A CONTRIBUIÇÃO DA TEORIA DOS ATOS DE FALA PARA UM MODELO HABERMASEANO DE AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

CONTRIBUTIONS OF SPEECH ACTS THEORY TO A HABERMASEAN MODEL IN PUBLIC AUDIENCES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7668354


EDGAR MEIRA PIRES DE AZEVEDO¹


RESUMO

Tendo em vista que a transição da modernidade para a pós-modernidade determinou alterações drásticas na sociedade que culminaram na crise do modelo clássico de democracia, pesquisa-se sobre a teoria dos atos de fala e sobre a Democracia Deliberativa de Jürgen Habermas, a fim de se verificar a viabilidade de um modelo de audiências públicas capaz de refletir a perspectiva filosófica de Habermas e de possibilitar uma deliberação verdadeiramente democrática, tomando por base a teoria dos atos de fala. Para tanto, se faz necessário analisar as principais correntes da teoria dos atos de fala, bem como os aspectos fundamentais da filosofia política de Jürgen Habermas, de modo a verificar as possíveis contribuições que a teoria dos atos de fala podem oferecer à construção de um modelo habermaseano de audiências públicas. Realiza-se, então, uma pesquisa de finalidade estratégica, com objetivo descritivo e exploratório, pelo método dedutivo e abordagem qualitativa, por intermédio de procedimentos bibliográficos e documentais. Diante disso, verifica-se a viabilidade de um modelo de audiências públicas pautado nas premissas filosóficas da obra de Jürgen Habermas, bem como que a teoria de atos de fala oferece contribuições substanciais e decisivas para a concretização do modelo proposto.

Palavras-chave: Teoria dos Atos de Fala. Jürgen Habermas. Democracia Deliberativa. Audiências Públicas.

ABSTRACT

Taking account that the transition from modernity to post-modernity has determined drastic changes in society that has culminated in the crisis of the classic model of democracy, research is carried out on the theory of speech acts and on the Deliberative Democracy by Jürgen Habermas, in order to verify the viability of a model of public hearings capable of reflecting Habermas’s philosophical perspective and enabling a truly democratic deliberation, based on the theory of speech acts. The main theoretical tendencies of the theory of speech acts, as well as the fundamental aspects of the political philosophy of Jürgen Habermas, so as to verify the possible contributions that the theory of speech acts can offer to the construction of a habermas model based on public hearings. Then, a research with a strategic purpose, with descriptive and exploratory objective, by the deductive method and qualitative approach, through bibliographical and documentary procedures, is carried out. Therefore, it is verified the feasibility of a model of public hearings based on the philosophical premises of the work of Jürgen Habermas, in which the theory of speech acts has offered substantial and decisive contributions to the realization of the proposed model.

Keywords: Speech Acts Theory. Jürgen Habermas. Deliberative Democracy. Public Hearings.

1. INTRODUÇÃO

A transição da modernidade para pós-modernidade promoveu uma alteração substancial nas relações sociais, as quais enfraqueceram instituições democráticas, em razão da dinâmica e exacerbação do fluxo de informações e inovações decorrentes da globalização.

Com isso, a própria Filosofia foi afetada, uma vez que a concepção da racionalidade solipsista não se mostrou adequada a responder às profundas indagações demandadas pela sociedade, de sorte que um novo paradigma epistemológico foi necessário na busca da retomada do ideário democrático tão almejado.

Nesse contexto, a doutrina do filósofo alemão Jürgen Habermas, lastreada na intersubjetividade a partir da linguagem, provou-se um opção viável e inclusiva para a consecução desse desiderato, uma vez que pautada na pragmática universal da linguagem como forma de torná-la um mecanismo efetivo para socialização a partir da interação comunicacional.

Assim, mister se faz uma investigação acerca dos paradigmas teóricos que inspiraram Habermas, de modo a se sustentar uma proposta de instrumento capaz de propiciar o alcance do ideal democrático com base na teoria desse autor.

Portanto, indaga-se: é possível a configuração de um modelo habermaseano de audiências públicas? As teorias dos atos de fala oferecem alguma contribuição a esse eventual modelo?

Então, o objetivo geral da presente pesquisa é verificar a viabilidade de um modelo de audiências públicas capaz de refletir a teoria discursiva de Jürgen Habermas, bem como analisar se as teorias dos atos de fala se prestam a oferecer contribuições a essa proposta.

Para isso, foram elencados os seguintes objetivos específicos: examinar as principais correntes da teoria dos atos de fala; analisar a proposta de racionalidade comunicativa defendida por Habermas, bem como sua influência na ideia de Democracia Deliberativa sustentada por esse autor, de modo a defender uma proposta de modelo habermaseano de audiências públicas; verificar se a teoria dos atos de fala é capaz de oferecer alguma contribuição para o modelo de audiências públicas proposto.

Parte-se da hipótese de que é possível se conceber um modelo de audiências públicas capaz de concretizar a Democracia Deliberativa defendida por Habermas, de forma que a teoria dos atos de fala contribuem de maneira decisiva para a consagração desse mecanismo.

Logo, para viabilizar o teste da hipótese, realiza-se uma pesquisa de finalidade básica estratégica, objetivo descritivo e exploratório, sob o método dedutivo, com abordagem qualitativa e realizada pelos procedimentos bibliográficos e documentais.

Na segunda seção são analisadas as correntes teóricas fundamentais da Teoria dos Atos de Fala, onde são destacadas as principais características e peculiaridades de cada uma delas.

Já na terceira seção é desenvolvido o exame de aspectos fundamentais da teoria habermaseana, notadamente aqueles que implicam no conceito de Democracia Deliberativa defendido por esse autor, sendo, ainda, proposto um modelo de audiências públicas arrimado na perspectiva do filósofo alemão.

Na quarta seção, procede-se a análise das principais contribuições da teoria dos ato de fala sobre o modelo de audiências públicas proposto.

Ao fim, conclui-se que os objetivos são atendidos e a pergunta central resta respondida com a confirmação da hipótese inicial, restando verificada a viabilidade de um modelo habermaseano de audiências públicas, amparado nas principais premissas da teoria dos atos de discurso.

2.  A FILOSOFIA DA LINGUAGEM – DOS ATOS DE FALA AOS DISCURSOS CONVERSACIONAIS

2.1 JOHN LANGSHAW AUSTIN – O EMBRIÃO DOS ATOS DE FALA

Não é recente o interesse da sociedade, e especificamente da Filosofia, pela linguagem.

Desde o Crátilo, quando Platão pretendeu investigar a origem dos nomes², a linguagem vem sendo objeto de interesse da Filosofia. No entanto, em fase inicial, a linguagem foi tratada, tão somente, como um meio para a representação do estado das coisas tal como postas no mundo, de modo que teria apenas caráter instrumental, servindo como um meio para a consecução do propósito representativo (semântico). Contudo, com o desenvolvimento da Filosofia da Linguagem foi sendo verificado que a linguagem não se reduziria apenas ao aspecto semântico, o que culminou em uma guinada, comumente denominada de virada linguística (ou giro linguístico, linguistic turn), quando a linguagem passou a ser tratada como um fim em si mesmo, ou seja, passou a ser investigada a partir de seu uso e não apenas como meio de representação dos estados das coisas no mundo, o que traduz a vertente pragmática da Filosofia da Linguagem.

É nesse contexto, partindo da concepção idealizada por Wittgenstein, que John Langshaw Austin inaugura a Teoria dos Atos de Fala (The Speech Acts Theory).

Austin inicia sua abordagem reconhecendo que os proferimentos não se restringem à mera descrição dos fatos verificados no mundo pelo falante, isto é, os atos de fala não seriam apenas constatativos. Assim, Austin destaca que certos proferimentos ao serem emitidos vão além da descrição do fato e implicam que ao pronunciar o enunciado o falante está realizando uma ação determinada, o que denominou de proferimento performativo, em alusão ao verbo da língua inglesa to perform (agir, executar), como destacado pelo próprio autor³.

Segundo Austin, os enunciados constatativos poderiam ser verificados por critérios de verdadeiro ou falso, de acordo com o fato representado. Portanto, ao emitir o enunciado “O menino está correndo”, este deverá ser analisado de acordo com a situação representada, ou seja, se, em concreto, o fato ocorreu na exata forma descrita. Por outro lado, os enunciados performativos não podem ser analisados por critérios de verdadeiro ou falso, uma vez que tais proferimentos não se limitam ao aspecto descritivo da elocução, de modo que implicam a realização de uma ação no momento em que proferida a sentença. Dessa forma, ao se enunciar um proferimento performativo o que deve ser analisado é se o mesmo foi malogrado ou não (feliz ou infeliz), o que Austin denominou por “doutrina das infelicidades”. Logo, ao dizer “Batizo este navio com o nome de Rainha Elizabeth” o falante além de descrever a situação fática verificada enuncia que está realizando a ação de batizar.

Dessa forma, para aferir se uma sentença performativa foi malograda ou não, Austin enumera algumas condições necessárias para a análise dessa: (A.1) existência de um procedimento convencionalmente aceito relativamente à emissão de certas palavras, por certas pessoas, e em certas circunstâncias; (A.2) pessoas e circunstâncias adequadas ao procedimento específico invocado; (B.1) o procedimento deve ser executado por todos os participantes de modo correto; (B.2) o procedimento deve ser executado por todos os participantes de modo completo; (┌.1) os participantes devem ter a intenção (sentimentos ou pensamentos) de se conduzirem de maneira adequada e (┌.2) os participantes, subsequentemente, devem conduzir-se de maneira adequada.

Entretanto, Austin constatou que a aparente dicotomia entre constatativos e performativos não subsistiria, uma vez que os enunciados constatativos apresentariam uma dimensão performativa, tendo em vista que ao se descrever um fato o falante pratica uma ação (a própria ação descritiva), ao passo que ao emitir uma sentença performativa o falante mantém relação com um fato determinado, de sorte que os enunciados performativos também contariam com uma dimensão constatativa. A partir daí Austin propôs que sua concepção da linguagem como ação fosse estendida, de modo a alcançar todos os aspectos da linguagem.

Com esse novo enfoque, Austin definiu o ato de fala como a unidade básica de significação, que seria constituído por uma pluridimensionalidade integrada pelos atos locucionários, ilocucionários e perlocucionários. Os atos locucionários, segundo a concepção de Austin, são aqueles que consistem no simples ato de “dizer algo”, ou seja, o mero proferimento de um enunciado qualquer que abarque os elementos fonéticos, fáticos e réticos (sentidos) da linguagem. Por sua vez, o ato ilocucionário é aquele que pressupõe a realização de uma ação determinada ao se dizer algo.

Conforme destacado pelo próprio Austin, os atos ilocucionários são o cerne de sua teoria, o que o levou a denominar a doutrina dos diferentes tipos de função da linguagem de doutrina das “forças ilocucionárias”, as quais seriam responsáveis pela definição do caráter ilocucionário do proferimento. ⁷

Quanto aos atos perlocucionários, estes são definidos como aqueles que provocam, por meio de expressões linguísticas, efeitos sobre os pensamentos, sentimentos ou intenções de outros falantes, ouvintes ou quaisquer outras pessoas. ⁸

Destaque-se que a realização de uma determinada dimensão não é estanque, mas antes integrada, de modo que ao ser proferido um ato locucionário, um ato ilocucionário também é emitido e, a depender dos efeitos causados no plano concreto do participante do ato de fala, um ato perlocucionário também poderá ser verificado.

Com base na Doutrina das Forças Locucionárias, Austin buscou distinguir os atos ilocucionários dos perlocucionários, de modo que os atos ilocucionários, além de convencionais, teriam um propósito distinto (propósito ilocucionário), cujo objetivo precípuo seria comunicacional (linguístico) pautado no sentido e na referência, ou seja, indicar para o ouvinte, o falante ou para qualquer terceiro interessado na emissão, qual a meta pretendida ao se emitir determinado ato de fala (ordem, indagação, promessa, veredicto, asserção…). Por sua vez, os atos perlocucionários não seriam, necessariamente, convencionais, tampouco teriam um aspecto exclusivamente comunicacional, tratando- se, portanto, do efeito que o falante pretende gerar no ouvinte ou em outras pessoas interessadas no proferimento no plano concreto, extralinguístico, o mundo dos fatos (o cumprimento da promessa, a verdade da asserção, a resposta à pergunta…).

Também com base na Doutrina das Forças Ilocucionárias Austin elaborou a primeira taxinomia (classificação) dos atos ilocucionários, os quais foram classificados segundo a força ilocucionária da emissão. Dessa forma, Austin enumerou os atos ilocucionários da seguinte forma: Vereditivos (caracterizados por um veredicto acerca de algo. São atos dependentes de posições de autoridade. Ex.: absolver, declarar culpado, condenar, optar, estimar…); Exercitivos (concebidos como o exercício de poder ou opção por um determinado curso de ação, sendo dependentes de uma relação hierárquica. Ex.: (nomear, aconselhar, suspender, demitir, anular, rebaixar, promover…); Comissivos (se configuram a partir de uma promessa ou alguma forma de assunção de algo. Ex.: prometo, me comprometo, me proponho, concordo, asseguro que…); Comportamentais (os que se referem a comportamentos, atitudes e condutas sociais. Ex.: pedir desculpas, felicitar, elogiar, dar os pêsames, desafiar…) e os Expositivos (aqueles utilizados para expressar opiniões, conduzir debates e esclarecer situações. Ex.: afirmar, negar, identificar, repudiar…).

No entanto, o próprio Austin destacou a provisoriedade e incompletude de sua classificação, o que demandaria um desenvolvimento posterior que o autor não chegou a realizar. Do mesmo modo, ainda que de forma inicial, Austin reconheceu que alguns atos ilocucionários não seriam explícitos, podendo, inclusive, não contar com verbos performativos expressos; contudo, o autor também não chegou a aprofundar a pesquisa dessa problemática antes de sua morte em 1960, legando para outros filósofos o desafio de analisar os atos ilocucionários implícitos ou indiretos.

2.2 A TEORIA DAS IMPLICATURAS DE PAUL GRICE

Herbert Paul Grice foi um dos autores que se dedicou ao exame dos atos de fala implícitos, focando seus estudos não apenas no falante, mas, sobretudo, no ouvinte, de modo que o caráter inter-relacional do fenômeno comunicacional avulta na teoria desse filósofo.

Grice acabou por ampliar a análise dos atos de fala à conjuntura estrutural existente entre falantes e ouvintes o que, embora não rechaçado por Austin, foi objeto de críticas relativas à denominação da teoria austiniana como “Atos de Fala”.

Em rigor, Grice não buscou apenas examinar e tratar dos atos de fala implícitos, mais que isso, o filósofo inglês desenvolveu um método analítico de reconstrução dos elementos implícitos de um proferimento⁹, com o fito de explicitá-los, o que denominou por Teoria das Implicaturas.

Segundo Grice, as intenções do falante devem ser reconhecidas pelo ouvinte, uma vez que um proferimento não se restringe apenas aos aspectos linguísticos da emissão, dependendo, também, de pressupostos extralinguísticos para definição do seu sentido, tais como o contexto, o assunto e a clareza do enunciado¹⁰.

Para Grice, as implicaturas podem ser convencionais ou conversacionais. As implicaturas convencionais seriam aquelas utilizadas para expressar de forma implícita, indireta, o significado pretendido pelo falante, por meio do auxílio de expressões linguísticas, como no exemplo “Ele corre muito, mas não chega a lugar algum”. Nesse enunciado, a conjunção adversativa “mas” implica que mesmo que se dedique bastante, a pessoa referida no enunciado nunca alcança seus objetivos ou então que essa está atuando de maneira equivocada. Percebe-se que a conjunção adversativa em questão faz uma alusão negativa à conduta da pessoa que “corre muito” do exemplo, de modo que gera a compreensão de que essa é incapaz de alcançar seus objetivos.

Por sua vez, as implicaturas conversacionais não decorrem diretamente das expressões linguísticas utilizadas no enunciado, sendo ocasionadas pelo rompimento de determinadas regras conversacionais pré-estabelecidas.

A regra basilar das implicaturas conversacionais formulada por Grice é denominada de “Princípio da Cooperação” ou “Máxima da Cooperação”, lastreada no pressuposto de que falante e ouvinte interagem na busca de um mesmo objetivo comunicacional de entendimento recíproco¹¹. Nesse intento, Grice subdividiu a Máxima da Cooperação em quatro “submáximas”: (1) Máxima da Quantidade, que consiste no dever dos agentes em serem informativos, ou seja, que não forneçam à relação comunicacional nem mais nem menos do que ela requer; (2) Máxima da Qualidade, aquela que impõe que falante e ouvinte sejam verdadeiros, de forma que não enunciem aquilo que acreditam, conscientemente, falso; (3) Máxima da Relação, a que estabelece que só deve ser dito o que guardar relação com o assunto tratado durante o ato conversacional; e (4) Máxima do Modo, que concebe que os agentes da relação comunicacional devem sem claros em suas intenções, rechaçando qualquer tipo de linguagem inacessível.

Assim, estabelecidas as máximas do discurso comunicacional, que no uso cotidiano da linguagem seriam contrafaticamente pressupostas, a implicatura conversacional consiste na ruptura de uma das submáximas, o que leva o ouvinte, de acordo com suas crenças e o contexto comunicacional, a levantar hipóteses interpretativas acerca da intenção do falante. Como exemplo, no enunciado “Passei o dia sentado no banco” restam desobedecidas as máximas da quantidade e do modo, uma vez que o falante diz menos do que a relação comunicacional requer e de forma imprecisa ou pouco clara. Assim, não há como, de imediato, definir se “passei o dia sentado no banco de uma praça” ou se “passei o dia sentado no interior de uma agência bancária”, cabendo ao ouvinte, portanto, interpretar a intenção do falante de acordo com o que ele, ouvinte, conhece e de acordo com o contexto conversacional em que estão inseridos.

Embora de grande relevância, a Teoria das Implicaturas de Grice pouco sistematizou ou inovou efetivamente no âmbito da teoria dos atos de fala, tendo em vista que algumas das premissas adotadas pelo autor, embora inegável o desenvolvimento, já eram reconhecidas, ao menos implicitamente, por Austin.

Contudo, foi John Searle quem, de fato, protagonizou a maior evolução para a teoria dos atos de fala.

2.3 JOHN SEARLE: EVOLUÇÃO, SISTEMATIZAÇÃO E NORMATIZAÇÃO DA TEORIA DOS ATOS DE FALA

Discípulo de Austin, o filósofo inglês John Searle procedeu uma verdadeira evolução sistemática na teoria originalmente formulada pelo seu antecessor.

Apesar da sofisticação do empreendimento conceitual reformulado por Searle, alguns pontos de convergência com Austin são identificados na obra desse autor, como a distinção entre constatativos e performativos; a definição e a diferença entre atos ilocucionários e perlocucionários, além da proeminência dos primeiros; e, ainda, a importância da força ilocucionária para identificação do telos do ato de fala proferido.

Também deve ser destacado um aspecto fundamental na construção teórica de Searle, qual seja, o fato da filosofia da linguagem serleana ser parte de seu projeto maior acerca da filosofia da mente. Neste contexto, alguns elementos fundamentais da filosofia da mente desse autor devem ser destacados para compreensão da teoria dos atos de fala conformada por Searle.

Em seus estudos sobre a Filosofia da Mente, Searle não chega a definir de forma peremptória o que seria consciência em sentido científico ou filosófico; todavia, adota o significado de consciência para o senso comum, de modo que essa consiste nos estados e processos sensíveis, científicos, internos, qualitativos e quantitativos, que iniciam no despertar do sujeito pela manhã e se encerram quando o mesmo adormece novamente, morra ou se torne, de alguma outra maneira, inconsciente¹². Por outro lado, Searle desenvolve diversos conceitos fundamentais, dentre os quais se destacam as ideias de Posição-Padrão, Realismo Externo, Intencionalidade, Rede e Background.

Segundo Searle, a Posição-Padrão consiste na existência de preconcepções cotidianas acatadas, sem maiores dificuldades, pelas pessoas acerca de fatos específicos, como, por exemplo, o fato de que o sol nasce pela manhã. Por sua vez, o Realismo Externo é a constatação da existência de um mundo real apartado do sujeito senciente¹³.

Contudo, o conceito fundamental da Filosofia da Mente de Searle é o de Intencionalidade, que, consoante destacado pelo próprio autor, não corresponde ao termo “intenção” no sentido de desejar, almejar algo¹⁴. Segundo Searle, Intencionalidade (grafado propositalmente com “I” maiúsculo) é um termo especificamente filosófico (Intentionalität) que traduz a projeção da consciência para o mundo, com o desiderato de um determinado fim. Nesse sentido, um exemplo simplório seria o de um sujeito que desejaria a chegada do verão (fim determinado) por odiar dias frios (expressão da consciência no mundo).

Conforme destacado por François André da Silva Marques¹⁵, Searle distingue a Intencionalidade em (a) Intencionalidade Intrínseca, que concebe que a mente representa para si mesma os objetos e os estados de coisas no mundo, independentemente da atuação de outrem; (b) Intencionalidade Derivada, a qual é definida como a que depende de observadores externos, como na hipótese de todas as línguas naturais (inglês, francês, português, só tem significado para quem entende e utiliza tais linguagens); (c) Intencionalidade Aparente ou Metafórica, quando a Intencionalidade expressada não configura uma Intencionalidade verdadeira, mas em sentido metafórico, como na afirmação de que “O aluno tem sede de conhecimento” (sede implica a Intencionalidade de matar a sede, mas não de obter conhecimento); (d) Intencionalidade Individual, que expressa a Intencionalidade do indivíduo em sentido particular (“eu”), como no exemplo “Ele estuda muito para passar em um concurso”; e (e) a Intencionalidade Coletiva, expressa a Intencionalidade lastreada na cooperação entre os indivíduos para a consecução de um fim comum (“nós”), como no caso do enunciado “Economizamos água para evitar o racionamento.”.

Decorrendo do conceito de Intencionalidade, Searle ainda desenvolve o conceito de Rede, que consiste no entrecruzamento de diversas formas de Intencionalidade¹⁶, de modo a possibilitar a satisfação da Intencionalidade manifesta do sujeito. Assim, a Rede traduz a explicitação de diversos fragmentos da Intencionalidade que culminam na Intencionalidade completa. No exemplo de uma pessoa que almeja se candidatar à Presidência do Brasil (Intencionalidade) se pressupõe que o Brasil é uma República, que existem eleições, que o candidato pertence a um determinado partido político¹⁷, tais pressuposições constituem a Rede de Intencionalidades (fragmentos).

Já o Background, ou pano de fundo, constitui o agrupamento de capacidades mentais do sujeito que não são passíveis de representação e que são pré-condições da Intencionalidade, podendo se tratar de Background de Base, como nas hipóteses de andar, correr, comer; ou Background Local, que encerra as práticas culturais localizadas, como os sotaques característicos de algumas regiões do Brasil.

Tais conceitos da Filosofia da Mente de Searle são fundamentais para o entendimento da teoria dos atos de fala de base searleana, tendo em vista que dos conceitos de Rede, Background e Intencionalidade Coletiva decorre a existência daquilo que Searle denominou de Fatos Institucionais, que são aqueles que pressupõem a existência de regras, direitos e deveres, e que são conhecíveis apenas pela mente humana, porquanto dotada de consciência. Exemplos de fatos institucionais são o Direito, o dinheiro, o contrato, as religiões.

O enfoque da Filosofia da Mente de Searle na linguagem reside, justamente, na criação dos fatos institucionais, isto porque a criação desses se dá por meio da linguagem, o que leva Searle a conceber a linguagem como forma de ação humana, sendo este o viés pragmático da Filosofia da Linguagem desse autor.

Valendo-se das ideias iniciais de Austin, Searle foca na sofisticação da teoria dos atos de fala daquele autor e reformula a pluridimensionalidade de tais atos, delineando a existência de atos de enunciação, consistentes na mera emissão de sons, textos, palavras, podendo ou não compor o ato ilocucionário; atos proposicionais, que são os enunciados compostos por uma referência e uma predicação; e os atos ilocucionários, que são os atos completos que englobam o aspecto enunciativo e proposicional, adotando, ainda, o mesmo aspecto ilocucionário desenvolvido por Austin e pautado na força ilocucionária¹⁸.

Searle distingue o ato proposicional do ato ilocucionário por meio dos seguintes exemplos¹⁹:

1. João fuma muito.

2. João fuma muito?

3. Fuma muito, João!

4. Oxalá João fumasse muito.

Na perspectiva de Searle, as quatro frases elencadas possuem o mesmo conteúdo proposicional (“João fuma muito”), onde “João” é a referência e “fuma muito” a predicação.

No entanto, as quatros frases elencadas possuem atos ilocucionários distintos, uma vez que na frase “1” está enunciada uma asserção, na “2” uma indagação, na “3” um comando e na “4” um desejo. Ou seja, na concepção de Searle, a qual não se afasta da perspectiva de Austin, o ato ilocucionário, por meio da força ilocucionária, define a Intencionalidade do falante ao emitir o enunciado por meio de um conteúdo proposicional, de modo que a forma lógica do ato ilocucionário elementar é representada pela fórmula F(p), onde “F” consiste nas expressões da força ilocucional e (p) o conteúdo proposicional da sentença.

Seguindo em sua sofisticada reformulação da concepção de Austin, Searle concebe uma nova taxinomia dos atos de discurso, centrando sua classificação em diversos parâmetros linguísticos e extralinguísticos listados da seguinte forma: (1) Diferenças quanto ao propósito do ato; (2) Diferenças quanto à direção do ajuste entre as palavras e o mundo; (3) Diferenças quanto aos estados psicológicos expressos; (4) Diferenças quanto à força ou o vigor com que o propósito ilocucionário é apresentado;

(5) Diferenças quanto o estatuto ou posição do falante e do ouvinte, no que isso concerne à força ilocucionária da emissão; (6) Diferenças quanto ao modo como a emissão se relaciona com os interesses do falante e do ouvinte; (7) Diferenças quanto às relações com o resto do discurso; (8) Diferenças quanto ao conteúdo proposicional determinadas pelos dispositivos indicadores da força ilocucionária; (9) Diferenças entre os atos que devem sempre ser atos de fala e os que podem, mas não precisam ser realizados como atos de fala; (10) Diferenças entre os atos que requerem e os que não requerem instituições extralinguísticas para sua realização; (11) Diferenças entre os atos em que o verbo ilocucionário correspondente tem um uso performativo e aqueles em que isso não acontece; e (12) Diferenças quanto ao estilo de realização do ato ilocucionário²⁰.

Com base nessa complexa estrutura, pela qual retoma aspectos semânticos, Searle procede a reformulação da taxinomia dos atos de fala de Austin, classificando-os da seguinte forma²¹: Assertivos, aqueles que tem como propósito ilocucionário a afirmação, descrição de uma situação verificada no mundo; Diretivos, os que implicam comandos, pedidos, súplicas (destinados aos interlocutores e não ao falante); Compromissivos, que concernem a uma promessa realizada e direcionada ao próprio falante (o que os distingue dos diretivos); Expressivos, aqueles que traduzem interjeições, saudações e congratulações e, por fim, os Declarativos, os quais concebem que o falante altera a realidade no momento em que profere a declaração (batizado, sentenças judiciais, vereditos…).

Searle ainda amplia a investigação de Austin ao se debruçar sobre os atos de fala indiretos, concebendo-os como aqueles em que um determinado ato ilocucionário é realizado a partir da realização de um outro ato ilocucionário²², como no exemplo “Você está pisando no meu pé!”, no qual o falante, ao emitir a assertiva quanto ao fato do ouvinte estar pisando em seu pé, também emite uma diretiva para que o interlocutor atue no sentido de cessar o ato de pisar o seu pé.

Assim, nos atos de fala indiretos são verificadas duas espécies de atos ilocucionários, a primeira denominada de Ato de Fala Primário não literal, que é o ato implícito àquele efetivamente enunciado, este que, por sua vez, é chamado por Searle de Ato de Fala Secundário literal.

Portanto, a investigação de Searle acerca dos atos de fala indiretos enfatiza ainda mais a retomada semântica realizada por esse filósofo ao reformular a teoria de Austin, de modo que acaba por se afastar da concepção eminentemente pragmática defendida por seu antecessor ao pautar sua sofisticada teoria na Intencionalidade e em outros aspectos extralinguísticos capazes de atuar sobre os atos ilocucionários.

2.4 LÓGICA ILOCUCIONÁRIA E TIPOLOGIA DOS DISCURSOS CONFORME DANIEL VENDERVEKEN

Em 1985, visando dar prosseguimento ao seu projeto de sistematização e sofisticação da teoria dos atos de fala, Searle, em conjunto com o autor canadense Daniel Roger Vandeveken, publicaram a obra Foundations of Illocutionary Logic, na qual buscaram apresentar os princípios de uma teoria lógica dos atos ilocucionários.

Segundo os próprios autores, a tarefa da lógica ilocucionária consiste em estudar toda a gama de forças ilocucionárias passíveis de realização, independentemente de sua conformação com uma língua natural específica23. Tal necessidade decorre do fato de algumas características semióticas (sintáticas, semânticas e pragmáticas) da linguagem serem indispensáveis para o processo linguístico, o que as tornariam transcendentes e universais24. Assim, não importa a forma como um ato ilocucionário é realizado, uma vez que ele possui uma forma lógica que determina seu propósito, ligando-o aos demais atos de fala.

Searle e Vanderveken sinalizam a existência de atos ilocucionários simples, que são indicados pela fórmula básica F(p), onde “F” é o marcador de força ilocucionária e (p) o conteúdo proposicional constituídos por, pelo menos, uma referência e uma predicação. No entanto, os autores reconhecem a existência, inclusive preponderante, de atos ilocucionários complexos, os quais são constituídos da conjugação de um ou mais atos ilocucionários interligados por conectivos ilocucionários (“e”, “mas”), como no caso de uma asserção com vários atos ilocucionários (F1(P1) & F2(P2)), uma denegação ilocucionária (¬F(P)) ou de uma condição (P→F(Q)).

O reconhecimento da força ilocucionária como elemento central e determinante dos atos ilocucionários, sendo capaz de transcender qualquer língua natural, implica, do mesmo modo, o reconhecimento de determinados elementos capazes de conformá-la, tais como: a ordem das palavras do enunciado, o acento tônico, a pontuação, a entoação, o modo do verbo e a presença de verbos performativos. Outrossim, os autores apontam a existência de componentes da força ilocucionária, quais sejam: o objetivo ilocucionário, o grau de força do objetivo ilocucionário, o modo de atingir, as condições sobre o conteúdo proposicional, as condições preparatórias, as condições de sinceridade do ato, o grau de força das condições de sinceridade.

Logo, verifica-se que a lógica ilocucionária proposta por Searle e Vanderveken, além de sofisticada, é mais abrangente que a proposta eminentemente pragmática de Austin, transbordando para uma análise semiótica e dinâmica da força ilocucionária, voltando-se, com vigor, para a busca da significação dos atos ilocucionários, tendo como pano de fundo um background conversacional, consoante elaborado por Searle, bem como um enfoque semântico da força ilocucionária, de modo a coordenar suas ações linguísticas, tenham ou não objetivos conversacionais²⁵.

Diante do reconhecimento e da prevalência, no cotidiano linguístico, dos atos ilocucionários complexos, Vanderveken, partindo da taxionomia dos atos ilocucionários de Searle, desenvolveu uma classificação dos discursos com objetivos conversacionais.

Para a realização desse propósito, Vanderveken considera a existência de atos ilocucionários de primeiro e de segundo nível.

Os atos ilocucionários de primeiro nível são aqueles emitidos por um único locutor no exato momento da enunciação. Por sua vez, os atos ilocucionários de segundo nível ou de nível superior são os emitidos por diversos protagonistas e que demandam tempo para a interação entre todos. Assim, para Vanderveken, os discursos conversacionais são atos ilocucionários desse tipo, os quais exemplifica como aqueles realizados em um processo penal²⁶.

Ainda, para desenvolver sua classificação dos discursos com objetivos conversacionais, Vanderveken recorre às formas de direção de ajuste mencionadas por Searle e Austin, definido quatro tipos de discursos: discursos com objetivos descritivos, discursos com objetivos deliberativos, discursos com objetivos declaratórios e discursos com objetivos expressivos²⁷.

Segundo a classificação de Vanderveken, os discursos com objetivos descritivos possuem direção de ajuste palavra-mundo, porquanto buscam conformar as palavras ao estado de coisas ou situações verificadas no plano concreto do mundo, tais como relatos, histórias, contos, previsões, entrevistas, exposições etc.

Por sua vez, os discursos com objetivos deliberativos servem para deliberar sobre ações futuras a serem adotadas pelos interlocutores, de modo que possuem direção de ajuste mundo-palavra, tendo em vista que visam adequar a perspectiva real àquilo que foi objeto da deliberação, como nas hipóteses de propagandas eleitorais, programas de pesquisa, planejamentos coletivos, negociações de paz.

Os discursos com objetivos conversacionais declaratórios, evidenciam que os interlocutores tentam alterar o mundo pelos atos que emitem, de forma que possuem dupla direção de ajuste, uma vez que objetivam modificar o mundo ao mesmo tempo em que proferem a locução, sendo exemplos as declarações de guerra ou independência, cerimônias de batismo, veredictos do júri²⁸, entre outros.

A última categoria de discurso com objetivo conversacional listada por Vanderveken é a dos discursos expressivos, os quais possuem direção de ajuste nula, pois servem, tão somente, para indicar atitudes comuns dos interlocutores, tais como trocas de saudações, vaias, congratulações, boas-vindas etc.

Vanderveken ainda destaca que durante um ato ilocucionário de segundo nível, portanto um discurso com objetivo conversacional, os interlocutores assumem tanto a posição de falantes quanto de ouvintes, de modo que a interação entre os protagonistas discursivos deve ocorrer por meio da exposição e defesa de seus argumentos, o que deve ocorrer por meio de intervenções.

Segundo Vanderveken, as intervenções também são atos de discurso, mais complexos que os atos ilocucionários de primeiro nível e correspondem à sub-sequências de atos ilocucionários individuais, de modo que interligam o ato ilocucionário superior²⁹.

Vandeverken destaca ainda que os discursos com objetivos conversacionais, assim como os atos ilocucionários elementares, também possuem elementos condicionantes do sucesso de seu propósito conversacional: objetivos discursivos, o modo de realização do objeto discursivo, condições temáticas, condições de fundo (background conditions) e as condições de sinceridade.

Os objetivos discursivos são aqueles visados pelos interlocutores ao iniciarem a relação conversacional, como na hipótese de apresentação de uma aula onde o professor busca o envolvimento dos alunos nas discussões temáticas. Em relação ao modo de realização do objetivo discursivo, denota-se que o mesmo discurso conversacional pode ser realizado de diversas formas; de maneira que entrevistas de emprego e inaugurações demandam discursos formais, enquanto que a prova de determinado teorema determina um discurso técnico.

As condições temáticas são aquelas que impõe condições ao desenvolvimento do tema discutido, como no caso da deliberação de um júri que deve restringir sua deliberação à absolvição ou condenação do acusado. Por sua vez, as condições de fundo (background conditions) impõe que em alguns discursos conversacionais os interlocutores detenham um prévio conhecimento sobre o que será tratado, como na hipótese do interrogatório de uma testemunha, onde os falantes pressupõem que estão em uma situação formal, na qual constarão um juiz, um advogado de defesa, a testemunha, o promotor de Justiça. Já as condições de sinceridade se dão da mesma forma que em qualquer outro ato ilocucionário, ou seja, são aquelas em que o discurso conversacional reproduz os estados psicológicos intencionais dos interlocutores; assim, os negociadores devem atuar de modo a concretizar a transação correspondente³⁰.

Com base nesses elementos, Vanderveken destaca que o sucesso da lógica dos discursos conversacionais deve desaguar naquilo que denomina de ato mestre de fala ou ato de fala essencial, que consiste nos atos fundamentais ao deslinde do contexto conversacional. Assim, no curso de uma petição inicial, o advogado deve expressar diversos argumentos, mas, ao final, deverá pugnar pela procedência da demanda. Outrossim, destaca Vanderveken, que para a análise do sucesso de um discurso com objetivo conversacional além do êxito do ato mestre de fala, mister se faz que as intervenções fundamentais também sejam exitosas. Assim, em um negociação contratual de compra e venda é necessário que além do ato mestre de fala consistente na celebração do contrato, as intervenções ocorridas durante as tratativas das cláusulas contratuais respectivas também obtenham sucesso.

Com a análise da teoria dos discursos com objetivos conversacionais de Vanderveken, verifica-se a sofisticação evolutiva da teoria dos atos de fala originariamente formulada por Austin, evidenciando-se que na realidade comunicativa contemporânea, marcada pelo dinamismo e complexidade das interações sociais, uma concepção pragmática restrita da linguagem³¹ não se mostra capaz de possibilitar o consenso comunicativo necessário ao entendimento entres os interlocutores, de modo que apenas a partir de uma pragmática de cunho universal, a qual considera todos os elementos semióticos de uma interação, pode se pensar na efetividade de uma interação comunicacional que objetive o consenso entre os envolvidos.

3. JÜRGEN HABERMAS – A RAZÃO COMUNICATIVA COMO FUNDAMENTO DA DEMOCRACIA DELIBERATIVA: POR UM MODELO HABERMASEANO DE AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

3.1 A APREENSÃO DA TEORIA DOS ATOS DE FALA POR JÜRGEN HABERMAS

O filósofo alemão Jürgen Habermas, expoente da 2ª geração da Escola de Frankfurt e adepto da Teoria Crítica, centrou o desenvolvimento de seus estudos na utilização social da linguagem, de modo a verificar a viabilidade de um consenso intersubjetivo a partir do uso performativo dessa.

Habermas partiu das conclusões alcançadas pelos seus antecessores, notadamente Max Horkheimer e Theodor Adorno, os quais, ao fim da década de 40, apontaram a instrumentalização da razão³², entendida como a incapacidade do pensamento em conceber a racionalidade objetiva³³, de modo que a única finalidade da racionalidade, após o desencantamento do mundo, estaria exclusivamente relacionada à consecução de fins predeterminados pela racionalidade subjetiva.

Diante da constatação de seus antecessores, Habermas, dissentindo desses, concebeu a possibilidade de uma razão comunicativa, pautada na socialização da linguagem a partir de uma comunicação intersubjetiva cuja finalidade seria a busca pelo consenso à luz do melhor argumento.

No desenvolvimento dessa perspectiva, Habermas, partindo das teorias linguísticas de Austin e Searle, desenvolveu uma concepção própria da teoria dos atos de fala, de modo que não se mostra exagerado identificar o filósofo alemão como mais um expoente dessa corrente filosófica.

Habermas parte da definição de atos performativos desenvolvida por Austin, reconhecendo que o falante ao dizer algo também pratica uma ação. Todavia, ampliando a definição daquele autor, Habermas distingue o “agir” do “falar”, de modo que o “agir” consubstancia ações em sentido restrito, que corresponde às atividades simples e não linguísticas, caracterizado por ações orientadas para fins (agir estratégico); por outro lado, “o falar” diz respeito aos atos pelos quais um locutor age no sentido de buscar entender- se com outro sobre algo existente no mundo³⁴, por intermédio da linguagem (agir comunicativo).

O autor alemão também apreende o conceito de ato ilocucionário proposto por Austin, sendo esse o que possui um componente linguístico capaz de identificar a intenção subjacente à emissão (componente ilocucionário), o qual só será compreendido a partir do ponto de vista de uma segunda pessoa que renuncie a condição de observador e se imiscua na perspectiva de um participante da interação linguística³⁵. Do mesmo modo, também acolhe o conceito de atos perlocucionários de Austin, os quais são definidos como os efeitos consequenciais no mundo objetivo decorrentes do sucesso do propósito ilocucionário da emissão, atribuindo a esse uma lógica de causa e efeito.

Contudo, a principal adição de Habermas à teoria dos atos de fala diz respeito à forma de avaliação da eficácia do componente ilocucionário no âmbito de uma interação comunicativa.

Valendo-se da classificação orgânica da teoria comunicativa de Karl Bühler, Habermas reconhece três funções semióticas (funções dos signos linguísticos) distintas: a função cognitiva, que consiste na representação de uma estado de coisas; a função expressiva, relativa às vivências do falante e a função apelativa, a qual diz respeito às intenções do agente manifestadas aos destinatários dentro de um contexto normativo próprio³⁶.

Diante disso, Habermas estabelece que para a obtenção do sucesso ilocucionário mister se faz a o reconhecimento de certas pretensões de validade inerentes aos atos de fala, as quais devem ser suscetíveis de comprovação intersubjetiva no âmago de um processo de entendimento que visa o consenso sobre algo no mundo³⁷.

Tais pretensões de validade (ou validez) devem corresponder a cada uma das funções semióticas do modelo orgânico de Bühler, de modo que à função cognitiva corresponde a pretensão de validade da verdade, que pressupõe que os proferimentos emitidos por um falante e um ouvinte numa interação comunicacional podem ser aceitos como verdadeiros³⁸. Por sua vez, a pretensão de validade referente à função expressiva da comunicação é denominada por Habermas por pretensão de veracidade, estando intrinsecamente relacionada às vivências subjetivas do falante, de modo que o emissor ao enunciar um proferimento na interação comunicacional o faz às claras, sem ocultar de si e dos seus interlocutores suas vontades subjacentes³⁹. Há ainda a pretensão de validade referida por Habermas por pretensão de correção ou retidão, a qual relaciona-se com a função apelativa da comunicação, que consiste na pressuposição, pelos falantes, que os argumentos utilizados na interação comunicacional são dotados de justeza em relação aos aspectos normativos vigentes⁴⁰.

Para Habermas, apenas na ação comunicativa é possível encontrar as pretensões de validade referidas, destacando ainda o filósofo alemão que às três pretensões se sobrepõem a inteligibilidade acerca das elocuções, verdadeira condição para a realização de qualquer ato de fala.

Assim, para ser aferido o sucesso ilocucionário da emissão é necessário que todas as pretensões de validade sejam satisfeitas no contexto comunicativo, de modo que havendo dissenso entre os falantes acerca de alguma das pretensões, esse deve ser problematizado no próprio contexto comunicacional para que os atores, por intermédio do discurso e através da argumentação, possam buscar o entendimento sobre a pretensão de validade problematizada.

Como pode ser visto, Habermas sofistica ainda mais a teoria dos atos de fala, inserindo-a em um âmbito comunicacional complexo, de interações linguísticas onde a pragmática da linguagem ganha contornos universais, uma vez que o sucesso ilocutório do ato de fala depende da ocorrência de todas as pretensões de validade criticáveis, as quais correspondem à todas às funções comunicativas do modelo orgânico de Bühler.

Portanto, há de se extrair da presente seção a possibilidade do uso racional da linguagem no âmbito de um processo comunicacional, o que implica reconhecer que Habermas redefiniu a teoria dos atos de fala numa perspectiva procedimental sobre a qual foi edificada toda a construção teórica posterior do autor alemão.

Na próxima seção, passa-se a tratar da ideia de Democracia Deliberativa cunhada por Habermas, bem como da função do Direito no contexto social segundo esse autor, temas fundamentais para a presente pesquisa.

3.2 DEMOCRACIA DELIBERATIVA E A FUNÇÃO DO DIREITO SEGUNDO HABERMAS

Verificada a forma concebida por Habermas acerca da teoria dos atos de fala, passa-se a tratar da ideia de Democracia idealizada pelo filósofo alemão.

Nesse sentido, não será realizado nenhum apanhado histórico sobre a Democracia, uma vez que tal desiderato foge aos limites dessa pesquisa. Em rigor, será tratado o impacto da teoria discursiva na perspectiva política de Habermas, o que culmina em um conceito próprio de Democracia segundo esse autor.

Feitas tais considerações, o primeiro passo desta seção é destacar o modelo dual de sociedade concebido por Habermas.

Para Habermas, partindo-se da posição de um observador “sociológico”, portanto não imerso no modelo que descreve, a sociedade é bipartida em dois módulos distintos. De um lado há o mundo da vida (Lebenswelt) e do outro o sistema.

Mundo da vida trata-se de um conceito apreendido pelo autor alemão a partir da fenomenologia de Edmund Hüsserl, podendo ser definido como o horizonte de sentidos intersubjetivamente compartilhado que serve como pano de fundo para a interação comunicativa. Nesse sentido, urge destacar que o arcabouço temático do mundo da vida, segundo Habermas, possui caráter eminentemente não problemático⁴¹, tendo em vista sua natureza pré-compreensiva e pré-predicativa. Há ainda que se destacar que o mundo da vida, conforme tratado por Habermas, possui duas dimensões distintas e complementares, de modo que a dimensão transcendental pode ser visualizada no manancial pré-compreensivo, não objetivável e anterior do mundo da vida enquanto pano de fundo linguístico dos falantes e, por outro lado, uma dimensão empírica também deve ser destacada, sendo essa o resultado prático da interação comunicativa realizada entre participantes de um mesmo mundo vital e que renovam o arcabouço transcendental não objetivável⁴².

Por sua vez, o sistema é o campo social que visa, precipuamente, o alcance de objetivos exclusivamente perlocucionários, de modo que nesse a linguagem é reduzida a mero meio para a obtenção de fins estratégicos43.

Diante de tais conceitos, Habermas diagnosticou que na transição da Modernidade – onde Mundo da Vida e Sistema se encontravam em harmonia – para a Pós-Modernidade, houve uma exacerbação da especificação interna do Sistema, de modo que as suas instituições passaram a se sobrepor aos manancial próprio do Mundo da Vida, subjugando-o a partir dos subsistemas do Poder e do Dinheiro. Tal fenômeno foi descrito pelo filósofo alemão por “colonização do Mundo da Vida pelo Sistema”, refletindo verdadeira patologia social a ser combatida pelo médio linguístico.

Foi nesse contexto que o filósofo alemão passou a tratar da função do Direito na sociedade, analisando qual o papel que esse, enquanto fato social, desempenharia no embate Mundo da Vida x Sistema.

Em um primeiro momento, ao cuidar do tema na obra Teoria do Agir Comunicativo, Habermas concebeu o Direito como mero propiciador da colonização do Mundo da Vida pelo Sistema, porquanto a partir do engessamento das instituições do Direito proporcionado pela exacerbação sistêmica o Mundo da Vida também seria estratificado. Exemplo claro desse fenômeno pode ser vislumbrado na excessiva burocratização da Administração estatal, característica marcante da crise do Estado de Bem-Estar Social.

Contudo, foi na obra Facticidade e Validade que Habermas aprofundou a análise acerca da função social do Direito, de modo que promoveu verdadeira reviravolta em sua teorização inicial, fincando as bases para um modelo democrático capaz de, ao menos, equalizar o fenômeno da colonização do Mundo da Vida pelo Sistema.

Nesse sentido, Habermas passou a entender o Direito como o regulador da tensão existente entre a sua própria facticidade e sua expectativa de validade, de modo que passou a definir o Direito como ponto intermédio entre o Mundo da Vida e Sistema, os quais, nas sociedades pós-convencionais, influenciam-se mutuamente⁴⁴. Consequentemente, a teoria democrática desse autor perpassa, obrigatoriamente, por essa ideia de Direito, porquanto ser a única capaz de estabelecer os cidadãos, reciprocamente, como autores e destinatários das normas jurídicas.

Nessa ordem de ideias, Habermas analisa as concepções Liberal e Republicana de Estado, concluindo que as mesmas, caso consideradas de modo estanque, são incapazes de fornecer uma teoria democrática condizente com a sociedade hipercomplexa da pós- modernidade.

Conforme analisado pelo filósofo tedesco, o Estado Liberal, fundado na valorização das liberdades individuais enquanto garantias negativas da atuação estatal e, por outro lado, o Estado Republicano pautado na valoração da coletividade representativa da vontade geral e que exige uma ação positiva do Estado, não se mostram suficientes a legitimar o poder político e o Direito na sociedade pós-convencional⁴⁵.

Diante dessa constatação, Habermas defende que a legitimidade democrática só pode ser alcançada se amalgamadas as bases clássicas do modelo estatal, ou seja, se coordenadas as liberdades individuais e a soberania popular em um único processo, a ser realizado por intermédio da busca de um consenso discursivo só passível de alcance por meio da linguagem.

Portanto, sob a teoria discursiva harbemaseana, a democracia legítima só pode ser alcançada a partir de um viés deliberativo/discursivo, que possibilite a participação cidadã na formação do poder político e, por conseguinte, do Direito, de modo que os concernidos possam ser considerados autores e destinatários das normas jurídicas produzidas⁴⁶.

Impende também destacar que o modelo de Democracia Deliberativa abraçado por Habermas guarda distinção daquele idealizado por John Rawls, uma vez que a concepção habermaseana se mostra perene às novas tendências, valores e dinâmicas apresentadas pelo contexto social; enquanto que a teoria igualitária de Rawls, pautada num modelo substancial de democracia, acaba por enraizar a democracia na ótica de um consenso abrangente que sempre buscará refletir os princípios de Justiça acordados pelos indivíduos na posição original. Portanto, enquanto para Habermas a Democracia Deliberativa se mostra aberta aos mais diversos atores e temáticas a qualquer tempo e contexto, em Rawls a deliberação democrática se mostra enfeixada à matérias específicas escolhidas de maneira adrede pelos cidadãos.

Assim, é perceptível, em Habermas, a adoção de um modelo de Democracia Radical, a qual para ser alcançada deve possibilitar acesso amplo aos cidadãos às deliberações políticas que os interesses, devendo ainda estar sempre aberta às novas demandas sociais, considerando não apenas as maiorias, eventuais ou não, mas, principalmente, as minorias cuja representatividade possam ter sido sufragadas em deliberações anteriores.

Conclui-se também que a doutrina de Habermas impõe ao Direito o encargo de propiciar meios suficientes ao exercício da Democracia Deliberativa, de modo a funcionar como uma verdadeira comporta (eclusa) capaz de possibilitar a panaceia para que o mundo da vida também possa exercer influência sobre o sistema.

POR UM MODELO HABERMASEANO DE AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Verificada a noção de Direito sob a perspectiva discursiva, bem como a concepção de Democracia Deliberativa no sentido procedimental defendida por Habermas, passa-se a tratar de um instrumento adequado para a materialização do modelo habermaseano a ser desenvolvido no âmbito do Direito positivo.

Nesse desiderato, adota-se como parâmetro o direito positivo brasileiro, no qual já foram consagrados institutos específicos com intuito de propiciar a aplicação do modelo deliberativo proposto por Habermas.

Nessa ótica, ganham relevo institutos como o amicus curiae, os negócios jurídicos processuais, o saneamento compartilhado do processo, entre outros mecanismos de direito material e processual que visam, pelo menos teoricamente, possibilitar a participação do concernidos na produção das normas jurídicas das quais também serão destinatários.

No entanto, não obstante a existência de outros instrumentos postos pelo ordenamento jurídico brasileiro para a viabilização da proposta de Democracia Deliberativa segundo Habermas, centralizar-se-á a presente pesquisa no exame das audiências públicas, sobretudo por se tratar de instituto jurídico que se mostra capaz de ampliar o leque participativo e, consequentemente, de legitimar as decisões que porventura forem tomadas em sua órbita.

Num primeiro momento será analisada a forma como as audiências públicas estão dispostas no direito brasileiro para, em seguida, demonstrar que o modelo em vigor no Brasil não se mostra adequado à concepção democrática radical defendida por Habermas. Por fim, será proposto um modelo harbermaseano de audiências públicas capaz de tornar viável a proposta de Jürgen Habermas acerca da Democracia Deliberativa.

As audiências públicas são originárias das public hearings do direito inglês bem como das enquête administrative do direito francês⁴⁷.

No Brasil, surgiram, de forma expressa, com a Resolução nº 01, de 23 de janeiro de 1986, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), para as hipóteses de discussão do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). No ano seguinte, foi editada a Resolução CONAMA nº 09/1987 que tratou de regulamentar o procedimento de referidas audiências.

No mesmo ano de 1987, o Regimento Interno da Assembleia Nacional Constituinte, em seu artigo 14, dispôs acerca da possibilidade de realização de audiências públicas em suas subcomissões temáticas⁴⁸.

Já em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, foi possibilitada a realização de audiências públicas nas duas Casas Parlamentares brasileiras, consoante disposto no art. 58, § 2º, II, da Carta da República. Tais audiências são reguladas pelos Regimentos Internos do Senado Federal (artigos. 93 a 95) e da Câmara dos Deputados (artigos 255 a 258)⁴⁹.

De igual modo, a Lei nº 8.625/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público, em seu artigo 27, § 1º, IV, também traz disposição expressa acerca da possibilidade de realização de audiências públicas. No mesmo ano, a Lei nº 8.666/93 – Lei Geral de Licitações e Contratos – também dispôs acerca da realização de audiências públicas, sendo obrigatória quando o valor da licitação superar o montante de R$ 150.000.000,00 (cento e cinquenta milhões de reais). Referida possibilidade foi mantida pelo artigo 21 da Lei 14.133/2021; todavia, não houve nenhuma obrigatoriedade de realização de audiências públicas, mesmo em se tratando de contratos de quantias vultuosas.

Também no âmbito administrativo existe previsão para realização de audiências públicas em hipóteses de contratos de concessões e permissões de serviços públicos, bem como nos casos de parcerias público-privadas, conforme, respectivamente, as Leis nº 8.987/94 e nº 11.079/04. Outrossim, também existe previsão legal no âmbito dos serviços públicos regulados por agências, como no caso do artigo 4º, § 3º, da Lei nº 9.427/96 (que instituiu a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL) e do artigo 19 da Lei nº 9.478/97 (que instituiu a Agência Nacional do Petróleo – ANP).

Destaque-se também o procedimento previsto para os casos de processos administrativos na órbita da Administração Pública, na forma dos artigos 32 a 35 da Lei nº 9.784/99, os quais também possibilitam a convocação de audiências públicas para tratar de matérias relacionadas a esse tema.

No âmbito do controle concentrado de constitucionalidade a Lei nº 9.868/99, que cuida do procedimento relativo à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), e a Lei nº 9.882/99, que diz respeito à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), também prevê a possibilidade de realização de audiências públicas, disposição também seguida pela Lei Complementar nº 100/2000, denominada de Lei de Responsabilidade Fiscal, e pela Lei nº 10.257/2001 – Estatuto da Cidade.

Recentemente, a Lei nº 13.655/2018 incluiu os artigos 26 e 29 no Decreto-Lei nº 4.657/42 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) – os quais também trazem disposições acerca da realização de audiências públicas no âmbito da Administração Pública.

Ademais, existem diversas normas dos demais entes federativos que possibilitam a realização de audiências públicas diante de situações específicas que possam interessar as coletividades como um todo.

No entanto, não obstante a farta legislação que propicia a convocação de audiências públicas no Brasil, verifica-se que a ampla maioria das leis trata as audiências públicas como mero instrumento consultivo ou informativo, de modo que na maior parte dos casos as audiências públicas não possuem qualquer caráter vinculante.

Não fosse só isso, a própria participação no contexto das audiências públicas no Brasil não se mostra adequado a possibilitar a ampla participação cidadã nos casos postos em debate, uma vez que a atuação em tais audiências geralmente se restringe àqueles grupos que detêm interesse estratégico no tema em discussão, de modo que a audiência serve como um simples meio para o alcance do fim almejado.

Do mesmo modo, urge destacar que a própria realização de audiências públicas, em que pese a fartura das disposições legais acima declinadas, mostra-se incipiente no caso brasileiro, existindo Cortes de Justiça locais que, culturalmente, não mostram nenhuma simpatia à realização de referidas audiências, só realizando-as quando o efeito midiático se mostra benéfico a interesses ilegítimos.

Portanto, estreme de dúvidas que a forma como as audiências públicas são tratadas no direito brasileiro as torna carente de efetividade, uma vez que além de não vinculantes não propiciam o caráter democrático deliberativo proposto por Habermas.

Diante disso, urge apresentar uma proposta para um modelo harbermaseano de audiências públicas, o qual deve buscar amparo em algumas máximas fundamentais:

1. Possiblidade de ampla e adequada participação dos concernidos alcançados, direta ou indiretamente, pela matéria posta em discussão;

2. Defesa dos argumentos com base em elementos jurídicos e extrajurídicos;

3. Vinculatividade do órgão julgador às deliberações ocorridas no âmbito das audiências públicas;

4. Possibilidade de revisão das questões deliberadas sempre que o contexto social se mostrar diverso daquele em que foi tomada a decisão anterior;

5. Obrigatoriedade de realização de audiências públicas, com ampla e adequada participação cidadã, sempre que a matéria em discussão se mostrar especialmente relevante para a coletividade.

Em rigor, as máximas propostas não são definitivas, podendo ser ampliadas ou reelaboradas de acordo com os desenvolvimentos doutrinários e legislativos correspondentes.

Na verdade, o que não pode prevalecer é a ínfima importância relegada às audiências públicas, sobretudo pelo fato desse instrumento se mostrar deveras salutar para promover uma Democracia Deliberativa e procedimental, sem a qual o Estado Democrático de Direito não há de subsistir.

Nesse sentido, em que pese se tratar de iniciativa extremamente audaz, e que pressupõe um modelo ideal de democracia, tais aspectos não podem obstar, ao menos, a busca pelo modelo defendido, mormente por ser cada vez mais caro ao Estado Democrático de Direito um perfil inclusivo, participativo e discursivo, de modo a possibilitar que os cidadãos se tornem autores e destinatários das normas jurídicas que irão reger a sociedade.

4. CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DOS ATOS DE FALA AO MODELO HABERMASEANO DE AUDIÊNCIAS PÚBLICAS

Na seção anterior foram propostas algumas premissas fundamentais para se conceber um modelo de audiências públicas capaz de consagrar um instrumento adequado à participação cidadã, de modo a viabilizar a ideia de Democracia Deliberativa defendida por Jürgen Habermas.

Na presente seção, buscar-se-á demonstrar a importância da teoria dos atos de fala para que se efetive o modelo proposto, analisando-se a contribuição de cada autor tratado no início da presente pesquisa para o mecanismo de audiências públicas ora defendido.

Nesse caminho, verifica-se que a contribuição de doutrina de John Langshaw Austin se mostra de hialina clareza, uma vez que um modelo habermaseano de audiências públicas só pode ser concebida se os falantes, no âmbito de referidas audiências, atuarem de maneira performativa, como enunciado primeiramente pelo autor destacado, de sorte que ao enunciarem uma sentença também desvelem uma ação.

Não fosse só isso, a própria teoria da ação comunicativa de Jürgen Habermas é centrada na importância dos atos ilocucionários, classificação que também advém da doutrina de Austin e onde se funda toda a teoria dos atos de fala.

Convém também destacar que Austin, seguindo Wittgenstein, reconheceu a importância da socialização da linguagem e da busca do seu significado a partir de seu uso, de modo a impingir um caráter pragmático à Filosofia da Linguagem.

Portanto, não florescem dúvidas quanto à grande importância e a elevada contribuição de John Langshaw Austin para a proposta da presente pesquisa de construção de um modelo harbemaseano de audiências públicas.

E com Paul Grice não é diferente. Conforme reconheceu o próprio Habermas⁵⁰, a teoria das implicaturas conversacionais de Grice guarda certos paralelos com suas pretensões de validade criticáveis. Isto porque em Grice ganha relevo a figura do ouvinte, bem como o contexto da emissão do ato de fala pelo falante e, ainda, a interpretação empregada pelo ouvinte diante de todo o arcabouço que circunda a interação comunicacional, refletindo, em parte, as pretensões de verdade, veracidade e correção normativa destacadas por Habermas.

Nesse sentido, também se mostra evidente a contribuição de Grice para um modelo harbemaseano de audiências públicas, uma vez que o modelo proposto deve levar em conta toda a interação comunicacional, contextualizada em um determinado tempo e espaço, de modo a garantir que a ampla participação dos concernidos possibilite a resolução de demandas concretas e necessárias para a sociedade.

Por sua vez, de John Searle deve-se enaltecer os conceitos de rede e background, os quais guardam similaridade com a ideia de Mundo da Vida lançada por Habermas, também se constituindo como o pano de fundo linguístico capaz de viabilizar uma interação comunicativa performativa na busca do consenso sobre algo no mundo.

Há ainda que se destacar a formação dos Fatos Institucionais a partir da linguagem, como defendido por Serale, o que mostra verdadeira clivagem com a proposta de audiência pública de matriz harbemasena, uma vez que só assim será possível institucionalizar, de maneira legítima, a política e o próprio Direito.

Do mesmo modo, também atribui-se a Searle o aprofundamento do exame dos atos de fala indiretos, os quais se lastreiam na Intencionalidade do falante e, no âmbito do modelo de audiência pública habermaseano, enaltecem, assim como em Grice, a análise de todo o arcabouço contextual relativo ao tema posto em discussão.

Relativamente à doutrina de Daniel Roger Vanderveken, embora a órbita filosófica desse autor não guarde relação expressa com a Teoria Crítica da qual Habermas é expoente, há uma relação íntima entre as teses defendidas por ambos: a imprescindibilidade do discurso.

Vanderveken defende a existência de atos de fala de segundo nível, os quais são, exatamente, aqueles a serem realizados no âmbito das audiências públicas de cunho harbemaseano.

Outrossim, Vanderveken, assim como Habermas, também adota uma pragmática universal, tanto que em conjunto com Searle buscou a formatação de uma lógica ilocucionária.

Destaque-se ainda, e com grande relevo, que a classificação dos discursos com objetivos conversacionais idealizada por Vanderveken se mostra em perfeita sintonia com a Teoria do Agir Comunicativo de Jürgen Habermas, de modo que a audiência pública de matriz habermaseana jamais poderá prescindir da classificação do autor canadense.

Do mesmo modo, o conceito de ato mestre de fala ou ato de fala essencial também se mostra em sintonia com a doutrina de Habermas, sobretudo por corporificar, materializando, o consenso, objeto precípuo da teoria da ação comunicativa.

Com base na análise acima deslindada, conclui-se que a teoria dos atos de fala contribui de maneira substancial para a consagração de um modelo habermaseano de audiências públicas, uma vez que seu arcabouço teórico se mostra capaz de possibilitar uma ambiência verdadeiramente democrática no âmbito de referidas audiências, no desiderato de propiciar, ao menos em tese, o alcance de uma Democracia Deliberativa de cunho procedimental.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando se iniciou a presente pesquisa foi constatado que a transição da modernidade para a pós-modernidade determinou uma alteração dramática no contexto social, a qual culminou na crise da democracia clássica, o que fez emergir a necessidade de novas perspectivas teóricas capazes de reafirmar o ideal democrático.

Diante disso, a pesquisa teve como objetivo geral verificar a viabilidade de um modelo de audiências públicas capaz de refletir a filosofia política do alemão Jürgen Habermas, bem como se esse poderia encontrar sustentação na teoria dos atos de fala.

Quanto ao objetivo específico relacionado à análise das principais correntes da teoria dos atos de fala, percebe-se que o mesmo foi atingido, uma vez que na segunda seção do trabalho restaram descritas e examinadas as obras de John Lagshaw Austin, Paul Grice, John Searle e Daniel Roger Vanderveken.

O segundo objetivo específico, que consistiu no exame dos aspectos fundamentais da obra de Habermas relacionados à ideia de Democracia Deliberativa defendido por esse autor, também foi atendido, uma vez que foram observados os conceitos da filosofia habermaseanos necessários à construção da Democracia Deliberativa de cunho procedimental idealizada pelo filósofo alemão. Do mesmo modo, concluiu-se pela viabilidade de um modelo de audiências públicas com esteio nas premissas filosóficas defendidas por Habermas.

No mesmo sentido, o terceiro objetivo específico, que visou tratar das contribuições das teorias dos atos de fala ao modelo proposto, também restou alcançado, uma vez que foi observado que todas as correntes da teoria dos atos de fala, ao menos em algum aspecto, são capazes de contribuir para a consagração efetiva do modelo de audiências públicas defendido na presente pesquisa.

A pesquisa partiu da hipótese de que seria possível propor um modelo de audiências públicas que refletisse o arcabouço filosófico de Jürgen Habermas, de modo que contribuição da teoria dos atos de fala seria decisiva para esse desiderato. Durante o trabalho, verificou-se que essa hipótese foi confirmada, uma vez que foi constatado que um mecanismo de audiências públicas de cunho habermaseano, mais que desejável, é imprescindível para retomada de fôlego do ideal democrático. Outrossim, também restou evidenciado que a teoria dos atos de fala amparam de forma substancial a proposta idealizada, porquanto oferece um lastro teórico e filosófico fundamental para a concretização do modelo de audiências públicas defendido.

Assim, o problema de pesquisa restou respondido, sobretudo diante da verificação da possibilidade de consagração de um modelo habermaseano de audiências públicas fundamentado na teoria dos atos de fala.

Quanto à metodologia desenvolvida no trabalho, também observa-se que a mesma foi atendida, uma vez que a pesquisa partiu das premissas teóricas da teoria dos atos de fala, consubstanciado o método dedutivo, cuja a abordagem qualitativa visou examinar a amplitude dessa sobre a filosofia de Jürgen Habermas, além da contribuição para a proposta de audiências públicas defendida no trabalho, sendo realizada pesquisa bibliográfica e documental de acordo com as obras existentes sobre o tema.

Por fim, recomenda-se que novas pesquisas busquem maior aprofundamento na matéria, sobretudo a partir da proposta ora realizada, de modo a se aprofundar ainda mais a possibilidade de uma Democracia deliberativa de cunho procedimental capaz de propiciar a ampla participação cidadã, objetivando que os próprios concernidos possam ser vistos como autores e destinatários das normas jurídicas responsáveis por reger a sociedade pós-moderna.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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²Nesse célebre diálogo, Platão busca investigar a correção dos nomes. Assim, o personagem Crátilo, que se vincula à corrente naturalista da origem dos nomes, defende que os nomes adviriam da própria natureza das coisas em si, como estas estão postas no mundo natural; por outro lado, o personagem Hermógenes, representante da corrente convencionalista, sustenta que os nomes têm origem na representação que os homens, em comum acordo, fazem das coisas como percebidas no mundo natural. Por sua vez, o personagem Sócrates é o intermediário do diálogo entre as duas correntes, o qual, ao final, sem concluir pela preponderância de qualquer das teorias defendidas por Crátilo e Hermógenes, entende que ambas possuem pontos de vistas que devem ser considerados para a correção da origem dos nomes. Importante destacar que, em que pese tal aporia, o diálogo platônico foi capaz de despertar a atenção filosófica para a importância da linguagem, de modo que além de mero marco histórico, O Crátilo é um marco epistemológico inicial acerca da linguagem.
³AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Trad. de Danilo Marcondes de Souza Filho. 1. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 25.
⁴AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Trad. de Danilo Marcondes de Souza Filho. 1. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 30
⁵MARCONDES, Danilo. As armadilhas da linguagem: significado e ação para além do discurso. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2017. p. 70.
⁶MARQUES, François André da Silva. Análise das teorias dos atos de fala de Searle e de Austin: Aspectos fundamentais de um proferimento performativo. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Instituto de Cultura e Arte, Departamento de Filosofia, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2018, p. 42.
⁷AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Trad. de Danilo Marcondes de Souza Filho. 1. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 89.
⁸OLIVEIRA, Manfredo Araújo de. Reviravolta linguístico-pragmática na filosofia contemporânea. 4. ed. São Paulo: Loyola, 2015, p. 159-160.
⁹MARCONDES, Danilo. As armadilhas da linguagem: significado e ação para além do discurso. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2017. p. 90.
¹⁰BEUTLER, Cleonice de Oliveira Santos. A intenção subjacente aos atos de fala. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Centro de Ciências Sociais e Humanas, Departamento de Filosofia, Universidade Federal de Santa Maria. Santa Maria, 2009, p. 24.
¹¹MARCONDES, Danilo. As armadilhas da linguagem: significado e ação para além do discurso. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2017. p. 90.
¹²SEARLE, John R. Consciência e Linguagem. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2021, p. 55.
¹³MARQUES, François André da Silva. Análise das teorias dos atos de fala de Searle e de Austin: Aspectos fundamentais de um proferimento performativo. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Instituto de Cultura e Arte, Departamento de Filosofia, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2018, p. 65.
¹⁴Contudo, urge destacar que a palavra “intenção” com sentido de desejar, almejar algo, é uma das formas de expressão da Intencionalidade destacada por Searle.
¹⁵MARQUES, François André da Silva. Análise das teorias dos atos de fala de Searle e de Austin: Aspectos fundamentais de um proferimento performativo. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Instituto de Cultura e Arte, Departamento de Filosofia, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2018, p. 71.
¹⁶MARQUES, François André da Silva. Análise das teorias dos atos de fala de Searle e de Austin: Aspectos fundamentais de um proferimento performativo. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Instituto de Cultura e Arte, Departamento de Filosofia, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2018, p. 71.
¹⁷MARQUES, François André da Silva. Análise das teorias dos atos de fala de Searle e de Austin: Aspectos fundamentais de um proferimento performativo. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Instituto de Cultura e Arte, Departamento de Filosofia, Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2018, p. 71.
¹⁸SEARLE, John R. Os Actos de Fala – Um Ensaio da Filosofia da Linguagem. Trad. Carlos Vogt, Ana Cecília Maleronka, Balthazar Barbosa Filho, Maria Stela Gonçalves, Adail Ubirajara Sobral. 1. ed. Lisboa: Coimbra, 1981, p. 35.
¹⁹SEARLE, John R. Os Actos de Fala – Um Ensaio da Filosofia da Linguagem. Trad. Carlos Vogt, Ana Cecília Maleronka, Balthazar Barbosa Filho, Maria Stela Gonçalves, Adail Ubirajara Sobral. 1. ed. Lisboa: Coimbra, 1981, p. 34.
²⁰SEARLE, John R. Expressão e Significado. Trad. Ana Cecília G. A. De Camargo e Ana Luiza Marcondes Garcia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 3-11.
²¹SEARLE, John R. Expressão e Significado. Trad. Ana Cecília G. A. De Camargo e Ana Luiza Marcondes Garcia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 19-30.
²²SEARLE, John R. Expressão e Significado. Trad. Ana Cecília G. A. De Camargo e Ana Luiza Marcondes Garcia. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 48-49.
²³SEARLE, John R.; VANDERVEKEN, Daniel. Foundations of Illocutionary Logic. 1. ed. Cambridge: Cambridge University Press, 2009, p. 2.
²⁴VANDERVEKEN, Daniel. Speech Act Theory and Universal Grammar. Revista Internacional de Filosofia, Campinas, v. 30, n. 2, p. 357-381, jul.-dez. 2007. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/manuscrito/issue/view/1002. Acesso em : 02 out. 2021.
²⁵VANDERVEKEN, Daniel. Illocutionary Logic and Discourse Typology. Revue Internationale de Philosophie, Bruxelles, v. 55, n. 2, p. 243-255, jun. 2001. Disponível em: https://www.cairn- int.info/journal-revue-internationale-de-philosophie-2001-2.htm. Acesso em: 01 jul. 2021.
²⁶MELO, Cândida de Sousa; VANDERVEKEN, Daniel. Atos Ilocucionários e Discursos Jurídicos, em português. Aufklärung, v. 6, n. 2, p. 11-46, mai.-ago, 2019. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/arf/article/view/47581. Acesso em: 02 jul. 2021.
²⁷VANDERVEKEN, Daniel. Illocutionary Logic and Discourse Typology. Revue Internationale de Philosophie, Bruxelles, v. 55, n. 2, p. 243-255, jun. 2001. Disponível em: https://www.cairn- int.info/journal-revue-internationale-de-philosophie-2001-2.htm. Acesso em: 01 jul. 2021.
²⁸MELO, Cândida de Sousa; VANDERVEKEN, Daniel. Atos Ilocucionários e Discursos Jurídicos, em português. Aufklärung, v. 6, n. 2, p. 11-46, mai.-ago, 2019. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/arf/article/view/47581. Acesso em: 02 jul. 2021.
²⁹VANDERVEKEN, Daniel. Illocutionary Logic and Discourse Typology. Revue Internationale de Philosophie, Bruxelles, v. 55, n. 2, p. 243-255, jun. 2001. Disponível em: https://www.cairn- int.info/journal-revue-internationale-de-philosophie-2001-2.htm. Acesso em: 01 jul. 2021.
³⁰VANDERVEKEN, Daniel. Illocutionary Logic and Discourse Typology. Revue Internationale de Philosophie, Bruxelles, v. 55, n. 2, p. 243-255, jun. 2001. Disponível em: https://www.cairn- int.info/journal-revue-internationale-de-philosophie-2001-2.htm. Acesso em: 01 jul. 2021.
³¹MARCONDES, Danilo. Em defesa de uma concepção pragmática de linguagem. Gragoatá, Niterói, v. 10, n. 18, p. 11-29, set. 2005. Disponível em: https://periodicos.uff.br/gragoata/issue/view/1755. Acesso em: 01 de jul. 2021.
³²HORKHEIMER, Max. EclipsedaRazão. Trad. Carlos Henrique Pissardo. 1. ed. São Paulo: Unesp, 2015, p. 15.
³³Em termo epistemológicos, a racionalidade objetiva é aquela inerente à representação própria realidade, da forma como está posta no mundo; por outro lado, a racionalidade subjetiva se traduz na representação que o pensamento humano faz daquilo que apreende a partir da realidade objetiva.
³⁴HABERMAS, Jürgen. Pensamento pós-metafísico: ensaios filosóficos. Trad. Lumir Nahodil. 1. ed. Coimbra: Almedina, 2004, p. 79.
³⁵HABERMAS, Jürgen. Pensamento pós-metafísico: ensaios filosóficos. Trad. Lumir Nahodil. 1. ed. Coimbra: Almedina, 2004, p. 81.
³⁶HABERMAS, Jürgen. Teoria do Agir Comunicativo, 1: racionalidade da ação e racionalização social. Trad. Paulo Astor Soethe. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012, p. 479.
³⁷BOTELHO, Marcos César. A legitimidade da jurisdição constitucional no pensamento de Jürgen Habermas. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 49.
³⁸BOTELHO, Marcos César. A legitimidade da jurisdição constitucional no pensamento de Jürgen Habermas. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 51.
³⁹PIZZI, Jovino. O Conteúdo moral do agir comunicativo: Uma análise sobre os limites do procedimentalismo. 1. ed. São Leopoldo: Unisinos, 2005, p 120.
⁴⁰BOTELHO, Marcos César. A legitimidade da jurisdição constitucional no pensamento de Jürgen Habermas. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 52.
⁴¹GÓES, Ricardo Tinoco de. Democracia Deliberativa e Jurisdição: A legitimidade da decisão judicial a partir e para além da teoria de J. Habermas. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 70.
⁴² ARAGÃO, Lucia Maria de Carvalho. Razão Comunicativa e Teoria Social Crítica em Jürgen Habermas. 3. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p, 48.
⁴³GÓES, Ricardo Tinoco de. Democracia Deliberativa e Jurisdição: A legitimidade da decisão judicial a partir e para além da teoria de J. Habermas. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 74.
⁴⁴HABERMAS, Jürgen. Facticidade e validade: Contribuições para uma teoria discursiva do direito e da democracia. Trad. Felipe Gonçalves Silva e Rúrion Melo. 1. ed. São Paulo: Unesp, 2020, p. 212-223.
⁴⁵GÓES, Ricardo Tinoco de. Democracia Deliberativa e Jurisdição: A legitimidade da decisão judicial a partir e para além da teoria de J. Habermas. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 49.
⁴⁶GÓES, Ricardo Tinoco de. Democracia Deliberativa e Jurisdição: A legitimidade da decisão judicial a partir e para além da teoria de J. Habermas. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2013, p. 52.
⁴⁷PAULINO, Virgínia Juliane Adami; SANTOS, Murillo Giordan; SILVA, Laís Sales do Prado e. Audiências Públicas: histórico, conceito, características e estudo de caso. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, v. 15, n. 62, p. 237-257, out.-dez., 2015, Disponível em: http://www.revistaaec.com/index.php/revistaaec/article/view/40. Acesso em: 08 de jul. 2021.
⁴⁸PAULINO, Virgínia Juliane Adami; SANTOS, Murillo Giordan; SILVA, Laís Sales do Prado e. Audiências Públicas: histórico, conceito, características e estudo de caso. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, v. 15, n. 62, p. 237-257, out.-dez., 2015, Disponível em: http://www.revistaaec.com/index.php/revistaaec/article/view/40. Acesso em: 08 de jul. 2021.
⁴⁹PAULINO, Virgínia Juliane Adami; SANTOS, Murillo Giordan; SILVA, Laís Sales do Prado e. Audiências Públicas: histórico, conceito, características e estudo de caso. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, v. 15, n. 62, p. 237-257, out.-dez., 2015, Disponível em: http://www.revistaaec.com/index.php/revistaaec/article/view/40. Acesso em: 08 de jul. 2021.
⁵⁰HABERMAS, Jürgen. Teoria do Agir Comunicativo, 1: racionalidade da ação e racionalização social. Trad. Paulo Astor Soethe. 1. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012, p. 539.


1Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Especialista em Direito Tributário pela Universidade Potiguar (UNP). Bacharel em Direito pela Universidade Potiguar (UNP). Servidor Público estadual (TJRN).