REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6726274
Autora:
Paula Matos Torres1
RESUMO
O presente artigo objetiva realizar uma análise discursiva da fundamentação veiculada no acórdão do julgamento do HC 126.292/SP, no qual o Supremo Tribunal Federal manifestou o entendimento pela constitucionalidade da execução provisória da pena a partir da publicação do acórdão condenatório de segunda instância. Como premissa teórica, partiu-se da análise empreendida por Rodriguez (2013) sobre a necessidade de submeter os atos emanados do Poder Judiciário ao controle da esfera pública, pela via da análise da fundamentação veiculada para perscrutar se as razões de decidir atendem à racionalidade exigida diante do marco do Estado Democrático. Como problema central, questionou-se se a decisão do Supremo apresentada no julgamento do supracitado caso paradigma está de acordo com um sistema de controle por justificação das decisões judiciais. Partindo-se desse questionamento e da perspectiva que evoca a necessidade de análise argumentativa, procedeu-se a uma pesquisa sobre o tratamento do tema da execução provisória por parte da doutrina pátria, com o objetivo de verificar se os fundamentos expostos para a mudança de entendimento suplantaram os ônus argumentativos que são postos sobre a questão. Ao final, observou-se haver espaços vazios na decisão que colocam em xeque a sua compatibilidade com o ordenamento posto, numa perspectiva de supremacia da Constituição.
Palavras-chave: Fundamentação. Controle. Execução provisória. Ônus argumentativos.
ABSTRACT
This article aims to perform a discourse analysis of the rationale conveyed in the judgment of HC 126.292/SP, in which the Federal Supreme Court expressed the understanding for the constitutionality of the provisional execution of the sentence from the publication of the judgment of conviction of the second instance. As a theoretical premise, we started from the analysis undertaken by Rodrigurez (2013) on the need to submit the acts issued by the Judiciary to the control of the public sphere, through the analysis of the reasoning conveyed to prescribe whether the reasons for decision meet the rationality required in the framework of the Democratic State. The central problem is whether the Supreme Court’s decision presented in the above-mentioned paradigm case is in accordance with a system of control by justification of judicial decisions. Starting from this questioning and from the perspective that evokes the need for argumentative analysis, a survey was conducted on the treatment of the theme of provisional execution by Brazilian doctrine, with the objective of verifying whether the reasons given for the change in understanding supplanted the argumentative burdens that are placed on the issue. At the end, it was observed that there are empty spaces in the decision that put in check its compatibility with the existing legal system, in a perspective of the supremacy of the Constitution.
Keywords: Rationale. Control. Provisional execution. Argumentative burdens.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa realizar uma análise argumentativa da decisão proferida no julgamento do HC 126.292/SP1 para averiguar, a partir das lições doutrinárias, se há adequação da solução alcançada com o ordenamento vigente bem como analisar se o julgamento é representativo do fenômeno do ativismo judicial. Trata-se de um caso paradigmático, no qual o Supremo Tribunal Federal (STF) alterou o entendimento até então vigente sobre a “execução antecipada da pena”, passando a permitir a execução da pena privativa de liberdade a partir do acórdão condenatório de segunda instância.
Desse modo, como objetivo central do estudo, buscar-se-á entender se a decisão do Supremo Tribunal Federal pela execução provisória da pena a partir de segunda instância está de acordo com um sistema de controle das decisões judiciais por justificação, ou seja, se a fundamentação veiculada atende aos comandos normativos presentes no ordenamento nacional. Toma-se como premissa o apontamento de Rodriguez (2013, p. 167) segundo o qual cabe à teoria do direito investigar as escolhas decisórias realizadas, trazendo-as ao debate, sem pretender dotar alguma delas de um caráter inquestionável. Nesse sentido, objetiva-se observar se a decisão atende aos pressupostos de racionalidade exigidos, de modo que a sua fundamentação ultrapasse uma esfera meramente simbólica de legitimação.
Tendo em vista que a execução antecipada da pena é um tema que comporta variadas incursões doutrinárias, tal objetivo será realizado por meio da observação dos ônus argumentativos que a doutrina comumente coloca sobre a temática, averiguando se na decisão em análise tais ônus foram suplantados.
Traçado o objetivo, a principal problematização que se coloca é a seguinte: a decisão do Supremo Tribunal Federal pela execução provisória da pena a partir da segunda instância está de acordo com um sistema de controle por justificação das decisões judiciais? Em outras palavras, questiona-se se a fundamentação veiculada pelos Ministros atende aos parâmetros normativos presentes no ordenamento.
Cabe esclarecer que essa perspectiva do controle por meio da justificação foi tomada, a partir tanto do comando normativo existente no artigo 93, inciso IX da Constituição Federal, o qual enuncia o dever de fundamentação das decisões judiciais como das reflexões empreendidas por Rodriguez, na obra “Como decidem as Cortes?” (2013) sobre a necessidade de submeter os atos derivados das instituições formais ao controle da esfera pública, assumindo a via argumentativa um importante caminho para averiguar a racionalidade do ato emanado do Poder Judiciário.
Assinala-se que essa perspectiva de controle não é pensada a partir de um órgão externo ao Judiciário como revisor das decisões tomadas tampouco como uma afronta à independência funcional dos juízes em realizar escolhas autônomas a partir dos casos submetidos à análise. A questão que se coloca é que o Judiciário exerce uma parcela do poder e, como qualquer outro, não lhe é dado o exercício arbitrário. Para além de uma legitimação simbólica das decisões como proveniente de uma autoridade, é preciso pensar em uma legitimidade democrática construída a partir de um discurso racional.
Suscitadas a referida problematização, cabe a exposição da hipótese de pesquisa. Desse modo, diante da análise inicial da temática e da leitura do acórdão proferido no julgamento do HC 126.292/SP, tomou-se como hipótese que a recente mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal a partir desse julgamento referendando a possibilidade de execução provisória da pena a partir da segunda instância deu-se mais em razão de uma perspectiva pragmática valorizadora da eficiência do processo penal, expressada por meio da invocação de possíveis disfuncionalidades do sistema judicial, como, por exemplo, a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva antes do julgamento pelas instâncias superiores, em detrimento de uma interpretação normativa do dispositivo constitucional que ventila a discussão: o artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal.
Quanto à metodologia do presente estudo, indica-se que será realizado um levantamento documental do acórdão proferido no julgamento do HC 126.292/SP, bem como uma abordagem teórica, por meio de pesquisa bibliográfica, acerca das temáticas levantadas. Destarte, será realizado um estudo de caso da decisão pela execução provisória da pena a partir do acórdão condenatório de segunda instância, buscando-se compreender a argumentação veiculada na decisão a fim de analisar se o discurso proferido atende aos parâmetros de um controle por justificação, tomando a necessidade de fundamentação da decisão, presente no artigo 93, inciso IX da Constituição Federal como diretriz de ordem normativa. Para realizar essa análise, será eleito como pressuposto teórico a perspectiva trazida por José Rodrigo, na obra “Como decidem as Cortes?”, no que tange, sobretudo, ao controle das decisões de acordo com os modelos de racionalidade jurídica existentes.
Especificamente foi escolhida essa decisão no julgamento do HC 126.292/SP que permitiu a execução provisória após o acórdão condenatório, diante da importância da discussão por estar em debate uma garantia fundamental, da notória oscilação jurisprudencial acerca da temática e de ter sido uma decisão paradigmática que ainda é amplamente discutida tanto na comunidade jurídica como na opinião pública. Percebe-se que, dentro da própria Suprema Corte, o precedente que ensejou a mudança teve uma maioria apertada de votos, o que também serve para evidenciar que é um tema que está longe de um pacífico entendimento.
Desse modo, constitui-se uma importante pauta de pesquisa a análise da motivação das decisões, com a avaliação da forma como as razões de decidir são colocadas para a esfera pública. Essas questões remetem à reflexão acerca do controle da atividade decisória. Conforme análise de Rodriguez (2013, p. 170) a questão do controle incidente sobre as decisões judiciais relaciona-se à “discussão dos critérios segundo os quais as instâncias jurisdicionais devem exercer suas atividades, posto que, num estado de direito, não há poder autorizado a agir arbitrariamente”. O famoso jargão de que ao Supremo Tribunal Federal é dado o poder de errar por último deve ser uma pauta de discussão na sociedade. Quando se naturaliza essa visão, a consequência pode ser a normalização de formas arbitrárias de exercício do poder, já que tudo pode ser passível de justificação.
2. O CONTROLE DAS DECISÕES PELA VIA DA FUNDAMENTAÇÃO
O ponto de partida para submeter a decisão à análise advém da perspectiva trazida por Rodriguez (2013) a respeito do papel da pesquisa empírica em direito como mecanismo de verificação dos atos emanados das instâncias formais detentoras do poder. Em artigo intitulado “Pesquisa empírica e estado de direito: a dogmática jurídica como controle do poder soberano”, Rodriguez (2006) expressa a possibilidade de a pesquisa empírica em direito ser incluída no âmbito da dogmática, trazendo a perspectiva da dogmática como um mecanismo de controle e de reconstrução sobre a maneira pela qual a decisão foi alcançada. Nessa perspectiva, seguem trechos das reflexões desenvolvidas por Rodriguez:
A análise sociológica do funcionamento das instituições implica na pesquisa empírica da ação dos órgãos de poder, inclusive todos aqueles que praticam atos jurisdicionais. Ora, se considerarmos que o modo de pensar dogmático é o instrumental de que os órgãos jurisdicionais se utilizam para tomar suas decisões, descrever seu funcionamento por meio de pesquisas empíricas é reconstruir a maneira pela qual estes órgãos realizam raciocínios dogmáticos com o fim de controlar o grau de indeterminação que caracteriza seus julgamentos e, nos termos de Neumann, propor, eventualmente, reformas institucionais para realocar certas matérias para órgãos de natureza administrativa. (RODRIGUEZ, 2006).
No livro “Como decidem as Cortes?”, Rodriguez (2013, p. 149), ao explicitar a necessidade de discutir o controle social das decisões judiciais, aponta para uma variedade de modelos institucionais existentes, operáveis em função das necessidades de cada ordenamento, traçando como objetivo desnaturalizar as soluções postas. Nesse sentido, partindo dessa profusão de modelos institucionais, o autor fundamenta a reflexão sobre a criação de parâmetros ao exercício da atividade judicial, a qual, como qualquer outra função do Estado de Direito, deve atender a critérios racionais.
Vale ressaltar que o mencionado pesquisador também apresenta a indeterminação, consubstanciada em uma multiplicidade de respostas, como uma característica do direito contemporâneo e da complexificação das relações sociais (RODRIGUEZ, 2013, p. 167). Nessa perspectiva, expõe que, diante da indeterminação, faz-se necessário definir um momento de autoridade no qual é preciso encontrar uma solução, ainda que temporária, para aquele problema que provocou a intervenção do Poder Judiciário.
Esse momento de autoridade pode se fundar no puro arbítrio, na força simbólica da autoridade do juiz ou, segundo uma alternativa possível, legitimar-se democraticamente por meio de um modelo de justificação que leve em conta os argumentos apresentados e os aceite ou refute num discurso racional (RODRIGUEZ, 2013, p. 162).
Desse modo, assevera Rodriguez (2013, p. 150) que a questão do controle incidente sobre as decisões judiciais está ligada à discussão dos critérios que norteiam a atuação do Judiciário, uma vez que, em um Estado de Direito, a atuação deve estar pautada de forma racional, afastando-se manifestações arbitrárias. Sendo assim, assinala como vertente do controle a via dos modelos de racionalidade judicial, como um conjunto de regramentos que se manifesta por meio da imposição de determinados ônus argumentativos, cujo intuito é formar padrões para a justificação das decisões provenientes do Poder Judiciário.
É importante salientar que essa perspectiva do controle não é pensada a partir de um órgão externo ao Judiciário como revisor das decisões tomadas, tampouco como uma afronta à independência funcional dos juízes em realizar escolhas autônomas a partir de casos submetidos à análise. A questão que se coloca é que o Judiciário exerce uma parcela do poder e, como qualquer outro, não lhe é dado o exercício arbitrário. Para além de uma legitimação simbólica das decisões como proveniente de uma autoridade, é preciso pensar em uma legitimidade democrática construída a partir de um discurso racional (RODRIGUEZ, 2013, p. 149). Nessa linha, vale trazer à luz as reflexões empreendidas pelo autor:
Nossa abordagem não tem qualquer relação com a pretensão de controlar as sentenças a partir de órgãos externos ao Poder Judiciário ou impor limites ilegítimos à ampla liberdade de julgar. Trata-se, em sentido bem diverso, de refletir sobre a necessidade de criar procedimentos e parâmetros para a atividade jurisdicional que, como qualquer outra função atribuída a um estado de direito, não pode ser exercida arbitrariamente (RODRIGUEZ, 2013, p. 149).
Nessa perspectiva, de acordo com Freddie Didier (2012), no artigo intitulado “Sobre a fundamentação da decisão judicial”, tendo em vista que o convencimento judicial é formado a partir de uma ideia de verossimilhança, uma vez inalcançável a verdade, exsurge a fundamentação como uma garantia do jurisdicionado em conhecer as razões que motivam a interferência estatal em sua esfera privada.
Desse modo, demonstra ser a motivação dotada de uma dupla função. A primeira diz respeito a uma perspectiva endoprocessual, ao permitir às partes ter ciência acerca das razões consideradas na análise da causa, e a partir disso, insurgir-se contra a decisão por meio dos recursos cabíveis bem como subsidiar aos magistrados de instância superior fundamentos para manter ou reformar a decisão. E a segunda – de interesse para a presente análise – apresenta-se como a função exoprocessual ou extraprocessual, segundo a qual a fundamentação torna possível o controle da decisão do magistrado mediante a via popular, sendo o exercício da atividade jurisdicional uma parcela de poder concedida ao magistrado, cujo titular, no entanto, é o povo e a ele se direciona o seu exercício (DIDIER JÚNIOR, 2012).
Observa-se a importância da dimensão argumentativa como um mecanismo que, a um só tempo, importa ao caso concreto ao permitir àqueles atingidos pela decisão meios de contestá-la, como também permite à esfera pública debater a interpretação dada à norma. No cenário em que, de forma recorrente, questões de relevo ao cenário nacional são decididas pelo Poder Judiciário, o debate se torna mais frequente uma vez que a projeção de efeitos sobre a sociedade é ampla.
Menciona-se que à teoria do direito incumbe, dentre variadas funções, analisar a escolha decisória, verificando como as diferentes possibilidades interpretativas se conectam aos problemas, de maneira a testar a consistência dos elementos que foram considerados para se realizar a escolha (RODRIGUEZ, 2017, p. 167-171). Relativamente à caracterização do que vem a ser uma escolha racional, aponta Rodriguez:
Lembremos, em poucas palavras, que um discurso racional é aquele em que os falantes levantam pretensões de validade e são capazes de defendê-las, sem entrar em contradição, quando instados a fazê-lo. Não se pode sustentar racionalmente A e não A simultaneamente. (RODRIGUEZ, 2013, p. 172-173).
Essa perspectiva de Rodriguez (2013) desencadeou a necessidade do estudo de uma decisão judicial, precisamente o acórdão HC 126.292/SP, com o intuito de verificar os ônus argumentativos postos e, a par das lições doutrinárias que são colocadas acerca do tema, verificar se os ônus argumentativos foram suplantados.
3. BREVE PANORAMA DA OSCILANTE TRAJETÓRIA JURISPRUDENCIAL ACERCA DA TEMÁTICA
O acórdão escolhido é representativo de uma oscilante trajetória jurisprudencial no que tange à execução antecipada da pena. À luz de um mesmo paradigma normativo, a Constituição Federal, foram proferidas variadas decisões em sentidos opostos. Importa salientar que, no cenário anterior à promulgação da Constituição, vigorava o entendimento segundo o qual era possível a execução da pena privativa de liberdade após o acórdão confirmatório de segunda instância (CALLEFI, 2017, p. 90). O argumento invocado respaldou-se na previsão de ausência de efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial, contida no artigo 637 do Código de Processo Penal.
Ressalta-se que, mesmo com o advento da Constituição Federal, o entendimento se manteve inalterado. No entanto, em 2007, começaram a aparecer alguns indicativos de mudança de orientação acerca do tema (CALEFFI, 2017, p. 94). No julgamento do Habeas Corpus 91183/SP, o relator Ministro Ricardo Lewandowski, concedeu a ordem, considerando “incompatível com o art. 5º, LVII, da Constituição Federal, a segregação cautelar baseada, exclusivamente, na disposição legal que prevê efeitos meramente devolutivos aos recursos excepcionais”. Frisa-se também que existiram outras decisões contrárias à tese da execução provisória, entretanto, limitavam-se ao entendimento de alguns Ministros, não referendando uma posição do Plenário (CARVALHO FILHO, 2017).
Entretanto, de modo geral, aponta-se que a decisão paradigmática, com a manifestação do Plenário do Supremo, somente ocorreu em 2009, no julgamento do HC 84078/MG, de relatoria do então Ministro Eros Graus, ocasião na qual a Corte passou a entender como inconstitucional a execução antecipada da pena, antes do marco do trânsito em julgado (CALLEFI, 2017, p. 96-97). Frisa-se que o resultado em questão foi obtido por uma maioria de sete votos a quatro (NOTÍCIAS STF, 2009).
Posteriormente, sedimentado o entendimento na Corte no sentido da impossibilidade da execução provisória, a questão voltou à pauta em fevereiro de 2016, no julgamento do HC 126.292/SP, ocasião em que se evidenciou uma reviravolta jurisprudencial, de maneira que foi veiculado o entendimento segundo o qual a execução provisória do acórdão condenatório não viola o princípio da presunção da inocência, expresso no artigo 5º, LVII, da Constituição. Desse modo, passou-se a admitir que a partir do acórdão condenatório proferido em segunda instância a pena já poderia ser executada (HC 126.292/SP, 2016).
Nesse diapasão, comumente se divide o entendimento do Supremo a respeito da temática de modo fragmentado: afirma-se que da promulgação da Constituição até 2009, de forma geral, predominava a orientação pela qual era possível a execução da pena antes do trânsito em julgado; de 2009 até o presente HC 126.292/SP, em 2016, o entendimento firmado era no sentido da inconstitucionalidade da execução antecipada, devendo-se aguardar o trânsito em julgado da condenação. Ou seja, vê-se que no referido julgamento em 2016 retomou-se uma orientação anterior do Supremo, referendando a possibilidade de execução a partir da segunda instância (CALEFFI, 2017, p. 96-97).
Desse modo, pode-se apontar que a existência desses entendimentos opostos acerca de um mesmo dispositivo constitucional levanta o questionamento sobre os modelos de interpretação em disputa. Indaga-se o que pode ter sido determinante para a mudança de entendimento. Ressalta-se que, entre os dois julgamentos, houve uma significativa modificação da Suprema Corte, sendo cinco Ministros comuns a ambos os julgamentos. Além disso, questiona-se até que pontos os reflexos da Lava-Jato, sobretudo uma demanda por maior eficiência possa ter influenciado o novo posicionamento. De toda forma, cumpre analisar a justificação veiculada no recente acórdão paradigma, o HC 126.292/SP, com o objetivo de verificar se a decisão atende aos pressupostos de um controle por justificação, considerando o marco constitucional.
4. CARACTERIZAÇÃO GERAL DO PADRÃO ARGUMENTATIVO PRESENTE NA DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO DO HC 126.292/SP.
No presente capítulo será realizada uma análise dos argumentos veiculados pelos Ministros no julgamento do HC 126.292/SP. A seleção das justificativas para compor o estudo foi feita por meio da observação da própria indicação argumentativa feita pelos Ministros como motivação para amparar os seus votos. Após a leitura do acórdão, embora tenha havido um manancial de argumentos, foi possível observar as justificativas mais recorrentes bem como os argumentos isoladamente utilizados por alguns Ministros.
Desse modo, será verificada a linha argumentativa que predominou na decisão paradigmática anterior – o HC 84.078/MG -, cuja orientação foi no sentido da impossibilidade de execução provisória, a fim de realizar uma comparação com a atual decisão. Ademais, serão observados os ônus argumentativos que geralmente são colocados no enfrentamento do tema com o intuito de verificar se, na decisão submetida à análise, tais ônus foram suplantados (HC 84.078/MG, 2009).
Consta no acórdão a informação no sentido de que restaram vencidos os votos dos Ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Ressalta-se que o voto do Ministro Dias Toffoli não se encontra presente no acórdão e, por consequência, não fora incluído na análise.
5. ARGUMENTAÇÃO GERAL EXPLANADA NOS VOTOS VENCEDORES
Após a realização da leitura da decisão, foi possível depreender que a invocação da efetividade foi um ponto marcante no referido julgamento, numa perspectiva de ponderação com a presunção de inocência e com a busca de um equilíbrio na proteção de outros bens jurídicos tutelados. No que tange aos votos vencedores, essa argumentação foi utilizada pelos seguintes Ministros: Teori Zavascki, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes (HC 126.292/SP, 2016).
O Ministro Relator, Teori Zavascki, assinalou que o tema em debate suscita a ponderação entre o alcance do princípio da presunção de inocência em conjunto com a garantia de efetividade da jurisdição penal. Tal efetividade, na compreensão do Ministro, deve se dirigir, em uma dimensão valorativa, não apenas aos acusados, como também à sociedade, diante da complexidade do sistema de justiça penal (HC 126.292/SP, 2016, p. 4).
Nessa linha, também se posicionou o Ministro Luís Roberto Barroso, ao enunciar que o preceito presente no artigo 5º, LVII, da Constituição Federal deve ser interpretado de forma a se garantir a efetividade da lei penal, em proteção aos bens jurídicos por ela tutelados (HC 126.292/SP, 2016, p. 35). Para tanto, expôs que, de um lado, há o princípio da presunção de inocência, o qual prevê que a adoção de medidas restritivas ao acusado deve ser excepcional, subsidiada nos postulados da “necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito”. De outro, há a efetividade da lei penal, dirigida aos objetivos de prevenção geral – ao desestimular a prática de crimes pelos demais membros da sociedade – e específica – ao inibir a reiteração delituosa por parte do indivíduo – como também voltada à proteção dos bens jurídicos, amparados na Constituição (HC 126.292/SP, 2016, p. 40).
Outrossim, o Ministro asseverou que, com o juízo condenatório em segundo grau, reduz-se o peso do princípio da presunção de inocência, ao já se ter demonstrado a responsabilidade do réu e a finalização da apreciação da matéria fático-probatória, e amplia-se a exigência de efetividade do sistema criminal. Além disso, enfatiza a importância da dimensão da proporcionalidade relacionada à “vedação da proteção deficiente”. (HC 126.292/SP, 2016, p. 41).
Por sua vez, o argumento segundo o qual a apreciação da matéria fático-probatória encontra-se afeta às instâncias ordinárias contou com ampla maioria daqueles que votaram pela possibilidade da execução provisória, uma vez que, dos sete Ministros que se posicionaram favoravelmente à execução provisória, cinco utilizaram essa justificativa para subsidiar os votos (HC 126.292/SP, 2016).
De modo geral, observou-se a sustentação no sentido de que, é no juízo de apelação que se exaure o exame dos fatos e das provas do caso, concretizando-se, nesse momento, o duplo grau de jurisdição com a devolução da matéria, destinando-se à reapreciação da decisão proferida pelo juízo a quo. Nesse sentido, mencionou-se que as instâncias ordinárias seriam as soberanas na análise dos fatos e das provas, de modo que os recursos excepcionais não seriam dotados de plena devolutividade (HC 126.292/SP, 2016, p. 23/30/41).
Notou-se também reiteradas comparações realizadas com a realidade do ordenamento de variados países acerca do tratamento conferido à execução da pena, mais especificamente, ao marco temporal que é considerado para o início da execução. Nesse sentido, pode-se perceber, já no início da leitura do acórdão, que essa justificação foi realizada amplamente no voto do relator, o Ministro Teori Zavascki.
No principiar de sua abordagem, o ex-ministro citou uma anterior afirmação da então Ministra Ellen Gracie, segundo a qual “em nenhum país do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa, aguardando o referendo da Corte Suprema”.
Por sua vez, o Ministro Gilmar Mendes apontou que, na realidade pátria, o acesso às instâncias superiores é significativamente amplo, inexistindo meios que garantam a satisfação da demanda de trabalho, especialmente considerando que a rejeição dos recursos por ausência de repercussão geral demanda detida análise, quadro que, em partes, justifica a mora no julgamento dos recursos extraordinários.
Foi possível notar a existência de variadas menções ao sistema recursal, sobretudo, aos recursos destinados às vias extraordinárias. Nesse sentido, verificou-se que os Ministros asseveraram a ausência de efeitos suspensivos aos recursos extraordinários e a eventual disfuncionalidade do sistema, com a existência de apelos protelatórios, o que por conseguinte implica a consumação da prescrição.
Nesse diapasão, foi levantada a afirmação no sentido de serem incomuns as hipóteses de êxito do recorrente, uma vez que os Tribunais Superiores não analisam a matéria fática, o que demonstra que, apenas excepcionalmente teriam o condão de modificar a situação do apenado.
Afirmou ainda a presença de algumas situações nas quais esses apelos são interpostos com “indisfarçados propósitos protelatórios” no intuito de se obter a prescrição. Além disso, o Ministro Edson Fachin asseverou a inobservância de inconstitucionalidade na previsão contida no art. 27, §2º, da Lei nº 8.038/90, ao prever que os recursos extraordinário e especial serão recebidos no efeito meramente devolutivos, uma vez que a Constituição afasta o acesso às instâncias superiores para resolver “injustiças” apenas de ordem pessoal.
6. POTENCIAIS ÔNUS ARGUMENTATIVOS ACERCA DA TEMÁTICA À LUZ DAS LIÇÕES DOUTRINÁRIAS
Após a decisão emanada no julgamento do referido HC 126.292/SP, verificou-se uma reação por parte de juristas em relação ao julgamento em comento, sob a alegação de violação ao preceito constitucional.
Conforme demonstrado, sob a referência das lições de Franz Neumann, José Rodriguez (2006) demonstra o papel desempenhado pela pesquisa empírica em direito, por meio da dogmática, como mecanismo de controle social do poder. Desse modo, valendo-se das lições doutrinárias, pretende-se verificar se a decisão suplantou os ônus argumentativos postos sob a temática, partindo do entendimento da pesquisa como instrumento de verificação dos atos emanados pelas instituições formais, especificamente, do Poder Judiciário.
A respeito da solução posta na supracitada decisão na supracitada decisão, o doutrinador Renato Brasileiro (2017, p. 48-49) frisou que, por mais que a busca por eficiência seja legítima, essa não pode se sobrepor aos comandos constitucionais, inclinando-se no sentido de que o referido pronunciamento da Corte foi de encontro à Constituição, com violação aos preceitos presentes no artigo 5º, inciso LVII, bem como do artigo 283 do CPP, não existindo margem, segundo ele, para a conclusão de que a presunção subsiste até a segunda instância.
De acordo com Lima (2017, p. 48-49), o artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) elenca hipóteses em que pode haver a prisão antes do trânsito em julgado, seja na fase investigatória seja na processual, exaurindo-se nas situações de prisões cautelares. Desse modo, a prisão-pena, decorrente da condenação, só pode ser objeto de execução após o trânsito em julgado, o qual só ocorre “quando a decisão se torna imutável”. Nessa linha, frisou que a formação da coisa julgada é obstada pela interposição de qualquer recurso, ainda que inexista efeito suspensivo. Nessa linha, frisou que a formação da coisa julgada é obstada pela interposição de qualquer recurso, ainda que inexista efeito suspensivo. Isso porque a imutabilidade da decisão encontra uma barreira no momento em que um recurso é interposto, independente de possuir o mesmo efeito suspensivo ou não. Sendo assim, considerou ainda que a invocação da natureza extraordinária e do conhecimento somente de questões de direito em relação aos recursos dirigidos ao STJ e ao STF não se caracterizam como justificativas legítimas a amparar a execução antecipada. Nesse sentido, segue trechos de sua exposição:
Há, portanto, um requisito de natureza objetiva para o início do cumprimento da reprimenda penal, qual seja, a formação da coisa julgada, que é obstada pela interposição de todo e qualquer recurso, seja ele ordinário ou extraordinário, seja ele dotado de efeito suspensivo ou não. (LIMA, 2017, p. 49).
No que tange à alegação de efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial, advinda da norma do artigo 637 do CPP24, assinalou o referido doutrinador que esse artigo fora revogado tacitamente pelo artigo 283 do CPP, o qual adveio da Lei 12043/11, posterior, portanto, àquele dispositivo. Além disso, entende que o comando do artigo 283 do CPP é reprodutor da previsão constitucional (LIMA, 2017, p. 48-49). Desse modo, tanto temporal quanto materialmente, a norma contida no artigo 283 do CPP suplanta à presente no artigo 637 do mesmo diploma normativo.
Em relação à sinalização de aplicação das previsões processuais civis à matéria sob análise no sentido de inexistência de efeito suspensivo, Lima (2017, p. 49-50) assinalou que o Código de Processo Civil se aplica somente subsidiária e supletivamente à seara penal, inexistindo qualquer lacuna no Código de Processo Penal sobre a questão, tendo em vista que o artigo 283 do CPP é o responsável por discipliná-la, ao permitir a prisão durante a fase processual somente em restritas hipóteses de caráter cautelar, não abrangendo, portanto, a prisão-pena. No mesmo sentido, Lopes e Badaró (2016, p. 28) também sinalizam não serem aplicáveis dispositivos do processo civil ao caso, tendo em vista a existência de parâmetros próprios, sobretudo, considerando ser o valor liberdade que está em jogo. Noutro vértice, inclinando-se favoravelmente à execução provisória, Barbagalo (2015, p. 130), na obra “Presunção de Inocência e Recursos Criminais Excepcionais”25, traz uma reflexão no sentido de que, mesmo antes do trânsito em julgado, houve uma etapa prévia na qual se desconsiderou a inocência daquele réu, uma vez que, para que haja o proferimento de uma sentença condenatória, é necessário o amparo em um juízo que afasta a dúvida e, fundando-se em elementos concretos, decide pela condenação do réu. Nesse sentido, traça o seguinte questionamento:
Afinal, como sustentar a presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, se antes desse trâmite, obrigatoriamente, o juiz de primeira ou Tribunal de segunda instância irão desconsiderar a referida presunção, pois, do contrário, como condenar? Realmente configura-se um entrave jurisdicional. (BARBAGALO, 2015, p. 130).
Seguindo a linha de entendimento favorável à execução provisória, na perspectiva de harmonizar a presunção de inocência com a efetividade da jurisdição penal, Paulino (2017, p. 227) entende que o argumento de que deve haver o aguardo do trânsito em julgado deve ser afastado, pelo fato de nenhuma decisão condenatória contemplar essa previsão presente no art. 5º, LVII da Constituição. Isso porque, segundo ele, as decisões condenatórias podem ter o seu mérito constantemente impugnado tanto pela via habeas corpus ou até mesmo pela revisão criminal, o que as torna, a rigor, provisórias, suscetíveis de alteração.
Percebe-se que há uma certa disputa doutrinária relativa ao marco temporal da presunção de inocência, na tentativa de, por vezes, demonstrar que a experiência prática ora sugere o afastamento da presunção a partir da sentença condenatória ora indica a inexistência propriamente de uma imutabilidade, tendo vista as demais possibilidades de impugnação, de modo a enfraquecer o parâmetro do trânsito em julgado.
Reporta-se, pois, a um esvaziamento do instituto do trânsito em julgado na prática, mas se reconhece ser essa a expressão textual presente na norma constitucional, o que leva à necessidade de perscrutar o seu alcance. Ao realizar uma definição do trânsito em julgado, Barbosa Moreira aponta o seguinte:
Por ‘trânsito em julgado’ entende-se a passagem da sentença da condição de mutável à de imutável. (…) O trânsito em julgado é, pois, fato que marca o início de uma situação jurídica nova, caracterizada pela existência da coisa julgada – formal ou material, conforme o caso (MOREIRA apud LOPES JÚNIOR, BADARÓ, 2016, p. 18).
A respeito da coisa julgada, Távora e Alencar (2017, p. 1138/1577) asseveram tratar-se de um “fenômeno que se dá com o decurso do prazo recursal “em branco” (in albis), sem que as partes interponham o recurso cabível, ou, em tendo havido recurso, após a apreciação definitiva deste”. No que tange à afirmação anterior de partidários da execução provisória no sentido de que há sempre um meio de impugnar as decisões, citando-se comumente a possibilidade do habeas corpus e da revisão criminal, importa ressaltar que ambos se caracterizam como ações autônomas de impugnação, as quais podem objetivar a revisão de decisão condenatória que já tenha transitado em julgado ou servir como sucedâneo recursal na situação em que não haja um recurso específico a ser manejado.
Desse modo, enquanto o habeas corpus pode servir como um meio de impugnar decisões que ponham em risco à liberdade de locomoção do acusado durante um processo em curso, a revisão criminal se caracteriza justamente como um meio de “excepcionar a coisa julgada em matéria criminal”, de modo a somente ser permitida quando favorável ao acusado. (TÁVORA; ALENCAR, 2017, p. 1613). Nessa perspectiva, põe-se em xeque a afirmação do prolongamento do trânsito em julgado, pela possibilidade de manejo de ações de impugnação, pelo fato de, no caso da revisão criminal, haver justamente o pressuposto de já ter a decisão transitado em julgado. Dessa forma, o trânsito em julgado remete ao encerramento da possibilidade de utilização dos recursos propriamente dito, afastando-se da órbita das ações de impugnações.
Sobre esse aspecto, é preciso salientar que houve uma discussão por parte do Legislativo referente à mudança do alcance do trânsito em julgado, com a possibilidade de ressignificá-lo, por meio da concessão de eficácia de coisa julgada à decisão proferida pelo Tribunal de Apelação. Entretanto, referida discussão não foi adiante no Senado Federal, sendo, no ano seguinte, modificada a interpretação vigente pela via judicial. (PAULA, 2017, p. 143). E é nesse contexto que surgem os questionamentos se poderia haver uma emenda propondo a referida modificação, tendo em vista estar o dispositivo inserido nos direitos individuais, os quais são acobertados pela cláusula pétrea, e, mais ainda, se o Judiciário poderia se imiscuir nesta seara. São questionamentos explorados capítulo referente ao ativismo judicial.
De todo modo, o fato é que essa discussão sobre o alcance do trânsito em julgado não se fez presente diretamente no referido julgamento. Frisou-se, para além da compatibilização com a efetividade do processo penal, a questão da inexistência de efeito suspensivo aos recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça, a finalização das questões fático-probatórias nas instâncias ordinárias bem como o uso protelatório dos recursos, não havendo uma análise mais detida do instituto do trânsito em julgado em si. E esse é um aspecto relevante porque está inserido expressamente no texto do dispositivo constitucional e é em torno dessa expressão que se amparam, comumente, as críticas dirigidas à decisão. Pode-se inferir, diante da literalidade do dispositivo, que o alcance do trânsito se constitui como um ônus argumentativo a ser suplantado pelos votos vencedores.
Sobre a fundamentação veiculada, Streck (2016) é categórico ao afirmar que “é facilmente constatável que o STF não assumiu de forma consistente o ônus argumentativo para fazer um overruling, porque isso exigiria ampliar a garantia e não a restringir”. Entende que, além de os limites semânticos do texto constitucional não comportarem a interpretação veiculada, não houve a invalidação do artigo 283 do CPP que subsidia a interpretação constitucional.
Nesse sentido, aponta o jurista que, em 2011, o Poder Legislativo, como resposta consonante à decisão proferida pelo Plenário da Corte, em 2009, pela inconstitucionalidade da 42 execução provisória, aprovou o artigo 283 do CPP para deixar clara a proibição da execução antes do trânsito em julgado. Desse modo, segundo Streck (2016), para tomar a decisão presente no julgamento do HC 126 292/SP, o STF deveria ter se pronunciado sobre a invalidação do referido dispositivo infraconstitucional, por caracterizar-se como uma questão prejudicial. Como não o fez, houve um “drible hermenêutico”, omitindo-se sobre a previsão presente em um dispositivo a fim de se alcançar um resultado determinado, em afronta à súmula vinculante nº 1027, no sentido de que foi afastada a incidência de um dispositivo, sem haver a menção expressa. A respeito dessa questão, expõe ainda o seguinte:
Ou seja: para dizer que era cabível a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado, não basta que o STF se refira a uma redefinição da interpretação do inciso LVII do artigo 5º da CF (ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória). Por que o constituinte teria posto esse inciso? Se não fosse para, exatamente, dizer o que depois foi posto no artigo 283, não precisaria tê-lo feito. Por que a expressão “trânsito em julgado”? O que é trânsito em julgado? Ora, enquanto couber qualquer tipo de recurso, uma decisão não transita. Então temos a holding — princípio constitucional — e o enunciado que explicita isso no plano de uma regra (artigo 283). (STRECK, 2016).
A esse respeito, Caleffi (2017, p. 129-130) aduz ainda que a decisão também deveria ter declarado a inconstitucionalidade dos artigos 105, 147 e 160 da Lei de Execução Penal29 (LEP), os quais remetem ao trânsito em julgado como “pressuposto de validade para os procedimentos neles previstos”.
Com base nessas perspectivas expostas, vê-se que há partidários de ambas as teses sobre a execução provisória. Os argumentos favoráveis, em síntese, estão em consonância com 45 aqueles presentes na decisão, sobretudo, ligados à defesa da compatibilização da presunção de inocência com a eficiência no sistema de justiça criminal, à ausência de efeitos suspensivo aos recursos dirigidos às instâncias extraordinárias e ao cotejo com os ordenamentos externos. Reflete alguns autores também sobre o alcance da expressão trânsito em julgado, de modo a mostrar a sua inoperabilidade na realidade prática, seja porque a inocência já foi desconsiderada com a mera sentença condenatória seja porque há uma gama de meios de impugnação que fazem persistir ad infinitum o caráter provisório da decisão. Porém, esse último eixo argumentativo não foi diretamente veiculado pelos votos vencedores. Em sentido diverso, encontra-se a linha argumentativa pela qual o artigo 5º, inciso LVII31 não comporta diversa interpretação, sendo o trânsito em julgado o marco para a execução. Nessa toada, sustenta-se ser o artigo 283 do CPP32 reprodutor do princípio constitucional, apontando-se a ausência de técnica da decisão em não ter se pronunciado sobre o dispositivo em questão. Como parâmetros infraconstitucionais, citam-se ainda os artigos 105, 147 e 160 da LEP33. Questiona-se também a impossibilidade de uma decisão ser tomada com base em argumentos utilitaristas sedimentados na eficiência processual em detrimento da previsão contida no texto constitucional, além da reflexão sobre a legitimidade do Judiciário em promover referida alteração.
7. CONCLUSÃO
Com amparo nas reflexões trazidas por Rodriguez, na obra “Como decidem as Cortes?”, no que tange à submissão dos atos emanados das instituições formais ao controle da esfera pública, empreendeu-se uma análise argumentativa de uma decisão proveniente do órgão de cúpula da jurisdição constitucional para testar a sua compatibilidade com o ordenamento pátrio bem como verificar se há a manifestação do fenômeno conhecido como ativismo judicial.
Partindo-se do problema central expresso por meio do questionamento se a decisão proferida no bojo do HC 126.292/SP se coaduna com um controle por meio de justificação, realizou-se uma busca em relação aos ônus argumentativos que são postos por parte da doutrina pátria em relação à temática da execução provisória para observar se a referida decisão efetivamente os suplantou.
A partir da análise realizada, pode-se observar uma predominância no uso de argumentos consequencialistas ligados à eficiência do processo penal assim como uma tentativa de contornar o preceito constitucional que ventila a discussão – o artigo 5º, LVII da Constituição – seja por meio da invocação de dispositivos infraconstitucionais que apontam, por exemplo, a inexistência de efeitos suspensivos nos recursos dirigidos às instâncias extraordinárias seja por meio de análises a partir do direito comparado.
Por meio da leitura dos aspectos doutrinários, pode-se observar que há espaços vazios na decisão, chegando a ser redundante a afirmação de que houve uma interpretação de encontro ao preceito constitucional objeto da discussão. No aspecto material, a doutrina, de modo geral, evidenciou que os fundamentos normativos levantados não são suficientes para transpor o artigo 5º, LVII da Constituição Federal tampouco o dispositivo infraconstitucional reprodutor dessa regra, o artigo 283 do Código de Processo Penal, não se coadunando a decisão, à luz do arcabouço doutrinário, com os comandos normativos presente no ordenamento. Dentre os fundamentos comumente levantados insere-se a ausência de efeito suspensivo aos recursos dirigidos às instâncias extraordinárias, o que pela argumentação dos Ministros seria um permissivo para que executasse a pena já a partir da segunda instância. Entretanto, em confronto a tal raciocínio, afirma-se, na doutrina, que ainda que inexista efeito suspensivo, a formação da coisa julgada é obstada pela interposição do recurso, só havendo o trânsito propriamente quando se encerra as possibilidades recursais, de acordo com as lições de Lima (2017, p. 49).
Mesmo que tenham sido levantados fundamentos normativos, observa-se que foi marcante o uso de argumentos consequencialistas baseados na eficiência do processo penal. Dessa forma, foram comuns as referências à ponderação entre os princípios da presunção de 77 inocência e o da eficiência do sistema penal, como forma de se alcançar um equilíbrio no sistema de justiça criminal. É nesse ponto que se situa o questionamento em relação à legitimidade de uma leitura da norma constitucional a partir de critérios pragmáticos, de modo a contorná-la para se alcançar, em tese, uma maior eficiência do processo. Entende-se, conforme a maior parte dos doutrinadores pesquisados, não ser legítimo esse tipo de interpretação que, de encontro ao texto normativo, vise alcançar determinado resultado, numa tentativa de instrumentalização do direito, levando-se em conta ainda tratar-se da seara penal, na qual o princípio da legalidade assume especial relevância.
Foi possível observar, a partir da análise das posições doutrinárias, uma significativa preponderância entre aqueles que adotaram uma postura de crítica à decisão proferida no julgamento do HC 126.292/SP, sendo contrários, portanto, à possibilidade de execução antecipada. Dentro desse contexto, notou-se também que aqueles se posicionaram favoravelmente não são vozes eminentemente conhecidas na doutrina nacional, mas membros de instituições como a Magistratura, no caso de Fernando Barbagalo, e o Ministério Público Federal, no caso de Galtiênio Paulino. Nesse sentido, nas pesquisas efetuadas, somente observou-se o livro “Presunção de Inocência e Recursos Criminais Excepcionais” (2015), de Barbagalo e o artigo “A execução provisória da pena e o princípio da presunção de inocência”, de Paulino como favoráveis à execução provisória, conforme exposto no tópico 3.3. Fez-se menção a esse fato para mostrar que não há uma divisão propriamente equânime da doutrina sobre o tema, de modo que a grande parte se posiciona contrariamente à possibilidade de execução da pena a partir do acórdão de segundo grau.
Por fim, menciona-se que a questão voltou novamente à pauta do Supremo, especificamente no julgamento das ADCs 43, 44 e 54, ocasião na qual a Corte decidiu pela impossibilidade de execução provisória, de modo que o réu somente pode permanecer preso antes do trânsito em julgado de forma cautelar. Dessa forma, entendeu-se que a interpretação do artigo 5º, LVII, da Constituição leva à necessidade de transcurso do trânsito em julgado para que a pena possa ser executada, de modo que a atividade investigatória e a busca por eficiência no processo penal não pode suplantar o princípio da presunção de inocência.
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