A SEGURIDADE SOCIAL E SUAS FACETAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11177203


Rafael Lima Bicalho1


RESUMO

O trabalho proposto versa sobre seguridade social, trazendo uma breve síntese acerca de seu contexto histórico. Na sequência abarca todas suas dimensões (direito à saúde, previdência social e assistência social), apontando postulados regentes previstos na Constituição Federal. Ao final, foi inserida a conclusão ressaltando a importância do instituto, relevante para superação de riscos sociais, violação de direitos e redução de desigualdade social, notadamente em um país desigual como o Estado brasileiro.

Palavras chaves: Seguridade Social. Previdência Social. Saúde. Assistência Social.  

ABSTRACT

The proposed article consists of Social Security, offering a brief summary of its historical context. It then covers all its dimensions (right to Health, Social Welfare and Social Assistance), pointing out regent postulates laid down in the Federal Constitution. At the end, a conclusion was inserted highlighting the importance of the institute, relevant for overcoming social risks, violation of rights and reduction of social inequality, notably in an unequal country like the Brazilian State.

Keywords: Social Security. Social Welfare. Health. Social Assistance.

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SEGURIDADE SOCIAL

O estudo da história da seguridade social, devido a sua importância e divergência, há de ser esquadrinhado de duas maneiras – uma englobando o surgimento do seguro social em um prisma de maior amplitude, verificando os aspectos históricos ocorridos pelo mundo – e outra, sob um prisma mais restrito, observando os antecedentes históricos ocorridos no Brasil.

Há uma certa dissonância entre os doutrinadores acerca do nascedouro da proteção social, onde uma parte delimita que os primeiros sinais ocorreram na Roma Antiga, com a instituição de “aposentadorias” aos veteranos de guerra, que, como forma de reconhecimento pelo trabalho prestado, ganhavam, após certa idade, um pedaço de terra para o cultivo e uma quantia em dinheiro para a mantença desta terra. Todavia, outra parcela dos doutrinadores afirma que os primeiros traços de proteção social se deram na Inglaterra, em 1601, com a Poor Relief Act (lei de amparo aos pobres), que estipulou uma contribuição obrigatória para fins sociais.

Ambas as correntes merecem reconhecimento, pois, de fato, os primeiros traços de proteção social ocorreram na Roma Antiga, porém, diante da ausência de elementos materiais, não se pode afirmar que o berço da Seguridade Social tenha nascido naquele momento. Dessa opinião compartilham Marcus Orione Gonçalves Correia e Erica Paula Barcha Correia, aduzindo que “assim, embora se possa vislumbrar algumas disposições concernentes à proteção social na Antiguidade – especialmente em Roma – não se deve entender que um sistema de seguridade social tenha emergido naquele momento histórico”. (2007, p. 2)

Fato é que o primeiro ato de assistência social, contido de materialidade e com características atinentes à seguridade social moderna, foi a Lei dos Pobres, em 1601, na Inglaterra, lei esta que tinha como destinatários as crianças pobres, os desempregados, os idosos e os inválidos. Por esta lei, foi instituída uma contribuição obrigatória da sociedade com fim social, que era arrecadada pelo Estado. Tem-se então, nesse momento, o marco inicial do seguro social.

Delimitado o berço da proteção social, grande foi o avanço em nível mundial, com uma participação fundamental de Otto von Bismarck, na Alemanha, a partir de 1883, quando introduziu sistemas até hoje utilizados, como a filiação compulsória e o caráter contributivo, no plano da previdência. Nos anos de 1883, 1884 e 1889, Bismarck criou, respectivamente, o seguro-doença (custeado pelos empregados, empregadores e Estado), seguro contra acidentes de trabalho (custeado pelos empregados) e o seguro de invalidez e velhice (custeado pelos trabalhadores, empregadores e Estado). Nesse sentido ensina Martins:

“Na Alemanha, Otto von Bismarck introduziu uma série de seguros sociais, de modo a atenuar a tensão existente nas classes trabalhadoras: em 1883, foi instituído o seguro-doença, custeado por contribuições dos empregados, empregadores e do Estado; em 1884, decretou-se o seguro contra acidentes do trabalho com custeio dos empresários, e em 1889 criou-se o seguro de invalidez e velhice, custeado pelos trabalhadores, pelos empregadores e pelo Estado” (2007, p. 4)

Segundo Ibrahim, e ratificando o exposto acima, o trabalho desenvolvido por Bismarck:

“Foi a gênese da proteção garantida pelo Estado, funcionando este como arrecadador de contribuições exigidas compulsoriamente dos participantes do sistema securitário. Aí temos as duas grandes características dos regimes previdenciários modernos: contributividade e compulsoriedade de filiação”. (2009, p. 46)

Temos também relatos na França, em 1898, quando se criou assistência à velhice e aos acidentes de trabalho.

Novamente na Inglaterra, temos a criação de vários institutos de proteção. Em 1897, o Worksman`s Compensation Act, instituiu o seguro obrigatório contra acidentes de trabalho. Em 1908, o Old Age Pensions, concedia pensões aos maiores de 70 (setenta) anos de idade, independentemente de contribuição. E, finalmente, em 1911, foi criado o National Insurance Act, sistema de proteção social de caráter contributivo compulsório, que possuía um custeio tríplice, através dos empregados, empregadores e do Estado.

Já, no seio constitucional, a primeira constituição a incluir o seguro social foi a do México, em 1917 

Outro importante acontecimento ocorreu em 1919, com a criação da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que visa promover, atuando em todos os países, a justiça social.

Nos Estados Unidos, em 1935, foi criado o Social Security Act, que assegurava os idosos, bem como instituiu o auxílio-desemprego. Na rubrica de Ibrahim “o Social Security Act, conhecido como a primeira citação feita à seguridade social em âmbito mundial, demonstra a crescente preocupação com os excluídos dos regimes previdenciários, defendendo a proteção de toda a população”. (2009a, p. 47)

Chegando às bases da seguridade social como conhecemos hoje, de suma importância foi a presença do Plano Beveridge, conduzido por Lord Beveridge em 1942, este propunha um programa de prosperidade política e social, garantindo ingressos suficientes para que o indivíduo ficasse acobertado por certas contingências sociais (Martins, 2007). A ideia de Beveridge era que a seguridade social deveria amparar o cidadão do berço ao túmulo, adotando assim, a ideia completa de seguridade social.

Acerca do tema assevera Ibrahim: 

“Ponto mais importante deste período da evolução securitária, é o famoso relatório Beveridge (Inglaterra, 1942). Este documento, que dá lugar ao plano de mesmo nome, foi responsável pela origem da Seguridade Social, ou seja, a responsabilidade estatal não só do seguro social, mas também de ações na área de saúde e assistência social”. (2009b, p. 47)

Em 1948, findando o ciclo em níveis mundiais de proteção social, nasce a Declaração Universal dos Direitos Humanos, tratando em seus arts. 22, 25 e 28 o direito à segurança social.

Alguns doutrinadores subdividem esta evolução do seguro social em três fases: fase inicial; fase intermediária e fase contemporânea.

A fase inicial perdurou até 1918, e corresponde à criação dos primeiros regimes previdenciários. 

Já a fase intermediária apraz-se de 1919 a 1945, onde se evidencia a expansão do seguro social pelo mundo. 

E a fase contemporânea deu-se a partir de 1946, regendo-se até hoje com o amparo universal das prestações sociais, prevendo a proteção de toda contingência social.

No âmbito nacional, há registros de que as primeiras manifestações de caráter assecuratório se deram nos séculos XV e XVIII, através das Santas Casas de Misericórdia e Montepios1, todas revestidas de estruturas mutualistas, porém o que podemos considerar com firmeza, apesar de várias manifestações anteriores, é que o grande marco da previdência social brasileira se deu em 1923, com a edição da Lei Eloy Chaves, Decreto n°. 4.682, de 24-01-1923, que fundava a Caixa de Aposentadoria e Pensões para os ferroviários. Mais tarde se estenderia aos portuários e marítimos (Lei 5.109/26) e ao pessoal das empresas telegráficas e radiotelegráficas (Lei 5.485/28).

A Lei Eloy Chaves (Decreto n. 4.682, de 24-1-1923) foi a primeira norma a instituir no Brasil a previdência social, com a criação de Caixas de Aposentadorias e Pensões para os ferroviários, de nível nacional.Tal fato ocorreu em razão das manifestações gerais dos trabalhadores da época e da necessidade de apaziguar um setor estratégico e importante de mão-de-obra daquele tempo. Previa os benefícios de aposentadoria por invalidez, ordinária (equivalente à aposentadoria por tempo de serviço), pensão por morte e assistência médica. (MARTINS, 2007, p. 7).

A partir de 1930, início da era Vargas e ano da criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, houve uma reestruturação no sistema de regimes previdenciários no Brasil, deixando de ser delimitado por empresas e passando a ser por categorias profissionais. Surge aí a figura do IAP (Instituto de Aposentadoria e Pensão), que substituiu as Caixas, contendo um sistema tríplice de contribuição, com a presença do empregado, do empregador e do governo, e sendo revestido de caráter autárquico e subordinação consolidada; conforme ensina Ibrahim (2009), a unificação das caixas em institutos também ampliou a intervenção estatal na área, pois o controle público ficou finalmente consolidado, já que os institutos eram dotados de natureza autárquica e subordinados diretamente à União, em especial ao Ministério do Trabalho.

O primeiro IAP criado foi em 1933, IAPM – Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Marítimos, daí em diante muitos outros foram criados, tendo sido alguns extintos ou fundidos. “Esse processo de unificação e criação dos Institutos avançou até o início dos anos 50, quando praticamente toda a população se encontrava coberta pela previdência, exceto os trabalhadores domésticos e autônomos”. (TAVARES, 2003, p. 32).

Posteriormente, ante a necessidade de um provimento norteador que subordina os Institutos, foi criada a LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social, Lei n°. 3.807, de 26-8-1960, que unificou toda a legislação securitária. A partir dela, todos os Institutos passaram a ser regrados pelas mesmas normas. Apesar de os Institutos estarem regidos pela mesma norma, ainda eram distintos um dos outros, de sorte que a unificação só veio a ocorrer em 1966, com a edição do Decreto Lei n°. 72, o qual criou o INPS – Instituto Nacional da Previdência Social. À época da unificação, tínhamos o IAPM, IAPB, IAPC, IAPI, IAPETC, IAPFESP. “Em abstrato, a unificação fez-se necessária, pois não era razoável a manutenção de variadas instituições estatais, exercendo exatamente a mesma função, diferenciando-se somente pela clientela protegida”. (IBRAHIM, 2009, p. 60).

No tocante ao trabalhador rural, Fábio Zambitte Ibrahim ensina que:

A proteção social na área rural começou com a instituição do Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural – FUNRURAL, instituído pela Lei n°. 4.214, de 02/03/1963. (…)
(…) A Lei Complementar n°. 11, de 25/05/1971, instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), de natureza assistencial, cujo principal benefício era a aposentadoria por velhice, após 65 (sessenta e cinco anos) anos de idade, equivalente a 50% do salário mínimo de maior valor no País (2009, p.61).

Em 1976, a LOPS era ainda a legislação previdenciária vigente, contudo, em 24 de janeiro do mesmo ano, por meio do decreto n°. 77.077, foi criada a CLPS – Consolidação das Leis da Previdência. Ressalte-se que havendo divergência entre uma e outra norma, prevalecia a rubrica da LOPS. 

Pela Lei n°. 6.439/77, tivemos a criação do SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social – que visava agregar todas as entidades ligadas ao Ministério da Previdência e Assistência Social. Era composto pelo agrupamento do: a) INPS – Instituto Nacional de Previdência Social; b) INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social; c) LBA – Fundação Legião Brasileira de Assistência; d) FUNABEM – Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor; e) DATAPREV – Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social; f) IAPAS – Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social e; g) CEME – Central de Medicamentos.

O SINPAS, o qual era submetido ao MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social, tinha a finalidade de integrar a concessão e manutenção de benefícios, a prestação de serviços, o custeio de atividades e programas e a gestão administrativa, financeira e patrimonial de seus componentes. (IBRAHIM, 2009).

Foi a partir da Constituição de 1988 que se implantou o sistema do seguro social do modo em que o conhecemos hoje, abrangendo a saúde, previdência e assistência social.

O SINPAS foi extinto em 1990, com a criação do INSS, devido à fusão do INPS com o IAPAS. Hodiernamente, as leis que ditam as diretrizes da Seguridade Social são as Leis 8.212/91, que versa sobre o custeio, Lei 8.213/91, referente aos benefícios, regulamentadas pelo decreto 3.048/99. A Lei 8.080/90 trata da saúde e a Lei 8.742/93 instituiu a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS.

No Brasil, a evolução da proteção social também pode ser dividida em períodos, de sorte que temos o período da implantação, que perdurou da Lei Eloy Chaves até o decreto de 1931, o qual cobria riscos de invalidez, velhice, morte e também concedia aposentadoria ordinária. 

Temos também o período de expansão, com a proliferação do IAPs até a criação da LOPS. 

O período de reestruturação começa com a criação do SINPAS em 1977 e vai até a Constituição de 1988. 

Por último temos o período da seguridade social, que se iniciou com a promulgação da nossa Carta Constitucional de 1988 e é celebrado até hoje.

1.1 A SEGURIDADE SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO DE 1988

O direito da Seguridade Social é objetivamente um direito social, desta sorte tem seus dispositivos rubricados na nossa Carta Maior, em seu título “Da Ordem Social”, arraigados do art. 194 ao art. 204, existindo ainda alguns dispositivos apartados, conforme preleciona Martins: 

“A Constituição de 1988 tratou do Direito da Seguridade Social em todo um capítulo (…). Existem, ainda, alguns dispositivos esparsos no art. 7°, que versa sobre direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, como: seguro-desemprego (inciso II); 13° salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria (inciso VIII); salário-família (inciso XII); licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120 dias (inciso XVIII); aposentadoria (inciso XXIV); assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até cinco anos de idade em creches e pré-escolas (inciso XXV); e seguro contra acidentes do trabalho, a cargo do empregador (inciso XXVIII)”.(2007, p. 28)

No seio da Constituição Federal destaca-se também a chamada Reforma Previdenciária, introduzida pela EC (Emenda Constitucional) n°. 20/98, que alterou o sistema da previdência social, prescreveu normas de transição, estabelecendo regras de aposentação para os servidores públicos, dentre outras providências.

Társis Nametala Sarlo Jorge assevera que: 

“O regime de previdência dos servidores, que nasce como mera extensão do regime de pessoal do Estado, assim prevalece ainda na Carta de 1988. No entanto, este sistema já se mostrava ineficiente àquela ocasião, tornando-se mais e mais insustentável. Por isso que irrompe em nosso ordenamento jurídico a EC 20/98”. (2006, p. 390)

Posteriormente a esta emenda, no que tange à seguridade social, tivemos ainda o implemento das Emendas Constitucionais n°. 41/03 e 47/05.

Todas referem-se intimamente à previdência social, não se olvidando que a seguridade social é composta por saúde, assistência social e previdência social, formando então o chamado tripé da seguridade social.

1.1.1 Saúde

A saúde é direito de todos e dever do Estado. Com essa afirmativa inicia-se o art. 196, da CF, relativo à Saúde, de onde emana uma figura mútuo-assistencialista entre os cidadãos e o Estado.

Este artigo estabelece que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” (BRASIL, 1988).

Marcus Orione Gonçalves Correia e Erica Paula Barcha Correia definem saúde “a partir da ótica de uma política destinada à prevenção e ao tratamento dos males que afligem o corpo e a mente humanos. (2007, p. 40).

A Organização Mundial da Saúde – OMS, define saúde como o estado de completo bem-estar físico, social e mental e não simplesmente a ausência de dores ou enfermidades.

A partir deste conceito, vale destacar os ensinamentos de Horvath:

A saúde como objetivo da Seguridade Social representa um conceito mais amplo do que simplesmente a atividade da saúde reparadora. O direito à saúde tem uma dupla dimensão coletiva e individual. A dimensão coletiva passa pelo estabelecimento de marcos mínimos de defesa e fiscalização da saúde pública (…). A dimensão individual acabará com o enfoque preventivo e reparador (2005, p. 89).

E ainda, quanto à figura de dever do Estado, objetiva a redução do risco de doenças, bem como a facilitação do acesso aos serviços de recuperação da higidez física e mental. (HORVATH, 2005).

1.1.2 Assistência Social

O art. 203 da CF estabelece a Assistência Social e seus objetivos. In verbis:

“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.” (BRASIL, 1988)

A assistência social tem por base assegurar o mínimo de condição social, salutar à sobrevivência dos cidadãos. Visa cobrir a hipossuficiência financeira dos que não têm condições de prover, por seus próprios meios, a sua subsistência.

“É política social destinada a prestar, gratuitamente, proteção à família, à maternidade, infância, adolescência, velhice e aos deficientes físicos.” (TAVARES, 2003, p. 10). 

Ainda nessa linha, assevera Horvath que:

“a assistência social é direito do cidadão e dever do Estado, é política de seguridade social não contributiva que provê os mínimos sociais. É realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas”.(2005, p. 94)

A Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS é que determina as diretrizes da assistência social. Dela, extraem-se as prestações oferecidas aos cidadãos, desmembradas em benefícios e serviços, sendo estes de caráter não-pecuniário e aqueles de caráter pecuniário.

1.1.3 Previdência Social

Por derradeiro, e complementando o tripé da seguridade social, a previdência social é de caráter oneroso e de filiação obrigatória, sendo contemplada precipuamente pela CF em seus arts. 201 e 202, e pela Lei 8.213/91, regulamentada pelo decreto 3.048/99.

As diretrizes estabelecidas por essas normas preceituam que:

Art. 201 – CF – A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: 
I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; 
II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; 
III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; 
IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; 
V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.(BRASIL, 1988) 

Já o art. 1° da Lei 8.213/91 dispõe que:

Art. 1º A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente. (BRASIL, 1991)

Conforme se observa, o art. 1° da Lei de Benefícios (LBPS) delimita as contingências abrangidas pela previdência social (observados os critérios de filiação e contribuição), garantindo aos seus beneficiários os meios necessários de manutenção decorrente de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.

“Trata-se de um seguro compulsório, do qual participam, obrigatoriamente, o Estado, os tomadores de serviço e os prestadores de serviço”. (JORGE, 2006, p. 14).

Distingue-se da assistência social no tocante à contribuição, visto que, aqui, o caráter contributivo se revela pressuposto essencial ao enquadramento junto à previdência social, e lá, a prestação dos serviços e benefícios independe de contribuição.

Segundo Ibrahim (2009), no nosso ordenamento jurídico, deparamos com dois regimes básicos de previdência – o regime geral de previdência social (RGPS) – e o regime próprio de previdência social (RPPS) – além de dois regimes complementares, podendo ser privado, aberto ou fechado no RGPS e público fechado no RPPS. No cerne deste trabalho discorreremos sobre o RGPS.

1.2 PRINCÍPIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

Para atingir a finalidade essencial de cobertura de riscos sociais, a previdência social se organiza e rege-se com base em uma série de princípios, que são basicamente os mesmos da Seguridade Social, já explanados anteriormente. A saber, os princípios da previdência social estão expostos no Art. 2° da Lei 8.213/91. In verbis:

Art. 2º A Previdência Social rege-se pelos seguintes princípios e objetivos:
I – universalidade de participação nos planos previdenciários;
II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios;
IV – cálculo dos benefícios considerando-se os salários-de-contribuição corrigidos monetariamente;
V – irredutibilidade do valor dos benefícios de forma a preservar-lhes o poder aquisitivo;
VI – valor da renda mensal dos benefícios substitutos do salário-de-contribuição ou do rendimento do trabalho do segurado não inferior ao do salário mínimo;
VII – previdência complementar facultativa, custeada por contribuição adicional;
VIII – caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação do governo e da comunidade, em especial de trabalhadores em atividade, empregadores e aposentados.(BRASIL, 1991)

CONCLUSÃO 

Verifica-se uma evolução significativa na proteção dos riscos sociais a partir do conceito empregado pela Constituição de 1988, chamada, não à toa, de “Constituição Cidadã”, que dá, ainda que não de forma ampla, uma garantia de subsistência e uma breve sensação de conforto aos cidadãos.

É cediço que o Brasil vem passando por uma nebulosa inquietude social, com a população erguendo olhares desconfiados e retraídos para os direitos sociais: educação, saúde, trabalho, moradia, previdência social, etc.

Conforme pudemos observar ao longo de toda a explanação, o pressuposto essencial por trás de todas as regras que movem a Seguridade Social, é sem dúvida o princípio constitucional consagrado da dignidade da pessoa humana, que se revela, insurge em meio ao sistema protetivo, através da garantia de cobertura das contingências sociais de velhice, doença, idade, etc.

E destes riscos, o que mais assola a população é, indubitavelmente, o da doença. 

Cumpre destacar o caráter solidário adotado pela Previdência Social, de modo que, a partir de contribuições obrigatórias, como não poderia ser diferente, mantém-se um sistema equilibrado de distribuição de renda, garantindo a todos, a partir deste caráter solidário, uma igualdade de participação.


1Montepio:Instituição em que, mediante uma cota, e satisfeitas outras condições, cada membro adquire o direito de, por morte, deixar pensão pagável a alguém de sua escolha.

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