REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7607604
Vandrey de Menezes Baldão1
Resumo
O trabalho em tela tem como objeto a análise do Direito tributário como instrumento útil à efetivação dos direitos humanos através da promoção de políticas públicas e da materialização dos direitos fundamentais sociais, econômicos e culturais. O Estado só poderá garantir os direitos humanos utilizando-se destas políticas tendo como meio a arrecadação de tributos.
Será feita uma abordagem conceitual e doutrinária acerca dos Direitos Humanos, baseada especialmente na concepção do autor Joaquin Herrera Flores.
O estudo será feito também quanto ao fundo e orçamento públicos, os tributos municipais bem como as demais formas de arrecadação de receita dos Municípios.
Palavras-chave: Direitos Humanos. Tributação. Finalidades dos Tributos. Desenvolvimento social. Impostos Municipais.
INTRODUÇÃO
No presente artigo, esboçar uma tentativa de compreensão da relação do Direito Tributário e decorrente arrecadação de recursos, como meio de efetivar a aplicação de Direitos Humanos (human rights).
Os indivíduos gozam de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, mas ao mesmo tempo, se encontram obrigados ao pagamento dos tributos que servem para financiar o gasto público. Os seres humanos são sujeitos concretos, que procuram satisfazer suas necessidades na dinâmica da vida cotidiana.
O Direito Tributário tem como um dos principais objetivos balancear interesses arrecadatórios do Estado (poder de tributar) e a proteção dos contribuintes (direitos humanos).
O trabalho divide-se em três partes, trazendo narrativas doutrinárias acerca dos direitos humanos, bem como suas dimensões, fontes e características de vedação ao retrocesso. Ato contínuo, passa-se a uma análise do Orçamento e fundo públicos, tendo o Direito Tributário como fundamental para efetivar os direitos humanos nas sociedades contemporâneas.
Finaliza-se o artigo com a explicitação dos tributos municipais, as formas de arrecadação de recursos pelos Municípios previstos constitucionalmente, e, por derradeiro, sua destinação no Município de Ponta Grossa, especificamente no ano de 2022.
Deve-se, ainda, destacar a Metodologia utilizada no trabalho. Em suma: apresenta e delimita a dúvida investigada (problema de estudo – o quê), os objetivos (para que serviu o estudo) e a metodologia utilizada no estudo (como). Como pesquisa bibliográfica, suas fontes constituíram-se, principalmente, de livros e artigos científicos, bem como de autores filiados ao pensamento crítico. Como pesquisa documental, serão analisadas a Constituição federal e infraconstitucional municipal.
1. DIREITOS HUMANOS PELA DOUTRINA
Inicialmente, cumpre-nos advertir que não há um entendimento doutrinário pacífico que possa fornecer de forma segura um conceito de direitos humanos.
Estes figuram como o conjunto de direitos previstos em instrumentos internacionais que proporcionam a todos os seres humanos, independentemente de qualquer condição, a base essencial para que tenham uma vida digna e para que se protejam contra violações praticadas ou toleradas pelo Estado.
Os direitos humanos podem ser entendidos como: “A proteção de maneira institucionalizada dos direitos da pessoa humana contra os excessos do poder cometidos pelos órgãos do Estado ou regras para se estabelecer condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade humana” (UNESCO, 1978, p. 11, apud ÂNGELO, 1998, p. 17. Grifos meus).
Para Joaquín Herrera Flores2, os direitos humanos, frutos de processos culturais, devem ser dinamizados a fim de construir de uma ordem social justa (artigo 28, da Declaração de 1948) que permita e garanta a todas e a todos lutar por suas reivindicações.
(…) Os direitos humanos são os meios discursivos, expressivos e normativos que pugnam por reinserir os seres humanos no circuito de reprodução e manutenção da vida, nos permitindo abrir espaços de luta e de reivindicação. São processos dinâmicos que permitem a abertura e a consequente consolidação e garantia de espaços de luta pela dignidade humana (…)
A afirmação dos indivíduos como atores do cenário em que vivem, e, sobretudo, para o discernimento relativo a aspectos concretos de suas dignidades, por meio da figura do diamante ético.
O diamante ético, pensado pelo filósofo, como concepção teórico-metodológica, é composto basicamente por três camadas ou capas. Na primeira delas, encontram-se as “categorias genéricas”: teorias, instituições, forças produtivas e relações sociais de produção.
Na segunda camada, encontram-se as “categorias impuras”: posição, disposição, narrações e historicidade.
E, por derradeiro, na terceira camada (núcleo mais profundo), estão as categorias que efetivamente delimitam os Direitos Humanos: espaço, valores, desenvolvimento e práticas sociais. O exame segue dois eixos (conceitual e material), que se entrecruzam nas várias camadas do diamante, em permanente relação de interdependência3
Na qualidade de diamante, nossa figura pretende afirmar a indiscutível interdependência entre os múltiplos componentes que definem os direitos humanos no mundo contemporâneo. Com o “diamante ético”, nos lançamos a uma aposta: os direitos humanos vistos em sua real complexidade constituem o marco para construir uma ética que tenha como horizonte a consecução das condições para que “todas e todos” (indivíduos, culturas, formas de vida) possam levar à prática sua concepção da dignidade humana. Nada é mais universal que garantir a todos a possibilidade de lutar, plural e diferenciadamente, pela dignidade humana.
A ONU – Organização das Nações Unidas – trouxe sua contribuição acerca do que seriam os direitos humanos:
Os direitos humanos são inerentes a todos os seres humanos, qualquer que seja a nacionalidade, local de residência, sexo, origem nacional ou étnica, cor, religião, língua ou qualquer outro estatuto. Todos têm igualmente direito aos direitos humanos, sem discriminação. Esses direitos estão todos interligados, interdependentes e indivisíveis. Os direitos humanos universais são frequentemente expressos e garantidos legalmente, na forma de tratados, no direito internacional consuetudinário, nos princípios gerais e em outras fontes do direito internacional. O DIDH [direito internacional dos direitos humanos] impõe aos governos a obrigação de agir de determinada forma ou de abster-se de determinados atos a fim de promover e proteger os direitos humanos e as liberdades fundamentais de indivíduos ou grupos4
Anteriormente à Segunda Guerra Mundial (ocorrida de 1939 a 1945), os tratados internacionais eram focados na questão trabalhista e no combate à escravidão. O período pós-guerra instaurou uma nova lógica planetária, por conta das atrocidades sofridas, exaltando a importância do indivíduo como um dos novos sujeitos do Direito Internacional.
Em 1945, na Conferência de São Francisco a ONU foi criada, porém não foram listados os direitos considerados essenciais, de modo que em 1948 foi elaborada a Declaração Universal de Direitos Humanos. Esta prevê, em seu preâmbulo, o necessário reconhecimento da dignidade, inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis, como o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo e essa previsão é ratificada também no preâmbulo do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, em 1966.
Existe uma discussão doutrinária se ela possui caráter vinculante por ser uma interpretação do que é direitos humanos, previsto na Carta da ONU, que tem caráter vinculante, ou se possui caráter vinculante por representar o costume internacional sobre a matéria (opinião do autor); ou ainda há quem defenda que é apenas uma soft law (orientam os Estados).
A partir do estudo da Teoria Geral dos Direitos Humanos, há duas maneiras/técnicas de conceituar Direitos Humanos, quais sejam: generalista e específica.
a) Generalista
Não há diferença entre direitos humanos e direitos fundamentais. Portanto, direitos humanos seriam um conjunto de direitos essenciais para a consecução de uma vida digna para todos os seres humanos, independentemente de previsão na Constituição ou em tratados internacionais.
b) Específica
É preciso diferenciar direitos fundamentais de direitos humanos, seja porque os mecanismos de proteção são distintos seja porque o Direito Internacional dos Direitos Humanos é ramo autônomo quando comparado ao Direito Constitucional.
1.1 CLASSIFICAÇÃO DAS GERAÇÕES/DIMENSÕES DOS DIREITOS HUMANOS
Primeiramente, destaca-se que a doutrina moderna prefere a expressão “dimensões” e não “gerações”, pois esta traz a ideia de sucessão, contrariando o caráter complementar dos direitos humanos. Assim, com o surgimento de uma nova dimensão a anterior não deixa de existir.
Bonavides afirma que a melhor expressão é “dimensão”, que se justifica tanto pelo fato de não existir realmente uma sucessão ou desaparecimento de uma geração por outra, mas também quando novo direito é reconhecido, os anteriores assumem uma nova dimensão, de modo a melhor interpretá-los e realizá-los.
1ª Geração/Dimensão
Surgiu com as revoluções burguesas dos séculos XVI e XIX. Englobam os direitos de liberdade, chamados de prestações negativas, nas quais o Estado deve proteger a esfera de autonomia do indivíduo. Denominados também de “direitos de defesa”, pois protegem o indivíduo contra intervenções indevidas do Estado
Assim, o Estado não poderia interferir na órbita individual, salvo para garantir a prevalência do máximo de liberdade possível para todos.
Exemplos: direito à liberdade, igualdade perante a lei, propriedade, intimidade e segurança, traduzindo o valor da liberdade.
Obs.: Na concepção contemporânea dos Direitos Humanos, os direitos de 1ª Geração não envolvem apenas condutas negativas do Estado. Por exemplo, o direito de não ser torturado envolve uma conduta negativa do Estado (não torturar), mas quando o Estado deixa de fornecer condições dignas aos presos (água potável, ambiente adequado) também está torturando. Portanto, perceba que este direito demanda sim prestações positivas dos Estados.
2ª Geração/Dimensão
Surgiu em decorrência da deplorável situação da população pobre das cidades industrializadas. Englobam os chamados direitos de igualdade. Impõe aos Estados obrigações positivas, defendendo a intervenção estatal, como forma de reparar a iniquidade vigente.
A segunda geração de direitos humanos representa a modificação do papel do Estado, exigindo-lhe um vigoroso papel ativo, além do mero fiscal das regras jurídicas.
Exemplos: direito à saúde, educação, previdência social, habitação.
3ª Geração/Dimensão
Englobam os chamados direitos de solidariedade/fraternidade.
São aqueles de titularidade da comunidade, como o direito ao desenvolvimento, direito à paz, direito à autodeterminação e, em especial, o direito ao meio ambiente equilibrado.
Exemplos: direito ao desenvolvimento, direito à paz (5ª Geração para Bonavides), direito à autodeterminação e, em especial, o direito ao meio ambiente equilibrado.
4ª Geração/Dimensão
Segundo Paulo Bonavides, há os direitos de quarta geração, decorrentes do desenvolvimento da globalização política, correspondente à derradeira fase de institucionalização do Estado Social. Correspondem aos direitos de participação democrática (democracia direta), direito ao pluralismo, bioética e limites à manipulação genética, fundado na defesa da dignidade da pessoa humana contra intervenções abusivas de particulares ou do Estado.
Exemplos: direito à democracia, direito à informação
1.2 FONTES DOS DIREITOS HUMANOS
Segundo a doutrina, as fontes dos direitos humanos estão previstas, de maneira não exaustiva, no art. 38.1 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, sendo elas:
a) as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito;
c) os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas;
d) as decisões judiciais e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes nações como meio auxiliar para a determinação das regras de direito.
No âmbito interno destacam-se: a) constituição; b) leis específicas; c) atos normativos secundários (decretos executivos).
1.3 DIREITOS HUMANOS E VEDAÇÃO AO RETROCESSO
Os direitos humanos também são protegidos pela vedação ao retrocesso, cujo significado compreende o dever de sempre se agregar algo novo e melhor, não podendo retroceder.
Aos Estados está proscrito proteger menos do que já protegem, estando os tratados internacionais, por eles concluídos, impedidos de impor restrições que diminuam ou nulificam direitos anteriormente já assegurados.
Internamente, o princípio da vedação ao retrocesso veda ao legislador a supressão pura e simples da concretização de norma constitucional que permita a fruição de um direito fundamental, especialmente os sociais.
Posição do STF
“(…) A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. – O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. – A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em consequência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar – mediante supressão total ou parcial – os direitos sociais já concretizados” (ARE-AgR 639337, Min. Rel. Celso de Mello, STF, J. 23/08/2011. Grifos meus).
1.4 DIREITOS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONAIS
Há uma clássica distinção doutrinária entre as expressões direitos humanos e direitos fundamentais.
Sarlet (2004) ressalta que direitos fundamentais e direitos humanos não são sinônimos, sendo distintos pela abrangência. Os direitos fundamentais são aqueles reconhecidos e positivados por um Estado dentro do direito constitucional, enquanto direitos humanos referem-se ao direito internacional, sem vinculação a nenhuma ordem constitucional e com caráter supranacional, aliada a pretensão de universalidade por abarcar os seres humanos em geral.
A Carta da ONU, de 1945, estabelece essa distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais. Da mesma forma, a Constituição brasileira de 1988 efetua uma correta distinção entre as expressões.
Nossa Carta Magna estabeleceu a mais precisa e detalhada carta de direitos de nossa história, incluindo vasta identificação de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, além de um conjunto preciso de garantias constitucionais. A Constituição impôs ao Estado brasileiro a obrigação de reger-se, em suas relações internacionais, pelo princípio da “prevalência dos direitos humanos”(artigo 4º, inciso II). Resultado desta nova diretriz constitucional foi o Brasil, no início dos anos noventa, ratificar a adesão aos Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e às Convenções contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes e Americana de Direitos Humanos, que se encontram entre os mais relevantes instrumentos internacionais de proteção aos direitos humanos.
Ora, o § 1º do art. 5º da CF, ao se referir aos direitos em âmbito interno, assenta que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. De outra banda, no § 3º do art. 5º, ao se referir à proteção internacional, a CF se utiliza, irretocavelmente, da expressão direitos humanos: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.
Os direitos fundamentais relacionam-se à previsão constitucional dos direitos das pessoas que se encontram dentro de um determinado Estado. Eles representam a proteção interna.
O valor da dignidade da pessoa humana impõe-se como núcleo básico e informador de todo e qualquer ordenamento jurídico, como critério e parâmetro de valoração a orientar a interpretação e compreensão de qualquer sistema normativo.
A proteção à vida foi alçada na garantia constitucional (art. 5º, caput, CF), em cujo conceito se incluem o direito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), à integridade físico-corporal e moral e o direito à existência.
A saúde, moradia, segurança e a assistência aos desamparados, por igual, têm estatura constitucional enquanto direitos sociais (art. 6º, caput, CF).
Os direitos à moradia e saneamento básico também têm envergadura constitucional, no rol das competências materiais da União, estados e municípios, para a promoção de “programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico” (art. 23, IX, CF).
No âmbito dos Direitos Humanos os critérios cronológico, hierárquico ou da especialidade podem ser desconsiderados na hipótese de conflito entre normas a fim de que se aplique a norma mais favorável ao ser humano. Essa é a essência de aplicação do princípio “pro homine”.
2. O DIREITO TRIBUTÁRIO
Nas últimas décadas, a tributação vem sendo vista não apenas como um instrumento de arrecadação de recursos para os cofres públicos, função por si só meritória, mas também como uma forma de garantir direitos fundamentais do cidadão, sendo a principal fonte de receitas dos Estados contemporâneos.
A “democratização” do Brasil recepcionou uma série de Direitos Humanos no texto constitucional de 1988. A dificuldade atual não é mais positivar os Direitos Humanos, mas sim torná-los plenamente eficazes.
Maria de Fátima Ribeiro:
A tributação é vetor à realização da almejada dignidade da pessoa humana, e, sem dúvida, há de se notar o existente pelo inter-relacional a realização de políticas públicas condizentes a realização do mínimo existencial. Desse modo, o princípio em tela ganha contornos relevantes à construção e à manutenção do Estado Democrático de Direito5.
De tal sorte, os objetivos do STN se identificam com os objetivos da República Federativa do Brasil. Nessa relação de identidade vislumbra-se o caráter político da tributação.
Tais valores resultam da concatenação do art. 1º com o art. 4º da CRFB. Para os fins deste trabalho, é de especial relevância a dignidade humana que, na ordem internacional, se reflete no princípio da prevalência dos direitos humanos.
Analisar o ramo do Direito Tributário exige uma reflexão sobre o viés de enfrentamento das questões que envolvem uma sociedade pluralista, desigual, injusta e que se constitui a partir de um confronto permanente entre diferentes visões (interdisciplinares).
2.1 TRIBUTO CONCEITO
No ordenamento jurídico brasileiro, a conceituação de tributo é trazida pelo Código Tributário Nacional, o qual, em seu artigo 3º, o qual estabelece que tributo é “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou em cujo valor se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”6
Enquanto tributo se apresenta como gênero, o imposto nada mais é que uma espécie. Dentre as espécies os tributos existentes encontram-se os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, o empréstimo compulsório e as contribuições sociais
2.2 FUNDO PÚBLICO E ORÇAMENTO PÚBLICO – A IMPORTÂNCIA PARA GARANTIR DIREITOS
No atual modelo neoliberal capitalista, o orçamento público visa resguardar o planejamento de cada ente federativo, com relação ao financiamento das políticas sociais e assim garantir a implementação dos direitos humanos.
Para o autor Evilásio Salvador, doutor em política social7
No capitalismo contemporâneo, o fundo público exerce uma função ativa nas políticas macroeconômicas sendo essencial tanto na esfera da acumulação produtiva quanto no âmbito das políticas sociais. O Fundo público tem papel relevante para a manutenção do capitalismo na esfera econômica e na garantia do contrato social. O alargamento das políticas sociais garante a expansão do mercado de consumo. Ao mesmo tempo que os recursos públicos são financiadores de políticas anticíclicas nos períodos de refração da atividade econômica. (…) o fundo público envolve toda a capacidade de mobilização de recursos que o estado tem para intervir na economia, seja por meio das empresas públicas, pelo uso das suas políticas monetária e fiscal, assim como pelo orçamento público.
Desta forma, por meio da extração de recursos da sociedade na forma de tributos – impostos, taxas e contribuições de melhoria – se faz a concretude do fundo público.
2.2 TRIBUTOS MUNICIPAIS E ARRECADAÇÃO DECORRENTE DE REPARTIÇÃO DE RECEITAS TRIBUTÁRIAS
Por força do art. 30 e art. 182, ambos da Constituição Federal, o Município é o ente federativo responsável pela política de desenvolvimento urbano, devendo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o bem-estar dos seus habitantes
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes.
Conforme artigo 30 da Carta Magna, os Municípios têm por competência a arrecadação de tributos bem como a aplicação de suas rendas, vejamos
Art. 30. Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; (Vide ADPF 672)
III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas,
sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;
DOS IMPOSTOS DOS MUNICÍPIOS
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
I – propriedade predial e territorial urbana;
II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.
Os Municípios também arrecadam mediante repartição de receitas tributárias entre os entes federativos, vejamos
Art. 158. Pertencem aos Municípios:
I – o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem;
II – cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) (Regulamento)
III – cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios;
IV – vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios:
I – 65% (sessenta e cinco por cento), no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020)
II – até 35% (trinta e cinco por cento), de acordo com o que dispuser lei estadual, observada, obrigatoriamente, a distribuição de, no mínimo, 10 (dez) pontos percentuais com base em indicadores de melhoria nos resultados de aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico dos educandos. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020)
Art. 159. A União entregará:
I – do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, 50% (cinquenta por cento), da seguinte forma: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 112, de 2021)
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios;
§ 3º Os Estados entregarão aos respectivos Municípios vinte e cinco por cento dos recursos que receberem nos termos do inciso II, observados os critérios estabelecidos no art. 158, parágrafo único, I e II.
§ 4º Do montante de recursos de que trata o inciso III que cabe a cada Estado, vinte e cinco por cento serão destinados aos seus Municípios, na forma da lei a que se refere o mencionado inciso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo pretendeu, de maneira sucinta, analisar a necessidade da tributação para a existência e manutenção dos direitos humanos.
Verificou-se que, por meio da extração de recursos da sociedade na forma de tributos – impostos, taxas e contribuições de melhoria – se faz a concretude do fundo público.
2 Herrera Flores, Joaquín. A reinvenção dos direitos humanos. / Joaquín Herrera Flores; tradução de: Carlos Roberto Diogo Garcia; Antônio Henrique Graciano Suxberger; Jefferson Aparecido Dias. – Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009. 232 f.: il. ; 30 cm – p. 1633 Herrera Flores, Joaquín. A reinvenção dos direitos humanos. / Joaquín Herrera Flores; tradução de: Carlos Roberto Diogo Garcia; Antônio Henrique Graciano Suxberger; Jefferson Aparecido Dias. – Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009. 232 f.: il. ; 30 cm – p.113
4 UNITED NATIONS. What are human rights? Disponível em http://www.ohchr.org/EN/Issues/Pages/WhatareHumanRights.aspx.
5 RIBEIRO, Maria de Fátima; NUNES, Geilson; ALMEIDA, Patrícia Silva. O desenvolvimento dos direitos fundamentais através da tributação: políticas públicas como fomento do bem-estar social. Belo Horizonte: Meritum, v. 13, n. 1, p. 138, jan-jun/2018
6 BRASIL, Código Tributário Nacional. Lei nº.5.172, de 25.10.1966.
7 SALVADOR Evilasio (et al.), Financeirização, fundo público e política social. São Paulo Cortez, 2012. P. 124-126.
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SEGUNDO, Hugo De Brito Machado. Código tributário nacional: anotações à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementares 87/1996 e 116/2003. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2017. 557 p.
1Especialista em Direito Público pela Escola da Magistratura do Estado do Paraná e UNIASSELVI, analista judiciário do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
2Herrera Flores, Joaquín. A reinvenção dos direitos humanos. / Joaquín Herrera Flores; tradução de: Carlos Roberto Diogo Garcia; Antônio Henrique Graciano Suxberger; Jefferson Aparecido Dias. – Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009. 232 f.: il. ; 30 cm – p. 163
3Herrera Flores, Joaquín. A reinvenção dos direitos humanos. / Joaquín Herrera Flores; tradução de: Carlos Roberto Diogo Garcia; Antônio Henrique Graciano Suxberger; Jefferson Aparecido Dias. – Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009. 232 f.: il. ; 30 cm – p.113
4UNITED NATIONS. What are human rights? Disponível em http://www.ohchr.org/EN/Issues/Pages/WhatareHumanRights.aspx.
5RIBEIRO, Maria de Fátima; NUNES, Geilson; ALMEIDA, Patrícia Silva. O desenvolvimento dos direitos fundamentais através da tributação: políticas públicas como fomento do bem-estar social. Belo Horizonte: Meritum, v. 13, n. 1, p. 138, jan-jun/2018
6BRASIL, Código Tributário Nacional. Lei nº.5.172, de 25.10.1966.
7SALVADOR Evilasio (et al.), Financeirização, fundo público e política social. São Paulo Cortez, 2012. P. 124-126.