The Effectiveness Of Remission By Reading And Its Importance For Prison Education
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7154440
Sandro José Gomes1
Neuma Maria Gomes do Nascimento2
Suely Aldir Messeder3
1Pedagogo, Doutor em Psicologia. Gestor de Unidade Prisional.
2Pedagoga, Técnica em Assuntos Educacionais na rede federal de ensino de Maceió, Mestranda em Educação pela UNIT/Sergipe.
3Graduada em Ciências Sociais, Doutora em Cuestions de Filosofia. Professora titular da Universidade do Estado da Bahia -UNEB.
RESUMO
Este estudo analisa uma intervenção realizada no projeto de remição por leitura em implementação no Conjunto Penal de Paulo Afonso, no interior da Bahia. Seu objetivo foi investigar a proposta de formação de uma consciência crítica baseada na Educação em Direitos Humanos entre os presos e presos do estabelecimento penal por meio da leitura e produção de textos em consonância com a legislação vigente para remição de pena através da leitura. No tocante a metodologia a pesquisa será exploratória, descritiva e de natureza qualitativa e consistirá inicialmente numa pesquisa bibliográfica e documental no qual serão analisados documentos que possibilitam compreender a caracterização e funcionamento da remição por leitura e os mecanismos adotados para implementação da mesma, tais como o Projeto de Intervenção, Notas e Orientações Técnicas vigentes no Sistema Prisional e Relatório Trimestral de Acompanhamento das Atividades Educacionais. Os resultados encontrados evidenciam que a leitura é uma prática educacional que ainda não recebe a mesma relevância que outras formas de remição de pena. Embora na intervenção estivessem previstos mecanismos que levavam em os diferentes graus de letramento, alfabetização e escolarização da pessoa privada de liberdade estes não funcionaram plenamente por falta de apoio dos trabalhadores prisionais. A discussão centrou-se na percepção que a intervenção articulou a leitura e produção textual a temáticas vivenciadas na prisão, na perspectiva da Educação em Direitos Humanos tais como questões de gênero, racismo e sexualidades. Por consideração final, é apontado que as práticas pedagógicas sugeridas na intervenção para o uso da leitura e produção textual entre os alunos e alunas participantes da Remição por Leitura fomentam o respeito, a tolerância e a igualdade de gênero entre os presos e presas e a redução de comportamentos de violência.
Palavras-chave: Remição. Leitura. Produção Textual. Educação
ABSTRACT
This study analyzes an intervention carried out in the Remission by Reading Project being implemented in the Conjunto Penal de Paulo Afonso, in the interior of Bahia. Its objective was to investigate the proposal for the formation of a critical conscience based on Human Rights Education among prisoners and prisoners of the penal establishment through the reading and production of texts in line with the current legislation for the remission of sentence through reading. Regarding the methodology, the research will be exploratory, descriptive and predominantly qualitative in nature and will initially consist of a bibliographic and documentary research in which documents will be analyzed that make it possible to understand the characterization and functioning of the redemption by reading and the mechanisms adopted for its implementation, such as the Intervention, Notes and Technical Guidelines in force in the Prison System and Quarterly Report for Monitoring Educational Activities. The results found show that reading is an educational practice that still does not receive the same relevance as other forms of penalty remission. Although the intervention provided for mechanisms that led to different degrees of literacy, literacy and schooling of the person deprived of liberty, these did not work fully due to lack of support from prison workers. The discussion focused on the perception that the intervention linked reading and textual production to themes experienced in prison, from the perspective of Human Rights Education such as gender, racism and sexualities. As a final consideration, it is pointed out that the pedagogical practices suggested in the intervention for the use of reading and textual production among students participating in Remission by Reading Project encourage respect, tolerance and gender equality between prisoners and of violent behavior.
Keywords: Redemption. Reading. Text production. Education
INTRODUÇÃO
O objetivo deste estudo foi investigar uma intervenção, realizada no projeto de remição por leitura do Conjunto Penal de Paulo Afonso em consonância com a legislação vigente, fundamentada na proposta de formação de uma consciência crítica entre os presos e presos do estabelecimento penal, sustentada na Educação em Direitos Humanos por meio da leitura e produção de textos.
A intervenção no projeto de remição por leitura analisado neste estudo é parte das atividades desenvolvidas na implantação do Projeto de Pesquisa selecionado no Estágio Pós-doutoral do Programa de Pós-Graduação em Crítica Cultural da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) intitulado: Leitura e produção textual na reflexão sobre a vitimização, relações de gênero, raciais, e sexualidades na prisão: interfaces com a educação prisional em estabelecimento penitenciário no semiárido baiano, o qual foi aprovado para execução pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UNEB, sob CAAE: 59501222.4.0000.0057.
A pesquisa partiu das seguintes premissas:
- A leitura amplia a capacidade de percepção e atribuição de significados na prisão;
- A remição por leitura é um reconhecido instrumento de fomento a leitura e produção textual para pessoas privadas de liberdade no Brasil;
- Um projeto de remição por leitura ao ser implementado deve considerar os diferentes níveis de letramento, alfabetização e escolarização das pessoas privadas de liberdade;
- Um projeto de remição por leitura para ter efetividade deve articular a leitura e
produção textual a temáticas vivenciadas na prisão, pois as percepções e significados atribuídos à prisão por parte dos seus usuários influenciam o comportamento destes (ALBUQUERQUE, CAVALCANTE E FERREIRA, 2020)
A justificativa deste estudo, do ponto de vista acadêmico, diz respeito ao fato que pesquisa sobre o nível de letramento das pessoas privadas de liberdade ainda é um tema que requer maiores aprofundamentos em função das constantes mudanças na legislação e propostas de intervenções para esta população. A pertinência social diz respeito a possibilidade de compreender mecanismos que viabilizem a formação de uma consciência crítica por meio da leitura e produção de textos, conforme a proposta defendida na intervenção, possibilitando compreender até que ponto os participantes da remição por leitura são levados a refletir através de textos literários sobre questões do cotidiano da prisão.
2 NÍVEIS DE ALFABETISMO/LETRAMENTO
De forma genérica o letramento constitui-se nas práticas de leitura e escrita e neste sentido deve ser considerado que a leitura e a escrita possibilitam a autonomia e o protagonismo dos alfabetizandos, englobando uma concepção crítica de inserção na sociedade através de sua transformação; pois o letramento é um elemento de sobrevivência e de garantia de direitos, abrangendo práticas educativas includentes e emancipatórias (PERTUZATTI & DICKAMNN, 2019); portanto, “os estudos que abordam os letramentos e a crítica cultural estão relacionados a um projeto de emancipação do sujeito” (VIEIRA & SOUZA, 2022, p. 297).
O letramento está presente em todas as instituições constituintes da sociedade e vincula-se ao campo da crítica cultural (VIEIRA & SOUZA, 2022).
Quanto aos aspectos conceituais, Pahl & Rowsell (2005) consideram o letramento como uma questão ideológica em função de seu aspecto social e político; por outro lado, Hasan (1996) e Halliday (1996), mesmo admitindo a existência de aspectos políticos, sociais e cognitivos envolvidos no letramento, veem esse fenômeno como linguístico; por outro lado, numa síntese de perspectivas, o letramento pode ser definido como um conjunto de práticas sociais que usam a leitura e a escrita em eventos relacionados com uso, função e impacto social da escrita, ou seja, o letramento é “um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia em contextos específicos, para objetivos específicos” (KLEIMAN, 1995, p.19).
Terra (2013) e Souza (2022) apontam uma relação entre letramento x escolarização, mostrando que quanto mais longo o processo de escolarização quanto mais as pessoas participam de eventos e práticas escolares de letramento, melhores desempenho apresentam nos eventos e práticas sociais que envolvem a leitura e a escrita, explicitando a existência de diferentes níveis de letramento. Neste sentido, Terra (2013, p. 51) apresenta, de acordo com o INAF Leitura e Escrita 2005, a descrição dos níveis de alfabetismo funcional em relação às habilidades de leitura e escrita.
Analfabeto: não consegue realizar tarefas simples que envolvem decodificação de palavras e frases;
Nível 1– Alfabetismo nível rudimentar: corresponde à capacidade de localizar informações explícitas em textos muito curtos, cuja configuração auxilia o reconhecimento do conteúdo solicitado. Por exemplo, identificar o título de uma revista, em um anúncio, localizar a data em que se inicia uma campanha de vacinação ou a idade a partir da qual a vacina pode ser tomada;
Nível 2– Alfabetismo nível básico: corresponde à capacidade de localizar informações em textos curtos (por exemplo, em uma carta reclamando de um defeito em uma geladeira comprada, identificar o defeito apresentado; localizar informações de textos de extensão média); e
Nível 3– Alfabetismo nível pleno: corresponde à capacidade de ler textos longos, orientando-se por subtítulos, localizando mais de uma informação, de acordo com condições estabelecidas, relacionando partes de um texto, comparando dois textos, realizando inferências e sínteses.
Neste sentido, Soares (2022) afirma que a entrada da criança ou do adulto analfabeto no mundo da escrita ocorre simultaneamente pela alfabetização (aprender a ler e a escrever) e pelo letramento (habilidade de compreender e fazer uso da leitura e da escrita em diferentes contextos), não sendo possível dissociar um processo do outro. Desta forma, embora a alfabetização seja o processo específico e indispensável de apropriação do sistema de escrita, a conquista dos princípios alfabético e ortográfico que possibilitem ler e escrever com autonomia e o letramento seja o processo de inserção e participação na cultura escrita, tais práticas são indissociáveis, interdependentes e simultâneas.
3 REMIÇÃO POR LEITURA
As práticas de leitura e escrita estão correlacionadas com as condições sóciohistóricas e culturais em que os sujeitos produzem tais práticas; ou seja, a leitura e a escrita são práticas sociais, portanto, não existem por si sós, independentemente dos sujeitos que as usam em suas atividades cotidianas. Ademais, a leitura tem o poder de influenciar nas atitudes e comportamentos das pessoas. Neste sentido, mesmo no contexto de privação de liberdade as pessoas ali inseridas produzem práticas de leitura e escrita, considerando que
Na prisão, ler significa um modo de ter contato extramuros, de estabelecer ou manter vínculos de afeto ameaçados pelo isolamento no estabelecimento prisional, assim como de acompanhar a própria situação jurídica e, com base nessas informações, projetar o próprio futuro após o encarceramento…Outro aspecto central é a afirmação da leitura como direito humano, na medida que esta prática social em sociedades letradas é um elemento de exclusão social. Hoje em dia, em sociedades letradas, saber ler permite maior autonomia na realização de atividades básicas do cotidiano, assim como de acessar outros direitos
(GODINHO & JULIÃO, 2021, p. 04).
Apesar da importância das práticas de leitura e escrita na prisão, até 2011 somente atividades de trabalho garantiam remição de pena; somente com a Lei nº 12.433/2011 estabeleceu-se a remição de pena pelo estudo e um ano depois, passou-se a reconhecer atividades educativas não formais, inclusive a leitura, como passíveis de remição de pena pelo estudo (GODINHO & JULIÃO,2021; IZABEL & SANTOS, 2021; JÚNIOR, 2022).
A remição por leitura surgiu no ordenamento brasileiro em 2012 através de uma lei estadual do estado do Paraná, como forma de complementação da remição por estudo, assim, considerando o êxito nos presídios paranaenses, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Recomendação de nº 44/2013 disciplinando a forma procedimental e o incentivo da adoção de tal instituto nos estabelecimentos prisionais, o que já vinha sendo adotado por diferentes estados (IZABEL & SANTOS, 2021).
Godinho e Julião (2021) chamam a atenção para o fato que projetos e programas educativos foram criados por secretarias estaduais de educação e/ou segurança pública voltados à leitura no sistema prisional para fins de remição de pena dos estados do Paraná, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Maranhão e São Paulo; todavia os autores ressaltam que em partes destes estados a remição pela leitura está em descompasso com o nível educacional da população prisional, pois a maioria é pouco escolarizada, sendo a seleção de livros um ponto em comum nas leis estaduais.
No ano de 2012, a Corregedoria-Geral da Justiça Federal e o Depen publicaram a Portaria Conjunta 276, que disciplinou o Projeto de Remição pela Leitura no Sistema Penitenciário Federal, a qual fixou que o pagamento de pena se daria em 4 (quatro) dias remidos para cada resenha, porém inovando ao limitar em 12 (doze) obras lidas e avaliadas, considerando que o limite de tempo remido pelo custodiado seria de até 48 (quarenta e oito) dias, no prazo de 12 (doze) meses. Esta portaria que disciplinou a remição de pena pela leitura pela primeira vez no Brasil também definiu como regras a participação voluntária do detento, a disponibilização ao participante de um exemplar de obra literária, clássica, científica ou filosófica, dentre outras; conforme as obras disponíveis na Unidade; o prazo de 21 a 30 dias para a leitura da obra, com apresentação de uma resenha sobre o tema ao final do período; dentre outras (GODINHO & JULIÃO,2021; IZABEL & SANTOS, 2021; JÚNIOR, 2022).
Em 2020 com a Nota Técnica n.º 1/2020 o Departamento Penitenciário Nacional apresenta orientação nacional para fins da institucionalização e padronização das atividades de remição de pena pela leitura e resenhas de livros no sistema prisional brasileiro, além de marcar a necessidade de lançamento de Programa Nacional de Remição de Pena pela Leitura no Brasil. Em novembro de 2020, o Conselho Nacional de Justiça publicou as Portarias nº 204 e 205, criando grupo de trabalho para elaborar e propor Plano Nacional de Fomento à Leitura nos estabelecimentos de privação de liberdade e Plano Nacional de Fomento aos Esportes no sistema prisional. Em 10 de maio de 2021, o Conselho Nacional de Justiça aprovou a Resolução nº 391, revogando a Recomendação nº 44/2013 e estabelecendo procedimentos e diretrizes a serem observados pelo Poder Judiciário para o reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas sociais educativas em unidades de privação de liberdade.
No tocante a efetividade dos Projetos de Remição por Leitura nas unidades prisionais a literatura da área (GODINHO & JULIÃO,2021; IZABEL & SANTOS, 2021; JÚNIOR, 2022; SILVA TORRES, JOSÉ, SANTOS, 2021; VOLLES & NAATZ, 2021) aponta para necessidade de estratégias para superar alguns obstáculos tais como o baixo nível de escolaridade da população prisional, considerando que conforme relatório divulgado pelo DEPEN (2021) 42,7% da população prisional do país constitui-se de pessoas analfabetas ou com ensino fundamental incompleto; ausências de bibliotecas ou espaços de leitura e outras deficiências de infraestrutura, e escassez de profissionais dispostos e preparados para atuar nesta forma de ressocialização prisional.
4 MÉTODO
A pesquisa foi exploratória, descritiva e de natureza qualitativa e consistiu numa pesquisa bibliográfica e documental.
A pesquisa documental é simultaneamente técnica de coleta, análise de dados e método de pesquisa cujo objeto de investigação, o documento, pode ser utilizado como fonte de informações, indicações e esclarecimentos que contribuam com seu conteúdo para elucidar determinados problemas e servir de evidência para outros, de acordo com o interesse do pesquisador; permitindo a produção ou retrabalho do conhecimento e a criação de outras formas de compreender fenômenos, interpretar fatos, sintetizar informações, determinar tendências e, conforme as possibilidades, fazer inferências (ANA & LEMOS, 2018; CASCAES & ROSA, 2018; SALGE, OLIVEIRA & SILVA; 2021).
Neste sentido, “a pesquisa documental tem apresentado relevância nas pesquisas em educação” e “se apresenta, muitas vezes, como uma técnica complementar de coleta de dados” (SALVATORI, GOMES & CORDEIRO,2022, p.
178); pois “as fontes da pesquisa documental supõem materiais que ainda não passaram por um ―tratamento analítico; e mesmo as que passaram, mas que aceitam novas abordagens, novos olhares, novos manuseios”(SALGE, OLIVEIRA & SILVA; 2021, p. 132).
Ao tratar da escolha do documento JUNIOR et al.(2021) diz que o pesquisador não pode centrar o foco, apenas, no conteúdo, embora o conteúdo seja relevante, aspectos como o contexto, a utilização e a função dos documentos não podem ser ignorados. Desta forma,
Uma vez reunidas as fontes documentais, vem o momento de sistematizálas, isto é, de lidar com os documentos com intenções de decodificação, análise e interpretação preestabelecidas… O pesquisador deve estar atento aos conceitos-chave e à lógica interna do texto, com foco na compreensão do sentido do termo empregado pelo autor
(SALGE, OLIVEIRA & SILVA; 2021, pp.135-136)
Portanto, neste artigo, a análise documental foi utilizada como técnica de processamento de dados, com o objetivo de transformar a informaçãocontida no projeto de remição por leitura do Conjunto Penal de Paulo Afonso, tornando-a mais compreensível e capaz de correlacionar com outros dados de fontes secundárias, sendo analisados, conforme o quadro1, os documentos descritos abaixo:
Quadro 1– Documentos a serem analisados
Nº | TIPO DE DOCUMENTO | CARACTERIZAÇÃO DO CONTEÚDO |
01 | NOTA TÉCNICA Nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ ORIENTAÇÃO TÉCNICA DMF/CNJ Nº 1 DE 04 DE JULHO DE 2022 SOBRE REMIÇÃO DE PENA PELAS PRÁTICAS SOCIAIS EDUCATIVAS | Manifestação do DEPEN e do CNJ sobre procedimentos quanto às ações de fomento à leitura, à cultura e aos esportes em ambientes de cárcere, integrando a política de educação para o sistema prisional. Orientação Técnica destinada aos Juízos de Execução com vistas à efetiva implantação do direito à remição de pena pelas práticas sociais educativas, conforme Resolução CNJ Nº 391/2021. |
02 | PROJETO DE REMISSÃO POR LEITURA DA UNIDADE PRISIONAL | Descreve a estrutura e funcionamento da Remição por Leitura na Unidade Prisional. |
03 | RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (OUT/NOV/DEZ 2021) | Traz relatos sobre a implementação de projetos e atividades educacionais instalados na unidade prisional durante o período de referência, considerando aspectos como adequação a legislação pertinente e alcance de objetivos. |
04 | RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (ABRIL/MAIO/JUN 2022) | Traz relatos sobre a implementação de projetos e atividades educacionais instalados na unidade prisional durante o período de referência, considerando aspectos como adequação a legislação pertinente e alcance de objetivos. |
05 | RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (JUL/AGO/SET 2022) | Traz relatos sobre a implementação de projetos e atividades educacionais instalados na unidade prisional durante o período de referência, considerando aspectos como adequação a legislação pertinente e alcance de objetivos. |
Assim, foram solicitados pelo e-mail institucional da Direção do Conjunto Penal de Paulo Afonso, que fossem disponibilizados por e-mail documentos referentes a remição por leitura, afixados em mural ou disponibilizado em site institucional; portanto de conhecimento da comunidade carcerária e de acesso público, dos últimos 3 anos.
O critério de inclusão para os documentos foi fazer referência a remição por leitura no sistema prisional e ter aplicabilidade no Conjunto Penal de Paulo Afonso.
O critério de exclusão foi o documento já ter mais de 3 anos de existência ou não ser aplicável ao contexto do Conjunto Penal de Paulo Afonso.
Assim, embora tenha sido solicitado e disponibilizado os Relatórios de Acompanhamento das Atividades Educacionais dos últimos 18 meses, apenas foram incluídos os relatórios do trimestre OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2021, do trimestre ABRIL/MAIO/JUNHO 2022 e do trimestre JULHO/AGOSTO/SETEMBRO 2022; pois os relatórios dos demais trimestres não faziam referência a remição por leitura.
- RESULTADOS
Os resultados são apresentados conforme a sequência do quadro1, acima:
- NOTA TÉCNICA Nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ E ORIENTAÇÃO TÉCNICA DMF/CNJ Nº 1 DE 04 DE JULHO DE 2022 SOBRE REMIÇÃO DE PENA PELAS PRÁTICAS SOCIAIS EDUCATIVAS
A Nota Técnica do Ministério da Justiça e Segurança Pública e Departamento Penitenciário Nacional nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ fundamenta-se na Resolução CNJ nº 391/2021 e tem por finalidade apresentar procedimentos quanto às ações de fomento à leitura, à cultura e aos esportes em ambientes de cárcere, integrando a política de educação para o sistema prisional (BRASIL, 2021).
A nota técnica nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ embasa a orientação técnica DMF/CNJ Nº 1 de 04 de julho de 2022 que dispõe sobre remição de pena pelas práticas sociais educativas. Esta orientação técnica, também citada no Projeto de Intervenção, é um documento que orienta os tribunais no que diz respeito a educação não escolar e as práticas de leitura enquanto atividades para a remição de pena. No tocante a remição por leitura o documento orienta os tribunais a estimular programas de acesso à leitura e institui Comissões de Validação do Relatório de Leitura, apresentando um modelo de Relatório de Leitura, como único documento exigido para comprovação da atividade de leitura da pessoa em privação de liberdade (BRASIL, 2022).
Em tais documentos é reforçado o propósito deevitar qualquer censura orientando que não seja criada uma lista prévia de leituras autorizadas. Outro ponto relevante dos documentos é a garantia que o acesso ao livro e a leitura seja assegurado a toda e qualquer pessoa em privação de liberdade, independente de programa formal e estrutura para esse fim (BRASIL, 2021; BRASIL, 2022).
3.2 PROJETO DE REMISSÃO POR LEITURA DA UNIDADE PRISIONAL
Em linhas gerais, o Projeto por Leitura do Conjunto Penal de Paulo Afonso foi constituído em 2019 seguindo as normas e diretrizes estabelecidas para a leitura no sistema prisional brasileiro na Recomendação n.44/2013 do Conselho Nacional de Justiça, e sofreu uma intervenção no primeiro semestre de 2022, objetivando adequa-se a legislação vigente, assegurando aos internos do Conjunto Penal de Paulo Afonso a leitura de qualquer obra literária, bastando para isso registrar o empréstimo da obra do acervo da biblioteca da unidade, momento a partir do qual terá o prazo de 21 (vinte e um) a 30 (trinta) dias para realizar a leitura, com a apresentação, em até 10 (dez) dias após esse período, de um relatório de leitura a respeito da obra (SEAP, 2022c).
O nível de escolaridade dos internos do Conjunto Penal de Paulo Afonso foi levado em consideração na adoção das estratégias da intervenção, tendo em vista que predominava um elevado nível de analfabetismo (15%) entre os presos e predominância do nível fundamental incompleto (52,20%), conforme tabela 1, abaixo:
Tabela 1- Classificação dos Internos do Conjunto Penal de Paulo Afonso por escolaridade
Assim, fundamentado na Nota Técnica do Ministério da Justiça e Segurança Pública e Departamento Penitenciário Nacional nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ a intervenção encontrou respaldo para adotar medidas em relação ao nível de letramento do participante da remição, que é um dos principais pontos da intervenção, quando em suas diretrizes estabelece que:
Para os casos de pessoas não alfabetizadas, com baixo letramento ou outras dificuldades de escrita, destaca-se que o Art. 5º, §2º e §3º, da Resolução CNJ nº 391/2021, estabelece a necessidade de prever estratégias de auxílio para elaboração do Relatório de Leitura, o qual poderá ser apresentado de forma não escrita (desenhos, representações teatrais, narração oral, entre outros).
(BRASIL, 2021 apud SEAP, 2022c, p. 04).
O Relatório de Leitura não assumirá caráter de avaliação pedagógica, uma vez que o reconhecimento do direito à remição decorre, por analogia in bonam parten às práticas escolares, pela leitura da obra, e não pelo aproveitamento de seu conteúdo…a Comissão de Validação analisará o Relatório de Leitura seguindo os critérios de legibilidade, autoria e clareza…
Quanto ao livro a ser lido o Projeto estabelece que:
o suporte aos leitores de baixo letramento levará em consideração 03 fases descritas a seguir: Fase I: Livros com muita ação e diálogo, com narração sequencial, temas agradáveis e de fácil assimilação, mas que oportunizam reflexão- Ensino Fundamental I;
Fase II: Preferivelmente livros da literatura brasileira, como contos, ficção, aventuras e romances- Ensino Fundamental II;
Fase III: Preferivelmente clássicos da literatura brasileira e universal, elencados como ficção, autobiografias, história, sociologia, política, filosofia e romances, dando-se especial destaque para obras que abordem problemas vivenciadas no contexto prisional como desrespeito aos Direitos Humanos, racismo e questões de gênero – Ensino Médio e Superior.Os leitores da Fase I e Fase II devidamente matriculados no anexo do Colégio Estadual Maria Quitéria de Jesus terão suporte dos seus professores e/ou dos Monitores de Educação, que são internos que possuem um grau de instrução considerado suficiente para dar suporte aos leitores de baixo letramento
(SEAP, 2022c,p. 10)
Em síntese, esta intervenção sofrida pelo Projeto de Remição por leitura no primeiro semestre de 2022 consistiu na:
1- Adequação a legislação vigente;
2- Adoção de estratégias de leitura e escrita levando-se em consideração o nível de alfabetização/letramento;
3- Campanha de Incentivo a doação de livros, notadamente obras com temáticas voltadas ao contexto da prisão;
4-Incentivo a leitura de temáticas específicas ao contexto da prisão( questões de gênero, racismo, sexualidades e violência);
5- Adoção de estratégias para tornar o preso leitor protagonista naimplementação da remição por leitura (presos atuando como monitores responsáveis pelos empréstimos dos livros, acompanhamento dos presos com baixo letramento e sugerindo a aquisição de obras para comporem o acervo da biblioteca da unidade prisional).
6- Adoção de estratégias para minimizar o trabalho dos policias penais talcomo a fixação em cada Pavilhão da Unidade Prisional de listas contendo o acervo de livros e a indicação de monitores ( tendo inclusive remição por este trabalho) responsáveis por emprestar os livros aos presos, levando o livro na cela do preso.
Na composição do acervo da biblioteca do Conjunto Penal de Paulo Afonso procurou-se assegurar a diversidade de autores e gêneros textuais, considerando a diversidade étnico-racial e de gênero, não havendo qualquer forma de censura; sendo também disponibilizado uma relação do acervo da biblioteca em todos os módulos da prisão.
3.3 RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (OUT/NOV/DEZ 2021)
Este relatório foi elaborado por iniciativa da Coordenação de Atividades Educacionais e Laborativas em parceria com a Coordenação de Segurança do Conjunto Penal de Paulo Afonso e como todos os demais relatórios de acompanhamento de atividades educacionais objetiva informar e orientar a comunidade carcerária(presos(as), trabalhadores prisionais, visitadores, familiares, etc.) sobre o funcionamento destas atividades na unidade prisional.
Conforme o que é exposto neste documento “não houve registro, neste trimestre, de um único relatório de leitura; quanto ao registro de empréstimo de livros apenas foi registrado 01 único livro”. Ainda de acordo ao que é abordado neste documento “ a leitura foi a forma de remição que menos recebeu atenção nesta unidade prisional” (SEAP, 2021, p. 02).
3.4 RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (ABRIL/MAIO/JUN 2022)
Elaborado pelo Coordenador de Atividades Educacionais e Laborativas este documento apresenta relatos sobre a implementação de projetos e atividades educacionais instalados na unidade prisional, considerando aspectos como estrutura, funcionamento, adequação a legislação pertinente e alcance de objetivos no período compreendido entre o dia 15 de abril à 15 de junho de 2022.
Este relatório traz especial destaque aos problemas relativos a leitura e escrita da população carcerária e aborda questões diversas pertinentes a ressocialização prisional através de práticas de leitura e escrita.
Os objetivos das atividades e projetos educacionais voltados a leitura e escrita em implementação no CPPA encontram-se seriamente comprometidos…Professores da Escola Prisional trazem relatos de problemas de leitura e escrita dos alunos da EJA prisional em função do comprometimento das atividades educacionais durante a pandemia do COVID e esta Coordenação tem discutido com o corpo docente da Escola Maria Quitéria de Jesus estratégias educacionais que possibilitem amenizar tais problemas… Dentre as propostas foi aprovada a Oficina Direitos Humanos em Verso e Prosa na Sala de Aula Prisional… Também foi encaminhado para aprovação da Direção uma proposta de intervenção no atual Projeto de Remissão por Leitura, apresentada por pesquisador da UNEB e já aprovada por esta Coordenação de Atividades Laborativas, tendo em vista que o Projeto vigente não atende ao previsto na Legislação vigente, e está organizado de forma que somente os internos que já possuem o ensino fundamental completo ou ensino médio conseguem ser contemplados; sendo a procura por esta forma de remição baixíssima.
(SEAP, 2022a, p. 03).
Este relatório aponta também que o Projeto de Remição não estava atingindo o objetivo de oportunizar aos recuperando remir parte de sua pena e ao mesmo tempo ser ressocializado através de ações de fomento ao letramento, justificando a urgência em aprovar a proposta de intervenção em função da importância da leitura e produção textual na prisão.
O relatório informa ainda que o Projeto de Remição vigente naquele período encontrava-se em desacordo com a legislação, pois prévia a existência de lista prévia de livros disponíveis para leitura dos presos.
3.5 RELATÓRIO TRIMESTRAL DE ACOMPANHAMENTO DAS ATIVIDADES EDUCACIONAIS (JUL/AGO/SET 2022)
Semelhante ao documento anterior este relatório da Coordenação de Atividades Educacionais e Laborativas traz relatos sobre a implementação de projetos e atividades educacionais no CPPA, abordando a estrutura, o funcionamento, a adequação a legislação pertinente e o alcance de objetivos no período compreendido entre o dia 15 de julho à 15 de setembro de 2022.
A remissão por Leitura neste relatório recebe uma seção exclusiva, na qual trata do Projeto de Remição já depois da intervenção proposta no trimestre anterior com o objetivo de adequa-se a Resolução CNJ nº 391/2021, aprovada e implementada no início de julho de 2022.
Embora o relatório somente traga detalhes sobre os resultados alcançadas com a remição por leitura referente a pouco mais que 2 meses, conforme o relatório
A intervenção realizada no Projeto de Remição por Leitura apresentou neste curto espaço de tempo resultados animadores como a participação de mais de 100(cem) internos, dentre homens e mulheres, o apoio das professoras da Escola Prisional, o uso de estratégias para possibilitar a leitura dos internos da Escola Prisional que estão no ensino fundamental I e Fundamental II, adequação a legislação atual, inclusive a orientação técnica dmf/cnj nº 1 de 04 de julho de 2022 sobre remição de pena pelas práticas sociais educativas, tendo sua Comissão de Validação do Relatório de Leitura aprovada pelo Vara de Execução Penal da Comarca de Paulo Afonso e o envio dos primeiros relatórios de leitura para a remição da pena. Foi substituído a lista prévia, por campanhas de incentivo a leitura de obras que fomentam o respeito, a tolerância e a igualdade de gênero e a redução de comportamentos de violência, aspectos já abordados em alguns relatórios de leitura
(SEAP, 2022b, p. 04).
O relatório traz ainda informações sobre obras sugeridas pelos presos e presas para aquisição da Unidade Prisional:
Foram apresentadas a esta Coordenação a indicação de 04 obras pelas presas e 02 obras pelos presos com ênfase em temáticas dos direitos humanos, notadamente as questões de gênero, sexualidade e raciais; tais como Cartas para Martin de Nic Stone, tradução Thaís Paiva; Afetos Ferozes de Vivian Gornick, tradução de Jahn Heloisa; O sol é para todos de Harper Lee, tradução de Beatriz Horta; Olhos d’Água, de Conceição Evaristo, Cartas de uma menina presa, de Debora Diniz e Talia, e Técnicas e Políticas de Si Nas Margens, Seus Monstros e Heróis, Seus Corpos e Declarações de Amor: Literatura e Prisão no Brasil Pós-Carandiru de Denise Carrascosa
SEAP, 2022b, p. 04).
O relatório esclarece que:
A intervenção no Projeto articulou a remição por leitura ao EJA prisional e já no início da implementação foram apresentados 11 relatórios de livros da literatura brasileira de alunos da Escola Prisional sendo os relatórios considerados pela Comissão de Validação como trazendo significativas reflexões sobre temas correlatos ao racismo… entre as internas temas correlatos a sexualidades, gênero e violência foram discutido em seus relatórios as/as professores(as) e os membros da Comissão de Validação apontam que as estratégias que estão sendo adotadas para incentivar a leitura de obras que possam viabilizar a formação de uma consciência crítica baseada na Educação em Direitos Humanos entre os presos e presas fomentam o respeito, a tolerância e a igualdade de gênero entre os presos e presas e a redução de comportamentos de violência (SEAP, 2022b, p. 05).
Conforme o relatório a campanha de incentivo a leitura de obras focadas na Educação em Direitos Humanos foi bem recepcionada por presos e presas, os quais apresentaram suas reflexões sobre os temas das obras lidas nos relatórios de leitura.
Os internos, tanto os do gênero masculino, quanto os do gênero feminino em suas resenhas expressam suas opiniões pessoais sobre a violência sexual na prisão, sobre o racismo estrutural presente no sistema prisional, e as relações de gênero e a situação da mulher aprisionada dentre outros temas correlatos aos Direitos Humanos.
(SEAP, 2022b, p. 05).
Em linhas gerais o relatório apresenta um projeto de remição por leitura com efetividade, capaz de promover a reflexão dos presos e presas através da leitura e da escrita.
4 DISCUSSÃO
De acordo com os resultados obtidos nos documentos analisados, a intervenção realizada no Projeto de Remição consistiu na adequação a legislação vigente (Resolução CNJ nº 391/2021), tendo por parâmetro a nota técnica nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ e a orientação técnica DMF/CNJ Nº 1 de 04 de julho de 2022; além da adoção de estratégias quando ao nível de letramento dos internos, quando a escassez de trabalhadores penitenciários, incentivo a temáticas específicas, incentivo ao protagonismo do preso leitor; sendo tais estratégias implementadas objetivando a efetividade da remição por leitura.
Deve ser ressaltado, neste sentido que a nota técnica nº 72/2021/COECE/CGCAP/DIRPP/DEPEN/MJ e a orientação técnica DMF/CNJ Nº 1 de 04 de julho de 2022 são a base da intervenção realizada no Projeto de Remição por Leitura e por esta razão foram amplamente divulgadas entre os trabalhadores prisionais e professores da escola prisional e os envolvidos na remição pela leitura, conforme comunicação circular interna apensa ao Projeto (SEAP, 2022c), ficando evidente que tais notas não apenas estabeleceram parâmetros para a intervenção no Projeto; mas impuseram a necessidade da mesma. Neste sentido, Carvalho (2019) aponta que a legislação adequada ao contexto de uma política pública é de extrema importância para efetividade desta na concretização dos direitos sociais.
No que diz respeitos as estratégias que caracterizaram a intervenção, as estratégias adotadas quanto ao nível de letramento dos internos, além de estarem em consonância com a legislação atual (BRASIL, 2021; BRASIL, 2022) tornam as práticas de leitura e escrita mais acessível para um maior número de pessoas encarceradas. Neste sentido, Melo e Almeida (2021) consideram que a remição por leitura no âmbito da educação prisional contempla todos os níveis de escolaridade.
Tais estratégias foram importantes principalmente para a elaboração do relatório de leitura que da forma como fora concebido na legislação anterior (BRASIL, 2013) excluía a maioria dos presos da participação da remição por leitura, considerando que o relatório de leitura se restringia a uma resenha crítica que configura-se num gênero complexo para o nível de escolaridade das prisões do país (JUNIOR, 2022).
No tocante as estratégias quanto a escassez de trabalhadores penitenciários, embora Gomes (2020) afirme que no sistema prisional da Bahia as atividades de ressocialização são afetas pelo pequeno efetivo de servidores penitenciários, principalmente nas unidades prisionais que são administradas exclusivamente pelo estado (gestão plena); os resultados mostram que alguns aspectos da intervenção no Projeto de Remição por Leitura, tal como a fixação em cada Pavilhão da Unidade Prisional de listas contendo o acervo de livros e a indicação de monitores (escolhidos dentre os presos, tendo inclusive remição por este trabalho) responsáveis por emprestar os livros aos presos leitores foram atitudes simples que garantiram a efetividade da remição por leitura mesmo em um contexto de escassez de servidores.
Em semelhante perspectiva, Júnior(2022), ao abordar a realidade prisional de Minas Gerais, afirma que apesar das deficiências relacionadas a infraestrutura enfrentadas pelos estabelecimentos prisionais, associadas ao reduzido número de profissionais dispostos e preparados para atuar na remição por leitura, é possível a execução de projetos de remição pela leitura lançando mão de determinadas estratégias que permitam aproximar os reclusos do livro e capacitá-los para a escrita.
Em todos os documentos analisados (BRASIL, 2021; BRASIL, 2022; SEAP, 2021;SEAP, 2022a; SEAP, 2022b; SEAP, 2022c) foi ressaltada a importância da leitura e produção textual no contexto da prisão. Neste sentido, Volles e Naatz (2021, pp.216-217) ao tratarem da importância da remição por leitura esclarecem que
Mais que fornecer subsídio para o desenvolvimento pessoal e formativo do preso, nota-se que o incentivo à leitura contribui para o enfrentamento das mazelas do Estado de Coisas Inconstitucional que atinge o sistema prisional brasileiro. Em um ambiente marcado por violações reiteradas aos direitos fundamentais e pela falta de estrutura para a manutenção dos estabelecimentos, o fortalecimento de programas de formação cultural pelo acesso aos livros pode ser um meio de amenizar o impacto do cárcere sobre os apenados…O acesso às obras literárias, ao mesmo tempo, permite a oferta ao preso de uma formação cultural completa, que lhe fornece bases para evitar novas condutas delitivas.
Entendimento semelhante é apresentado por Junior(2022, p. 242):
Guardadas as devidas proporções e considerando a realidade do ambiente carcerário no país, é certamente uma situação nova o fato de que, pela prática da leitura e da escrita, os recuperandos, comumente vistos como sujeitos distantes da educação formal, desenvolvam habilidades de análise, reflexão e comunicação geralmente atribuídas aos sujeitos que conduzem a ação penal. Contudo, mais do que esse “nivelamento” pela via do trabalho intelectual, a superação de entraves individuais que os impedia de se verem como leitores e, em consequência, como resenhistas é muito significativa e funciona como marco em suas trajetórias.
Em síntese a intervenção possibilitou a efetividade do projeto de remição por leitura articulando a leitura e produção textual a temáticas vivenciadas na prisão, na perspectiva da Educação em Direitos Humanos tais como questões de gênero, racismo e sexualidades; tendo adotado estratégias para assegurar a leitura até mesmo dos presos de baixo nível de letramento.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste estudo foi alcançado, ficando evidente que as práticas pedagógicas sugeridas na intervenção para o uso da leitura e produção textual entre os alunos e alunas participantes da Remição por Leitura fomentam o respeito, a tolerância e a igualdade de gênero entre os presos e presas e a redução de comportamentos de violência, viabilizando a formação de uma consciência crítica sustentada na Educação em Direitos Humanos.
Os resultados mostram que os participantes da remição por leitura são levados a refletir através de textos literários sobre questões do cotidiano da prisão, a exemplo da violência sexual, relações de gênero e raciais até ao ponto de expressarem suas opiniões pessoais sobre tais temáticas.
No tocante as limitações do estudo cabe mencionar que a consulta de apenas seis documentos pode não abranger muitos outros aspectos importantes que esclarecem a efetividade da remição por leitura na unidade prisional estudada, considerando que em alguns casos o número de documentos não permite fazer inferências. Outro aspecto que deve ser pontuado é que documentos como relatórios podem trazer informações superestimadas ou mesmo subestimadas sobre determinados fatos, além disso, os relatórios são amostras não representativas dos fenômenos estudados que podem não traduzir a informação real, considerando que neste caso não foram elaborados para fornecer dados para investigações posteriores.
Quanto as contribuições para investigações futuras, deve ser ressaltado que além do seu caráter descritivo, esta pesquisa possui um caráter exploratório que permite a geração de hipóteses a serem testadas em pesquisas futuras, que permitirá trazer mais dados que possam preencher as lacunas deixadas por esta investigação, contribuindo para o aprofundamento do conhecimento das potencialidades e limitações da efetividade da leitura e produção textual nas unidades prisionais através dos Projetos de Remição por Leitura.
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