REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7462722
Maria Helena da Silva¹
RESUMO
O artigo aborda a história da mulher desde a época antiga até a validação de seus direitos diante da sociedade machista, evidenciando os tipos de violência. A pesquisa foi através da metodologia bibliográfica e qualitativa, reconhecendo que mesmo na atualidade a mulher ainda sofre violação dos direitos humanos. Enfatiza-se a importância das políticas públicas como modo de prevenção à violência doméstica e a necessidade de haver uma reeducação cultural na sociedade, havendo igualdade de direitos, e que tenha como objetivo estabelecer estratégias eficazes na busca pela luta da mulher.
Palavras-Chave: Igualdade de direitos; Mulher; Violência doméstica.
1. INTRODUÇÃO
O referido artigo busca demonstrar através da história a opressão que as mulheres vivem ao longo dos anos, imposto pela sociedade, muitas vezes machista ao qual vivemos. A opressão muitas vezes era olhada como algo natural, e legitimada através do padrão social implantado no seio familiar e cultural.
Busca mostrar que ao longo dos tempos, a mulher vem ganhando voz na sociedade e a submissão ao homem, que a violência não se trata somente de um problema, de espaço ou cultura, mas que atinge milhares de mulheres de diversas etnias e classes sociais, e que na maioria das vezes sofrem de forma silenciosa.
A violência doméstica existe desde muito tempo, ela fere todo padrão da sociedade, desde as mais altas até as de baixo nível social, tratando-se de um problema que atinge a todos, e que muitas vezes impede que a mulher tenha reconhecimento, visto que o mesmo deve ter sua liberdade, e seus direitos humanos conservados.
Houve a necessidade de punir e erradicar a violência doméstica no Brasil; foi criada em 2006 a lei principal de defesa a mulher, Lei n° 11.340/06 intitulada Lei Maria da Penha, com o intuito de dar segurança e assistência a mulher.
No decorrer do trabalho, teve como metodologia a pesquisa qualitativa de estudos bibliográficos sobre o tema; separado em dois subtítulos: Histórico da violência doméstica no Brasil e Lei Maria da Penha, sobre estudos baseados em sites, artigos, revistas etc.
A princípio, será abordado um breve histórico da violência doméstica do Brasil, a cultura machista encarnada na nossa sociedade, e os vários tipos de violência contra a mulher. Em seguida, relataremos um breve relato sobre a construção da lei Maria da Penha, e os benefícios que ela trouxe para a sociedade.
2. LUTA CONTRA A QUESTÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
2.1 Histórico da violência doméstica no Brasil
Efetua-se que a violência que faz a mulher refém no seu âmbito doméstico, é sem tempo histórico determinado, não sendo procedente de uma época em si, uma localidade, nem classe social ou cultura, mas que já vem desde muitos anos, e décadas.
Em meados do século XVI, os portugueses tinham acabado de chegar ao Brasil, no início o interesse não era em tomar posses, mas na exploração das terras, enriquecer e depois retornar à Europa.
Passaram-se os tempos, a partir da valorização do açúcar na Europa, e surgiu então a necessidade de criar engenhos, dessa forma os portugueses se fixaram no Brasil.
Sob o domínio do pater familias, conhecido como senhor de engenho, estabelecia-se a casa-grande, parte mais importante dessas fazendas, as quais eram governadas por uma gerente doméstica que mantinha a ordem e organização da casa, chamada também de matronas ou matriarcas. A própria palavra família – cuja origem está no latim, famulus, significa conjunto de escravos domésticos, considerando-se como parte desse todo: mulher, filhos e agregados. (LEAL, p. 167, 2004).
As mulheres trouxeram consigo, a cultura europeia que elas viviam com seus maridos, a fim de que tentassem trazer alguns hábitos de Portugal para o Brasil.
Nas famílias havia entre mãe, pai e filhos uma hierarquia que colocava papéis e regras para cada um, então o poder patriarcal estabeleceu como característica básica a restrição ao espaço da mulher e o poder exercido sobre ela pelo marido, chefe da casa e do engenho. A mulher estava limitada ao poder masculino que viam as mulheres como propriedade, e deveria reconhecer seu próprio lugar e função social a partir deste modelo de sociedade.
Desde esse período, o homem era a representação da força e virilidade e a mulher era vista como algo frágil, que deveria cuidar do lar, dos filhos e do esposo. Desde a infância os homens eram educados para serem mais brutos, acreditava-se que os homens não podiam demonstrar sensibilidade, não demonstrando as emoções e nem chorar, por sua vez as meninas deveriam desde criança aprender a serem mais sensíveis e as mães as incentivaram desde novas a imitarem elas. Para as mulheres o casamento era o objetivo mais alto das suas vidas, não pelo afeto em si, mas porque era o único destino que a sociedade a impunha, e dentro dela ela era vista pelo homem, como uma posse sua.
Da visão histórica brasileira, a violência contra a mulher é ainda herdeira de uma cultura com raízes em uma sociedade escravocrata, construída a partir do modelo colonizador que aqui se instalou (MARCONDES FILHO, 2001).
A violência, segundo a análise de Stela Valéria Soares de Farias Cavalcanti,
“é um ato de brutalidade, abuso, constrangimento, desrespeito, discriminação, impedimento, imposição, invasão, ofensa, proibição, sevícia, agressão física, psíquica, moral ou patrimonial contra alguém e caracteriza relações intersubjetivas e sociais definidas pela ofensa e intimidação pelo medo e terror” (2007, p.29).
Para termos maior entendimento da palavra violência, é importante esclarecer. Para Nucci (2013, p.609), “Violência significa, em linhas gerais, qualquer forma de constrangimento ou força, que pode ser física ou moral […]”. Portanto, não engloba apenas em violência física, mas sim moral e psicológica que abalam a vítima não apenas fisicamente, mas diminuem seu ego e abalando o seu íntimo.
Nessa condição a violência contra mulher é explicada através das falhas que existem no cumprimento dos papéis. Ao passar dos anos as mulheres vem conquistando seu espaço, o que retirou dos homens a capacidade de mandar, então muitos veem a necessidade de usar a força bruta para impor suas vontades. Há também no ambiente domiciliar, a violência sexual, Dias (2007, p.16) diz que “Os resultados são perversos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde – OMS […] 69% das mulheres já foram agredidas ou violadas”. A subordinação da mulher ao homem o faz crer que esta deve ceder a todos os seus desejos, quando e onde quiser, como se um objeto fosse. É assustador pensar que em muitos lares a mulher não tem poder e liberdade sobre seu próprio corpo. A violência doméstica, portanto, pode ser considerada a soma de um processo histórico que legitima a diminuição social da mulher, juntamente com a incapacidade masculina de adequar-se a uma nova esfera social na qual as mulheres detêm o poder sobre si mesmas. É possível que boa parte da violência que os homens praticam hoje contra a mulher, não seja apenas a persistência do velho sistema, e, sim, uma incapacidade ou recusa de adaptar-se ao novo. Ou seja, não é apenas a continuação do patriarcado tradicional, mas também um modo de reagir contra a sua derrocada. (GIDDENS, 2000, p. 92).
Portanto, comprova-se que a violência de gênero é um desacato aos direitos humanos, pois se dispõe inibir a liberdade, a igualdade e a solidariedade feminina. No momento em que o homem vem constranger a mulher, impedir que ela manifeste a sua vontade a liberdade é violada.
Somente em 1993, que a violência contra as mulheres foi reconhecida como uma luta ao desenvolvimento, a paz e à igualdade, pelas nações unidas, e em 1994 foi proclamado pela Convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência doméstica.
Em 1995 foi ratificada pelo Brasil, tem o propósito de preservar os direitos humanos das mulheres, visto que no art. 6º, quando diz que “A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos”, demonstra que se faz necessário ressaltar essa referência, mesmo que fosse considerada desnecessária. Mesmo que tenha havido reiteração em norma infraconstitucional daquilo que a Constituição já prevê, a prática indica que não é o que costuma ser cumprido (SOUZA, p. 42).
Em 1995, a constituição federal, deu um grande passo dado pelo artigo 98, que se deu pela criação de Juizados Especiais, Lei 9.099/1995 para julgamento de crimes de menores potenciais ofensivos. Com esta criação, o trâmite processual para estes crimes passou a ser sumaríssimo, tornando mais ágil. A lei dos Juizados Especiais veio dar efetividade ao comando constitucional e significou verdadeira revolução no sistema processual penal brasileiro. A criação de medidas despenalizadoras, a adoção de um rito sumaríssimo, a possibilidade de aplicação da pena mesmo antes do oferecimento da acusação e sem discussão da culpabilidade, agilizam o julgamento dos crimes considerados de pequeno potencial ofensivo. (DIAS, 2007, p. 21). A lei do juizado especial, apesar de ter sido uma grande evolução, ela possui medidas despenalizadoras, através das transações da aplicação da pena de multa ou pena restritiva de direitos, que não consta no nome do agressor, muitas vezes não surtindo efeito.
A Lei nº 10.455/2002 criou a medida cautelar que permite o afastamento do agressor da vítima, e a Lei nº 10.886/2004, acrescentou a lesão corporal leve aumentando a pena para o delito da violência doméstica.
Vale lembrar que mesmo tendo alcançado algumas leis, ainda faltava uma legislação que se voltasse completamente para a violência no âmbito doméstico, com um tratamento e punições diferenciadas.
Embora haja a luta contra a violência, o problema ainda se encontra longe de ser erradicado, e até então não havia nenhuma lei para fundamentá-la. Até que em 2006, criou-se a Lei 11.340/06 uma lei de proteção à mulher, dando voz a muitas mulheres que lutam há anos, uma lei específica que foi criada para tratar da violência doméstica, conforme veremos no próximo tópico.
2.2 Lei Maria da Penha
Maria da Penha, um caso que ganhou reconhecimento no mundo inteiro, onde ela foi vítima da violência doméstica, sua história deu início a lei, que foi criada em 7 de agosto de 2006, a Lei Maria da Penha de número 11.340 que entrou em vigor no dia 22 de setembro de 2006.
Maria da Penha Maia Fernandes, a farmacêutica que foi violentada pelo marido durante seis anos de casamento. Em 1983 ela teve a primeira tentativa de assassinato, enquanto dormia levou um tiro nas costas pelo seu marido, o marido por sua vez fingiu um suposto assalto, o crime foi responsável pela paraplegia de Maria. Meses depois o acusador tentou novamente matá-la, empurrando-a da cadeira de rodas e tentou eletrocutá-la no banheiro.
No ano seguinte ele foi denunciado, porém o julgamento só aconteceu após 8 anos, tendo ele sido condenado em 1996, porém pelo descaso do sistema jurídico brasileiro e o autor encontrando brechas no senado, o processo prosseguiu por mais 15 anos em aberto.
Em 1998, Maria da Penha encaminhou uma petição a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que diante de tal calamidade responsabilizou o Brasil por ficar omisso diante desse cenário, foi a partir disso que o estado brasileiro em 2002 prendeu Viveiro (Nome do acusador), por apenas 2 anos de prisão. Desta forma a OEA orientou que o Brasil criasse uma lei específica para a violência doméstica.
A lei específica brasileira no combate à violência contra a mulher, teve como nome Lei Maria da Penha, ou Lei 11.340/2006. A mesma passou a regulamentar os direitos assegurados a nível internacional, ratificados pelo Brasil por meio de tratados sobre direitos humanos, ela possui natureza constitucional, o que foi um grande avanço no âmbito legislativo quando se trata de uma lei que visa beneficiar as mulheres que sofrem com violência doméstica.
A Lei Maria da Penha está adequada à Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém de Pará, OEA, 1994), à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW, ONU, de 1979) e à Constituição Federal (Brasil, 1988).
Art. 1º desta lei entende-se que ela foi criada para combater qualquer tipo de violência contra a mulher seja ela moral, sexual, física, psicológica, etc. Sua finalidade é punir aquele que pratique o ato de violência doméstica contra mulher.
Como forma de proteger as mulheres vítimas de violência, uma das alternativas é recorrer ao Poder Judiciário. As medidas protetivas têm como objetivo assegurar à mulher a proteção de sua integridade, e que proíbe a parte ativa (agressor) a cumprir limites, tais como: proibição de aproximação e contato com a vítima, afastamento do lar, suspensão de porte de arma e não frequentar determinados lugares (BRASIL, 2006).
A lei assegura proteção em tais âmbitos:
• no âmbito doméstico;
• no âmbito familiar; ou
• em decorrência de relação de afeto.
Quando constatada que a vítima sofre violência, algumas das medidas de proteção de urgência:
• Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a mulher; • Proibição de aproximação da mulher, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
• Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
• Prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
• Determinar o afastamento da mulher do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos.
A lei pede a criação de um sistema de base de dados referente a violência doméstica, denominado Sistema Nacional de Dados e Estatísticas sobre a Violência Doméstica. O objetivo desse sistema nacional era verificar a funcionalidade e a aplicabilidade da lei. A partir da obtenção dos dados é que se tem a possibilidade de verificar a eficácia nas diferentes regiões do país.
Segundo Corrêa (2010), a Lei Maria da Penha marca o início de um novo tempo, pois essa norma jurídica transformou os casos envolvendo mulheres vítimas de violência, uma vez que antes eram tratados pelo direito penal como irrelevantes, pois se enquadram em crimes de menor potencial ofensivo.
Verifica-se ao longo dos tempos que houve um aumento relevante nos casos de violência doméstica que chegaram até o Poder Judiciário, não porque a violência aumentou, e sim que as vítimas encontraram na Lei Maria da Penha uma segurança para denunciar a violência sofrida, que antes era uma luta solitária e silenciosa.
Não obstante a lei, é necessário a dedicação e o compromisso de todos os envolvidos não só para melhoria dos inúmeros casos de violência, mas, na luta contra a mudança na cultura machista que predomina no Brasil.
3. CONCLUSÃO
Conclui-se que ao longo do artigo, que várias são as formas que a violência pode surgir, tanto por meio da cultura da sociedade, ou por gênero e que se encontra vários padrões que a sociedade impõe a muitos séculos nas mulheres, e desde muito nova, colocando a mulher num lugar de submissão masculina.
Existem vários tipos de violência doméstica, podendo ocorrer de forma física, psicológica, moral, sexual, etc., e que o ato de violência causa traumas e perdas, psicológicas e físicas, muitas vezes irremediáveis.
Ao longo dos tempos, podemos perceber que mesmo tendo avanços significativos, a violência doméstica ainda é um grande desafio, e que cresce a cada dia mesmo na nossa atualidade, que ainda necessita aumentar a rede de apoio na defesa das mulheres, e promovendo as várias formas de valores sociais.
Constatamos que a Lei Maria da Penha, foi um grande avanço ao sistema jurídico, tendo mais visibilidade no nosso País, mas que a lei só foi criada em 2006, de lá para cá verificamos que ainda existem inúmeros casos de violência que a mídia divulga constantemente.
Por fim, verifica-se a importância das políticas públicas, para assegurar e prevenir a violência, e que existe a necessidade da civilização do estado, para uma reeducação na sociedade que busque que homens e mulheres convivam com igualdade, para prevenir ao invés de somente punir.
É necessário formar uma base sólida em todo ser humano, para que entendam que somos todos depositários de direitos e deveres, incluídos no mesmo contexto social e merecedores de respeito e igualdade.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006. Disponível em:< https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>.
CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. Violência doméstica: análise da Lei “Maria da Penha”, nº11.340/06, Salvador: Podivm, op. cit., p. 29.2012.
CORRÊA, L. R. A necessidade da intervenção estatal nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. In: LIMA, Fausto R.; SANTOS, Claudiene (Coords.). Violência doméstica: vulnerabilidades e desafios na intervenção criminal e multidisciplinar. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
DIAS, Maria Berenice. A lei Maria da Penha na justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais Ltda, 2007.
GIDDENS, A. Conversas com Anthony Giddens: o sentido da modernidade. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2000, p.92.
LEAL, José Carlos. A Maldição da Mulher: de Eva aos dias de hoje. São Paulo: Editora DPL, 2004.
MARCONDES FILHO, C. Violência fundadora e violência reativa na cultura brasileira. São Paulo Perspectiva, São Paulo, v.15 n.2, abr./jun. 2001.
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
SOUZA, Sérgio Ricardo de. Comentários à lei de combate à violência contra a mulher: Lei Maria da Penha 11.340/2006. Curitiba: Juruá, 2007.