A NOVA ROTULAGEM NUTRICIONAL E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS DO CONSUMIDOR: DESAFIOS E IMPLICAÇÕES PARA ALIMENTOS QUE NÃO SE ADEQUAM À LEGISLAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202410161625


Felipe Augusto Sena Silva1
Francisco Jose de Oliveira Neto²
Hugo Francisco dos Santos³
Tâmisa Caroline Santos Melo ⁴
Nairana Santos Vieira ⁵


RESUMO

Este artigo analisa as novas regras de rotulagem nutricional no Brasil, estabelecidas pela Resolução RDC nº 429/2020 e Instrução Normativa nº 75, e suas implicações para a proteção dos direitos do consumidor. A rotulagem frontal, com o uso da lupa para indicar altos teores de nutrientes críticos como açúcar, sódio e gorduras saturadas, é uma inovação importante que visa facilitar escolhas alimentares mais conscientes. No entanto, a implementação dessas regras impõe desafios para a indústria alimentícia, especialmente para pequenas empresas que enfrentam dificuldades para adequação. Além disso, apesar de representar um avanço na defesa do consumidor, a legislação brasileira apresenta critérios menos rígidos em comparação com normas internacionais, o que pode limitar seu impacto na saúde pública. O artigo conclui que, embora as novas regras contribuam para a transparência e proteção do consumidor, ajustes ainda são necessários para maximizar sua eficácia.

Palavras-chave:  Conformidade regulatória; Indústria alimentícia; Nutrientes críticos; Proteção ao consumidor; Rotulagem nutricional; Saúde pública.

ABSTRACT 

In this paper, the recent Brazilian nutritional labeling laws introduced by Resolution RDC No. 429/2020 and Normative Instruction No. 75 as well as its relevance for consumer protection were investigated The front-of-pack labelling, based on a magnifying glass symbol that highlights products with high content of critical nutrients as sugar, sodium and saturated fats, is an innovation to achieve more informed food choices. But applying those rules has proven to be burdensome for the food industry, and especially so for small businesses. However, Brazilian legislation has slightly lower requirements compared to international standards and may thus be less effective in protecting public health. In conclusion, the paper finds that although the new rules improve transparency and customer protection, additional modifications are required to make them more efficient.

Keywords: Nutritional labeling; consumer protection; food industry; public health; regulatory compliance.

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, o Brasil tem intensificado seus esforços para garantir uma maior transparência nas informações fornecidas ao consumidor, especialmente no que tange aos rótulos de alimentos. A implementação das novas regras de rotulagem nutricional, estabelecidas pela Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) n.º 429/2020 e pela Instrução Normativa (IN) n.º 75, visa fornecer informações mais claras e acessíveis, permitindo ao consumidor tomar decisões alimentares mais informadas e conscientes. Este artigo analisa o impacto dessa legislação no direito do consumidor e discute os desafios enfrentados pelos fabricantes, especialmente os que ainda não se adequaram às novas normas.

A rotulagem nutricional tem sido alvo de intenso debate no país, devido à crescente conscientização sobre a relação entre hábitos alimentares e doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, hipertensão e diabetes. Diante desse cenário, as novas normas de rotulagem frontal surgem como uma resposta a uma demanda da sociedade por mais clareza nas informações nutricionais. Produtos que contenham altos níveis de açúcares adicionados, sódio e gorduras saturadas devem exibir, de forma destacada, o símbolo de uma lupa na parte frontal das embalagens, alertando os consumidores sobre esses ingredientes críticos​ (Serviços e Informações do Brasil)​ .

Essas mudanças visam, principalmente, facilitar a compreensão dos rótulos pelos consumidores, especialmente aqueles com baixo nível de letramento nutricional. No entanto, a rotulagem frontal não é uma novidade exclusiva do Brasil. Modelos similares já foram adotados em países da América Latina, como Chile, México e Uruguai, onde se observou uma redução na compra de alimentos ultraprocessados após a implementação da rotulagem frontal ​(Instituto IDEC). Isso evidencia o potencial impacto dessa política na melhoria da saúde pública, ainda que seu sucesso dependa também de outras medidas complementares, como campanhas educativas e restrições à publicidade de alimentos não saudáveis.

Embora as mudanças tenham o objetivo de proteger o consumidor, o governo brasileiro também enfrenta perdas consideráveis devido à baixa taxa de conformidade das empresas com a nova regulamentação. Assim, ao não se adaptarem, às indústrias de alimentos estão prolongando a venda de produtos sem a rotulagem adequada, o que resulta em um impacto direto sobre os consumidores, que continuam sem acesso às informações completas, podendo estar prejudicando sua saúde de forma inconsciente. Dessarte, a falta de conformidade retarda os potenciais benefícios para a saúde pública, como a redução das doenças relacionadas ao consumo excessivo de nutrientes prejudiciais à saúde, como por exemplo o açúcar adicionado, gordura saturada e sódio. 

Consequentemente, para muitas empresas, os altos custos envolvidos na reformulação de rótulos e na alteração das embalagens, especialmente para aquelas que comercializam uma ampla gama de produtos, são os principais obstáculos para a adequação, gerando enorme resistência à mudança. 

A nova norma traz benefícios para os consumidores, mas também traz desafios significativos para os fabricantes de alimentos. Além das empresas que vendem muitos produtos diversificados, as pequenas empresas, em particular, enfrentam dificuldades em adaptar seus processos de produção e rótulos dentro dos prazos estabelecidos, tendo em vista que possuem margens de lucro mais apertadas e menos recursos para investir em novos processos​ de produção e rotulagem.

 As sanções por descumprimento das normas incluem desde multas até a suspensão da comercialização dos produtos, o que pode representar um risco para a sobrevivência de pequenos negócios. Diante disso, a adequação à legislação se torna um ponto crucial tanto para a proteção do consumidor quanto para a equiparação do no mercado.

2 MÉTODO

Este estudo se baseia em uma revisão bibliográfica sobre as novas regras de rotulagem nutricional no Brasil, com foco nas implicações para os consumidores e para as empresas. Assim, foram analisadas fontes como artigos acadêmicos, notícias, relatórios governamentais e dados de organizações não governamentais, além de consultas a legislações atuais e pertinentes, como por exemplo o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e as regulamentações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 MUDANÇAS NA ROTULAGEM NUTRICIONAL

A nova legislação traz inovações significativas, especialmente com a introdução da rotulagem frontal. Esse tipo de rotulagem é caracterizado pela inclusão de uma lupa no painel frontal dos produtos alimentícios, destacando a presença de níveis elevados de açúcares adicionados, sódio e gordura saturada (Serviços e Informações do Brasil) ​( ). Diante disso, a inclusão dessa lupa visa facilitar a compreensão dos consumidores quanto à qualidade nutricional dos alimentos, já que o consumo excessivo desses nutrientes está relacionado ao aumento de doenças crônicas, como diabetes e hipertensão.

Contudo, apesar de não muito difundido e comentado a legislação também estabelece que a tabela nutricional tradicional deve ser reformulada, com informações mais detalhadas sobre os nutrientes presentes nos alimentos, como a quantidade de açúcares totais, gorduras trans e a exigência de apresentar os valores nutricionais tanto por porção quanto por 100g/100 ml. Pode-se inferir que essa mudança é especialmente relevante para permitir comparações mais precisas entre produtos diferentes​ e suas qualidades e composições  .

3.2 DESAFIOS PARA A INDÚSTRIA DE ALIMENTOS

Apesar das inovações, a adaptação às novas regras representa um desafio considerável para a indústria alimentícia, especialmente para micro e pequenos empreendedores. Empresas menores enfrentam dificuldades técnicas e financeiras para reformular seus rótulos dentro do prazo estabelecido, que varia de 12 a 36 meses, dependendo do tipo de produto e do tamanho da empresa​ (Serviços e Informações do Brasil).

Além disso, os produtos que não se adequarem às novas normas estarão sujeitos a sanções, como multas e até a suspensão de suas vendas. (Diário de Pernambuco). Essa situação gera incertezas, pois muitas empresas ainda não se encontram totalmente preparadas para cumprir as exigências, o que pode gerar implicações negativas tanto para a sua continuidade no mercado quanto para os consumidores que dependem desses produtos.

3.3. ALIMENTOS ULTRAPROCESSADOS E O IMPACTO DA NOVA ROTULAGEM

Alimentos ultraprocessados são aqueles que passam por diversos processos industriais e contêm ingredientes que normalmente não são utilizados em preparações caseiras, como aditivos, conservantes, emulsificantes e corantes. Eles geralmente têm altos teores de açúcares, sódio e gorduras, que estão justamente no foco da nova rotulagem nutricional. Esses produtos são conhecidos por sua baixa qualidade nutricional e estão associados ao aumento de doenças crônicas, como obesidade, diabetes e hipertensão​ (Instituto IDEC, 2019).

No contexto da nova legislação, a rotulagem frontal busca alertar os consumidores sobre esses nutrientes críticos presentes em muitos alimentos ultraprocessados, facilitando a identificação de produtos que devem ser consumidos com moderação. No Brasil, produtos que ultrapassam os limites de açúcar, sódio e gordura saturada agora devem exibir o símbolo de uma lupa em seus rótulos, chamando a atenção do consumidor para esses ingredientes.

Entretanto, o grande desafio está no fato de que muitos alimentos ultraprocessados podem não ser devidamente rotulados devido aos critérios menos rígidos adotados pela ANVISA, quando comparados a normas internacionais mais estritas, como as implementadas no Chile, onde o modelo de advertência frontal é mais rigoroso​ (Instituto IDEC, 2019). Portanto, isso significa que, embora a nova rotulagem seja um avanço, muitos produtos ultraprocessados ainda podem escapar do radar do consumidor, comprometendo o objetivo de promover uma alimentação mais saudável.

Conclui-se que os alimentos ultraprocessados, como biscoitos recheados, salgadinhos, refrigerantes e outros produtos industrializados, são amplamente consumidos no Brasil e representam uma parcela significativa da alimentação diária de muitos consumidores. A nova legislação, portanto, tem um papel crucial em alertar a população sobre os riscos associados ao consumo excessivo desses produtos. Contudo, para que a rotulagem cumpra plenamente seu papel, é necessário que os critérios sejam constantemente revisados e atualizados, alinhando-se aos padrões internacionais mais rigorosos.

3.4. PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR E DIREITOS À INFORMAÇÃO

O Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu artigo 6º, estabelece como direito básico do consumidor a informação clara e precisa sobre produtos e serviços, assegurando que todos os cidadãos tenham acesso a dados adequados para a tomada de decisões conscientes. A nova rotulagem nutricional, que inclui a tabela de informações nutricionais detalhada e a rotulagem frontal com a lupa, é um reflexo direto desse princípio, pois oferece ao consumidor uma ferramenta visual simplificada para identificar alimentos com altos teores de açúcares, sódio e gorduras saturadas. Essa medida visa evitar práticas enganosas que poderiam induzir o público ao consumo de produtos potencialmente prejudiciais à saúde sem o devido esclarecimento​ ​(Serviços e Informações do Brasil).

No entanto, apesar desse avanço na transparência e na acessibilidade das informações, as normas brasileiras apresentam certas limitações em comparação com padrões internacionais mais rigorosos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), os parâmetros adotados pela ANVISA não seguem integralmente as recomendações da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que propõe critérios mais estritos para a rotulagem de alimentos ricos em nutrientes prejudiciais​ (Instituto IDEC, 2019). O perfil nutricional adotado pela ANVISA, embora seja um passo positivo, utiliza limites que permitem que alguns produtos com altas quantidades de açúcar ou sódio não sejam rotulados como deveriam. O modelo chileno de rotulagem, por exemplo, utiliza octógonos pretos para advertir sobre a presença de nutrientes críticos, o que se provou mais eficaz em reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados​.

Essa diferença nos critérios pode comprometer a eficácia da rotulagem como ferramenta de saúde pública. Produtos que deveriam receber o alerta da lupa podem escapar dessa advertência, levando os consumidores a crer que determinados alimentos são mais saudáveis do que realmente são. Isso enfraquece o impacto das novas regras na prevenção de doenças crônicas, como obesidade e diabetes, que estão diretamente relacionadas ao consumo excessivo de nutrientes críticos​ (Instituto IDEC, 2019).

Além disso, a ausência de políticas complementares, como a restrição da publicidade de produtos não saudáveis ou a taxação de alimentos ultraprocessados, como feito no Chile, limita o alcance das mudanças propostas. Ressalta-se que no Brasil, a nova legislação foca exclusivamente na melhoria da transparência das informações, sem uma estratégia mais ampla de saúde pública, o que pode diminuir seu potencial de transformação nos hábitos alimentares da população.

Por fim, é fundamental que haja um esforço contínuo por parte das autoridades de saúde para aprimorar os critérios de rotulagem, tornando-os mais alinhados com os padrões internacionais, principalmente em relação as penalidades e suas aplicações. Com isso não só será fortalecida a proteção do consumidor, como também potencializará o impacto da rotulagem nutricional na melhoria da qualidade de vida da população brasileira.

3.5. RESOLUÇÃO RDC Nº 429/2020 E INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 75

A Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº 429/2020 e a Instrução Normativa (IN) nº 75 marcam significativa mudança nas normas de rotulagem nutricional dos alimentos no Brasil, tendo como objetivo promover maior clareza e acessibilidade nas informações sobre os alimentos industrializados. Assim, por terem sido publicadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), essas regulamentações fazem parte de um esforço maior para garantir que os consumidores possam tomar decisões alimentares informadas e conscientes.

A RDC nº 429/2020 introduz uma série de mudanças nos rótulos nutricionais, incluindo a exigência de uma rotulagem frontal. Essa rotulagem, representada por uma lupa, deve indicar a presença de níveis elevados de açúcar adicionado, sódio e gorduras saturadas em produtos alimentícios embalados. O objetivo é alertar os consumidores de maneira visual e direta, permitindo que eles identifiquem rapidamente alimentos que podem ser prejudiciais se consumidos em excesso​ (Serviços e Informações do Brasil)​.

Além disso, a tabela de informação nutricional tradicional também passou por mudanças substanciais. Agora, é obrigatória a inclusão de informações sobre açúcares totais e adicionados, além de ser necessário apresentar os valores nutricionais tanto por porção quanto por 100 g/ml, facilitando comparações entre diferentes produtos. Essa padronização visa evitar práticas que possam confundir o consumidor, como o uso de unidades de medida incomuns ou porções muito pequenas para mascarar o verdadeiro impacto nutricional do produto.

A Instrução Normativa nº 75, por sua vez, complementa a RDC nº 429/2020, detalhando os parâmetros técnicos que os fabricantes devem seguir para cumprir a nova legislação. Ela especifica as regras sobre o design das tabelas nutricionais, o contraste de cores entre fundo e texto, o tamanho mínimo da fonte, e até mesmo a localização da tabela no rótulo, garantindo que as informações sejam sempre legíveis e fáceis de encontrar ​(Serviços e Informações do Brasil).

Essas mudanças afetam todos os produtos fabricados no Brasil ou importados, com prazos de adequação diferentes conforme o tamanho das empresas. Para alimentos em geral, o prazo de adequação terminou em outubro de 2023, enquanto pequenas empresas e produtos de microempreendedores individuais (MEIs) têm até outubro de 2024 para se adaptarem. Bebidas em embalagens retornáveis têm um prazo mais estendido, até 2025​ (Serviços e Informações do Brasil).

A implementação dessas normas representa um avanço importante na proteção dos direitos do consumidor, ao assegurar o acesso a informações mais detalhadas e confiáveis. Contudo, como discutido anteriormente, desafios ainda permanecem, especialmente no que se refere à adequação das empresas, que enfrentam custos elevados e dificuldades técnicas para cumprir as exigências dentro dos prazos estabelecidos.

3.5. COMPARAÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE ROTULAGEM NUTRICIONAL COM OUTROS PAÍSES

A nova legislação brasileira de rotulagem nutricional, regulamentada pela Resolução RDC nº 429/2020 e pela Instrução Normativa nº 75, coloca o Brasil no grupo de países que adotam medidas para facilitar o acesso do consumidor a informações claras e precisas sobre os alimentos que consome. No entanto, ao comparar essas normas com a legislação de outros países, especialmente no que diz respeito à rotulagem frontal de advertência, é possível observar diferenças significativas na abordagem, no rigor dos critérios e nos impactos esperados para a saúde pública.

CHILE

O Chile é frequentemente citado como pioneiro na implementação de rotulagem nutricional frontal. Desde 2016, o país utiliza um sistema de octógonos pretos em seus rótulos para alertar sobre altos níveis de açúcares, sódio, gorduras saturadas e calorias. Ao contrário do símbolo de lupa adotado pelo Brasil, o octógono chileno é considerado mais visualmente impactante, o que facilita a identificação de produtos que devem ser consumidos com moderação. Além disso, o Chile combinou sua política de rotulagem com restrições à publicidade infantil e taxas sobre bebidas açucaradas, fortalecendo os efeitos da medida sobre os hábitos alimentares da população​(Instituto IDEC, 2019).

Estudos realizados no Chile indicam que essa abordagem teve sucesso não apenas na conscientização dos consumidores, mas também na reformulação de produtos pela indústria alimentícia, que passou a reduzir os teores de açúcar e sódio para evitar os alertas frontais. Isso demonstra o impacto positivo que políticas rigorosas de rotulagem podem ter na saúde pública, ao estimular escolhas mais saudáveis e a oferta de produtos com menor teor de nutrientes críticos​ (Instituto IDEC, 2019).

MÉXICO

Outro exemplo relevante é o México, que implementou um sistema semelhante ao chileno em 2020. O país optou por octógonos pretos e adotou critérios rígidos para determinar quais produtos devem exibir esses alertas. Assim como o Chile, o México também impôs restrições à publicidade de produtos não saudáveis e à venda de alimentos ultraprocessados em escolas, criando um ambiente regulatório mais abrangente. A combinação de advertências visuais e restrições à comercialização de alimentos para crianças faz parte de uma estratégia de combate à obesidade infantil, uma preocupação crescente no país​ (Instituto IDEC, 2019).

CANADÁ

O Canadá, por sua vez, adota uma abordagem mais moderada. Em vez de octógonos, o Canadá introduziu uma lupa semelhante à brasileira, como parte de sua política de rotulagem nutricional frontal. Desse modo, embora essa medida também busque destacar níveis elevados de açúcares, sódio e gorduras saturadas, a adoção da lupa é considerada uma abordagem menos agressiva visualmente do que o sistema chileno. No entanto, as autoridades canadenses seguem com forte campanha educativa para acompanhar a rotulagem, de modo a garantir que os consumidores compreendam e utilizem as informações nutricionais adequadamente ​(Instituto IDEC, 2019)​ .

ARGENTINA E URUGUAI

Na Argentina e no Uruguai, países que seguiram o exemplo chileno, os governos optaram por octógonos pretos semelhantes aos do Chile, enfatizando uma rotulagem mais rigorosa. O foco está na advertência clara e direta ao consumidor, acompanhada por políticas complementares, como restrições à publicidade de alimentos para crianças. Esses países adotaram critérios baseados nas recomendações da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), que são mais rígidos que os critérios adotados pela ANVISA​.

COMPARAÇÃO COM O BRASIL

Embora o Brasil tenha dado um passo importante com a lupa frontal e as mudanças na tabela nutricional, há críticas sobre a falta de rigor nos critérios de definição dos limites de nutrientes críticos. Em comparação com países como Chile e México, os limites brasileiros são mais flexíveis, permitindo que certos alimentos ultraprocessados não recebam o selo de advertência, o que pode comprometer a eficácia da medida como ferramenta de saúde pública. Além disso, enquanto outros países combinam a rotulagem com políticas mais amplas, como a taxação de produtos não saudáveis e restrições à publicidade infantil, o Brasil foca exclusivamente na melhoria da transparência das informações​.

Nota-se que essa diferença de abordagem sugere que, embora o Brasil tenha avançado na proteção do consumidor, há espaço para tornar a legislação mais abrangente e eficaz. Ajustar os critérios de rotulagem para níveis mais rigorosos, como os recomendados pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), e adotar políticas complementares pode maximizar o impacto da rotulagem na saúde pública, promovendo uma alimentação mais saudável e a redução de doenças crônicas.

Tabela Comparativa de Rotulagem Nutricional Frontal entre Países:

A tabela acima foi elaborada para refletir as diferentes políticas de rotulagem nutricional adotadas em países da América Latina e no Canadá, com base em disposições legais e estudos de rotulagem nutricional. Esses dados foram organizados para destacar como cada país implementa as medidas de notificação para alimentos com altos níveis de nutrientes prejudiciais à saúde.

O primeiro aspecto analisado foi o símbolo de advertência utilizado em cada país. Enquanto o Brasil e o Canadá adotam a lupa frontal, que facilita a identificação de produtos com altos teores de certos nutrientes, países como Chile, México, Argentina e Uruguai usam o octógono preto para sinalizar os produtos que apresentam concentrações excessivas de nutrientes, como açúcar, sódio e gorduras saturadas.

Em relação aos critérios de limite, observou-se que o Brasil e o Canadá adotam padrões moderados, enquanto os outros países impõem limites mais rígidos. Esses limites referem-se às quantidades máximas de nutrientes críticos que podem estar presentes em alimentos antes que a advertência seja exigida no rótulo.

Os nutrientes monitorados também foram comparados. Todos os países focam no controle de açúcar adicionado, sódio e gorduras saturadas. No entanto, países como Chile e México também incluem o monitoramento de calorias, ampliando o escopo das advertências.

A implementação dessas políticas variou ao longo do tempo. O Chile foi um dos pioneiros, implementando essas medidas já em 2016, enquanto países como Brasil e Canadá começaram a implementação em 2022, com prazos para adequação até 2025.

Além da rotulagem, alguns países adotaram políticas complementares, como a restrição de publicidade infantil e taxação de alimentos ultraprocessados, que tornam essas ações mais eficazes na promoção da saúde pública.

Por fim, a tabela também analisa o êxito na reformulação de produtos. Países como Chile e México têm alcançado taxas elevadas de reformulação, com muitas indústrias adaptando seus produtos para se adequarem às novas normas. Já o Brasil e o Canadá apresentam taxas moderadas de reformulação até o momento.

As informações foram extraídas de resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) no Brasil​(Anvisa)​(Serviços e Informações do Brasil), relatórios da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)​(PAHO)​(BVS Public Health), e estudos sobre o impacto dessas políticas em outros países​(BVS Public Health).

4.CONCLUSÃO

A implementação das novas regras de rotulagem nutricional no Brasil marca um avanço significativo na proteção dos direitos dos consumidores, proporcionando informações mais claras e acessíveis sobre os alimentos que são consumidos diariamente. Desse modo, com a exigência de uma rotulagem frontal simples e direta, utilizando o símbolo da lupa para indicar altos níveis de açúcar, sódio e gorduras saturadas, a legislação facilita escolhas mais conscientes por parte do consumidor, contribuindo assim para uma melhoria na saúde pública em longo prazo.

 Entretanto, essa mudança enfrenta desafios tanto para os consumidores quanto para a indústria alimentícia. Nesse viés, para os fabricantes, especialmente para pequenos e médios negócios, a adaptação às novas normas acarreta custos significativos que podem comprometer sua competitividade. As exigências de adequação dos rótulos e o risco de penalidades colocam essas empresas em uma posição difícil. Contudo, a regulamentação visa equilibrar esses desafios com o objetivo maior de melhorar a transparência e promover um ambiente de consumo mais saudável.

Por outro lado, o governo sai perdendo ao não conseguir implementar essas novas regras de maneira ampla e eficaz, adiando os benefícios esperados para a saúde pública. Além disso, os consumidores continuam vulneráveis aos produtos com rótulos em desconformidade, uma vez que dependem de informações precisas para fazer escolhas alimentares seguras. Logo a resistência à mudança por parte das empresas reflete tanto dificuldades financeiras e operacionais quanto um certo grau de oposição às transformações necessárias; essa resistência pode ser enfrentada através do apoio técnico e políticas públicas que incentivem tal transição.

Em resumo, apesar de a nova rotulagem ser um passo fundamental para promover a saúde pública e proteger o consumidor, seu sucesso dependerá do esforço conjunto entre governo, indústria e sociedade. Afinal, somente com uma implementação eficaz e fiscalização contínua será possível alcançar os objetivos desejados, garantindo que os consumidores tenham acesso às informações necessárias e permitindo que as empresas se adaptem de forma sustentável. Esse equilíbrio será essencial para gerar os impactos positivos esperados com essa mudança.

5. REFERÊNCIAS

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1Graduado em Direito pela Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão-SE ORCID:https://orcid.org/009-0002-4972-634X
²Graduando em Nutrição pela Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão-SE
³Graduando em Direito pela FANESE – Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe
⁴Graduando em Nutrição pela Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão-SE
⁵Graduando em Nutrição pela Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão-SE