicação em eventos futebolísticos. Além disso, será analisada a viabilidade e a adequação do uso desses IMPO em tais operações, levando em conta os aspectos específicos desses eventos. Os desafios impostos pela dinâmica das multidões em ambientes de futebol são complexos, uma vez que esses espaços são considerados como fechados, por conta das limitações nas vias de fuga para um grande número de pessoas reunidas. A impossibilidade de dispersão segura e o risco de pânico podem agravar a situação. Assim, se utilizados de forma inadequada, os IMPO podem gerar tragédias, como já ocorreu em eventos desse tipo. Portanto, é essencial avaliar cuidadosamente as circunstâncias antes de aplicar qualquer ferramenta de controle, a fim de evitar consequências desastrosas.
3.1 Granadas Explosivas Indoor e Outdoor (GB-707 e GL-307)
Segundo a fabricante Condor Tecnologias Não Letais a granada GB-707 (luz e som) foi desenvolvida para ser utilizada por grupos especiais em operações de adentramento em ambientes fechados. O efeito sonoro da detonação da carga explosiva, e a intensa luminosidade produzida provocam surpresa e atordoamento, criando condições favoráveis para uma rápida intervenção.
Já a granada GL-307 (luz e som) foi desenvolvida para ser utilizada em Operações de Controle de Distúrbios e combate à criminalidade. Possui grande efeito atordoante provocado pela detonação da carga explosiva associado à luminosidade intensa que ofusca a visão dos agressores por alguns segundos, permitindo uma eficiente ação policial.
No entanto, pela recomendação de uso do fabricante, as granadas explosivas outdoor não devem ser lançadas a uma distância inferior a 10 metros dos infratores e da tropa, impossibilitando seu uso no interior de um estádio de futebol, especificamente nas arquibancadas, devido à proximidade dos torcedores para a atuação da Tropa de Choque. Desta forma, devido às granadas indoor terem sido desenvolvidas com os mesmos componentes das outdoor, mas para uso em ambientes fechados e, por assim, não possuírem um raio de segurança recomendado pelo fabricante, é possível e recomendado seu uso no interior de estádios de futebol, principalmente nas arquibancadas.
As granadas explosivas indoor, modelo atualmente utilizado pela PMPR, GB-707, são utilizadas para a dispersão de tumultos, ocorridos nas arquibancadas dos estádios ou em casos de invasão em massa do acesso restrito aos competidores (gramado), ocasião em que há a necessidade da atuação da Tropa de Choque para a dispersão e redirecionamento dos torcedores para os seus lugares previstos. Tal efeito é buscado através do som da deflagração da granada, aliado à sua luminosidade intensa e ao seu efeito psicológico, gerando desconforto na turba e fazendo com que queiram sair daquele local.
Nas situações de invasão em massa descritas, a depender do caso é possível a utilização das granadas explosivas outdoor GL-307, desde que a distância entre a Tropa de Choque e a turba seja pelo menos 20 metros, caso contrário deverão ser utilizadas granadas explosivas indoor, devido às restrições de uso emanadas pelo fabricante em seus manuais, torna-se extremamente importante esta avaliação pelo comandante e seus auxiliares.
Ainda com relação ao uso da granada GB-707, deve ser bastante observado seu tipo e local de lançamento, tendo em vista que seu tempo de retardo (tempo que a granada leva para deflagrar) é de 1,5 apenas, ou seja, o tempo para que ocorra sua deflagração é 1 segundo inferior ao tempo que granada GL-307 demorar para deflagrar (2,5s). Considerando tais aspectos relatados, não se deve realizar o lançamento das granadas GB-707 em anéis superiores das arquibancadas, pois sua deflagração muito provavelmente irá ocorrer no ar, longe do solo e próximo ao rosto dos torcedores, correndo o risco de causar sérias lesões. Ainda, levando em conta seu tempo de retardo, o operador da Tropa de Choque que for realizar o lançamento da granada em tela deve priorizar o seu lançamento rasteiro, sendo vedado o seu lançamento em parábola, pelo seu tempo de retardo.
3.2 Munições de Impacto Controlado (cal. 12 AM-403/ P e AM-403/ PSR)
Segundo a fabricante Condor Tecnologias Não Letais os cartucho calibre 12 AM-403/ P e AM-403/ PSR foram desenvolvidos para ser utilizados no Controle de Distúrbios e combate à criminalidade com a finalidade de deter ou dissuadir infratores da lei, em alternativa ao uso de munições convencionais. As munições de impacto controlado recebem esta terminologia porque o operador consegue controlar os efeitos do seu impacto, quando a utiliza da maneira correta, estas munições possuem alto poder de intimidação psicológica, provocam hematomas e fortes dores, para tanto devem ser disparadas na região das pernas dos infratores, visando propiciar os menores danos possíveis, bem como sua distância de utilização deve ser observada, sendo de 5 metros para a AM-403/ PSR e 20 metros para a AM-403/P.
As munições de impacto controlado para curta distância (5 a 15 metros), modelo atualmente utilizado pela PMPR, AM-403/ PSR, são utilizadas para combater agressões não letais perpetradas por agressores, contra os policiais militares, reduzindo sua capacidade combativa e fazendo com que deixem de agir. Ressalte-se que os disparos de munições de impacto controlado devem ser sempre efetuados em alvo certo, específico e ativo, não devendo ser utilizados para realizar dispersão, mas sim para a defesa contra agressões não letais.
O Operador de Choque na função de atirador deve ter em mente que o disparo de MIC efetuado de maneira incorreta, ou seja, fora da sua distância mínima de utilização pode causar graves lesões, também o local inapropriado do disparo, que não seja na região das pernas, pode causar lesões indesejáveis.
Ademais, deve ser levado em consideração também a diferença de nível do posicionamento da Tropa de Choque e da turba, pois pode ocorrer do disparo ser direcionado para as pernas de um agressor, mas este pode vir a se movimentar para o andar logo abaixo ou logo acima do qual estava, alterando desta maneira o local de impacto do projétil.
Já com relação às munições de impacto controlado AM-403/P, atualmente utilizadas pela PMPR, possuem sua distância de utilização de 20 a 30 metros e também podem ser utilizadas no interior do estádio, para casos de atuação específica no gramado, quando a distância entre a Tropa de Choque e a turba permitir.
3.3 Espargidor Químico de Gel ou Espuma
Segundo a fabricante Condor Tecnologias Não Letais os espargidores químicos são caracterizados por possuírem em sua formulação o agente químico capsaicina (OC), substância natural extraída da pimenta, que causa grande desconforto nos olhos, nas vias aéreas superiores e ardência nas áreas atingidas. Foi criado para reduzir a capacidade combativa de um agressor, com a finalidade de realizar a sua detenção, tendo em vista propiciar um jato direcionado.
Seu uso no interior dos estádios de futebol pode ser para a realização de alguma prisão, através do emprego do seu jato direcionado na região dos olhos do infrator resistente, fazendo com que ele fique incapacitado por alguns minutos, possibilitando assim sua detenção e condução.
3.4 Bastão Policial
Conforme descrito no Manual de Defesa Pessoal Policial da PMPR, define-se por bastão policial um instrumento de menor potencial ofensivo, utilizado para a defesa pessoal de policiais, é um bastão de polipropileno, com uma alça em uma de suas extremidades. Os dois principais bastões policiais em uso na PMPR são o PR-24 (tonfa) utilizado pela tropa regular e o PR-90, comumente utilizado pelas Tropas de Choque, além do bastão retrátil.
Seu uso no interior dos estádios de futebol deve ser feito de maneira técnica e após a análise dos riscos que ele pode vir a causar, tendo em vista ser um IMPO que pode causar sérias lesões no corpo de quem for com ele golpeado.
Sua aplicação pela tropa regular é para a defesa pessoal do Policial Militar, para separar pequenos tumultos e afastar infratores. Já para as Tropas de Choque o bastão é o IMPO que está à disposição do Operador de Choque na função de escudeiro, juntamente com seu escudo, nesta circunstância o PR-90 é utilizado quando a distância entre a turba e a Tropa de Choque é exígua, fazendo-se necessária a atuação a curta distância, através do chamado “combate corpo a corpo”, golpeando os infratores, com a intenção de afastá-los para criar uma janela de oportunidade e propiciar a distância necessária para que os demais Operadores de IMPOs (granadas e MIC) possam utilizá-los de maneira técnica.
4. Tipos de IMPO que não devem ser utilizados no interior de estádios de futebol
Neste capítulo serão descritos os IMPOs que não devem ser utilizados no interior de estádios de futebol, bem como em seu perímetro imediato.
De maneira sucinta, todos os IMPOs que possuem em sua composição agentes químicos lacrimogêneos como o OC e o CS, e que são expelidos no ambiente através de emissão ou deflagração não podem ser usados no interior dos estádios e em suas adjacências imediatas, pois nestes locais há uma massa heterogênea de espectadores, dentre eles mulheres, crianças, idosos e pessoas com problemas graves de saúde, somado ao fato de que no local onde está ocorrendo um espetáculo esportivo a quantidade de pessoas ultrapassa o limite das vias de fuga, para que ocorra uma eventual saída segura. Sendo assim, ao utilizá-los há um grande risco de causar efeitos colaterais indesejáveis, tendo em vista o desespero de diferentes tipos de pessoas que vão tentar correr e sair do local que está contaminado com os agentes químicos.
Também será explicado o motivo pelo qual é desaconselhado o uso de armas de incapacitação neuromuscular no interior de estádios de futebol, levando-se em conta sempre a premissa do IMPO de “não causar lesões permanentes”.
4.1 Espargidor Químico de Uso Coletivo
Possuindo as mesmas características dos espargidores químicos de gel ou espuma, que tem em sua formulação o agente químico capsaicina, o espargidor químico de uso coletivo diferencia-se no seu uso, devido ao tipo de jato proporcionado por ele, pois sua finalidade é proporcionar um espargimento em aerossol, que contamine a turba como um todo, buscando assim o desconforto das pessoas ali presentes e sua consequente dispersão.
O espargidor químico de coletivo no interior de estádios de futebol, considerado ambiente fechado, devido às suas vias de fuga insuficientes para uma evacuação urgente, não deve, em hipótese alguma, ser utilizado, tendo em vista o risco iminente de causar um pânico geral nos presentes e a tentativa de saída em massa do interior do estádio, podendo haver pisoteamentos, entre outros acidentes, inclusive mortes.
4.2 Granadas Lacrimogêneas de Emissão
Conforme a fabricante Condor Tecnologias Não Letais as granadas lacrimogêneas de emissão produzem densa fumaça, com agente químico lacrimogêneo CS ou OC e diferentemente das granadas explosivas outdoor, não possuem raio de segurança, ou seja, não há impedimento de uso devido à distância da turba.
Contudo, apesar de não possuírem raio de segurança, seu uso no interior de estádios e perímetro imediato é inviável, pelos mesmos motivos elencados anteriormente e que justificam a não utilização de agentes químicos nestes tipos de locais, sob o risco de ser ocasionada uma tragédia, como será estudado mais adiante.
4.3 Granadas Explosivas com Agente Químico Lacrimogêneo em sua composição
Segundo a fabricante Condor Tecnologias Não Letais as granadas explosivas que possuem agente químico lacrimogêneo CS ou OC em sua composição possuem grande efeito atordoante provocado pela detonação da carga explosiva, associado ao efeito dos agentes citados.
Seu uso, assim como as granadas lacrimogêneas de emissão, é vedado no interior do estádio e seu perímetro imediato, devido ao fato de um grande número de pessoas ser contaminadas pelo agente químico expelido no ar após a deflagração da granada, havendo sérios riscos de haver pânico generalizado no local e as consequências, já citadas, decorrentes de tal situação.
4.4 Arma Eletroeletrônica de Incapacitação Neuromuscular (AINM)
Segundo a Norma Técnica da SENASP nº 002/ 2020, arma eletroeletrônica de incapacitação neuromuscular é uma arma de porte que quando acionada promove descarga elétrica pulsada no alvo, estimulando ação neuromuscular para causar incapacidade física temporária, sem causar lesões graves, consideradas armas menos letais, projetadas para reduzir riscos fatais durante sua aplicação.
As AINM, como a SPARK, da Condor Tecnologias Não Letais e a TASER da Axon Enterprise, são dispositivos eletroeletrônicos que atuam diretamente sobre o sistema neuromuscular do indivíduo. Esses dispositivos emitem pulsos elétricos de alta voltagem e baixa amperagem que, ao atingirem o alvo, estimulam involuntariamente os nervos sensoriais e motores, provocando desorientação, contrações musculares intensas e a consequente incapacitação física temporária. Diferentemente de armas baseadas no estímulo doloroso, as AINM são eficazes mesmo em indivíduos com alta tolerância à dor, como usuários de drogas ou pessoas altamente treinadas.
A incapacidade gerada pelas AINM se dá pela interferência no sistema nervoso periférico, onde os pulsos elétricos desorganizam temporariamente a comunicação entre o cérebro e os músculos, resultando na perda de controle motor e queda imediata. Esse mecanismo é extremamente útil para a contenção de infratores em situações de risco à segurança pública, pois reduz a possibilidade de resistência ativa e minimiza danos permanentes.
Apesar de sua eficácia, o uso de AINM no interior de estádios de futebol é inviável, especialmente em áreas como arquibancadas, devido às características estruturais e dinâmicas desse ambiente. Um dos principais fatores de risco é a diferença de nível característica das arquibancadas, com escadas e desníveis acentuados, o que pode aumentar drasticamente as chances de lesões graves durante a queda do indivíduo incapacitado.
Quando uma AINM é utilizada em um ambiente plano, a queda é geralmente controlada, minimizando o risco de impacto severo. No entanto, em arquibancadas, o risco de lesões graves é significativamente amplificado devido às características do ambiente. Além da possibilidade de o indivíduo colidir com degraus, corrimãos ou outros objetos durante a queda, o maior perigo reside na chance de cair de um plano elevado. Nessa situação, o impacto da cabeça ou da coluna contra o plano inferior pode causar lesões graves, como traumatismos cranioencefálicos, fraturas severas ou até mesmo óbito. Esses cenários comprometem a premissa fundamental de utilização das armas menos letais, que é minimizar danos permanentes aos envolvidos.
5. Procedimentos a serem adotados após o uso de IMPO no interior de estádios de futebol durante eventos futebolísticos
O uso de Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) em estádios durante eventos futebolísticos é uma medida de segurança fundamental para garantir a ordem e o controle da multidão, especialmente em situações de risco, como tumultos ou invasões. No entanto, a eficácia do uso desses instrumentos não depende apenas de sua aplicação, mas também da execução de procedimentos adequados após sua utilização. Estes procedimentos são essenciais para minimizar os impactos negativos, garantir a segurança de todos os envolvidos e restaurar a ordem pública de forma eficiente.
Após a utilização de IMPO, como granadas de gás lacrimogêneo, bastões de controle de multidões ou munições de impacto controlado, uma série de ações deve ser tomada para assegurar a integridade dos torcedores e dos agentes de segurança, além de mitigar danos ao ambiente e prevenir novas ocorrências de violência. A seguir, são apresentados os procedimentos que devem ser adotados.
5.1 Socorro a eventuais feridos
O primeiro procedimento a ser realizado após a atuação da Tropa de Choque com o uso de IMPO é a verificação se existem vítimas da ação e realizar o socorro àquelas que estiverem feridas, seja através das equipes médicas presentes no evento, Bombeiros Militares, SAMU ou eventual deslocamento até uma unidade médica.
5.2 Detenção de infratores
Após o socorro aos feridos é de extrema importância que sejam realizadas detenções de infratores, pois tal ato subsidia e justifica a atuação da Tropa de Choque, após a detenção estes devem ser encaminhados para a unidade de Polícia Civil específica, geralmente a DEMAFE (Delegacia Móvel de atendimento a Futebol e Eventos), onde serão submetidos aos procedimentos de Polícia Judiciária, seja por meio de termo circunstanciado, medidas restritivas determinadas pelo JECRIM e até mesmo a prisão em flagrante, a depender do caso.
A referida detenção deve ser realizada, preferencialmente, pela segurança terceirizada do clube e, na impossibilidade destes, por policiais militares integrantes da tropa regular presente na operação, buscando seguir a Doutrina vigente na PMPR e visando não onerar os operadores da Tropa de Choque com esta missão.
5.3 Rescaldo de materiais utilizados
Após finalizada a atuação da Tropa de Choque, faz-se necessária a verificação do terreno para o recolhimento de provas, eventuais artefatos falhos e restos de IMPO que foram utilizados. Tal ação tem por objetivo apreender materiais que foram utilizados contra a tropa, subsidiando a atuação, além de pretender preservar a integridade física de civis que posteriormente terão acesso ao local e por fim, dar o devido encaminhamento às sobras de IMPO.
5.4 Feedback
Ao término da operação futebol na qual houve a necessidade de atuação da Tropa de Choque com uso de IMPO, geralmente a tropa retorna a sede do Batalhão ou Companhia. Após a desequipagem, o comandante deve realizar um “feedback” com todos os policiais que participaram da atuação. Neste momento será analisada a atuação do Pelotão de Choque como um todo, sendo apontados erros e acertos cometidos por cada um dos operadores e, principalmente, avaliado se a utilização dos IMPOs seguiu a Doutrina da PMPR, respeitou as legislações acerca do seu uso e orientações do fabricante.
5.5 Confecção de documentos
Como último procedimento a ser realizado após a atuação da Tropa de Choque com uso de IMPO no interior de estádio de futebol, está a confecção de documentos. Nesta fase o comandante da Tropa de Choque, com o assessoramento de seus auxiliares, deve elaborar, cuidadosamente, documentos acerca da atuação, visando promover o registro do ocorrido, para respaldo em eventuais procedimentos futuros, informar os fatos ao escalão superior, para controle, descarregar corretamente os materiais utilizados e manter o controle atualizado dos IMPOs. Deverão ser confeccionados um Boletim de Ocorrência Unificado, contendo o nome de todos os policiais militares que participaram, narrando toda a atuação, o que a antecedeu e o que a precedeu, especificando locais, horários e IMPOs utilizados. Realizando então uma parte circunstanciada contendo todas as informações que foram descritas no BOU, além de demais dados específicos.
5.6 Estudo de casos e treinamentos
Procedimento semelhante ao feedback, porém realizado em dia adverso e subsequente a atuação da Tropa de Choque com o uso de IMPO, os estudos de casos e treinamentos constantes são de extrema importância para a excelência da Tropa de Choque, que deve estar sempre preparada e bem treinada para uma atuação.
Desta forma, regularmente na rotina de uma Tropa de Choque devem estar previstos estudos de casos, momentos nos quais serão apresentadas atuações com o uso de IMPOs que já ocorreram anteriormente, propiciando uma atividade reflexiva, bem simulações de situações que já ocorreram ou podem vir a ocorrer, buscando aparar arestas e aperfeiçoar ações já realizadas de maneira correta.
6. Análise Crítica
Neste capítulo, serão apresentados dois estudos de caso que ilustram os impactos da utilização de Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) em operações de controle de distúrbios. O primeiro estudo explora um cenário trágico, no ano de 1964, na cidade de Lima, Capital do Peru, em que o desfecho negativo foi devido ao uso inadequado de IMPO, aliado à falta de vias de fuga, com portões fechados, agravando a situação. A utilização incorreta dos IMPOs, combinada com a restrição de saída para os torcedores, resultou em um ambiente de extrema tensão, onde houve mortes durante o tumulto.
Por outro lado, o segundo estudo relata uma intervenção bem-sucedida, 60 anos depois, no ano de 2024, na cidade de Curitiba, Paraná, durante a qual o uso correto e estratégico dos IMPOs, em conformidade com protocolos e treinamento adequado, garantiu um desfecho positivo, com a preservação da ordem pública e a minimização de riscos.
6.1 Caso mal sucedido no uso de IMPO no interior de estádios de futebol durante eventos futebolísticos.
A tragédia ocorrida no Estádio Nacional de Lima, no Peru, em 24 de maio de 1964, foi um grande desastre na história do futebol, com mais de 300 mortes confirmadas. A partida entre Peru e Argentina, válida pelo Torneio Pré-Olímpico para os Jogos Olímpicos de Tóquio, atraiu uma enorme massa de 53 mil torcedores, em sua maioria peruanos, que esperavam a vitória de sua equipe, que precisava de um bom resultado para avançar à última rodada.
Nos minutos finais da partida, enquanto a Argentina vencia por 1 a 0, um gol de empate do Peru foi anulado. A decisão do árbitro gerou grande tensão na torcida, transformando-se em tumulto, com alguns torcedores invadindo o campo. A polícia, tentando controlar a situação, fez o uso de agente químico CS (ortoclobenzilmalononitrilo), mais conhecido como “gás lacrimogêneo” na arquibancada norte, provocando pânico entre os espectadores.
O pânico se espalhou rapidamente, gerando uma tentativa em massa de fuga do interior do estádio. No entanto, o estádio possuía portões de saída bloqueados por persianas de aço corrugado, que estavam fechadas. Esses portões não abriram a tempo de permitir uma evacuação segura, e os torcedores, em pânico, correram para os túneis do estádio em busca de uma fuga. Esse movimento gerou um esmagamento fatal nas escadas, onde os espectadores foram pressionados uns contra os outros, incapazes de escapar devido à falta de vias de fuga adequadas.
Foram registrados oficialmente 328 mortos, embora muitos acreditem que o número real possa ser ainda maior. A maioria das vítimas faleceu devido à asfixia ou hemorragias internas.
O impacto dessa tragédia levou a mudanças significativas no manejo de eventos esportivos no Peru e ao redor do mundo. O Estádio Nacional teve sua capacidade reduzida de 53 mil para 42 mil lugares, e medidas de segurança em estádios começaram a ser repensadas para garantir que não ocorressem situações similares. Além disso, o evento gerou um debate sobre a responsabilidade da polícia e a eficácia de seus métodos de controle de multidões, especialmente no uso de agente químico lacrimogêneo em espaços fechados, o que agravou a situação.
A tragédia no Estádio Nacional de Lima evidencia uma série de falhas nas práticas de segurança e no controle de multidões. O uso de agente químico lacrimogêneo em uma área fechada, com saídas restritas, exacerbado pela pressão de milhares de pessoas em pânico, é um exemplo claro de uma abordagem inadequada para o controle de distúrbios em um ambiente de grande concentração de pessoas, como as praças esportivas. Além disso, a falta de vias de fuga adequadas e a demora na abertura dos portões contribuíram diretamente para o número elevado de vítimas.
Esse desastre serve como um alerta sobre a necessidade de um planejamento de segurança eficaz, que leve em consideração não apenas o controle de multidões, mas também as medidas de prevenção e evacuação em caso de pânico. A tragédia também mostra a importância de treinamento adequado para os profissionais de segurança, para que possam reagir com sensatez em situações de crise, minimizando danos e salvando vidas.
Conclui-se que a tragédia de Lima de 1964 continua a ser um ponto de referência trágico para a segurança em eventos esportivos. Embora tenha levado a mudanças importantes nas medidas de segurança, como a redução de capacidade e o aprimoramento do controle de multidões, a lição mais importante permanece em como o uso inadequado de técnicas de controle pode, em vez de conter a violência, agravar a situação, resultando em uma tragédia de grandes proporções.
6.2 Caso de sucesso no uso de IMPO no interior de estádios de futebol durante eventos futebolísticos.
A partida entre o Clube Athlético Paranaense e o Red Bull Bragantino, realizada no dia 5 de dezembro de 2024, pela 37ª rodada do Campeonato Brasileiro Série A, foi marcada por grande tensão. O confronto aconteceu no Estádio Ligga Arena, em Curitiba, e tinha grande importância para o time da casa. O Athlético Paranaense ocupava as últimas posições da tabela e lutava contra o rebaixamento iminente para a Série B.
Com a derrota por 2 a 1, o time praticamente selou o rebaixamento para a série B, ampliando a frustração de seus torcedores. A situação agravou-se ainda mais entre os integrantes da torcida organizada “Os Fanáticos”. Esse contexto esportivo de tensão criou um ambiente altamente propenso a tumultos, com potencial para desdobramentos graves.
Diante da importância da partida e do risco de conflitos, o Pelotão de Choque foi mobilizado, se posicionado estrategicamente para conter qualquer ato de violência que pudesse colocar em risco a ordem pública, a integridade física dos presentes e o patrimônio.
Logo após o encerramento da partida, parte da torcida começou a se comportar de maneira agressiva. Torcedores subiram na parede de acrílico que separa as arquibancadas do gramado, enquanto outros forçavam o portão de acesso ao campo com chutes, socos e empurrões. Paralelamente, o Pelotão de Choque, posicionado no túnel abaixo da torcida visitante, passou a ser alvo de objetos arremessados pelos torcedores.
A pressão sobre o portão tornou-se insustentável, e os seguranças terceirizados não conseguiram impedir que ele cedesse. O cenário apresentava risco real de invasão em massa ao campo, o que poderia causar confrontos físicos entre torcedores, atletas, comissões técnicas e outras pessoas presentes no estádio. A situação exigia uma resposta rápida e técnica para preservar a ordem pública e evitar consequências mais sérias.
A atuação do Pelotão de Choque exemplificou a importância do treinamento especializado no controle de multidões. Inicialmente, os policiais tentaram conter os torcedores utilizando presença física e verbal. No entanto, com o agravamento da situação e a iminência de um rompimento do portão, foi necessário o emprego de instrumentos de menor potencial ofensivo.
O pelotão utilizou bastões PR-90 e lançou três granadas indoor de luz e som (GB-707). A intervenção dispersou os torcedores, permitindo que o portão fosse fechado novamente. Embora a tensão tenha persistido com o arremesso de objetos e insultos, a mediação conduzida pelo comando da operação e os representantes do clube foram fundamentais para acalmar os ânimos e restabelecer a ordem.
Importante ressaltar que a ação foi conduzida de forma proporcional, evitando o uso excessivo da força. Não houve registro de feridos entre os torcedores devido à intervenção.
A intervenção do Pelotão de Choque impediu a invasão ao gramado, preservando a integridade física de todos os envolvidos e evitando danos ao patrimônio do estádio. A rápida resposta da equipe também evitou a escalada do conflito para níveis mais graves, garantindo a segurança de torcedores, atletas e funcionários.
Conclui-se que a atuação do Pelotão de Choque no evento esportivo entre o Clube Athlético Paranaense e o Red Bull Bragantino foi um exemplo de profissionalismo e eficiência. Em um cenário de alta tensão, com torcedores revoltados e a iminência de um conflito generalizado, a resposta técnica, estratégica e proporcional dos policiais militares garantiu a manutenção da ordem pública e a segurança de todos os presentes.
A utilização de instrumentos de menor potencial ofensivo, em especial a granada indoor de luz e som GB-707, foi decisiva para o desfecho positivo. Esse IMPO permitiu dispersar os torcedores de maneira eficaz e imediata, evitando uma invasão ao gramado sem causar ferimentos ou agravar ainda mais a situação de tensão.
7. Conclusão
O presente trabalho buscou abordar os principais aspectos relacionados ao uso dos Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo (IMPO) pela Polícia Militar do Paraná (PMPR), com ênfase em sua aplicação durante eventos futebolísticos. A análise considerou tanto a importância da utilização de técnicas e equipamentos que minimizem danos quanto os desafios específicos impostos por ambientes com grande concentração de pessoas.
Ficou evidente que, embora os IMPO sejam ferramentas indispensáveis para a preservação da ordem e a redução da letalidade nas operações, seu uso exige preparo técnico, capacitação contínua e uma análise criteriosa das circunstâncias. Em eventos futebolísticos, a dinâmica das multidões e a configuração dos espaços tornam-se fatores críticos, uma vez que o uso inadequado desses instrumentos pode potencializar riscos e até provocar tragédias.
Dessa forma, ressalta-se a necessidade de investimentos contínuos em treinamento, supervisão e revisão de protocolos, assegurando que as ações policiais sejam realizadas dentro dos parâmetros legais, éticos e técnicos. Apenas por meio da conscientização e do aprimoramento constante será possível garantir a segurança de todos os envolvidos, preservando a dignidade humana e o respeito aos direitos fundamentais.
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