AS PRIMAVERAS DE HUGO JOSÉ LIGNEUL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6827410


Autoria:
Margareth Lopes de Souza


RESUMO

 Buscamos nesta pesquisa apresentar, através de depoimentos orais e arquivos pessoais, uma nova abordagem sobre a vida e carreira de um militar do Exército Brasileiro. Suas memórias divididas entre a família, a infância e profissão, nas décadas de 20 a 70 do século XX, criam condições gerais para entender as transformações sociais ocorridas na sociedade e na corporação militar brasileira, especialmente, a partir dos anos 60. O trabalho se inicia com as discussões pertinentes à problemática da memória em depoimentos orais como os que servem de fontes para a reflexão esboçada. Em Primeiras Palavras, a utilidade para o estudante de história é nosso relato de como chegamos ao objeto de pesquisa. Os dois primeiros capítulos narram as memórias de Hugo Ligneul, sua infância e carreira no Exército Brasileiro. No terceiro capítulo o personagem passa por problemas com os militares, no ano de 1968, ao ajudar o Bispo da cidade de Crateús – CE, Dom Fragoso, na confecção de uma cartilha para alfabetização de adultos, levando-o a exoneração do seu cargo de comando.

Palavras-chave: Ligneul, Exército Brasileiro, Militares, Generais, Crateús.

UMA DISCUSSÃO SOBRE MEMÓRIA

Buscamos nesta pesquisa apresentar, através de depoimentos orais e arquivos pessoais, uma nova abordagem sobre a vida e carreira de um militar do Exército Brasileiro. Suas memórias divididas entre a família, a infância e profissão, nas décadas de 20 a 70 do século XX, criam condições gerais para entender as transformações sociais ocorridas na sociedade e na corporação militar brasileira, especialmente, a partir dos anos 60.

De acordo com Jacques Le Goff, a memória tem como função conservar determinadas informações, que nos remetem a um conjunto de funções psíquicas, às quais os indivíduos podem atualizar informações passadas ou que eles representam como passadas[1]. Para Alessandro Portelli, as lembranças não constituem um núcleo compacto e impenetrável para o pensamento e para a linguagem, mas resultam de um processo elaborado no tempo histórico[2]. Assim, lembrar proporciona a reinvenção de um passado em comum, fornecendo-nos elementos para a compreensão do presente.

 De acordo com Maurice Halbwachs, a memória deve ser entendida sobretudo como um fenômeno coletivo e social, que é estruturado coletivamente e está sujeito a flutuações, transformações e constantes mudanças.  A memória seria uma recriação do passado a partir de quadros sociais definidos por aspectos estruturantes como a língua e a cultura e por aspectos conjunturais como o contexto histórico[3]. Esse processo é concebido num espaço sócio-político historicamente datado, conferindo especificidade e temporalidade à rememoração das representações e dos fatos.

Segundo Henry Rousso, a memória é uma reconstrução psíquica e intelectual que confere uma representação seletiva do passado, que não é apenas aquele do indivíduo, mas de um indivíduo inserido num contexto familiar, social, nacional. Para tanto, Rousso, com Halbwachs, define que toda memória é coletiva e, acrescenta, deve ser compreendida como um elemento primordial da construção da identidade e da percepção de si e dos outros[4]. Deste modo, a memória como fundamento da identidade reporta-se aos comportamentos e às mentalidades coletivas, na medida em que o relembrar individual está relacionado à inserção histórica de cada indivíduo.

Pollak, ao analisar certos conceitos usados com freqüência na história da França, observa que há algumas designações que aludem diretamente a fatos de memória, muito mais do que a acontecimentos ou fatos históricos não trabalhados por construções mnemônicas. Por exemplo, a utilização do termo “anos sombrios”, por parte dos estudiosos franceses ao se referirem ao período de Vichy[5]. Ao mencionarem o período de maior repressão durante o regime militar brasileiro, logo após a decretação do AI-5, historiadores e mídia referem-se a esse período como os “anos de chumbo”. Essas expressões remetem mais a percepções da realidade, do que à factualidade positivista subentendida a tais percepções.

Diante dos diferentes aspectos acerca do papel da memória coletiva, destacamos, além de sua significativa influência na construção das identidades, o seu aspecto de desafiar a história oficial através do resgate de memórias concorrentes. Segundo Le Goff, a memória coletiva pode ser compreendida como um importante elemento na luta das forças sociais pelo poder. A disputa por esse tipo de poder – ou seja, pela posse e pela interpretação da memória – está enraizada no meio do conflito e do jogo de interesses e valores sociais, políticos e culturais do presente.

Tornarem-se senhores da memória e do esquecimento é uma das grandes preocupações das classes, dos grupos, dos indivíduos que dominaram e dominam as sociedades históricas. Os esquecimentos e os silêncios da história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva.[6]

Como exemplo desta disputa de poder, Michael Pollak ressalta que até mesmo as datas oficiais de uma nação são estruturadas do ponto de vista político. Sendo assim, a memória nacional constitui um importante objeto de disputa, onde os conflitos para determinar que datas e quais acontecimentos serão gravados na memória de um povo são comuns em sua vida política. A História Oral, ao privilegiar a análise dos excluídos, dos marginalizados e das minorias, ressaltou a importância de memórias subterrâneas, como denomina Michael Pollak[7]. Para o autor, essas memórias subterrâneas são compreendidas como elementos de subversão do silêncio e elas emergem de maneira quase imperceptível em momentos de crise. Portanto, a memória encontra-se em disputa.

O historiador, por sua vez, escolhe os objetos de pesquisa onde preferencialmente exista conflito e competição entre memórias concorrentes. Assim, com o fim do Regime Militar, a sociedade brasileira vive momentos de rememoração de seu passado recente, dando voz àqueles que tiveram participação ativa no movimento de oposição à ditadura e que estavam excluídos do discurso oficial[8]. A reconstituição da trajetória desse personagem, constrói sua versão desse período da história brasileira. E esse é o caso de Hugo José Ligneul, objeto deste estudo e com quem conversamos horas a fio sobre esse período emblemático do país. De nossas longas conversas, nasceu o estudo que ora apresentamos.

Para tanto, a História Oral cumpre um importante papel na percepção das representações dos atores sociais sobre a própria história. Desta forma, a narrativa oral permite estruturar a história de um país a partir das próprias palavras daqueles que vivenciaram e participaram de um determinado período. Pelas referências dadas por quem testemunha, podemos reconstituir o imaginário de uma época, montar um rico e expressivo painel, já que a realidade é complexa e multifacetada. Paul Thompson afirma que o principal mérito da história oral é que numa maior abrangência que a maioria das fontes, ela permite que se recrie a multiplicidade original de pontos de vista[9].

A utilização das fontes orais recebe, porém, severas críticas por alguns acadêmicos quanto à sua credibilidade. Segundo alguns historiadores, os depoimentos são mencionados como fontes subjetivas por proverem-se da memória individual que, às vezes, pode ser falha e fantasiosa. Entretanto, a subjetividade está presente em todas as fontes históricas, sendo elas orais, escritas ou visuais. Michael Pollak – ao ser indagado a respeito da crítica à história oral como método apoiado na memória, capaz de produzir representações e não reconstituições do real – responde que:

Se a memória é socialmente construída, é óbvio que toda documentação também o é. Para mim não há diferença fundamental entre fonte escrita e fonte oral. A crítica da fonte, tal como todo historiador aprende a fazer, deve, a meu ver, ser aplicada a fontes de tudo quanto é tipo. Desse ponto de vista, a fonte oral é exatamente comparável à fonte escrita. Nem a fonte escrita pode ser tomada tal e qual ela se apresenta.[10]

A veracidade do narrador não é a nossa preocupação, o interessante é saber por que o entrevistado foi seletivo ou omisso, pois essa seletividade certamente tem o seu significado.

A relação estabelecida entre entrevistado e entrevistador é um dos elementos mais ricos na metodologia da História Oral. Esta relação tem colaborado com a produção historiográfica na medida em que relativiza posturas mais rígidas sobre a separação entre sujeito e objeto no campo da pesquisa. Grande parte da força deste procedimento vem do fato de que a utilização do testemunho oral oferece ao pesquisador o acesso a perspectivas e nuances que podem estar fora do seu alcance a partir de outras fontes documentais.

Para Maurice Halbwachs toda memória é socialmente construída, sendo esta construção o resultado de uma reconstituição do passado inserido num quadro de recordações comuns a um determinado grupo histórico, ou seja, o que é lembrado apenas possui sentido em relação a um conjunto do qual se faz parte[11].

De acordo com Giovanni Levi “a época, o meio e a ambiência também são muito valorizados como fatores capazes de caracterizar uma atmosfera que explicaria a singularidade das trajetórias[12].” Segundo o autor, o contexto nos remete a duas perspectivas diferentes. Por um lado, a reconstituição do contexto histórico e social em que se desenrolam os acontecimentos propicia a compreensão, num primeiro momento, do que parece inexplicável e desconcertante. “Portanto não se trata de reduzir as condutas a comportamentos–tipos, mas de interpretar as vicissitudes biográficas à luz de um contexto que as torne possíveis e, logo normais[13].”

Vale esclarecer que o personagem, em estudo, nessa monografia, além de reconstituir, através dos depoimentos orais, o panorama do Brasil do século XX, nos agraciou com muito mais. Hugo José Ligneul arquivou: documentos, fotografias, cartas diários etc. Documentação preciosa, ao que parece, a servir à comprovação da “veracidade de suas histórias”, assim “suas verdades”, arquivadas de maneira peculiar, dariam corpo às suas memórias. No entanto, como afirma Pedro Nava: “É impossível restaurar o passado em estado de pureza. Basta que ele tenha existido para que a memória o corrompa com lembranças superpostas”[14].

O objetivo da nossa pesquisa é narrar as memórias de Hugo Ligneul, por esse motivo, valemo-nos do texto de Georges Gusdorf que afirma:

O memorialista não é um historiador, mas uma testemunha da história. Seu testemunho se limita àquela parte dos acontecimentos em que ele foi espectador ou ator. As coisas vistas passam pela consulta de fontes e arquivos e por testemunhos indiretos. A primeira pessoa do discurso toma a direção e organiza as coisas segundo a perspectiva própria de um indivíduo particular. Já o historiador está determinado pela abstração do seu ponto de vista próprio. Ele reivindica uma objetividade da qual o memorialista está dispensado. Memórias propõem-se a ser crônica pessoal do acontecimento histórico […][15]

Em consonância com as palavras de Philippe Lejeune, reiteramos que:

[…] todo relato de vida não é senão uma reprise ou uma transformação das formas de vida pré-existentes. É uma evidência: mas esta evidência engendra um efeito de transparência. Se isto é ‘natural’ nada se pode dizer a respeito. […] trata-se seguramente de uma forma cultural, historicamente variável, ideologicamente determinada […]. Funções e formas da perspectiva biográfica não são imagens de vida ‘real’, mas construções que revelam a civilização que as produziu[16].

PRIMEIRAS PALAVRAS

Assim que entrei no curso de historia fiquei obcecada por adquirir, a maior quantidade de informações em um mínimo de tempo. Extraia ao máximo o conteúdo das aulas, e trocava informações com alunos de períodos mais avançados. Nessas trocas de informação, tínhamos o hábito de nos vangloriar quanto à aquisição de exemplares de livros antigos e bem conservados, os quais, todos nós, garimpávamos nos sebos da cidade. Nesta ocasião um amigo me mostrou com orgulho seu exemplar do livro “O Capital”, de Marx, impresso no ano de 1968, na Argentina – realmente um material raro no Brasil nos tempos da ditadura militar.

Na mesma semana fui ao sebo, e encontrei uma edição de 1975, do mesmo livro de Marx, só que desta vez, impresso no Brasil. Estava bem conservado e eu revolvi comprá-lo. Mas meu maior interesse, dividia-se entre o valor histórico do livro, por causa do seu ano de edição, e a curiosidade a respeito do seu primeiro dono. Pois essa pessoa teria que ser muito corajosa, para possuir um livro que é taxado como “A Bíblia dos comunistas”, já que nos anos de 1974 e 1975, a fúria dos “militares linha-dura” estava no seu auge.

Levei o livro pra casa, e dei uma olhada em suas páginas, que estavam sem rasuras, ou qualquer tipo de observações. Achei somente, um cartão de papelão vermelho, impresso, e com alguns dados escritos à caneta (usado provavelmente como marcador de livros) como na hora estava sem tempo, pensei em mais tarde investigá-lo com calma.

Três anos se passaram, eu agora estava no sétimo período da faculdade (na época estava no primeiro período), e o cartão ainda estava lá, dentro do livro, na mesma página. Certo dia, estudando fontes históricas, eu me lembrei do objeto, “O Cartão Vermelho”. Lembro-me de que estava em sala de aula, e discutíamos a respeito de fontes históricas, e que, qualquer objeto, por mais simples que pareça, pode nos levar a enormes descobertas.

Acabei me lembrando de que ainda não tinha dado uma olhada direito, naquele tal “cartão vermelho”, achado dentro do livro, O Capital, e pensei em chegar à minha casa e investigá-lo. Naquela mesma noite, ao chegar da faculdade (já passara da meia noite, pois meu curso fica em outra cidade, distante uma hora e meia da minha casa), peguei o cartão de dentro do livro e então li-o cuidadosamente. Nele estava impresso: TORRE PALACE HOTEL – SHN – Q. 04 – Lote A – Fone: 23-3360. End. Teleg.: TORRETEL – Brasília – DF, ou seja, era um cartão de hóspedes de um hotel, localizado no centro de Brasília, bem no Plano Piloto, o numero do apartamento era 1008, e a validade até 23/11, infelizmente não constava o ano, mas, constava o nome do hóspede, “HUGO JOSÉ LIGNEUL”. Imediatamente liguei meu computador e fui procurar esse nome na internet. Abri o GOOGLE e digitei. Para minha alegria, apareceram mais de vinte resultados constando o tal nome completo. Entre muitas páginas relacionadas, meus olhos se voltaram para algumas, onde antes do seu primeiro nome, vinha escrito “Ten. Cel. Eng.” – traduzindo, Tenente Coronel de Engenharia, ou somente Coronel.

De repente aquela sensação, “Eu sabia”, que por traz da leitura daquele livro, naquela época, tinha que ter alguém de muita coragem ou costas quentes. É claro, um militar! Aí, vieram as perguntas: Quem é ele? O que estava fazendo com o livro? Era dele ou confiscou de alguém que prendeu, ou até mesmo torturou? Será que ainda estará vivo? Entre muitas perguntas, uma era a mais apreensiva. Será que este livro era realmente dele, ou somente, acharam este cartão, esse pedaço de papel vermelho e o utilizaram como marcador de páginas? Nesse caso, as hipóteses formuladas estariam todas anuladas.

Comecei a ler os resultados do Google á procura de informações. Encontrei muitos resultados a respeito de histórico militar, da referida personalidade mas, procurei por publicações atuais, já que precisava saber se ela ainda estava vivo. Acabei encontrando o tal nome, citado na relação do Rating da FEXERJ[17], e na Página da CECIP[18], ambas, referentes ao ano de 2009. Resolvi então, enviar um e-mail para a CECIP. Nele me identificava como estudante de história, contava o caso do Cartão Vermelho e pedia o telefone ou o e-mail do Sr. Hugo, ou se poderiam pedir para que ele entrasse em contato comigo.

Fui dormir ansiosa e cheia esperança a respeito de uma resposta positiva. No dia seguinte, já na parte da tarde, abri minha caixa de e-mail e lá estava à resposta da CECIP. Nela dizia que infelizmente, eles não estavam autorizados a fornecer dados de seus membros da assembléia, mas que, se eu enviasse outro e-mail, este seria encaminhado para o Sr. Hugo e ele mesmo poderia me responder. Enviei outro e-mail, desta vez, ele constava, além da história do livro do sebo, também, meus dados pessoas, como: Endereço, telefone e até CPF. Tudo isso para dar mais confiança à minha pessoa, para caso de uma investigação referente à minha idoneidade.

Fiquei aguardando ansiosamente por uma resposta, no entanto, dia após dia, ia ficando sem esperança, já que se haviam passado uns dez dias e nada de resposta.

Seguia minha vida e minhas pesquisas, referentes ao tema da minha monografia de final de curso, o qual era ligado à antropologia da música africana no Brasil. No entanto, sempre, acabava me deparando com um material de pesquisa, que me remetia à política, como: Samba e identidade nacional (na era Getúlio Vargas), e Tropicalismo com ditadura militar. Com isso, fazia leituras, a respeito de música, porém, sempre ligada à política e economia, remetendo minha investigação sempre a um tema muito mais sociológico do que antropológico. Ficava fascinada, ao ler a respeito das musicas de protesto aos governos ditatoriais, e me via, meio perdida em meu tema original. Ao mesmo tempo, aquele militar, o Coronel Ligneul, não me saía da cabeça e, por isso, todos os governos militares acabavam me interessando.

Mas o tempo era curto, já estávamos no mês de maio, e só havia mais um mês para entregar ao menos, dois capítulos do meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso).

Um dia, estava na farmácia perto de minha casa, e meu celular tocou, era mais ou menos, umas onze e trinta da manha, do dia quatorze maio de 2009, atendi, e para a minha surpresa: “Aqui quem esta falando é o Hugo José Ligneul, você queria falar comigo”? Fiquei trêmula, não sabia o que responder, e nem acreditava o que estava ouvindo. Ele me disse:

 _ Adivinha onde eu moro? Eu moro em Teresópolis, aqui na sua cidade. Eu li seu e-mail, mas no momento, não me lembro exatamente desse livro, em todo caso, eu sempre li o que bem quis. Eu deixei de ser militar no ano em que você nasceu, em 1969, por que “eles”, os militares, não concordavam com a minha maneira de pensar. Mas, eu tenho muitas histórias, tanto de antes de 69, quanto depois. Minha vida sempre foi muito intensa, e trabalhei em muitas coisas agradáveis. Se você tiver interesse, a minha casa esta de portas abertas para te receber, e posso lhe contar, um pouco de tudo que vivi, são histórias bem interessantes. 

Eu estava pasma, ele me disse tudo, assim mesmo, de uma vez só, e eu parada, ali, no meio da farmácia, ser ter ao menos uma caneta e papel à mão. O que eu fiz foi confirmar o número do seu telefone, pois já estava gravado no meu celular. Em seguida, eu lhe disse sim. Confirmei que era de grande interesse ouvir suas histórias, e disse que voltaria a ligar para marcar o dia de uma entrevista. Chegando à minha casa, olhei na minha agenda, retornei o telefonema para o Sr. Hugo, e marquei um primeiro encontro na segunda feira, dia 18 de maio, às dez da manhã.

Assim começou a história… um simples cartão de papelão vermelho deu inicio, ao meu maior desafio acadêmico, mudando o tema da minha monografia, e me fazendo sonhar muito mais além!!

INTRODUÇÃO

No dia 18 de maio, como havíamos combinado,  fui ao encontro do Sr. Hugo. Era uma linda manha de outono, o céu estava muito azul e a temperatura bem agradável. Como moro no centro da cidade, demorei cerca de vinte minutos para chegar a sua casa, já que o bairro da Posse, onde fica sua residência, é um pouco afastado. A descrição do endereço foi perfeita e não errei o caminho. Para minha surpresa o Sr. Hugo já me esperava do lado de fora de seu portão, apesar de o ter visto somente em uma foto dos anos 60, no site do 4º BEC unidade da qual ele foi comandante nos anos de 1967 e 1968[19]. Eu sabia que aquele senhor que estava ali, era ele, e parece que ele também já sabia quem eu era.

Recebeu-me com um belo sorriso e olhar sereno, e apesar da idade avançada, 85 anos mostrou-se elegante e bem disposto, fazendo-me sentir bem à vontade. Sua casa era muito bonita, com um jardim bem florido, piscina, pomar, tudo muito bem cuidado. Era uma linda chácara a qual me mostrou com prazer. Fiquei emocionada com a beleza e o verde do lugar. Do jardim, direcionamo-nos para seu escritório, onde faríamos esta primeira entrevista.

Chegando lá, foi impossível não observar sua biblioteca e, principalmente, os livros novinhos que estavam ao lado do tabuleiro de xadrez, em uma mesa no centro do recinto. Entre eles, a biografia do atual presidente Norte Americano, Barack Obama. Olhando mais adiante, avistei, além de muitos porta-retratos e pôsteres com fotos de família, sua mesa de computador. Pela organização e pelos objetos daquele escritório, já deu para saber que estava lidando com uma pessoa muito culta, bem informada e atualizada, além de muitíssimo organizada.

Eu estava certa! Apesar das debilidades físicas impostas pela idade, o Sr. Hugo estava longe de ser uma pessoa “velha”, ou antiga e ultrapassada, até porque, havia trabalhado até seus 76 anos, e se sentia muito mal com o fato de estar aposentado, não tendo mais rotina de trabalho. Mantinha seu tempo muito bem ocupado, navegando na Internet e aprendendo línguas estrangeiras (Além do Inglês, Francês, Espanhol, Italiano e Alemão, que já dominava, agora estava aprendendo Húngaro).

Mostrou-me as fotos de seus netos e parentes, seus livros e diários. Iniciamos nosso diálogo, a respeito do objeto pelo qual me fizera estar ali. Mostrei-lhe o tal livro, “O Capital”, de Marx, e dentro dele o cartão de hospedes do hotel de Brasília. Ele olhou para o livro e se lembrou que realmente lhe pertencia. Falou que fizera uma arrumação nos seus livros e doara uma grande quantidade destes para o SESC de Teresópolis. Disse ainda que um dia foi ao SESC fazer uma pesquisa em um dos livros sobre xadrez doados, e percebeu que o mesmo já não estava lá. Concluímos que deveria ter levado o mesmo destino dos outros, indo parar no sebo da cidade. No entanto, não me disse o porquê da leitura ou da compra do livro, adiantando que, naquela época, ia bastante para Brasília, pois trabalhava para uma empresa civil que prestava serviço para o governo.

Depois de me mostrar outras fotos de família, e de sua bela esposa, Elys, da mesma idade dele e com quem estava casado há 56 anos, começou a contar-me suas histórias. Falou da sua família, dos seus antepassados, das suas origens, da sua carreira como militar e civil, assim como muitas curiosidades e anedotas de sua época. Parecia que aquela autobiografia já estava ali em sua mente, muito bem organizada e dividida, somente a espera de alguém que se interessasse por ouvi-la.

Em nossas três horas e meia conversa, desse primeiro encontro, ele me contou histórias que dariam tema de monografia para os 23 alunos da minha turma da faculdade de história. Sua vida recheada de vivências,cujo cenário era a capital do nosso país: na época, a cidade do Rio de Janeiro. Os personagens, pessoas ilustres de nossa História, como seu colega de turma da Escola do Estado Maior do Exército (turma de 1953), João Baptista Figueiredo[20] e outros contemporâneos militares, num período em que, essas pessoas tinham o poder de modificar a história.

A narrativa do Sr. Hugo me encantava. Naquele momento receava me apaixonar pela fonte, sabia que teria que ser imparcial, mas o fato é que aquele Sr. Simpático me deixou tão a vontade que parecia fazer parte da minha família. Ele ia narrando os dias da época, o comportamento da sociedade, a relação entre pais e filhos, famílias, política, etc., e eu ia imaginando os cenários.

Certa hora, lhe pergunto, se a idéia de escolher comprar uma casa naquela região de Teresópolis tinha alguma relação com o fato de ser o bairro onde o antigo presidente Ernesto Geisel também tinha uma residência. Ele me disse que não, que apesar do bairro – que é até hoje um paraíso ecológico – ter sido o refúgio de muitos políticos, militares ou não, nas décadas de 50 e 60, ele comprou sua chácara, naquela região, porque já freqüentava o bairro da Posse quando ia visitar o seu sogro, o Lott. Eu, meio sem saber direito se estava pensando na mesma pessoa, lhe perguntei se tratava do General Teixeira Lott, e ele prontamente me corrigiu dizendo, o Marechal Teixeira Lott[21]. Nesta hora, vi que o meu entrevistado poderia ser uma fonte inesgotável de conhecimentos.

Foi nesse momento que ele começa a me contar da mágoa que sentia pelos militares. Num episódio em que era comandante do 4º Batalhão de Engenharia em Crateús – uma pequena cidade no Ceará. A seca e a miséria faziam parte do cotidiano daquela população sofrida, e devido as precárias condições, a base militar influenciava direta ou indiretamente em toda comunidade. Lá, o Coronel Ligneul se sentia na obrigação de dar assistência àquela gente. Muito católico, foi procurado por jovens para ajudar num projeto de alfabetização para adultos, que estava sendo implantado pelo bispo da região. Na mesma hora se prontificou como pôde, dando sua assistência. Mais tarde, foi acusado pelo militares de contribuir com os grupos comunistas da região. Este fato teve repercussão nacional e acabou levando o Sr. Hugo a exoneração do seu cargo. Sem nunca ter podido se defender de tais acusações, restou-lhe a indignação, pela falta de compreensão e de merecimento, apesar da certeza de ter feito o que era certo, segundo seus princípios de caridade cristã e honestidade.

Depois de me contar este acontecimento, o Sr. Hugo abre sua estante e pega duas grandes pastas de arquivo. Nelas os títulos: Lembranças de Crateús Parte I, e Lembranças de Crateús Parte II. Depois olhou para mim e disse: “Ta tudo aí, toda esta história, com fotos e documentos”. Eu olhava para aquele material, cheio de relatórios secretos do exército e ficava boquiaberta. Ele olhou pra mim, sabendo da preciosidade do arquivo que estava me mostrando, e disse que se eu me interessasse poderia me emprestar para que desse uma olhada com calma. Na mesma hora disse sim e que, no dia seguinte, lhe devolveria. Na manha do dia 19 de maio já tinha tirado cópias dos documentos das pastas.

E assim, passaram-se várias entrevistas. Tais contatos foram se intensificando pela confiança mutua.

Numa ocasião, quando estava de fato envolvida pelo projeto, o Sr. Hugo me oferece mais uma grande quantidade de material. Desta vez, eram as suas histórias já escritas, umas digitalizadas, outras manuscritas. Nelas, constava sua infância, sua família e alguns contos sobre sua carreira militar e civil. Junto com os diversos pequenos blocos de texto, havia uma folha solta, um rascunho manuscrito, onde constava uma listagem cronológica dos fatos de sua vida e cuja, ultima frase dizia “Pendurando as chuteiras”. Tudo aquilo, todos aqueles textos eram o esboço da sua autobiografia. Perguntei-lhe se já tinha publicado algum daqueles textos – os quais eram muito bons – ele me disse que não, que apenas escrevia para o futuro: Quem sabe se alguém da família um dia se interessaria por aquelas histórias.

Parece que mais uma vez a sorte estava comigo. Não sei o que o futuro me reserva, mas não foi por acaso que recebi este material. Por isso, vou usar todo o meu conhecimento e toda a minha determinação para tirar o melhor proveito desses “Arquivos pessoais de Hugo José Ligneul”, os quais poderão apreciar ao longo dos capítulos e dos anexos desse trabalho.

CAPITULO 1 – OS LIGNEUL

O primeiro dos Ligneul, Victor, veio para a América do Sul no final do século XIX, por volta de 1891, migrando, não se sabe por que, de Coutance, uma pequena cidade francesa, na região da Normandia. Era solteiro e descompromissado, chegou ao nosso continente de navio, passando por Buenos Aires e Montevidéu. Entrou no Brasil como clandestino pela fronteira do Rio Chuí, em direção a Santa Vitória do Palmar, no Estado do Rio Grande do Sul, fronteira com o Uruguai. Dali, rumou para os pampas gaúchos, oferecendo-se para trabalhar como agricultor, uma vez que já tinha experiência e dominava técnicas agrícolas mais desenvolvidas para o tipo de solo daquela região, pois estas eram muito semelhantes às de sua terra natal, na Europa.

Depois de alguns trabalhos pequenos, passou a ganhar a confiança dos estancieiros da região e a propor-lhes um negócio: transformar aquele tipo de campo, plano e pedregoso, em uma bela, e produtiva fazenda, ficando com o primeiro ano de colheita como pagamento.

A primeira fazenda em que trabalhou, foi em plena época da Revolução Federalista. Certo dia, os Chimangos apareceram e cortaram a cabeça do seu patrão, que era um Maragato[22]. Então, ele acabou ficando sem essa remuneração. Sem dinheiro, nem trabalho, passou pela fazenda ao lado, de propriedade de dois irmãos Italianos, fazendo-lhes a mesma proposta, no cuidado da fazenda. Os Italianos aceitaram a sua prestação de serviço, porém, quando o trabalho já estava concluído, estes fazendeiros, com a má intenção de não lhe pagar o lucro da primeira colheita, denunciaram-no para polícia local, acusando o Francês de socialista, anarquista, e de estar talvez  implicado no assassinato do Presidente Francês Sadi Carnot[23]. A policia acreditou nos Italianos, pois, era o depoimento deles, proprietários de terra, contra um simples camponês, sem um tostão. Ele mais uma vez, fugiu, deixando todo o seu trabalho para traz. Por sorte, era um solteiro de trinta anos e muita saúde para recomeçar. Foi parar no Porto do Rio Grande, lá trabalhava como carregador, fazia pequenos trabalhos, e como era bem articulado, já estava começando a se reerguer, quando, um dia, os tais irmão italianos o avistaram na cidade e o denunciaram novamente à polícia que então o prendeu na mesma hora.

Preso foi colocado em um navio rumo à capital, Rio de Janeiro, onde eram julgados estes tipos de criminosos (anarquistas, comunistas, e socialistas). Assim, Ligneul chegou ao Rio de Janeiro, ficou detido uma semana, no Quartel General do Exército, no centro da cidade, na Praça Duque de Caxias[24] (um lugar que o pai do Sr. Hugo, sempre mostrava aos filhos, quando por ali passavam). Victor Ligneul ficou retido apenas por uma semana, sendo posto na rua, já que  não havia maiores provas quanto ao seu suposto crime.

Desta forma, estava mais uma vez sem destino nas ruas do Rio de Janeiro, solto, sem raízes, e sem família, mas com liberdade para fazer o que quisesse da vida, pois como imigrante, tinha muito mais possibilidades de subir na escala social, já que poderia fazer qualquer coisa, submetendo-se a todo tipo de tarefa, sem ter nada a perder. Tratou rapidamente de entrar em contato com os outros franceses da cidade e, em pouco tempo, já havia se instalado e conseguido um bom emprego. Trabalhando como superintendente da Manufatura de Cerveja Brahma, foi um dos articuladores na formação da Companhia Cervejaria Brama S.A., inaugurada em 1904[25].

Ali no mesmo local onde se situava a Cervejaria, na Rua Marques de Sapucaí, (local que hoje abriga o Sambódromo[26]), Victor Ligneul moraria, casando-se com uma francesa Eulalie Ernestine Prevost e tendo seus cinco filhos. A época era de muita afluência, estabilidade no emprego e realizações pessoais. No entanto, parece que o destino sempre pregava peças no francês Ligneul: uma delas foi o falecimento precoce da esposa, deixando-o sozinho e com os cinco filhos para criar. O infeliz acontecimento transformou mais uma vez a sua vida. Desnorteado acabou saindo do emprego da cervejaria e indo morar no bairro do Meyer, onde trabalhava como representante comercial da firma francesa “Lê Mallax” fabricante de masseiras industriais que estavam sendo introduzidas nas padarias do Rio, em geral propriedade de Portugueses. Contratara uma governanta para cuidar de seus filhos. Por ironia ou muito azar, certo dia, ao chegar a casa, depara-se com as crianças sozinhas e assustadas. A tal governanta, havia fugido roubando-lhe tudo o que havia dentro de casa, até a mobília. Desta vez, o golpe o atingiria muito mais fundo e sem saber o que fazer distribuiu seus filhos entre padrinhos e orfanatos, ficando somente com o filho mais velho, o qual, mais tarde viria ser o pai do nosso personagem principal. Restando somente pai e filho, o garoto de 17 anos, se via com um pai que, de tanto sofrimento, já não tinha forças para levar a vida, vindo há falecer pouco tempo depois.

Assim, começa a história do nosso segundo Ligneul, órfão, antes mesmo, do fim da Primeira Guerra Mundial. Sozinho, passa a morar de favor na casa de uma senhora francesa chamada, Madame Desirée, ou Madame dos Cachorros, pois criava cachorros grandes, em sua casa em Santa Tereza. Desta forma, morando de favor, trabalhando de Office Boy, nas empresas do centro do Rio de Janeiro, Georges Ligneul, consegue se formar em Contabilidade. Muito esforçado, dominando o francês e arranhando um pouco de italiano, espanhol e inglês (devido aos muitos contatos com imigrantes), vai trabalhar em uma firma francesa chamada Mestre & Blatge, situada na Rua da Assembléia, 83, no Centro do Rio de Janeiro. Essa empresa que vendia de tudo, de material esportivo a navios, mais tarde, seria conhecida pelo nome de Mesbla[27]. Nesse grande magazine, Georges Ligneul entra para trabalhar como Office Boy e vai evoluindo, até ser chefe da cessão de Automóveis e Aviões. Nesta ocasião, ele vende três aviões de franceses, experimentados na primeira guerra mundial,  que seriam os três primeiros aviões do Exercito Brasileiro[28]. Eram três aviões Breguet e foram vendidos ao Exercito, pois  ainda não existia a Força Aérea. Detalhe interessante: da comissão de compras faziam parte os futuros Brigadeiros Eduardo Gomes e Carpenter Ferreira, oficiais da arma de aviação do Exército brasileiro.

Parecia que tudo era promissor, bom até demais para ser verdade. Quando Georges foi receber sua comissão, referente à venda dos aviões, o proprietário da loja disse-lhe que não iria lhe pagar, e afirmou que ele era muito moço e que uma quantia tão grande de dinheiro iria estragá-lo. Entregou-lhe somente uma parte. Georges afirmou que se a comissão não fosse paga integralmente, ele iria sair da empresa. A comissão não foi paga, e Georges, saiu da empresa para abrir seu próprio negócio.

Com muito trabalho, esforço e predisposição, abriu uma loja para vender rádios. Sua penetração entre os europeus fazia com que estivesse sempre bem informado sobre o que estava acontecendo no Velho Mundo. Sendo assim, estava por dentro das modernidades de seu tempo. Na época, o rádio era uma novidade. Embora os aparelhos fossem incipientes, sem muitos recursos eram a novidade da época. Ter uma loja de rádios no centro do Rio de Janeiro, na década de 20, era como ter uma loja de computadores, nos anos 90,  O negócio deu certo.

Essa empresa, a Ligneul Santos e Cia., durou cerca de 40 anos e foi o que deu sustento à família. Com a receita dessa loja Georges Ligneul alimentou e educou seus cinco filhos. Nunca chegaram a ser ricos, mas tinham bastante recurso, comparado com a maior parte da população, num Brasil  praticamente sem indústrias. Apoiado nessa empresa, pode dar uma vida tranqüila a sua família,  conseguindo formar seus filhos.

CAPÍTULO 2 – PROFISSÃO OFICIAL DO EXÉRCITO

2.1 A INFÂNCIA

Neto de Victor e Eulalie, filho de Georges e Iracema, Hugo José, nasceu no dia 16 de junho de 1924. Era o primogênito da segunda geração dos Ligneul, nascida no Brasil Foi criado no coração do Rio de Janeiro, capital do Brasil, e centro dos acontecimentos nacionais. Tendo uma infância cheia de aventuras e cultura, da qual guarda boas recordações, incluindo sua casa na Mangueira[29]. A casa da Mangueira tinha sido impingida a seu pai por um oficial da marinha, Cmte. Barreto, que se endividara na Ligneul Santos e Cia a ponto de não poder mais resolver a situação, senão dando a casa em pagamento. Seu pai não teve escolha e a família acabou morando lá dezenove anos, sendo uma lembrança feliz para todos os que viveram nela infância e adolescência.

Foi sua mãe, Dona Iracema, que lhe ensinou a ler, usando método da Cartilha de Thomaz Galhardo[30]. O pequeno Hugo não ficava satisfeito com uma lição por dia. Dada à sua sede de conhecimento, em quinze dias já tinha acabado com o livrinho, obrigando a sua mãe a matriculá-lo na escola de freiras no meio do ano letivo. No ano seguinte, entrou para escola pública, Escola Municipal Barão Homem de Mello – Rua Alm. João Candido Brasil, 352, ou Rua Vde. De Itamarati – Maracanã, Rio de Janeiro – RJ. Lá cursou o segundo e o terceiro anos primários, sendo transferido para a Escola Bezerra de Menezes para fazer o quarto ano. No meio do quarto ano, aplicaram um teste nos alunos e, conforme orientação do Dr. Anísio Teixeira, Secretário de Educação do Distrito Federal, o menino foi promovido para o quinto ano, no intuito de economizar vagas em benefício dos que precisavam mais da escola. E foi assim que, em 1935, Hugo prestou exame de admissão para o São Bento e para o Colégio Militar. Passando nos dois chegou a cursar o São Bento por um mês, mas quando veio o resultado do CM, sua mãe decidiu que iria para esse último.

Ainda no Colégio Militar, Hugo presenciou grandes acontecimentos históricos que movimentaram a capital na década de 30. Entre eles, a Intentona Comunista[31] em 1935. Apesar de não ter nada ligado ao Colégio Militar, Hugo lembra-se do quartel do 3º RI arrasado pelo bombardeio direto dos canhões colocados na Avenida Pasteur e logo depois abandonado. Na ocasião, ele passava com o pai por dentro do quartel para ir pescar nas encostas do Pão de Açúcar. Já em 1937 houve a Revolta dos Integralistas[32] e a implantação do Estado Novo[33], Hugo lembra-se dos “Plinianos” que freqüentavam o colégio e que ele e seus amigos chamavam de “Galinhas Verdes”. “O Brandão era um deles e chegava a me ameaçar dizendo que quando eles vencessem, eu e meu pai íamos sofrer muito, pois se não éramos integralistas certamente éramos comunistas.” – Completa Hugo.

O ano de 1938 passou rápido com a Copa do Mundo na França, transmitida para os rádios de todo o país. Em 1939, acabaram com os Colégios Militares de Fortaleza e de Porto Alegre, e trazendo os alunos desses colégios para o Rio de Janeiro. Fizeram o 5º ano na 5ª Companhia, a antiga maternidade (salas onde normalmente estudavam os primeiros anos).  O curso do Colégio Militar era diferente do ginásio comum, feito em cinco anos, lá havia também o 6º ano, destinado a revisões e ao curso profissionalizante. No entanto, sob pretexto da guerra que ameaçava o mundo, suprimiram o 6º ano e a turma acabou se formando ao fim de 1939. Nesta ocasião, lá pelo final do ano letivo de 1939, os alunos estavam em forma quando um oficial lhes perguntou: “Quem quer fazer um concurso para a Escola Militar?” E Hugo Ligneul foi um dos que levantou o braço. Levou para casa os formulários para o pai ler e assinar a autorização permitindo “verificar praça”, caso fosse aprovado no concurso, uma vez que era menor de idade.

Hugo terminou o quinto ano e continuou estudando, no curso do Quintela, para concorrer com 2800 candidatos a cerca de 300 vagas. Assim, o menino de quinze anos passou sem problemas em seu teste, apesar da dificuldade da prova, pois, havia meninos que faziam muitas provas até obter um resultado positivo. Foi o caso, do famoso político, Armando Falcão[34], que após três tentativas desastrosas para passar nos exames, acabou desistindo de ser um militar.

Naquela época o Brasil era bem diferente, havia poucas oportunidades de carreira. Uma pessoa fazia o curso de Engenharia, e seria, na melhor das hipóteses, engenheiro das estradas de ferro, e ficava ali, nessa função a vida toda; um outro iria ser médico, e acabava tendo algum status, mas os outros levavam uma vida bem modesta. Advogados havia à vontade, mas muito poucos tinham valor, a maioria era funcionário público. Essa era a vida brasileira, na época em que o mundo estava ás vésperas da segunda guerra mundial. Dessa forma, para aquele jovem, acostumado com a correria do comercio e a agitação da cidade grande, essas profissões não inspiravam nenhuma atração, além disso, o mundo estava muito motivado para a guerra, e a carreira militar proporcionava um elevado grau de ascensão tanto profissional, quanto econômico. Para os pais, também era um alívio do ponto de vista financeiro, já que a Escola Militar sustentava completamente o seu aluno. Assim, o filho, além de estar encaminhado em uma profissão, não daria mais despesas em casa.

2.2 A ESCOLA MILITAR

Após exames físicos, médicos e várias provas escritas eliminatórias, o contingente ia diminuindo. A viagem de trem para Realengo era cansativa e apenas 41 alunos do quinto ano do Colégio Militar haviam passado, entre eles Hugo José, trazendo muito orgulho para sua família e amigos.

O novo regulamento previa um curso de quatro anos para a formação dos oficiais de cada uma das cinco armas do Exército. A aviação ainda era um dos cursos da Escola Militar de Realengo em 1940. [35]

O começo do primeiro ano foi cheio de novidades e requereu um grande esforço de adaptação. O regime de internato, a dureza dos exercícios físicos, o estilo dos professores, a comida do rancho, o frio das manhãs de Realengo, os trotes dos veteranos, tudo foi vencido com paciência e perseverança.

O começo das provas trouxe novos incentivos. Bons resultados atraíam atenção para um cadete que não tinha outros dotes para brilhar. Nunca foi o primeiro, mas era dos melhores e não tinha dificuldades como alguns companheiros que viviam em pânico, com o medo de não receberem o espadim ou de serem reprovados ao fim do ano letivo. Seu regime de estudo era apenas sério, não perdia muito tempo e sempre se dava bem nas provas orais. Costumava estudar com seus amigos Renildo e Helio Dorneles, ou então ensinar ao Marques Henriques ou ao Estrela. Como no Colégio Militar, fazia toda força no início do ano e folgava no final, quando já estava passado.

Chegaram ao segundo ano e, em virtude de um acúmulo de cadetes nas subunidades de Infantaria, normalmente encarregadas de acolher os alunos do curso fundamental, as armas de cavalaria e artilharia foram oferecidas como alternativa de alojamento.  . Ligneul escolheu o Esquadrão de Cavalaria, por influência dos colegas Renildo e Helio Dorneles, uma vez que a Engenharia não foi oferecida como opção. No Esquadrão, além dos colegas de Cavalaria, teve o prazer de conviver com o Boaventura, Negreiros, Estrela e muitos outros colegas que iam depois para a Engenharia e Artilharia. Com isso o segundo ano tomou outro colorido, porque além das matérias teóricas como Mecânica e Química, havia a instrução prática na Infantaria e o treinamento no Esquadrão de Cavalaria para as manobras e para a parada de sete de setembro.

Na escolha da arma, a partir do terceiro ano, valeu a classificação intelectual, como era de costume. Hugo Ligneul foi o quarto cadete a ingressar na arma de Engenharia, em março de 1942. A vida na Engenharia não mudou muita coisa. A instrução profissional despertava interesse. Os instrutores eram, em geral, de boa qualidade. Hugo foi designado para dirigir um dos caminhões de transporte da equipagem de pontes, e isso era a glória para um cadete de 17 anos. Na Engenharia estreitou sua amizade com Negreiros[36]que já conhecia do Esquadrão, e com Ivan de Souza Mendes[37], que era talvez o colega mais chegado da Engenharia. Havia também o Estrela, o Mário Athayde, o Mariath, o Sisson e muitos outros nomes dessa nossa história.

Havia um programa intenso de acompanhamento das campanhas militares, que se desenrolavam pelo mundo afora naqueles dias de guerra mundial. A princípio, o Governo Brasileiro simpatizava com o eixo. Isso se refletia na atitude dos oficiais superiores e de alguns capitães e tenentes. Havia, na cidade, um cinema chamado Metro. Ao cinema de Realengo os cadetes puseram o apelido de Milímetro. A sala de Realengo, onde assistiam as proezas militares dos exércitos de Hitler, eles a chamavam Calorímetro. Lá assistiram à invasão da Checoslováquia, da Polônia, da Holanda, da Bélgica, da França e do Norte da África. A Batalha da Inglaterra, vista pelos alemães, assim como a invasão da Rússia e as ações alemãs na Escandinávia foram acompanhadas no mesmo Calorímetro.

Um dia, em meados de 1941, todos os alunos foram conduzidos pelos oficiais ao Milímetro. Lá estavam todos os oficiais da Escola, algumas autoridades e o Embaixador Alemão no Brasil. Passaram para eles, um longa metragem mostrando toda uma variedade de equipamentos bélicos alemães testados na Guerra Civil Espanhola. Uma carnificina e uma prévia de todos os armamentos que viriam a surpreender o mundo em 39 e 40. Lá estavam os primeiros Aviões Stukas destruindo as esperanças do povo Espanhol e ajudando a instalar a ditadura de Franco. No final do espetáculo, apareceu, em tela cheia, a figura de Hitler com a suástica por cima. A grande vaia que começou na Esquadrilha de Aviação, espalhou-se pela Engenharia e, à revelia dos germanófilos, que eram numerosos, transformou-se num grito de protesto e libertação de uma grande maioria até então oprimida, naqueles tempos finais de ditadura getulista.

As luzes se acenderam, a vaia cessou como por encanto, o Sr. Embaixador saiu carrancudo, no meio de oficiais embaraçados. Alguns estavam amedrontados com possíveis conseqüências e todos os alunos foram levados de volta á Escola para receber uma violenta reprimenda coletiva aplicada pelo então Capitão Geraldo Menezes Côrtes, ajudante do Corpo de Cadetes, mais tarde o “grande democrata udenista”.

Durante esse período de opressão, Ligneul costumava levar para Realengo os folhetos de propaganda da França Livre de Gaulle e um folheto chamado Neptuno, distribuídos pelo serviço de informações de sua Majestade Britânica. Os americanos ainda não tinham entrado em campo. Alguns germanófilos mais petulantes eram remanescentes de grupos de Plinianos, conhecidos desde o Colégio Militar, pelo apelido genérico de “Galinhas Verdes”. As vezes, havia ameaças e as discussões terminavam no banheiro que era o lugar da briga. Hugo se limitava a colocar a propaganda aliada em baixo dos travesseiros dos Galinhas Verdes. A propaganda chegava à sua casa em nome de seu pai, que vivia pendurado no rádio de ondas curtas, escutando as notícias da guerra, nessa época bem frustrante para os brasileiros que detestavam o fascismo.

Mais tarde, vieram os afundamentos de nossos navios, que muitos imputavam aos próprios aliados, no sentido de mudar a posição do Brasil. O fato é que, depois do ataque a Pearl Harbor e, mais tarde, da visita de Roosevelt ao Nordeste Brasileiro, a virada foi completa. O Brasil declarou guerra ao eixo e os germanófilos ficaram por baixo. Houve muita violência e tumulto por conta da mudança. As conseqüências oficiais foram a mudança dos programas de propaganda no Calorímetro, passando, então, a exibir filmes ingleses da Batalha da Inglaterra, das campanhas de Montgomery, no Norte da África, dos bombardeios da Fortaleza Alemã, filmes americanos das campanhas das ilhas do Pacífico e de Burma, filmes Russos da resistência à invasão alemã e das contra-ofensivas soviéticas, filmes da Batalha no Mar para manutenção das linhas de suprimento aliadas, etc.

E, assim, chegaram a março de 1943, quando foram declarados aspirantes, com meses de antecipação, pelo fato de o curso ter sido comprimido, em virtude das necessidades de guerra. Urgente se fazia começarem os treinamentos da tropa brasileira a ser enviada a algum teatro de guerra.

Não se falava ainda de Força Expedicionária e a escolha das guarnições foi feita da maneira tradicional: por merecimento intelectual, dentro das vagas fornecidas pela Diretoria das Armas. Hugo e mais seis companheiros escolheram o 1º Batalhão de Pontoneiros, sediado em Itajubá, no Sul de Minas. Eram de início seis colegas que haviam combinado servir juntos. Mas o Rollin Pinheiro furou a combinação e tirou o lugar do Fraenckel. Este, entretanto, era bem protegido e, para surpresa de todos, conseguiu uma vaga extra, só para ele. E lá foram os sete para Itajubá: Hugo Ligneul, Pragana, Ivan, Delpho, Negreiros, Fraenckel e o Rollin Pinheiro.

Ser declarado Aspirante foi uma nova e grande alegria. Hugo tinha então dezoito anos e ia poder viver independente para o resto de sua vida. Tinha uma carreira pela frente, cheia de oportunidades de aprendizagem e de prestação de serviço público. Não devia nada a ninguém, a não ser a seus pais que tinham lhe dado apoio para chegar até ali.

Seu pai não estava bem, economicamente, pois a guerra acabara com as importações, fonte de seu negócio. Mesmo assim tirou recursos não se sabe de onde para pagar o uniforme de Hugo na alfaiataria do Rodrigues, enquanto a maioria de seus colegas tinha ficado com uma dívida razoável para quitar. O Aspirante recebia uma ajuda de custo para fazer os uniformes de modo que Ligneul tinha mil e quinhentos cruzeiros para começar a vida em Itajubá. Infelizmente, no primeiro dia no Batalhão sua carteira foi roubada no vestiário, mais tarde, acharam o ladrão, porém este já tinha gastado a maior parte do dinheiro, Hugo acabou recuperando somente novecentos dos mil e quinhentos cruzeiros.

Os setes Aspirantes chegaram a Itajubá pelo trem da Rede Mineira que pegaram em Cruzeiro, baldeação da E F Central do Brasil. Seu primeiro comandante foi o Coronel Machado Lopes. Era um bom comandante, saiu de Itajubá para organizar o 9º BE de Combate que iria integrar a Força Expedicionária na Itália.

Era uma linda primavera, em setembro de 1943, quando foram promovidos a 2º Tenentes e transferidos para guarnições distantes do Rio de Janeiro, como exigia o regulamento. Em termos, porque justamente os dois de mais modernos acabaram ficando por perto, o Rollin nem foi transferido e o Fraenckel foi para o Rio de Janeiro. Hugo foi classificado em Fazenda Jardim – MT, Negreiros e Delpho em Fernando de Noronha, Ivan em Recife, e Pragana em Vacaria – RS.

Com a guerra os prazos regulamentares de trânsito estavam reduzidos de modo que seguiram destinos sem delongas. Naquele tempo, relembra Hugo, o tempo custava a passar, parece que viveram uma longa aventura em Itajubá. Hoje o tempo voa, seis meses não é nada. A separação foi triste e lá seguiu o nosso personagem sozinho para Aquidauana e Jardim, com apenas uns dias para se despedir da família no Rio.

Em Aquidauana encontrou com os colegas do 9º B E Comb. de mudança agora para Três Rios – RJ, onde iriam se preparar, sob o comando do Coronel Machado Lopes, para seguir para Itália. Em Jardim, nunca teve uma turma de amigos tão ligados como em Itajubá. Encontrou boas pessoas, teve uma vida simples. Foi uma grande escola, entretanto, esteve sempre entregue à própria sorte, sem orientação superior, sem companheiros da mesma idade e de mesma formação, não via a hora de voltar para casa, para sua cidade, o Rio de Janeiro.

E seu desejo não demorou a se realizar, em dezembro de 1944 foi promovido a 1º Tenente e conseguiu ser transferido para o CPOR RJ[38]

2.3 A PROFISSÃO

No final do ano de 1944, seu amigo, ex-comandante de companhia Capitão Carvalho tinha saído de Jardim e estava servindo na antiga Diretoria das Armas, encarregado de movimentar os oficiais. Carvalho tinha ficado muito amigo não só de Hugo como de sua família, nos tempos de Fazenda Jardim, por isso, sabia o quanto eles desejavam ver o filho de volta, depois de quase dois anos de ausência de casa, numa época em que até as férias estavam suspensas. Desta forma, foi sem dificuldades que Ligneul conseguiu uma vaga no CPOR do Rio.

Samuel Augusto Alves Corrêa, antigo instrutor de Hugo Ligneul, tinha sido classificado instrutor chefe do curso de engenharia do CPOR e precisava de um tenente. Então foi bem simples, Samuel o conhecia e tinha boa impressão do seu ex-cadete.

No Rio, Hugo foi morar em Mangueira, na casa de seus pais. Fernando, seu irmão, estava em Rezende, cursando o primeiro ano de Intendência na AMAN; suas irmãs Martha, Eulalie e Letícia, ainda freqüentavam o colégio. Naquela época, o chefe de Polícia do Rio de Janeiro, o General Etchegoyen tinha tido a infeliz idéia de acabar com a “Zona do Mangue” [39]. O resultado foi desastroso para a cidade, pois todos os bairros receberam sua carga de marginalidade. A Mangueira em especial, antes pobre e pacata, viu-se invadida por uma nova espécie de habitantes que começou a incomodar os antigos moradores. Por conta desta situação, no final de 1945, a família de Ligneul muda da famosa casa de infância. Com o fim da guerra e a retomada das importações, criou-se uma nova fase de prosperidade para a loja do pai de Hugo. Houve recursos para que mudassem para uma casa na Rua Eugênio Hussak 19, em Laranjeiras.

No CPOR Samuel era um velho conhecido, bom de lidar, competente e honesto. Dividiam, ele e Hugo com facilidade as funções de instrução. A parte mais pesada ficava para o tenente e a responsabilidade maior para o Capitão.

Os alunos eram, nesse tempo, de uma faixa etária avançada, pois tinham sido convocados para a guerra sem qualquer habilitação militar e, face às qualificações civis, tinham sido matriculados no curso de engenharia do CPOR, isto feito para que não fossem desperdiçados, nas funções de lavar cavalos e latrinas, estudantes de engenharia, engenheiros formados e até professores universitários que eram. Eram todos mais velhos que Hugo, mas não criaram dificuldades por isso. Foram realmente amigos e se alguma vez perderam tempo com seus instrutores, não chegaram a demonstrar com agressividade. Além das aulas de equitação, educação física e de tiro, o uso de explosivos despertava interesse do pessoal. Trabalhavam na parte de engenharia, em construção de pontes e outras obras. Muitas vezes iam á Vila Militar para usar o stand de tiro e, com freqüência, costumavam cavalgar pela Quinta da Boa Vista aos domingos.

Em meados de 1945, acabava a guerra na Itália, então, chegaram ao CPOR RJ uns caixotes de material bélico apreendido pelas forças brasileiras. Eram minas explosivas, dispositivos acionadores e duas metralhadoras alemãs apelidadas de “Lurdinhas” pelos nossos pracinhas. Ficou para Hugo Ligneul a tarefa de examinar e encaminhar, este material para os centros de instrução do Exército depois de organizado e catalogado. Ligneul, então dividiu o material, encaminhando uma parte para a AMAN e para a ESA e guardando uma terceira parte para o próprio CPOR RJ.

Havia minas alemãs, italianas e americanas, havia acionadores de todas as procedências, havia dispositivos para destruição de canhões a serem abandonados, havia minas simples alemãs e complicadas como a “mina para general” dos italianos. Um dia, Hugo estava de serviço de Oficial de Dia e o sargento adjunto insistiu para que experimentassem a “Lurdinha” nas baias do CPOR. Ligneul resistiu enquanto pode, mas acabou cedendo diante da própria curiosidade. Foram para o fundo das baias, tomando toda a precaução para quem ia utilizar uma arma nova de características desconhecidas. Atiraram então no ângulo de umas paredes a noventa graus para evitar ricochetes. Foi uma só rajada furando o cano de água que abastecia as baias do CPOR. O resto do Domingo de serviço foi só arrependimento e procura de um bombeiro que consertasse a traquinagem antes do expediente de segunda-feira.

Durante o ano de 45, Ligneul teve tempo para freqüentar com Samuel, Carvalho e outros companheiros mais antigos de Engenharia os cursos que faziam, para se prepararem para o concurso de Escola de Estado Maior. Tinham aula de Inglês com professores de um colégio na Rua Conde de Bonfim, e freqüentavam aulas e conferências sobre história e geografia, Hugo não estava matriculado no curso, era muito moço para fazê-lo, no entanto, aproveitava para já ir se preparando para quando chegasse a sua vez. Depois do curso, todos os seus amigos conseguiram entrar para a EsCEME em 1946.

No ano de 1945, houve um fato político de grande importância: o afastamento do presidente Getúlio Vargas em 29 de outubro de 1945. As pressões pela redemocratização após o regresso das tropas que foram lutar contra as ditaduras fascistas na 2ª Guerra Mundial terminaram por expulsar do governo nosso ditador, colocando temporariamente a presidência na mão do Linhares[40] até a eleição do Dutra.

Nessa ocasião, conta Hugo, havia entre os oficiais do exército a idéia de que o Prestes teria soluções para o Brasil. E foram falar com ele  que estava sendo libertado por uma anistia decretada ainda pelo ditador. E, decepcionados, ouviram dele que a solução era a Constituinte com Getúlio. E não estenderam nada porque naquela época, – completa Ligneul – como agora, os militares eram bastante ignorantes em matéria de política.

Durante a prontidão que se seguia ao acontecimento, no dia 10 de novembro Hugo Ligneul teve que organizar a defesa do quartel, pois estava de serviço. Carregou de mau jeito uns cunhetes de munição e passou a sentir uma dor que acabou sendo uma hérnia que o levou para o Hospital do Exercito, para ser operado, logo um mês depois.

Ainda naquela tensa primavera, nos dias que se seguiram ao dia 10 de novembro, houve outra experiência pela qual não merecia ter passado. Foi mandado para dar uma batida num sindicato de operários vizinho ao quartel do CPOR e, para lá, mandaram-no armado até os dentes, juntamente com um grupo de dez soldados. Samuel foi comandando o destacamento que se deslocou a pé para o objetivo. Lá chegando, encontraram apenas um pobre homem, mal vestido e desdentado. O ódio com que o sujeito os olhou, talvez por sua impotência diante daquele excesso de força que representavam Hugo jamais esqueceria  assim como a vergonha que sentiu e a vontade de pedir desculpas pela brutalidade potencial.

No início de 46, Samuel entrara para a EsCEME e outro capitão o substituiria, Hugo estava sendo indicado para Instrutor de Pontes no curso da AMAN. Foi classificado na Escola Militar de Rezende[41], no início de 1946. Dessa forma iria conviver com seu irmão Fernando que na época era cadete do 2º ano de Intendência.

2.4 ESCOLA MILITAR DE REZENDE

Em principio de 1946, Rubens Negreiros lhe contou que estava sendo convidado para ser instrutor em Rezende. Hugo e Rubens eram grandes amigos, desde Realengo, e Ligneul lhe disse que ser instrutor na Escola Militar era um dos seus sonhos e que gostaria de ser o instrutor de cadetes que seu senso crítico exigia de seus ex-instrutores. Não demorou muito e o convite chegou. Não se sabe dos detalhes, mas, certamente, Negreiros indicou o seu nome a alguém que podia escolher os instrutores do Curso de Engenharia.

Em Rezende, Hugo encontrou o Major Carlos dos Santos Jacinto como Instrutor Chefe de Engenharia e o Capitão Ibiapina como comandante da companhia. Seus colegas Instrutores eram Luiz Francisco Ferreira, Rubens Negreiros, Ary Pinho e  Jayme Miranda Mariath. Eram todos amigos muito dedicados, pretendendo servir da melhor maneira possível.

Nesse tempo o Tenente Coronel Rodrigo Octavio Jordão Ramos havia conseguido montar um curso para oficiais brasileiros em Fort Belvoir, VA- USA[42]. O curso chamava-se Brazilian Officers Training Course e seria ministrado a 100 oficiais de Engenharia, divididos em quatro turmas de 25 oficiais.

A primeira turma, de 15 oficiais estava em Fort Belvoir e um dos alunos era o Capitão Délio Barbosa Leite, comandante efetivo da Companhia de Engenharia, substituído interinamente pelo Capitão Ibiapina.

Aproximava-se a época de selecionar o 2º BOTC e foram convidados os dois oficiais mais antigos do Curso de Engenharia, o Capitão Ibiapina e o 1º Tenente Ferreira, que era da turma de 1942. Ibiapina achou que seria desonesto deixar suas turmas de instrução no meio do ano letivo e recusou o convite que lhe foi feito. O mais antigo pela ordem era Hugo Ligneul, este foi convidado e aceitou. Assim, ele e Ferreira começaram a se preparar para viajar para Fort Belvoir.

Para Ligneul, era difícil descrever a satisfação com a oportunidade que o Exército lhe oferecia. Ele tinha consciência de que certas oportunidades não eram para qualquer um, e ele era “qualquer um”. Mas a seleção foi por antiguidade e não por favorecimento, influencia ou nepotismo, então, “viva o Exército democrático do Brasil!”

Fazia apenas um semestre que Hugo estava em Rezende como Instrutor de Pontes para as turmas de Engenharia de 46 e 47. Além de ensinar, Pontes, ele era assistente de todos os exercícios interessantes, conduzidos pelos seus colegas. Era muito comum freqüentar as instruções de minas e explosivos do Negreiros ou as sessões de tiro real no “Stand”.

Na Escola Militar, ele levava uma vida reclusa no 4º piso, fazendo esportes, lendo, jogando xadrez e freqüentando, ocasionalmente, o clube da cidade nos sábados e domingos. Raramente ia ao Rio de Janeiro, porque a Dutra ainda não estava em construção e a ferrovia levava quatro horas e meia, numa viagem poeirenta para o trajeto Rio – Rezende.

Fernando, seu irmão era cadete de Intendência, no 2º ano do curso. Algumas vezes, eles saiam juntos, mas normalmente, ele ia com seus colegas e Hugo com os oficiais seus amigos. No Serviço de Oficial de Dia Ligneul tinha contato com todos os cadetes. Causando boa impressão, apesar de sua severidade. Algumas vezes, foi alvo de brincadeiras porque lhe confundiam (de propósito) com Fernando, nunca levou estas brincadeiras a mal e, por isso, elas acabaram cessando.

Com a ida de Hugo e seus amigos para os Estados Unidos a situação dos Instrutores de Engenharia piorou muito. Apesar da volta do Capitão Délio Barbosa Leite, Negreiros, Mariath e os outros, ficaram muito sobrecarregados na tarefa de instrução de oficiais. As exigências burocráticas do Jacinto continuaram e ele acabou tentando punir o Negreiros e o Ibiapina. Quando Hugo e Ferreira voltaram do curso dos EUA, os instrutores eram outros, ninguém tinha podido agüentar o Jacinto. Nos seus lugares, estavam o Corsetti nas Comunicações, o Rubens Pinho em Organização do Terreno e o Antônio (Mostro) nas Minas e Explosivos. Ferreira voltou para a Instrução de Estradas e Hugo para a Instrução de Pontes. 

A diferença é que eles voltaram treinados por um exército que tinha vencido a 2ª Guerra Mundial e encontraram um curso de Engenharia com currículos organizados á base das apostilas usadas no curso da EsAO, feitas pelo Major Jacinto em 1939/40.

Hugo ficou em Rezende todo o resto do ano de 47 e no início do ano de 48. Foi instrutor das turmas de Engenharia de 47 e 48 e chegou a dar instrução, no primeiro mês de 1948, para a turma de 49. Em março de 1948, por causa de um incidente na preparação de uma sessão de Instrução de Pontes, o Major Jacinto conseguiu desliga-lo em 48 horas. Hugo já estava classificado na Escola de Instrução Especializada[43], que funcionava no Rio de Janeiro, em Realengo, no Parque de Engenharia da antiga Escola Militar, assim, volta mais uma vez para sua terra querida.

2.5 AVENTURAS EM USA

Hugo Ligneul e sua família não escondiam a alegria que esse curso proporcionava para todos eles, o orgulho do filho que, sem nenhuma proteção de militares superiores ou oficiais na família conseguiu por esforço próprio a vaga do 2º BOTC (Brazilian Officers Training Course).

O gostinho de vitória foi muito bem saboreado, por aquele que sonhava viajar por todo o mundo, apesar de não gostar que soubessem que estava desejando alguma coisa que não podia conseguir.

Viajaram num DC 3 da FAB que levou cinco dias para chegar a Washington. Eram dez oficiais de Engenharia para o 2º BCTC e cinco funcionários brasileiros do Itamarati, para servir na ONU, em Nova York. Um cônsul, todo enfarpelado, de chapéu coco e quatro moças que se tornaram a atenção dos oficiais e da tripulação da FAB. No percurso Rio/Belém, o DC 3 sofreu tanta turbulência que todos enjoaram. O Cônsul tirou toda a roupa a começar pelo chapéu, sofrendo horrores e enchendo sacos e sacos de papel. Quase morreu de enjôo.

Em Belém, Hugo esqueceu a máquina fotográfica Exata que seu pai havia lhe emprestado, num táxi do aeroporto. Mais tarde, felizmente, conseguiria recuperar a máquina. O avião demorou dois dias em Belém, porque o Pulo Victor, colega de Hugo de Realengo e co-piloto, era da terra e queria matar saudades, mas a desculpa foi de pane no avião.

Houve ainda duas paradas antes de chegar ao território norte americano dormiram em Atkinson’s Field, na Guiana Inglesa, e depois em Borinquen Field, em Porto Rico. O próximo pernoite seria em Miami.

Em Miami, Ligneul e Ferreira entraram em terras americanas gastando o seu Inglês precário. Tomaram uma sopa de ervilhas. Depois do almoço pegaram um ônibus no qual rodaram mais de uma hora. Ao fim do percurso quiseram voltar e resolveram pegar um táxi.  Felizmente o motorista era honesto, pois quando viu o endereço do hotel que lhe foi mostrado apontou o edifício em frente que era o próprio hotel. O Ônibus era circular!

No hotel, uma convenção de senhoras americanas, foi o primeiro choque cultural. Completamente desinibidas e livres, para os padrões brasileiros, iam á praia e a piscina exibindo suas silhuetas avantajadas na maior sem cerimônia. Mais tarde, queriam dançar com os oficiais, que eram eles, com a maior alegria de viver. Hugo nunca tinha visto tantas idosas juntas, vindas de toda parte dos Estados Unidos, com seus chapéus extravagantes, e uma simplicidade verdadeiramente infantil.

De Miami, voaram para Washington, onde chegaram com a primeira neve do ano, no início do outono. Os pilotos de seu avião se confundiram com os controladores de vôo e aterrissaram no aeroporto errado. Em vez de descerem na Base de Andrews, na margem esquerda do Potomac, aterrissaram no Aeroporto Nacional na Virginia, na margem direita do rio. Levaram uma grande bronca.

Apesar de tudo, foram recebidos pelo Tenente Coronel Rodrigo Octavio e por seu adjunto o Tenente Serrano. Rodrigo Octavio tinha sido o idealizador dos BOTCs, quando servia na Comissão Mista Brasil-Estados Unidos, função  inexpressiva e decorativa, mas nada era decorativo para o Rodrigo. Ele idealizou o projeto e conseguiu que lhe comprassem a idéia, no Brasil e nos Estados Unidos, e lá se foi para a Virginia, para implantar e chefiar o curso.

Serrano era um oficial de Engenharia meio boêmio, tocador de violão e cantor de blues. À custa de cantar música americana, aprendeu inglês e era o interprete e o braço direito do Rodrigo. O Tenente Coronel Rodrigo falava inglês com o sotaque bem latino mas que todo mundo entendia, ou pelo menos, fazia o que ele queria. Mandava e desmandava em brasileiro e americanos.

Do aeroporto, Hugo e os outros oficiais, foram a um PX onde compraram peças de fardamento americanas que adaptaram aos uniformes brasileiros, de modo que pudessem enfrentar os rigores do inverno que se aproximava. Compraram também “Fatigues” [44] para o trabalho sujo de oficinas com o equipamento pesado. Compraram ceroulas de lã, meias de lã, luvas quentes e camisetas de malha. A roupa era tão boa, que até hoje, 60 anos depois, ainda existem as peças que não foram dadas ou perdidas.

Hugo e os outro oficiais do curso viviam em uma barraca de madeira construída para as ampliações do tempo da guerra. A Engineer School estava cheia de oficiais de aviação do exército americano fazendo cursos de adaptação à mudanças de efetivo forçadas pelo fim da Segunda Guerra. Havia também uma turma de West Pointers e um grupo de oficiais chineses de Chiang Kai-Chek[45].

 Todo mundo andava fardado, pois a guerra ainda estava na moda. Usavam a bandeira do Brasil no braço esquerdo e eram muito bem recebidos. Como seus uniformes tinham estrelas perguntavam admirados se eram generais. Os uniformes não impediam qualquer atividade como acontecia no Brasil, onde o uniforme era proibido ou inadequado para a maioria das atividades particulares. Hugo só foi comprar um traje civil, muito mais tarde, quase na época de voltar ao Brasil.

Comprou também um carro Hudson (depois da guerra, não havia muita escolha, ele queria um Ford ou Chevrolet), companheiro de muitas aventuras.

Depois da conclusão do curso, foi a Baltimore e embarcou seu carro num navio com destino ao Rio, junto com outras compras, livros e roupas pesadas, tudo dentro de uma “Foot Locker” (uma mala tipo baú) do exército americano.

Terminando o curso de Fort Belvoir, foram fazer uma viagem visitando instalações fabris e depósitos de engenharia do Exército Americano: Os oficiais também visitaram: Fort Bragg, Saint Louis, Detroit, Chicago, New York e West Point, sendo sempre muito bem recebidos.

Pouco antes de embarcarem no avião da Pan Air para o qual já tinham passagem, receberam ordens do Adido Militar Brasileiro, General Lott para regressarem a Washington, afim de esperar o próximo avião da FAB (aeronave que chegava para levar peças de manutenção e carga da comissão de compras). Ficaram esperando o avião por quinze dias, ganhando diárias em dólar.

Logo que chegaram a Washington, foram chamados ao gabinete do Adido onde compareceram acompanhados pelo Rodrigo Octavio. O General Lott lhes explicou as razões pelas quais suas viagens tinham sido adiadas. Dos dez oficiais da turma, sete eram casados e estavam separados de suas famílias havia seis meses. Era muito importante para eles voltarem logo. Quanto a Hugo Ligneul, pouco lhe importava, pelo contrário, quanto mais tempo estivesse de férias nos Estados Unidos melhor.

Eles tinham saído do Forte Belvoir no fim do inverno e a volta a Washington seria no início da primavera. Enquanto o General falava, Hugo se encantava com os jardins da Embaixada do Brasil, vistos da janela do gabinete do Adido. Eram flores a mais flores, tão coloridas, depois de um inverno tão rigoroso.

Hipnotizado com tantas cores, aquele jovem solteiro de 22 anos, seguia desinteressado pelas explicações do Adido enquanto ele tentava convencer seus colegas da excelência de sua medida de economia para os cofres públicos, já que suas caras passagens internacionais seriam devolvidas. Até hoje Hugo pensa se realmente fizeram alguma economia.

Já pelas tantas o Edgard Barreto Bernardes perfilou-se todo e soltando seu desabafo, disse ao general que compreendesse, pois estavam todos há seis meses separados de suas esposas e sentindo muita falta da casa.

 General Lott, com sua sutileza peculiar, respondeu-lhe que não precisava compreender nada, e que já estava perdendo muito tempo com tantas explicações. Dizendo: “Retirem-se todos, já! E o senhor aí, fica”. Apontando o dedo para Hugo Ligneul.

A turma se retirou, silenciosamente e, Hugo, ficou, sem ter a mínima idéia do que o esperava. Foi quando o General o chamou de indisciplinado e mal educado. “O senhor. não tem educação militar nem civil. Eu falei o tempo todo e o senhor, nem sequer me encarou. Esteve o tempo todo olhando displicentemente pela janela. Retire-se!” Ligneul saiu revoltado, com lágrimas nos olhos. Lá fora, na presença do Rodrigo desabafou: “Esse general só dá valor a quem bate os calcanhares. Será que ele sabe que eu tive o melhor grau da turma? Que aproveitei bastante o dinheiro que gastavam no meu treinamento? Que eu não me importo de ficar aqui quanto tempo ele quiser, mas que não acredito nessa economia burra?” Rodrigo Octavio, o acalmou, dizendo-lhe “você é um camarada de altos e baixos”, uma hora é bom aluno outra hora dá suas alterações.

Dias depois houve uma festinha em casa do Brigadeiro Carpenter. Lá Hugo encontrou duas garotas com quem começou a dançar. A certa hora o Santa Cruz lhe disse: “são as filhas do Lott”. Hugo tinha visto, pela primeira vez na vida, a sua futura esposa, Elys. Mas a festa para ele acabou ali mesmo, foi saindo de mansinho.

O tal avião da FAB custou muito a aparecer em Washington. Os aviadores brasileiros tinham muitos truques para alongar as viagens que eram pagas em dólares por dia, enquanto fora das fronteiras do Brasil.

Finalmente, um dia entraram num DC 3, daqueles de bancos de lona ao longo da cabine, com a carga disposta no centro, toda amarrada. O avião não era pressurizado, só voava a 3000 metros de altitude e tinha uma autonomia de nove horas de vôo a 250 Km/h.

Acontece que a carga trazida para o Brasil, mais as “muambas” dos aviadores, já enchiam todo o avião, quando eles chegaram. Além dos dez oficiais de Fort Belvoir, viajaram para o Brasil cinco oficiais que tinham tirado o curso em Fort Leavenworth[46]

Esses quinze oficiais foram recebidos em clima de trote. A tripulação mandou que arrumassem as suas bagagens junto à porta de onde se lançavam as cargas dos pára-quedistas. O avião estava tão pesado que só cabiam cinco horas de combustível. Em conseqüência, as etapas seriam de no máximo duas horas e meia. 

A recomendação era para que eles não levassem nem mais um quilo de bagagem para dentro do avião. Além de tudo, havia um problema com um dos carburadores, que era desmontado e limpo em cada parada. O comandante dizia: “Olha pessoal, se houver qualquer coisa com um dos motores, vamos ter que diminuir a carga, e a bagagem de vocês está na porta”.

Nesse clima, saíram de Washington para Geórgia e de lá chegaram a Miami no primeiro dia de vôo. Dormiram em Miami e, no dia seguinte, decolaram para Havana. Em Havana passaram o dia e a noite. Eram tempos de Batista e as ruas eram infestadas de agentes dos rufiões  importunavam com convites para “exibições”. Um dos oficiais acabou aceitando o convite o que levou ao atraso do vôo no dia seguinte, pois pela manha ninguém sabia de seu paradeiro.

Decolaram de Havana com atraso e conseguiram chegar à Base Americana de Guantanamo Bay que fica no outro extremo da ilha. Uma tentativa de decolagem falhou e o comandante da aeronave decidiu dormir em Guantanamo limpando o tal carburador.

No dia seguinte conseguiram se arrastar até Porto Rico. A próxima etapa os levaria a Trinidad e à Guiana Holandesa de onde decolaram em direção a Macapá, já em território brasileiro. Dormiram em Macapá e a partir daí a viagem passou a ficar mais rápida. No dia seguinte, rumaram para Natal. De Natal chegaram ao Rio, fazendo escalas em Recife, Salvador, Ilhéus e Vitória. Uma “pedreira”, segundo Hugo.

Acabada a aventura, em todos os sentidos, Hugo Ligneul e Ferreira, depois de alguns dias de descanso, voltaram a Rezende para reiniciarem suas atividades como Instrutores de Cadetes.

2.6 ANOS CORRIDOS

Em principio de 1948, Hugo foi transferido da Escola Militar de Rezende para a EsIE. Esta era uma escola de instrução especializada na qual ele foi ser instrutor de equipamento pesado de engenharia, aplicando os ensinamentos que tinha colhido em seu recente curso nos Estados Unidos. Muito curta foi, entretanto, sua permanência na EsIE que ficava aquartelada na antiga Escola Militar de Realengo. Logo, em Junho de 1948, foi promovido a Capitão e designado para cursar a Escola de Aperfeiçoamento, curso obrigatório para a futura promoção a Oficial Superior. Ligneul aceitou a indicação e foi cursar a EsAO onde teve por colegas vários oficiais mais antigos. Ele era o mais moderno da turma e o único de sua turma de formação, a turma de Março de 1943.

Terminada a EsAO em fins de 1948, foi classificado no CPOR de São Paulo onde foi exercer a função de Chefe do Curso de Engenharia. Lá, Hugo encontrou vários companheiros com que fez estreita amizade. Morava, então, no próprio quartel onde ocupava um modesto quarto com sua mala armário e um caixote de livros. Lá esteve por dois anos (1949/1950), aproveitando as horas vagas para se preparar para o concurso de admissão à Escola de Comando e Estado Maior.

No CPOR de São Paulo conviveu especialmente com Helio Mendes e Joaquim Abreu Fonseca. Conheceu também o Oliva, o Branco, o Raul e o Esdras morando no quartel.

Durante sua estada em São Paulo, o General Lott assumiu o Comando da 2ª. Região Militar à qual estava subordinado o CPOR de São Paulo. Com isso, voltou a se encontrar com Elys, sua filha, de quem acabou se enamorando.

Em fins de 1950, passou no concurso de admissão à EsCEME sendo, em decorrência disso, desligado do CPOR de São Paulo e transferido para o Rio para cursar a Escola de Estado Maior.

Na Escola de Estado Maior foi colega de turma do futuro Presidente Figueiredo, então Major. Mais uma vez ele era o mais jovem da turma.

No fim do 1º ano de curso foi a São Paulo se casar com Elys. Foram morar no Rio de Janeiro, na Rua Souza Dantas, em São Francisco Xavier. Lá residiram durante os dois últimos anos do curso e mais um ano em que ficou como instrutor da EsCEME.

Em 1954 passaram pelos trágicos acontecimentos políticos que terminaram pelo suicídio do Presidente Vargas. O General Lott foi nomeado Ministro da Guerra do Presidente Café Filho.

Em principio de 1955 foi transferido para Rezende como Chefe do Curso de Engenharia da AMAN.

Passou, nessa função, os anos de 1955 e 1956 sendo transferido, em principio de 1957 para a DVT (Diretoria de Vias de Transportes) onde foi servir com os então coronéis Euler Bentes Monteiro e Rodrigo Otavio Jordão Ramos, sob a chefia do General Ururai.

Na DVT Hugo encontrou colegas como o Cel Francisco Fernandes de Carvalho Filho e Cássio Dario Schlapall de Araújo.

Acabou por substituir o Cel Carvalho no Conselho Rodoviário Nacional sendo depois transferido para a 4ª. Seção do Estado maior do Exército. Lá conviveu com os Coronéis Ernesto Geisel, chefe da 2ª. Seção, Golbery, chefe da 3ª. Seção,  João Batista Figueiredo, adjunto do Cel Golbery e muito outros destacados oficiais que, mais tarde, teriam enorme responsabilidades no governo militar iniciado em 1964.

Passou no Estado Maior de Exército o restante do governo Juscelino e o inicio do governo Jânio Quadros. Em Junho de 1961, foi a Brasília com o Conselho Rodoviário Nacional entregar ao então Presidente Jânio o Plano Rodoviário Qüinqüenal que por sua ordem tínham acabado de elaborar. Em agosto, Hugo e outros oficiais viajaram para uma visita à estrada Cuiabá-Porto Velho, com a intenção de encontrarem com o Presidente Jânio em Manaus. Em Guajará-Mirim, durante um almoço, receberam a notícia da renúncia do Presidente Jânio. Voltaram, imediatamente, ao Rio onde ainda chegaram a tempo de testemunhar a prisão do General Lott em conseqüência do manifesto que assinou, por instancia do ex-presidente Juscelino, preconizando a transmissão do cargo presidencial ao vice-presidente Jango.

Passada a crise política, com a emenda parlamentarista, Ligneul retornou às suas funções no Estado Maior do Exército até que foi matriculado na Escola Superior de Guerra para fazer o curso do CENCFA.

O CENCFA foi cursado em 1962 e ao fim do curso, foi designado para as funções de Chefe do Curso de Engenharia da EsCEME. Em 1963, exerceu a sua função escolar em meio às desordens políticas que marcaram o período. Hugo lembra-se de que foi convidado pelo seu colega Francisco Boaventura para conspirar contra o governo Jango. Recusou o convite e conviveu com as correntes em confronto. No mesmo ano, foi um dos dois oficiais da EsCEME condecorados com a Medalha do Mérito Militar no grau de Cavaleiro. Seu companheiro de condecoração foi o Cel Afonso Celso Bodstein, mais tarde seu companheiro no PREMEM.

Em 1964, Hugo assistiu na EsCEME a “Revolução” de 31 de Março. Logo no primeiro dia recebeu a incumbência, juntamente com Otavio Costa, de escrever uns textos que seriam lançados sobre o Rio de Janeiro, explicando o movimento militar. Seu texto bem como o de Otavio Costa não foi bem recebido pelos chefes. O de Hugo foi jogado numa gaveta e ele o recolheu tendo esse rascunho guardado consigo até hoje. Disseram-lhe que não tinha compreendido bem os acontecimentos. Talvez o Otavio Costa também não os tenha compreendido.

Pouco depois foi transferido para o EMFA onde serviria na 4ª. Seção sob a chefia do Cel Rodrigo Otavio até que ele saísse para auxiliar o General Juarez no Ministério dos Transportes. No EMFA, participou de vários projetos e assistiu ao planejamento inicial do sistema de telecomunicações, embrião do que hoje dispomos para interligar nosso imenso território.

Durante esse período, foi designado para fazer um inquérito no DNER. Pediu ao General Rodrigo que obtivesse sua liberação da referida tarefa, pois não tinha o menor pendor para funções policiais. Foi atendido, mas advertido de que isso poderia lhe prejudicar.

Mais adiante, foi selecionado, de acordo com os critérios vigentes, para fazer o curso do CID (Colégio Interamericano de Defesa) sediado em Washington. Houve quem tentasse excluí-lo objetando que era genro do Lott. O próprio Ministro da Guerra, General Costa e Silva, foi quem lhe contou o fato, numa visita que fez ao CID, quando Hugo já estava lá fazendo o curso.

O curso do CID foi um período muito interessante. Atividade rica em informação com palestras dadas por eminentes técnicos selecionados nas melhores universidades americanas. O Colégio era freqüentado por quatro representantes de cada estado membro da OEA. Os alunos eram oficiais superiores das três forças armadas ou diplomatas. O Brasil mandou dois oficiais do Exército, um da Marinha e um da Força Aérea. Durante esse curso, ocorreram os problemas políticos na República Dominicana que acabaram pelo envio de tropas da OEA, comandadas pelo General Hugo Panasco Alvin tendo como chefe do Estado maior o Cel Francisco Boaventura[47].

Terminado o curso Hugo voltou ao EMFA onde foi designado para presidir a um grupo de trabalho para estudar a indústria de construção naval. Era o fim do governo Castelo Branco e as recomendações do grupo de trabalho deviam considerar a extinção da indústria, julgada antieconômica pelo Ministro do Planejamento Roberto Campos, bem como a compra de 12 navios poloneses. As instruções do EMFA contrariavam ambas as intenções do planejamento e isso resultou em forte pressão sobre o Presidente do Grupo.

Durante esse tempo, foi convidado a comandar o 5º. BEC que seria criado para completar a estrada Cuiabá-Porto Velho. Recusou o convite por razões pessoais entre as quais estava absoluta desconfiança no General que fez o convite, o futuro Ministro dos transportes responsável pelo fracasso da Ferrovia do Aço.

No final do ano de 1966 Ligneul foi promovido a Coronel e classificado Comandante do 4º. BEC. Recebeu do General Euler Bentes Monteiro uma passagem de avião para ir a Crateús assistir à passagem de comando do General Sotero de Menezes, transferido para a reserva.

O problema era o tal grupo de trabalho da indústria naval cujo relatório ainda não estava pronto. Tão logo pode entregar o relatório ao Ministro Juarez, embarcou com a família para Crateús onde novos problemas o esperavam.

CAPÍTULO 3 – MEMÓRIAS DE CRATEÚS

3.1 ASSUMINDO O BATALHÃO

Em fins de 1966, Hugo Ligneul foi promovido a Coronel por merecimento, mantendo sua posição de primeiro da turma de Março de 43, na Arma de Engenharia. Conseguiu, portanto, chegar ao fim da carreira regular de oficial do exército, numa posição de destaque. Junto com todos os cursos e demais requisitos do regulamento. Todos pensavam que ele seria um General.

Faltava o requisito de comando, e Hugo foi consultado pelo Ministro da Guerra, como de praxe, se desejava assumir o comando do 4º Batalhão de Engenharia de Construção em Crateús, no sertão do Ceará.

Alguns colegas disseram a Hugo que ele podia conseguir coisa melhor. Mas ele achou que não deveria recusar. Afinal era ele ou outro colega.

Ligneul já estivera em Crateús e tinha gostado do lugar. Era um Batalhão bem nascido, fora organizado à imagem do 2º Batalhão Rodoviário de Lajes por uma equipe de ouro, comandada pelo Coronel Souto Maior. De mais a mais, ia receber o comando do Coronel Sotero, homem sério. Desta forma, Hugo respondeu agradecendo a honrosa designação, e foi classificado Comandante do 4º BEC.

Hugo entrou em contato com o General Euler Bentes Monteiro[48], Comandante do 1º Grupamento de Engenharia, o qual tinha sido seu capitão em Realengo com quem mantinha uma relação de amizade e respeito mútuos. Hugo disse ao General, que gostaria de assumir o seu comando, mas que estava preso a um compromisso com o Estado Maior das Forças Armadas. Tinha que apresentar um relatório final de um grupo de trabalho, presidido por ele, representando o EMFA, para definir a política de construção naval no Brasil. Desta forma, retido pelo grupo de trabalho, Hugo foi para João Pessoa e Crateús conhecer a próxima missão, mas resolvendo na viagem questões que ainda o prenderiam no Rio de Janeiro até março de 1967.

Em João Pessoa, o general Euler, após a passagem de Hugo por Crateús, lhe disse:

“Hugo, o Sotero vai lhe entregar um batalhão em bom estado. Acontece que você não esta disponível e o seu subcomandante assume o comando interino. Cuidado, quanto mais tempo você demorar a chegar, menos Batalhão vai encontrar…”

Era verdade, segundo Ligneul, o Barreto Cezar, Major Subcomandante Interino, não era fácil. Quando  assumiu o comando, três meses depois, recebeu menos Batalhão do que o Sotero havia lhe deixado.

Foi assim que em março de 1967, chegaram a Crateús, via João Pessoa, num velho bimotor pilotado por um oficial da FAB. Hugo Ligneul, sua esposa Elys e seus dois filhos, Jorge com nove anos e Victor com quatro.

Chegaram antes das chuvas e encontraram Crateús sofrida pela seca, mas foi só chegar e começar a enchente de 1967.

Em Crateús o povo sem terra ocupava as várzeas e o próprio leito dos rios, após a estação das águas. Quando chovia perdiam tudo, pois não tinham tempo, para retirar os seus pertences.

Em março de 67, logo após a posse de Hugo no comando do Batalhão, chegaram as chuvas e com elas a fuga dos ocupantes do leito do Rio Poty. O Prefeito da cidade, pouco letrado, porém, espertíssimo e acostumado a ganhar dinheiro com o drama do nordestino, botou a boca no mundo anunciando “Calamidade Pública”, no intuito de pedir verbas para resolver os problemas da população atingida. E era a famosa, “Indústria da Seca” [49]às avessas.

O Batalhão colocou a serviço dos flagelados, todos os meios disponíveis, inclusive verbas das diferentes fontes de recurso das obras civis. A Diocese de Crateús mobilizou seus recursos humanos e começou a agir com rapidez e eficiência. Coordenando juntos, Batalhão e Diocese, suas ações para evitar os desperdícios e aperfeiçoar os resultados.

Ligneul chamou o Prefeito da cidade e lhe disse que estava prejudicando o esforço de todos, em vez de ajudar, uma vez que sua ação semeava pânico e desencorajava a auto-ajuda incentivada por eles. Para os políticos da cidade, era mais cômodo sentar e esperar o milagroso auxílio do governo.

Acabou a enchente e todos voltaram à vida normal, ficando o canal de comunicação com Dom Fragoso[50]e uma cautelosa desconfiança do Prefeito.

No Batalhão, Hugo resolveu alguns problemas de pessoal, herdados de Sotero, entre eles os protestos de um Capitão Médico lutando contra sua transferência para outra cidade.  Hugo resolveu os problemas de maneira inteligente, de modo que nem o médico, nem outros lhe criaram mais problemas.

A rotina do Batalhão foi se revolvendo. Ligneul se adaptando ao novo cargo, e adaptando o Batalhão aos seus princípios e pontos de vista. Acabou com mordomias, proibiu o uso de recursos do Batalhão em benefício de indivíduos, cuidou de melhorar as condições sanitárias e ambientais, tratou de que horários fossem respeitados e, principalmente, que as metas de construção e instrução fossem cumpridas.

Aprovado o programa de 67 pelo 1º Grupamento, Hugo reuniu no quartel as lideranças de Crateús e lhes fez uma exposição dos recursos disponíveis e dos compromissos assumidos pela unidade. Prometeu reuni-los no próximo ano para prestar contas das realizações e custos com os recursos públicos. Desta forma, Hugo pensou estar contribuindo para que o respeito pelo batalhão, – e por extensão pelo exército – aumentasse na área de ação da unidade.

Procurou se aproximar de Dom Fragoso De início encontrou um pouco de desconfiança. Foi preciso que se conhecessem melhor mas não demorou muito. Assim, quanto mais Hugo obtinha a confiança do Bispo, mais se comprometia com um comportamento de lealdade que não seria exatamente compreendido pelos chefes do exército.

Hugo freqüentava as reuniões da Diocese, sempre sozinho e conhecia intimamente os movimentos pastorais. Era quando aproveitava para conversar com seu amigo Fragoso, pois lá, naquela terra tão carente, o Bispo era uma das poucas pessoas com quem Hugo podia dialogar, uma vez que a pobreza de educação era geral, e o religioso, um oásis de conhecimento.

Nesse meio tempo, chegaram ao Batalhão os oficiais para completar o efetivo. O engenheiro Major Jayme foi substituído por três engenheiros recém saídos do IME. Bosco, Crisanto e Fortes. Havia um boato de que o Batalhão receberia uma missão de construção de casas em Fortaleza e todos três queriam essa oportunidade. Servir num Batalhão de construção, ganhando o adicional correspondente e morando numa capital, longe dos acampamentos, era uma tentação.

Hugo não se comprometeu, mas reconheceu  o direito de escolha ao primeiro colocado da turma, tenente Crisanto de Almeida. O Capitão Fortes e o Tenente Bosco ficaram na seção técnica em Crateús, substituindo o Jayme que saia. O grupo teve muito trabalho, principalmente na coordenação da entrega de obras que estavam atrasadas e com problemas técnicos.

No desenvolvimento da instrução de oficiais, que se desenrolava aos sábados, quando os comandantes de Cia. e chefes de Residência destacados vinham à sede prestar contas, o Coronel Ligneul teve que cumprir um programa de natureza política. O assunto principal era a Guerra Revolucionária  e suas ameaças, num mundo bipolarizado onde o Brasil se colocava ao lado do ocidente. Isso implicava em se começar por uma discussão de natureza política.

Seu subcomandante ofereceu-se para tratar do assunto. Ele havia concluído recentemente o curso da EsAO e tinha apostilas muito atualizadas. Mas além de alienado ele era também pouco inteligente e não enxergava nada que não fossem os chavões das apostilas que ele mal chegara a compreender.

Hugo agradeceu o oferecimento, mas objetou que política não era o forte dos militares e que nem mesmo o Comandante se sentia em condições de falar daqueles temas ditando idéias acabadas e definitivas. Sua decisão foi discutir os assuntos da temática com os oficiais, aceitando seus conhecimentos, suas idéias e pedindo que procurassem se preparar para as sessões de discussão dirigida.

Hugo fez um questionário e distribuiu aos oficiais, procurando por em discussão o entendimento das definições de democracia, autoritarismo, ditadura, capitalismo, socialismo, comunismo, etc. Procurando estabelecer os compromissos entre os sistemas econômicos e os regimes políticos.

A primeira discussão foi muito boa e ofereceu a oportunidade de consultar os oficiais sobre a possibilidade de convidarem o Bispo Dom Fragoso para conferência na próxima sessão. Ele viria sem compromissos, as perguntas seriam absolutamente livres, havendo apenas o dever de tratá-lo com cavalheirismo e educação. A maioria dos oficiais aceitou a idéia. Restava obter a permissão do comandante da 10ª Região Militar (Fortaleza) e a aquiescência do convidado.

Ligneul, então, falou com o General Dilermando em sua próxima viagem a Fortaleza e recebeu a permissão. O General pediu-lhe apenas que lhe relatasse os resultados obtidos.

Hugo procurou em seguida Dom Fragoso que, gentilmente, aceitou as condições que lhe foram impostas.

No quartel, os resultados foram excelentes. Dom Fragoso foi bombardeado de perguntas, nem sempre bem formuladas, mas respeitou-as com paciência, por mais irritantes que pudessem ser. Sua instrução, sua experiência, sua compreensão inteligente permitiram que impressionasse os oficiais, especialmente, os mais honestos e bem intencionados. Não conseguiu nada com um ou dois cabeças duras que, entretanto, juntaram-se aos restantes na opinião de que Dom Fragoso era uma pessoa bem informada, inteligente e capaz.

Pouco depois desse acontecimento, o Major Barreto tentou gravar um programa da Diocese na radio de Crateús usando os equipamentos do escritório do Batalhão. Essa atitude, pouco inteligente – pois seria muito simples ele gravar tudo que quisesse em sua própria casa – podia prejudicar muito a aproximação de Hugo com Dom Fragoso.

Ligneul proibiu o Major de repetir essas asneiras e ele, deslealmente, fez um informe para o Serviço de Informações[51] tentando envenená-lo com os “maníacos” de serviço. Somente mais tarde, Ligneul viria, a saber, disso, no entanto,  Hugo já havia incluido em seu relatório periódico de informações, sua versão dos fatos, cuidado sempre presente em sua passagem por Crateús.

Entre os oficiais novos do 4º BEC, dois tiveram destaque nesse período da vida de Ligneul, um deles o 1º tenente Dentista Garcia, de muitas habilidades, que sabia tudo, menos  sua a profissão de cirurgião dentista, o que trazia muitos aborrecimentos e preocupações; o outro, pelo contrário, se tornaria amigo de Hugo para o resto da vida: o Capitão Fujita.

Capitão João Batista Fujita, filho de um imigrante japonês radicado em Fortaleza, era um dos melhores oficiais de Ligneul. Sua Companhia de Independência era um modelo de administração e eficiência, e por isso ganhava respeito de admiração de seu comandante. Desta forma, tão logo receberam os recursos para construção das quinhentas casas do IPASE em Fortaleza, Ligneul destacou Fujita para o cargo, dando-lhe o cheque com os recursos totais e lhe recomendando somente o cuidado com o cronograma Do resto Hugo sabia que ele daria conta. E estava certo.

Mais tarde, quando Hugo foi destituído do Comando do Batalhão, Fujita participou do “protesto dos oficiais”, sendo punido e posteriormente pedindo demissão do exército, partindo para vida civil, trabalhando como empresário de construção no Ceará. Hoje, seu amigo Fujita é um nome respeitado nacionalmente na construção civil. Sua empresa está entre as maiores do norte e nordeste do país. Fujita é líder da categoria empresarial no Ceará, o que enche Hugo de satisfação, pois uma das suas maiores preocupações foi quando seus oficiais, ainda jovens, se demitiram do exército em conseqüência do seu afastamento de Crateús. Pois, por menos que dependessem dele, Hugo sentiu o peso de uma enorme responsabilidade pelo destino desses amigos.

Já o “Dentista” Garcia tomava conta dos terrenos do 4º BEC (2,5 Km²) incluindo nisso, o paiol, bem provido de explosivos – comprados com as verbas de construção – e de dispositivos de acionamento fornecidos  pelos órgãos de suprimento do exército. Garcia sabia usar explosivos e acionadores de todo tipo. Nisso, ele era bom.

Um dia, Garcia brigou com o Capitão médico Fernandes. Fernandes era sério, não gostava de safadezas. Apertou Garcia que correu para Hugo. Nesse tempo ainda tinham boas relações, e apesar de achá-lo um pouco desorganizado e atrapalhado, Hugo simpatizava com umas habilidades de Garcia.

Diante da queixa do dentista, Ligneul foi mais cauteloso, esperou a ação do médico. Quando este o procurou, Hugo chamou o tenente e os pôs cara a cara. O Garcia não resistiu e ficou claro que o Fernandes estava cheio de razão. Ligneul aplicou os corretivos necessários e deu ao Capitão as satisfações que merecia fazendo valer sua autoridade.

Depois desse fato, as relações de Garcia com Hugo jamais seriam as mesmas. O goiano Garcia nunca o perdoou e esperou a oportunidade certa para dar o troco. Sendo ele um dos oficiais que forneciam informações ao “Serviço do Fiúza”, CIEx[52].  Mais tarde na transferência de Hugo e sua família de Crateús para o Rio, Garcia aparece como bastante capacitado para ter dado uma ajuda ao incêndio da bagagem no caminhão alugado pelo exército para fazer sua mudança, uma vez que ele era bom em explosivos e dispositivos de acionamento.

Um dia, após a questão com Fernandes, Garcia procurou Ligneul e lhe disse que havia chegado a Crateús, na única livraria da cidade, certo número de exemplares de um livro chamado “Torturas e Torturados” [53]. Ligneul, respondeu: “Sim e daí?” E Garcia disse que: “Daí que eu estou nominalmente citado nesse livro como torturador, quando servia em Goiás. Sugiro que o senhor apreenda os livros que são subversivos”.

Hugo lhe respondeu que não podia e não queria fazer aquilo, e que se estivesse tão incomodado o próprio Garcia deveria comprar todos os exemplares e dar a eles o destino que bem entendesse.

Mais um motivo para as ações posteriores de Garcia. Se, no caso do Fernandes, ele tinha sido apenas profissional, acima da pretendida amizade pessoal que os ligava, no caso dos livros Hugo mostrou seu lado político vulnerável. Garcia deve ter anotado. Possivelmente conversou com seus companheiros do CIE.

No dia 1º de maio de 1968 houve uma série de comemorações em Crateús promovidas pelos sindicatos. Na véspera, Hugo estava na casa de Dom Fragoso onde participou dos preparativos, inclusive da leitura de um auto chamado: SUDENE[54], desenvolvimento sem Justiça, preparado em Recife, que seria lido no palanque armado na praça.

Ligneul leu o auto com os operários e, mais tarde,  perguntou-lhes se seria convidado para as comemorações. Os operários responderam que não o iriam convidar. Hugo recomendou que eles se portassem estritamente dentro da lei, pois não gostaria de ser chamado a agir contra eles usando a tropa. Hugo complementou dizendo que haveria o patrulhamento normal para garantia da manutenção da ordem..

Hugo voltou para o quartel e deu suas ordens. Haveria uma patrulha de serviço. Os oficiais ficaram sabendo que não estariam nos palanques como convidados. Ligneul, então, estava despreocupado na sala ao lado do seu gabinete usando uma estação de Rádio Amador quando chegou afobado, o Tenente Bosco,  um de seus três oficiais engenheiros e S2 do batalhão.

Bosco contou-lhe que estivera na cidade com mais três companheiros e fora hostilizado com palavras pelos oradores de manifestação operaria. Hugo pediu maiores esclarecimentos e acabou sabendo que Bosco, Barreto, Garcia e um sargento estavam observando o palanque e tirando fotografias dos oradores quando Messias, líder estudantil, filho de um dos  operários no Batalhão, denunciara os oficiais aos companheiros: “Olha lá, ali estão quatro oficiais do Batalhão tirando fotos!” E houve gritaria, protestos e ameaças. Os quatro bateram em retirada.

Hugo se irritou com Bosco e disse:

“Mas vocês são uns vira-latas. Onde se viu tirar fotos de um palanque em situação semelhante? E com uma Kodak Caixote[55]? Mas é de uma burrice sem limites. Vocês quatro estão colocando em perigo todo um trabalho meu de meses de duração”.

O próximo RPI relatou a versão de Hugo dos acontecimentos. Certamente, os meninos rebeldes, estimulados pela verdadeira subversão de disciplina do Exercito que era a existência de um canal de informações, paralelo ao canal de comando, expediram suas versões fantasiosas de um Coronel, aliado aos Sindicatos, contra seus próprios oficiais.

Certa vez chega a Crateús um colega de Infantaria, Comandante de um Batalhão de Caçadores em Fortaleza, pedindo que Ligneul emprestasse os caminhões do 4º BEC para transportar seus soldados numa manobra em Tauá. Tauá era localidade dentro da zona de ação  do 4º BEC, onde construía um sistema de irrigação. Era uma região muito carente de verbas onde  um projeto se arrastava havia anos. Muitos dos soldados de Hugo eram de Tauá, onde seus país e irmãos viviam. Manobra de Infantaria em Tauá em 1968, significava, confrontar um inimigo camponês guerrilheiro com soldados regulares que os derrotariam. Psicologicamente, para a segurança da zona de ação de Ligneul, não poderia haver nada pior. Se houvesse lideranças inteligentes essa manobra só poderia dar resultados negativos.

Hugo respondeu ao colega que não poderia emprestar os caminhões. Eram pagos pelas verbas de obra e fariam falta à produção, além do mais, eram caminhões basculantes, sem conforto e perigosos para os soldados. Não poderia emprestar. O colega ficou decepcionado

Então Ligneul revelou seus verdadeiros motivos dizendo: se você  fantasiar seus soldados com um capacete russo ou americano e  fizer  a manobra com os guerrilheiros, derrotando os invasores, eu empresto os caminhões. O oficial desistiu. Deve ter ido contar a estória ao “Serviço”.

As nuvens iam se acumulando e a tempestade se aproximava…

3.2 1968, O ANO SEM FIM

No resto todo o Batalhão ia bem, o tal subcomandante tanto fez que um dia foi transferido. Em seu lugar, Hugo recebeu um dos melhores companheiros que conheceu no exército – Major Gilson Mulhoz de Carvalho, Junto com ele veio outro ótimo companheiro, o Major Fonseca. Desta forma, a administração chegou ao auge quanto ao controle e á economia. Os serviços andavam bem e as metas foram cumpridas. O equipamento nunca tinha conseguido um grau tão alto de disponibilidade.

O oficial americano da missão, Major Highfill, lhes fez uma visita e só houve elogios quando foram vistas a qualidade das obras e a organização do Batalhão.

A construção da barragem do Poty foi terminada antes das chuvas de 1968. Tinham mais que quadruplicado a capacidade do reservatório que ia suprir a Estação de Tratamento de água da cidade. Nesta ocasião em 68, Hugo reuniu as lideranças de Crateús prestou contas e convidou a todos para uma viagem de trem a Castelo do Piauí, na Estrada de Ferro concluída pelo Batalhão e com o trem tracionado pela locomotiva que haviam conseguido no Porto do Ceará.

Em Castelo Hugo teve uma surpresa agradável.  Seu cunhado Lauro e família vieram de Recife lhe fazer uma visita. Lauro Henrique Lott chegou pilotando um B-25 (adaptado) da 2ª Guerra Mundial. Foi realmente uma alegria, esse encontro tão inusitado.

Chegando de volta a Crateús, tendo feito a viagem de volta no B-25, o clima de festa entre família foi subitamente interrompido pela notícia de que o pai de Hugo havia sofrido um acidente vascular e estava em estado grave na Clínica Dr. Eiras[56] no Rio de Janeiro. Tia Alice (irmã de Georges) que estava em sua casa, aproveitou a viagem do Lauro e voou para Recife de onde pegou uma carona no mesmo avião para o Rio.  Hugo esperou o dia seguinte e foi de Electra para o Rio. Chegou em plena época das manifestações estudantis[57]. Encontrou no aeroporto um automóvel do Ministério dos Transportes á sua disposição, por gentileza de Andreazza[58] e Ajace.

Nada podia fazer. Visitou o pai,  tratou de negócios do Batalhão. Conversou com as autoridades militares e os amigos do Ministério dos Transportes e voltou para o seu posto de comando.

Em Crateús, a vida continuava e os movimentos da Diocese se tornaram cada vez mais ativos. Nos contatos Hugo falou da situação do seu pai que se agravava e lhes contou o que tinha visto no Rio de Janeiro a respeito das manifestações estudantis. Disse-lhes que pensava que a repressão se agravaria e que todos estavam subestimando a força da ditadura.

Hugo recomendava moderação, inteligência, paciência, mas não quis jamais proibir, impedir, reprimir. Disse que sentia próximo o dia em que ele mesmo seria transferido de Crateús e aí as condições seriam péssimas para os movimentos de educação popular. Ele sabia que entre a comunidade havia indivíduos mais radicais, que  mais cedo ou mais tarde, iriam querer usar a força como aconteceu mais tarde no Araguaia. Mas Ligneul não fez chantagem, não pediu que o poupassem nem que pensassem nas ameaças  às suas chances de promoção.

Já pelo meio do ano de 1968, Dom Fragoso resolveu iniciar uma campanha de alfabetização de adultos. Elegeu o Método Paulo Freire[59] e organizou o treinamento dos futuros professores. Pediu voluntários e até a esposa de Hugo aceitou o convite para ensinar.

Todas as organizações de Crateús atenderam ao pedido de Dom Fragoso e apoiaram materialmente seu projeto. O 4º.BEC  se comprometeu a fornecer umas resmas antigas de papel de imprensa que estavam sobrando.

Atrás do papel, um dia a moça do MEB[60] entrou no  gabinete de Hugo e lhe perguntou se o Batalhão não teria um desenhista para ajudá-los com as gravuras da cartilha que seria dada aos alunos.

Ligneul tinha sim, um ótimo desenhista. Mandou procurar o Sargento Mário Georg na 3ª. Seção. 

Interessante a coincidência, pois quando Hugo chegou, em Crateús, para comandar o Batalhão, percorreu toda a área sobre a qual tinha jurisdição. Eram quase cem quilômetros de raio.. Era uma região muito podre e muito seca, de maneira que toda a estrutura perto da sede do Batalhão parecia um grande oásis. Quanto mais perto a pessoa estivesse desta sede, mais recursos teriam á sua disposição. Nessa ronda pela região o Coronel Ligneul foi até Tauá, que era o último “buraco” de seu Batalhão. Lá, ele encontrou um sargento bonito, alto, casado com uma moça bonita também, com dois filhinhos loirinhos de olhos azuis, morando sozinhos no fim do mundo. Hugo olhou para a parede e viu os trabalhos a cargo do sargento representados num quadro com lindas, miniaturas de tratores, um trabalho gráfico de alta qualidade..  Hugo perguntou: “Quem foi que fez estes desenhos”? O Sargento respondeu: “Fui eu senhor”!

Hugo lhe perguntou o que estava fazendo ali naquele buraco com tanto talento. Para sua surpresa o Sargento Mario Georg, descendente de alemães, nascido na Região Sul do Brasil respondeu-lhe: “Coronel, eu vim para o seu Batalhão a bem da disciplina, pois fazia parte de um “grupo de 11”[61], lá do Sul, em 64. Fui transferido de Bento Gonçalves para cá”.

Mario Georg fazia parte de um dos grupos de 11 do Brizola.[62]. Hugo o encarou e disse: “você gostaria de ir para a sede do Batalhão, para fazer lá isso que está fazendo aqui? Vou transferi-lo para a 3ª. Seção do Batalhão. Lá você estará mais bem aproveitado.”

O Sargento Mario não poderia ter ficado mais agradecido, ele e sua família iriam morar na sede do Batalhão. Mario era um sujeito bem tranquilo, com muitas habilidades, não criava problemas, nunca esqueceu essa nova oportunidade. Esta seria mais uma amizade para o resto da vida.

Mario Georg adaptou-se rapidamente às suas novas funções. Procurado pela menina do MEB fez muito bem feitos os desenhos da cartilha. O alemão era. segundo Hugo, um verdadeiro artista. Com os instrumentos da época, mimeógrafo e estêncil ele fez um belo trabalho. A matriz das gravuras era feita em estêncil de cera onde os desenhos eram feitos com estilete. E assim iam saindo às páginas da “Tal Cartilha”, com suas letras, figuras e palavras, retiradas do universo vocabulár da população local, as quais serviam de base para a alfabetização.

LABUTA, FOME, TIJOLO, SOCIEDADE, VOTO, POBREZA, CASA, TERRENO, ENXADA, CHUVA, MISSA, ESTRADA, FILHO, DOENÇA, CARGA, EMPREGO, COMPANHEIRO.

Foram estas as palavras da cartilha, devidamente, ilustradas e mimeografadas em papel barato. Uma cartilha bem simples, como toda aquela gente e aquela região. Eram pessoas muito pobres e carentes. Notou-se que na classe de Elys oito pessoas não enxergavam o quadro negro, Hugo pediu que o oftalmologista do Batalhão examinasse os alunos de Elys. Resultado, Hugo comprou do seu próprio bolso os óculos necessários..

Naturalmente quem escolheu as palavras, o fez para fazer comentários, não podemos dizer que não, por que é verdade.  Hugo se recorda de frequentar o Centro de Treinamento de Líderes, rezar com eles Um dia uma moça lhe disse: “ Coronel, homens como o senhor atrasam a processo.. O senhor deveria arranjar fuzil e munição para nós”. Nesta hora, dava para ver o grau de confiança que esta gente tinha nele, pois sabiam que Ligneul seria incapaz de denunciá-los. Ele somente os aconselhava, e dizia: “Minha filha, você está errada, você não conhece o seu inimigo, você está menosprezando um inimigo forte, você vai morrer se continuar por esse caminho”. Nos próximos anos, tudo seria diferente. Depois de saída de Hugo de Crateús, muita gente sumiu, foi presa e torturada, já não havia mais complacência.

Na hora de rodar a cartilha, a moça do MEB aparece novamente perguntando a Ligneul se ele não poderia emprestar o mimeógrafo, pois o deles tinha quebrado. Mais uma vez, Hugo diz: “Está bem, vá pegar com o Sargento Georg na 3ª Seção, você já sabe onde é”. E lá se foi à moça para o ato final de incriminação do coronel, acusado depois  de editar no 4º BEC uma “cartilha subversiva”.

O Método Paulo Freire era reconhecido, internacionalmente e, naquela época tinha acabado de ganhar um prêmio na ONU. Mas no Brasil “Eles” não pensavam assim, achavam que o Paulo Freire era um comunista, e que o método era subversivo. Hugo tinha muito trabalho para argumentar com seus colegas aos quais era subordinado. Ele lhes dizia que um método não pode ser chamado de subversivo, pois isso não é qualidade de método, um método pode ser eficiente, pouco eficiente, mas subversivo, não. Toda esta argumentação não adiantava, pois a ignorância era muito grande. É claro que por traz da alfabetização, tinha-se um objetivo maior, que era o da conscientização. Conscientizar o povo era um perigo, pois dava-se consciência daquilo que ele podia reivindicar. Então você transformava o povo, tornando-o mais exigente e mais difícil de ser conduzido.

Hugo, pessoalmente nunca foi de Esquerda. Sempre foi uma pessoa conservadora, mas não alienada, uma pessoa que tem a mente aberta para idéias novas, que não devem ser reprimidas. As novas idéias devem ser discutidas e examinadas. No entanto, Ligneul foi criado dentro de um padrão de patriotismo, de amor à pátria. Assim, como todos no exército, são doutrinados no patriotismo, não são “entreguistas”.

Todavia, o militar é um funcionário público, seu salário é pago pelo governo. A tendência é ser a favor do governo e, na maioria das vezes, ele o é. Mas isso não descarta a possibilidade de diversas linhas de pensamento, o que, propriamente, não causava repugnância até o governo do Castello Branco. No exército era comum encontrar muito nacionalismo, ao qual se unia o socialismo. Muitos da geração de Hugo simpatizavam até com o nazismo, O que não lhes causava estranhezas e nem desconfianças ou paranóias. Há de se convir que a formação política militar sempre foi muito deficiente, pois seus cursos iniciais de estudo são todos baseados em Matemática, Física, Química, Mecânica, deixando quase que zero a Sociologia, a Economia e Filosofia. Essas ciências sociais eram ausentes nos currículos, então, havia sempre uns oficiais que eram autodidatas, curiosos e gostavam de ler. Esses indivíduos passaram a ser considerados suspeitos, pois os Generais não gostavam de muita sabedoria, eles queriam muita obediência. Havia muita ignorância, porque eles tinham muito medo do que não conheciam.

O capítulo final começou com uma armação em que tomaram parte vários “Generais”…

Em junho de 1968 Hugo recebe a incumbência de ir ao Rio de Janeiro tratar de problemas de liberação de verbas para o orçamento do 4º BEC. Ele aproveitaria para visitar seu pai que continuava hospitalizado, nessa ocasião, fazendo uma cirurgia em situação muito crítica.

No Rio, Hugo praticamente não teve o que fazer, o tal problema orçamentário nunca existiu. Aproveitou o tempo para estar com a família. Assistiu a uma séria de passeatas e greves que enchiam o centro do Rio de manifestantes. Havia correria, espancamentos, prisões e até mortes.

No Ministério da Guerra Ligneul visitou o seu amigo, ex-instrutor, ex-chefe do Curso de Engenharia no CPOR do Rio de Janeiro, Coronel Samuel Augusto Alves Correa. Com a intimidade que os ligava Hugo contou-lhe todos os problemas que estavam acontecendo em Crateús abrindo-se inteiramente quanto à sua compreensão da situação. Samuel não deu opinião, apenas se lamentou de estar sendo ultrapassado pelos companheiros de turma na promoção ao generalato, estava muito queixoso e sem esperanças.

Hugo voltou a Crateús passando por Recife onde visitou o General Malan[63]·, Comandante do 4º Exercito, seu antigo Instrutor Chefe de Engenharia e em seu tempo de cadete em Realengo, seu ex-subchefe no Estado Maior do Exército.

Malan tratou-o com amizade, ouvindo todas as suas opiniões, duvidas e interpretações. Perguntou-lhe diretamente a respeito de uma “Tal Cartilha” que Hugo tinha editado no 4º BEC.

Ligneul contou-lhe toda a história, em pormenores. Disse o que pensava da cartilha, do método Paulo Freira, do Programa de Alfabetização e da prontidão do Batalhão em prestigiar uma campanha de ajuda à população da região. Não houve reprimendas, nem advertências, nem mesmo conselhos. Hugo prometeu ao General que assim que chegasse em Crateús lhe enviaria um exemplar da cartilha.

Em João Pessoa, a mesma coisa. Hugo conversou com o General Vinicius, Comandante do Grupamento de Engenharia que manifestou muita preocupação quanto ao seu futuro, face ao falatório nas altas esferas a seu respeito. Mas não houve argumentos para lhe convencer de que estava errado. Apenas dizia que Hugo estava se prejudicando. Isso ele sabia… Mas, que fazer… Vender sua consciência por uma promoção futura a general?

Em Crateús, Hugo encontrou seu substituto eventual, Coronel Gilson, muito desconfiado. Contou-lhe que em sua ausência tinha visitado o Batalhão o Major Sobreira, seu ex-cadete na AMAN, pessoa medíocre, sem muitas qualidades. O Sobreira apareceu em trajes civis para visitar a família de sua mulher, dona de terras em Crateús, certamente incomodada com um Comandante de Batalhão que não fazia a política dos donos de terra. Procurou a “Tal Cartilha” por todo o batalhão até consegui-la da mão do Capitão Barreto, como se fosse um Agente 007.

O Gilson, quando começou a suspeitar dos verdadeiros motivos da visita do Sobreira ficou muito indignado. Estava furioso quando relatou os fatos ao Ligneul.

Assim mesmo Hugo saiu de férias com a família. Por falta de dinheiro aceitou uma carona do avião do Grupamento e foi para João Pessoa e Natal, onde usou as casas de hóspedes das unidades (pagando) para gozar uns dias de descanso. Em Natal, Hugo conversou bastante com os companheiros do quartel general do Grupamento e do Batalhão de Construção. Foi, gentilmente, tratado pelo General Vinicius e pelo Coronel Ergilio. Em Natal, o Coronel Eliano Moreira, seu ex-cadete também foi amabilíssimo.

Mas, nenhum deles teve coragem de dizer uma palavra sobre o que todos já sabiam. Que Hugo Ligneul ia ser DESTITUIDO DO SEU COMANDO.

Findas as férias, Hugo voltou a Crateús de avião com a família. Nem bem tinha descarregado as malas e já recebia um Radiograma convocando-o URGENTE, para João Pessoa, para tratar de sua destituição. Veio novamente o avião buscá-lo. No Grupamento, os mesmos amigos da véspera mal o olhavam nos olhos. Hugo voltou a Crateús para preparar as malas e voltar ao Rio para onde, segundo constava, seria transferido.

A interrupção de seu comando, antes de completar os dois anos do requisito, por motivo aparentemente político, apesar de nunca explicado, significou o fim de sua carreira, pois a promoção ao generalato, agora seria praticamente impossível. Daí para diante seria esperar doze anos se passarem – com os colegas sendo promovidos – até Ligneul cair na expulsória.

Hugo recebeu algumas cartas de colegas bem conceituados e bem situados, dizendo-lhe que ficasse quieto, pois logo todo mundo já tinha esquecido o fato. Ligneul sabia que não era bem assim. A partir de 1968 o Brasil já não era mais o mesmo, os valores estavam trocados, os amigos agora eram delatores, as famílias divididas, a Igreja dividida. Havia um medo generalizado e uma intolerância doentia, as palavras precisavam ser controladas e a ajuda comunitária era vista como ação comunista assim como os simples grupos de amigos podia ser vistos como facções reacionárias. O muro[64] que separava as duas Alemanhas separava também o Brasil, não somente em Capitalistas e Socialistas, mas, principalmente, entre Grandes Proprietários e Sem Terras, Poderosos e pobre coitados, Governo e cidadão e entre mães desesperadas e soldados militares.

Os dias corriam e Hugo se preparava para deixar o Batalhão. O primeiro substituto seria um ex-cadete que acabara o Curso da Escola Superior de Guerra, em Paris. Preferiu pedir transferência para Reserva a ir para Crateús. Teve que indenizar ao Tesouro Nacional os dois anos de Curso em Paris não aproveitados pela nação.

A segunda opção era nomear seu próprio subcomandante. Ele, porém se apressou a fazer sentir aos seus superiores que nada mudaria em Crateús com a sua nomeação, pois estava inteiramente de acordo com todas as ações de seu comandante.

E, então, designaram interinamente o Navarro, também ex-cadete de Ligneul, servindo no Grupamento em João Pessoa. Navarro veio calado, sem fazer alarde, mas Hugo sabia o que os Generais não sabiam que sua esposa tinha trabalhado na Ação Católica[65] com Dom Fragoso, de quem era amicíssima. Navarro durou pouco tempo e logo foi substituído pelo “Linha Dura”. Companheiro do General Mourão no golpe de 64, ex-cadete de Hugo, Coronel Alísio Sebastião Mendes Vaz.

Mas quando Hugo se preparava para sair o Gilson resolveu “balançar a roseira” e deu parte do Barreto que o tinha traído no caso da cartilha surrupiada pelo Sobreira. Na apuração dos fatos, já escabreado, Ligneul resolve gravar toda uma reunião de oficiais em que se despediu do Batalhão.

Hugo se despede também da cidade, por convite dos amigos e autoridades, no clube da região. Fez um discurso emocionado no Clube Sargento Hermínio e deixou uma nota de despedida na Rádio Educadora de Crateús:

O Coronel Hugo José Ligneul, na impossibilidade absoluta de se despedir pessoalmente, visitando as inúmeras pessoas que o distinguiram com sua amizade, não só em Crateús como na zona rural adjacente, vem por intermédio da Radio Educadora apresentar suas despedidas e manifestar desde já sua saudade por tudo que deixa nesta terra.

Em seu nome e no de sua esposa, agradece as gentilezas e atenções com que os cumularam colocando-se à disposição de todos em seu endereço no Rio de Janeiro, na Rua Xavier da Silveira, 85, Ap. 501, em Copacabana.

Da mesma forma, pela rádio e publicada nos jornais da região, o Bispo de Crateús, Dom Antonio Fragoso, lança sua nota de despedida ao amigo Hugo Ligneul:

Um Grande Soldado

Chama-se Hugo José Ligneul, até agora, comandante do 4º BEC em Crateús.

Correu a noticia de sua transferência. Não sei para onde. Não sei por quê.

O Coronel Ligneul fez-me ter confiança nos homens de bem que há nas Forças Armadas. Devo-lhe a alegria do contato com o General Dilermando Monteiro. Para mim ele tem o sentido do serviço do povo brasileiro, de dignidade humana, da justiça, da honestidade como poucas vezes eu vi.

Coronel Ligneul assumiu a vida militar como uma vocação. Nunca adulou ninguém. Conservou a liberdade de espírito diante de todos e de tudo. Crateús deve-lhe um profundo reconhecimento, se quiser ser coerente.  Ele criou um ambiente de paz e segurança. Por isso mesmo não lhe faltava autoridade moral para advogar sempre o uso de meios pacíficos.

Por ocasião de instalação de sindicatos rurais, ele estava presente para dizer que a sindicalização era postulado da Constituição Brasileira, era órgão de justa cooperação com o governo brasileiro, que os trabalhadores lutassem por seus interesses por meios pacíficos, dentro da justiça e da ordem. Boatos de origens turvas diziam ao povo que o sindicato era comunista e que os sindicalizados poderiam ser presos pelas forças armadas. A presença do Coronel Ligneul matava pela raiz o terrorismo dos boateiros.

Quase dois terços dos adultos de Crateús são analfabetos e marginalizados. Com o seu sentido da dignidade humana, ele estimulou os esforços de esclarecimento e educação de base através do Movimento de Educação de Base e dos Círculos de Cultura. Os Círculos de Cultura utilizam um método cientifico que parte do universo vocabular do povo para ajudá-lo a adquirir as técnicas elementares de leitura, de escrita e da reflexão e a tomar consciência de si, dos outros e do mundo.

Nesta mesma linha, colaborou com o Centro de Treinamento de Líderes de Crateús, onde se educam os animadores dos movimentos de proporção humana.

Crateús lhe deve uma estação de tratamento de água, iniciada na gestão do General Sotero de Menezes, uma barragem de 600 metros de parede, em concreto, com 3.200.000m³ de água acumulada para o abastecimento da cidade, uma centena de quilômetros de rodovias e ferrovias básicas, um conjunto residencial para funcionários, etc.

Crateús deve-lhe, sobretudo, a admiração diante do testemunho de um homem de bem. O Bispo de Crateús vê no Coronel Ligneul um cristão coerente. Nunca promiscuiu vida militar e religião. Mas a fé adulta e esclarecida motivou, nutriu, iluminou a substância de sua vida de homem.

Cristão é quem luta para derrubar as barreiras que separam os Homens. Coronel Ligneul foi um tombador de barreiras. Aproximou os civis e os militares à base de confiança. Num respeito sincero à hierarquia militar ele acolheu sempre com igual justiça oficiais e praças. Muitas vezes procurou fazer-me descobrir a significação da vida militar, sua psicologia específica, para que eu o compreendesse retamente.

A meu ver, Coronel Ligneul combateu mais em Crateús as raízes da subversão do que todos os clamores e esquemas de força do anticomunismo negativo. Quando corre a notícia da transferência do Coronel Ligneul eu me pergunto: Por quê? E lamento profundamente, como se lamente a ausência de um irmão.

Dom Antônio Fragoso
Bispo de Crateús
Fortaleza, 5 de agosto de 1968.

Após a cerimônia de passagem do comando para o Navarro, Hugo sentiu que começava um murmúrio entre os oficiais. Entre umas e outras tomadas no almoço de despedida resolveram fazer um protesto por escrito. Situação disciplinar grave, Navarro já no comando, confidenciou a Hugo a intenção dos companheiros e o malogro de seus conselhos para que desistissem da ação.

Navarro partiu para João Pessoa e deixou Gilson no comando interino. Ligneul arrumando as malas e providenciando a mudança para o Rio num caminhão alugado pelo Exército.

Foi Navarro decolar e o Gilson com o Dr. Fernandes foram à estação de rádio de Crateús e levaram o manifesto que dizia:

OFICIAIS DO 4º BEC FALAM AO POVO

No momento em que é exonerado do comando do 4º BEC o Coronel Hugo Jose Ligneul, seus comandados abaixo assinados houveram por bem tomar público o seguinte:

1. Achamos que o Coronel Ligneul é um chefe de atitudes retas, um amigo leal e um líder verdadeiro. Não é afeto à bajulação, mas ao trabalho de Construir e Educar;

2. Desconhecemos oficialmente a origem, mas lamentamos o encaminhamento e a consecução do injusto ato de sua exoneração;

3. Nossa opinião em relação a tal medida é que:

a) Não se deve punir a quem só merece elogios;
b) Não se julga de longe aquilo que somente pode ser avaliado de perto;
c) Não se espiona a quem nunca escondeu nada de ninguém;
d) Não se deve estimular à deslealdade nem de companheiros de nem subordinados;
e) Não se nega a ninguém o sagrado direito de defesa.

4. Concluindo, levamos ao Coronel Ligneul a nossa irrestrita solidariedade e repudiamos este ato injusto e desleal a um homem que sempre procurou e conseguiu identificar o Exército com o Povo, dele recebendo como conseqüência lógica todo o respeito, toda a confiança e todo o apoio. 

Crateús, 16 de agosto de 1968.

Gilson Muñoz de Carvalho – Major
Alberto Pinto da Fonseca – Major
José Fernandes da Silva – Capitão Médico
Francisco Martins de Souza Torres – 1º Tenente
Caio Mario Bezerra Nogueira – 1º Tenente
Almir Sabino de Souza – 2º Tenente Médico
Edson Moreira – 2º Tenente
Crisanto Ferreira da Almeida – Capitão
João Batista Fujita – Capitão
Airton Martins Xavier – 2º Tenente
George Veras Pacheco – Aspirante a Oficial
Edson de Saboya e Silva – 1º Tenente

Depois do manifesto dos oficiais foram as notícias publicadas em jornais de Fortaleza e do Rio de Janeiro (O Globo – Rio, 29 ago. 68; Jornal do Brasil, quarta-feira, 28-8-68; Jornal do Comércio – Recife, 29.8.68; O Povo – Fortaleza, 30. ago. 68; O Estado – Fortaleza, 29 ago. 68; A Gazeta de Notícias – Fortaleza 29 ago. 68; A Tarde – Salvador, 28 ago. 68; Tribuna da Imprensa – Rio de Janeiro, 30 de agosto de 1968.) e muitos outros.

Todos os jornais lançavam suas notas indignadas com o que estava acontecendo em Crateús. Algumas neutras, pelo mistério que envolvia o caso, outras interrogativas pelo alarde diante do motivo tão banal a exoneração e algumas, diretamente, à favor do Coronel Ligneul. Apenas um jornal, o Correio do Ceara, colocou nota contrária, não ao Coronel Ligneul, mas ao que estava acontecendo na cidade:

CORREIO DO CEARA – TERÇA-FEIRA, 29 DE OUTUBRO DE 1968.

TERRORISMO EM CRATEÚS (Texto de Themístocles de Castro e Silva)

(…) No Brasil, porém, especialmente no Nordeste, pela ação da chamada esquerda clerical, ela promove a MASSIFICAÇÃO, seja com Dom Hélder, seja com Dom Fragoso e demais da mesma corrente. O primeiro fundou um tal “Movimento de Pressão Moral”, que já mudou de nome, a fim de retirar dele – para os ingênuos, evidentemente – o sentido de terrorismo que de fato o caracteriza. O outro, aqui de Crateús, tem sido mais modesto. Falta-lhe a publicidade que certa imprensa, levianamente, dá ao Arcebispo de Olinda. Sob a orientação de sue Bispo, existe em Crateús um tal “Centro de Treinamento de Líderes”, com o objetivo de “CONSCIENTIZAR NOSSOS IRMÃOS QUE SOFREM”. Nesse centro, a principal matéria ministrada á a LUTA DE CLASSES, no mais refinado estilo comunista. Há também uma Escola, mantida pelas Irmãs Maria Teresa, também especializada em subversão, sem falar nos “movimentos diocesanos”, todos eles de orientação esquerdista (…). O Evangelho, que ensina amor, paz e compreensão entre os homens, foi ARQUIVADO pelo Bispo de Crateús. Esses “movimentos”, no dia 7 de setembro, distribuíram panfletos pela cidade com dizeres como este: “Acorda, brasileiro, enquanto tu dormes a ditadura te governa”.

A Estação de Radio Dragão do Mar de Fortaleza, influenciada pelo pessoal da Contra Informação da 10ª RM, publicou nota insinuando que o Coronel Comandante do 4º BEC havia sido exonerado a pedido de seus próprios oficiais, mas a essa nota ninguém deu importância, pois, era o caso da insubordinação dos quatorze oficiais que a imprensa queria publicar e o que o país estava ansioso para saber mais.

Na Câmara dos Deputados, o Deputado Moreira Alves[66] disse que se todos os oficiais do Exército fizessem como os de Crateús o Brasil seria melhor. Agora é que a situação ficou mais complicada, ser apoiado pelo Deputado mais criador de caso do Congresso era no mínimo desanimador para quem nunca gostou de confusão.

O Coronel Navarro se apressou a dar quinze dias de prisão aos seus oficiais, mas o Ministro da Guerra agravou a punição para trinta dias. Dividiu os oficiais em grupos e distribuiu-os pelas várias unidades do 1º Grupamento. Hugo ficou sozinho em Crateús, arrumando as malas. Despediu-se dos fieis amigos no campo de pouso onde foram embarcados nos aviões do Grupamento, com destino aos locais de prisão. Ligneul ainda pode evitar que os sargentos do Batalhão fizessem à mesma loucura, argumentando com eles que não haveria para eles a mesma contemplação e respeito devidos aos oficiais. Eles seriam simplesmente expulsos do Exército, sem qualquer resultado prático.

De Crateús, Hugo foi para Fortaleza com sua família, levando poucas malas e a roupa do corpo. Iria fazer a viagem para o Rio em um navio de passageiros, o Princesa Isabel[67], do Lloyd Brasileiro.

Ao chegar a Fortaleza, Hugo foi procurado pelo proprietário de empresa transportadora contratada pelo Exército para fazer sua mudança. Ele lhe mostrou noventa e oito cartuchos de revolver 38 num lenço branco chamuscado e perguntou:

 _ O senhor tinha dessa munição em sua mudança?
_Sim. Eu tinha. Tinha duas caixas de cinqüenta cartuchos cada, acondicionados em minha mala armário.
_ Pois não diga nada a ninguém, porque é proibido transportar munição na mudança, e a sua bagagem pegou fogo em Cabrobó, no caminho para o Rio de Janeiro. Fique quieto para ver se recebemos o seguro.
_ Como? Que diz o senhor? Que aconteceu com a minha mudança?
_ Pegou fogo. O caminhão com os objetos salvados do incêndio esta vindo para Fortaleza.

Hugo embarcou no Princesa Isabel cercado pelo carinho da família da Fujita e do Major Paulo, seu ex-cadete, radicado em Fortaleza. Viajou pensando nos livros, nas fotos, nos objetos acumulados em mais de quinze anos de casamento com Elys, nos brinquedos dos meninos, enfim, em tudo que tinham acumulado em sua vida modesta, própria de oficial de Exercito.  Antes de Crateús, Hugo tinha feito um curso de um ano no Colégio Interamericano de Defesa, em Washington, como é natural tinha algumas coisas de valor compradas lá.

Chegaram ao Rio no dia 7 de Setembro, de 1968. Hugo se lembra que fazia muito frio. Sem agasalhos com a roupa do corpo foram dormir num apartamento sem cama nem cobertas. Foi muito desconfortável nos primeiros dias.

O casal não tinha poupança, as coisas foram compradas aos poucos e, somente em dezembro de 1968, Hugo recebeu o seguro pelo sinistro do incêndio da mudança.

O incêndio da bagagem assustou a todos da família. Sabiam que não tinha sido um acidente. Imaginavam que quem seria capaz de fazer uma coisa desta, faria qualquer coisa.

Hugo deu parte do “acidente” ao seu novo comandante na Diretoria de Vias de Transporte, mas não recebeu nem resposta.

Procurou os amigos e encontrou no Hélio Mendes o apoio de um irmão. Ele o levou ao Paulo Vidal que era amigo do Sodré, Governador de São Paulo, e dono da nomeação para a presidência do IRB – Instituto de  Resseguros do Brasil – no governo Costa e Silva. Paulo Vidal o levou ao Presidente do IRB, que lhes mostrou evidências de que o sinistro tinha sido fraudulento e de que o manifesto de carga só tinha sido apresentado à seguradora após o sinistro. Como pagar?

Mas depois de um pouco de conversa reservada, na qual Ligneul não participou, ouviu o Presidente dizer a um de seus assessores: “Os “homens” querem que se pague. Mande tomar as providencias necessárias”.

Alguns dias depois Hugo recebe o chamado de Seguradora para receber o cheque de Cr$25.000,00 (vinte cinco mil cruzeiros). O Exército limitava o seguro das mudanças dos oficiais a Cr$5.000,00 (cinco mil cruzeiros), mas a transportadora, após o sinistro, havia corrido à seguradora com sua apólice no valor de vinte e cinco mil.

Na véspera de receber o cheque, visitou-o no Ministério da Guerra, onde Hugo estava servindo, o próprio transportador, o mesmo que friamente em Fortaleza, lhe dera a notícia do sinistro e o ameaçara em relação à existência de munição em sua bagagem.

Ele queria receber uma parte do seguro. Hugo nem imaginou a hipótese de negociar com aquele sujeito, o homem veio alegando prejuízo, porém nem seu caminhão foi atingido, fato é que levou os salvados para Fortaleza. Depois de não aceitar os argumentos do homem naquela conversa a se passar dentro de um táxi, indo na direção de Copacabana, dentro do qual o transportador se meteu de qualquer maneira, forçando a oportunidade de conversar, o transportador resolve saltar á poucos metros da residência de Hugo.  Quando chegaram à Xavier da Silveira o motorista comentou: “Mas que pilantra em meu Coronel”?

No dia seguinte, Hugo foi à seguradora bem cedo acompanhado de seu fiel amigo Coronel João de Abreu Pessoa. Recebido o cheque, foi direto depositar e relaxou no chope.

Á noite, chegou em casa alegre e encontrou o recado, dizendo que o homem da seguradora estava aflito atrás dele. Telefonou para ele e perguntou o que era. Simplesmente ele não conseguia se livrar do dono do caminhão que o estava incomodado, e pediu a Hugo que desse um pouco de dinheiro ao tal transportador. Hugo indignado, respondeu: “Meu amigo, porque você não dá? Eu não dou nada. Ele armou sozinho ou acompanhado essa jogada. A vítima sou eu. Chega! O cheque já foi depositado e eu não trato mais do assunto”.

Finalmente, livrou-se do caso, recebendo o dinheiro dos seus pertences, porém o valor afetivo de suas coisas não tinha preço. Até hoje lhe resta a mágoa ao revirar livros e fotos chamuscados, sobreviventes do incêndio.

Mas Crateús não ficaria por aí. Ligneul ficou encostado na Diretoria de Vias de Transporte (DVT). Por falta de oficiais havia assumido a função de chefe de gabinete do General Diretor. Nesta condição, no dia 30 de Novembro de 1968, foi representar seu chefe em uma solenidade de declaração de aspirantes do CPOR RJ, no campo do Vasco.

O Diretor Geral de Engenharia e Comunicações o encarregou de entregar, ao 1º aluno do Curso de Engenharia, uma espada oferecida como prêmio pela Diretoria. Vestindo o seu 5º uniforme, único que possuía depois do incêndio de sua bagagem, portando alamares de Chefe (interino) de Gabinete do General Tourinho, desceu as arquibancadas do estádio do CRVG e entregou a espada ao Aspirante[68].

Vinha voltando para seu lugar quando se deparou com o General Lira Tavares[69], Ministro da Guerra. O encontro foi fortuito, mas inevitável. Hugo cumprimentou o General militarmente e ele, tomado de surpresa por vê-lo ali, entre os Generais, estendeu-lhe a mão, que Ligneul tomou vigorosa e longamente. Enquanto aproveitava aquela oportunidade de ouro para uma audiência improvisada que até o momento lhe tinha sido negada, apesar da insistência. Dizendo:

_ Que bom meu General encontrá-lo, faz tempo que solicito uma audiência sua e não consigo êxito.
_Se é sobre o episódio de Crateús, não tenho nada a conversar.
_Meu General, uma vez ouvi Vossa Excelência dizer, no meio de vários oficiais que eu era um dos oficiais mais equilibrados que V. E. conhecia.
_Mas no caso de Crateús você não foi nada equilibrado.
_Gostaria de contar o caso de Crateús com minhas próprias palavras.
_Você vive contando sua versão dos acontecimentos pelos vestiários. Eu tenho informantes.
_Minha versão é a única verdade a respeito dos fatos que se passaram.
_O senhor vai ser transferido para uma CSM (Circunscrição do Serviço Militar). Seu “sogro” transferiu muitos oficiais para CSMs e agora “ELES” estão querendo que aconteça o mesmo com o senhor.  

A essa altura Ligneul sentiu que não havia mais clima para diálogo e largou a mão do General.

Dois dias depois, o Boletim do Exército publicou sua classificação na chefia da 1ª Circunscrição do Serviço Militar (CSM 1), no Campo de São Cristóvão. Era o Ministro cedendo às pressões dos raivosos inimigos que, sem nunca terem convivido com Hugo,  misturavam-no às lembranças desagradáveis dos tempos em que conspiravam contra Juscelino e foram disciplinados pelo Marechal Lott, seu sogro.

Mas como dizia o Grande Adenauer[70], “A sabedoria humana tem limites, mas a estupidez humana é ilimitada”. Então, parece que o assunto ainda não havia terminado, faltava ainda a última alfinetada.

Dia 26 de dezembro de 1968, Hugo recebe o telefonema do Coronel Portela ( o transportador também era um Portela), vendedor de automóveis usados nas horas vagas, puxa-saco de Generais, e grande reacionário. Todo meloso disse que tinha uma notícia má para lhe dar:

_Diga logo Coronel.
_ O Senhor Ministro mandou lhe comunicar que lhe aplicou dez dias de prisão disciplinar para ser cumprida no Forte de Copacabana.
_Tudo bem, e daí?
_Bem, eu estou telefonando para saber se você quer uma escolta.
_Ora Portela, vai-te catar, diga onde e quando querem que eu me apresente e eu economizo o transporte de vocês. Mas, espera um pouco. Que história é essa? E o meu diretor já sabe disso? Olha, quer saber de uma coisa? Eu vou me apresentar ao meu Comandante de Unidade, vocês se entendam com ele.

Hugo fardou-se, arrumou sua maleta com os materiais dos cursos que estava tirando na IBM e no IPR (Instituto de Pesquisas Rodoviárias) e foi para o Ministério da Guerra, ainda na Praça da República.

No elevador, encontrou com o General Mamede, seu ex-comandante na EsCEME, nos dias da Revolução, agora General de Exército, Chefe do Departamento de Material Bélico, ao qual estava subordinada a  Diretoria Geral de Engenharia e Comunicações.

O General Mamede levava na mão um papelucho e respondeu meio constrangido ao cumprimento de Ligneul.

Hugo foi à DVT e o General Mamede continuou torre acima até a DGEC. Ligneul estava com o General Tourinho quando chegou o chamado do General Dirceu para que ele se apresentasse na DGEC. Lá chegando encontrou o General Mamede com o papelucho na mão, ao lado do General Dirceu.

Deram o papel para Hugo ler, era aquele primor de nota de punição, em péssimo português, escrita possivelmente pelo Frota, porque Hugo não pode imaginar a Imortal ADELITA[71] errando daquela maneira.

Hugo leu a “Solução de Sindicância”, que depois de muito tempo, vai pra lá, vem pra cá, e quando se achava que não ia dar em mais nada, ainda rendeu uma boa vingança ao genro, filha e netos do Marechal Lott.

Hugo leu o documento e disse: “Tudo bem, meu General, estou ciente, e agora?” O Mamede, como de Hábito, mudo nessas ocasiões. Então o Dirceu disse: “Pois é, você que se diz democrata, está em minoria na opinião de seus colegas”. “Meu General, eu estou em minoria no Exército, mas o Exército está em minoria no meio do Povo. Eu sou parte do Povo”.

O fato é que dali Hugo tomou um taxi e foi se apresentar ao Comandante de Forte Copacabana, Coronel Moreno, seu ex-colega de Escola Superior de Guerra, seu sucessor no Colégio Interamericano de Defesa.

Moreno o tratou friamente, encaminhou-o para um quarto onde Hugo ficaria os últimos dias do ano de 1968, cumprindo pena de prisão disciplinar.

Arrumou logo suas coisas e não perdeu tempo. Estudou as apostilas de IBM e tirou grau 100 no teste que se realizou após o período de prisão. Completou o projeto do curso de PERT do IPR, com as lembranças da realização de Barragem do Rio Poty em Crateús, e garantiu o diploma do curso.

No Forte Copacabana, recebeu visita de seus amigos Hélio Mendes, Abreu Fonseca e Oliva, todos  companheiros do tempo do CPOR de SP. Foram também visitá-lo os amigos do MFC (Movimento Familiar Cristão) Sabino e Ricardo Cruz, este último sempre vibrante como um escoteiro, acabou morrendo na estrada, como o seu ídolo Juscelino.

Elys, sua esposa, levou uma pequena TV. Hugo assistiu, preso e solitário, o Homem chegar pertinho da Lua, mostrando o planeta azul e emocionando o mundo, bem no finalzinho de 1968[72].

Antes da passagem do ano, Hugo recebeu um recado do Ministro pelo Coronel Moreno. Ele seria libertado antes do tempo porque eles julgaram que a prisão já teria cumprido sua finalidade.

Esta ação mostra bem o tipo de Governo naquele momento, depois da entrada do Presidente Costa e Silva, época que teve início um dos períodos mais aterrorizantes da história brasileira. Com atos mesquinhos e bem calculados.

No início de 1969, os Generais, para surpresa de Ligneul, além de tira-lo do ostracismo, trabalhando numa diretoria qualquer, lhe confiaram à chefia de uma organização militar autônoma, o que poderia até lhe devolver os requisitos necessários ao Generalato, abortados com a destituição do cargo do 4º BEC.

Hugo assume a chefia do CSM 1, sozinho, lá esteve somente seu amigo Octávio Costa, gentil e corajoso. Para quem estava acostumado a servir em unidades de elite, como as Escolas do Exército, o Estado Maior, o EMFA e os Batalhões de Engenharia de Construção, a CSM 1 era um duplo castigo.

Casarão velho, mal cuidado, arquivos empoeirados, inseguros e ineficientes, oficiais mal fardados, sem qualquer entusiasmo, transformados em burocratas. Era todo um ambiente para um coronel de Engenharia, com todos os cursos do Exército, na força dos seus 45 anos, sentir-se excluído.

Assim mesmo, Ligneul ainda tentou modernizar o serviço. Chamou a IBM[73] (única empresa de informática atuante no Brasil) e pediu uma proposta para mecanizar seus arquivos de mobilização e seus serviços de expedição de certificados de reservista. No entanto, foi chamado à diretoria do Serviço Militar onde lhe disseram que não havia dinheiro para qualquer modificação e que se houvesse os estudos teriam que vir de cima para baixo.

Alguma coisa sempre muda. Os mesmos serviços antigos, as mesmas rotinas, passaram a funcionar melhor. Exigindo respeito aos usuários do CSM, bem como rapidez nas providencias requeridas, Ligneul fazia a sua parte. Administrava com, amor, zelo, respeito e companheirismo, mesmo se sentindo um peixe fora da água naquele lugar.

Um dia, chegou à CSM 1, um Boletim Reservado do Exército publicando sua prisão por dez dias, em virtude dos acontecimentos ocorridos em Crateús, em agosto de 1968. Seu subchefe trouxe o Boletim muito surpreso e lhe perguntou o que fazer. Hugo lhe disse que não desse importância, pois a prisão já tinha sido cumprida entre os dias 26 e 31 de dezembro de 1968. Nem mesmo tiveram o trabalho de transcrever a punição no Boletim da Unidade. Como Hugo tinha cumprido a prisão ainda na DVT, obedecendo a um bilhetinho do General Mamede ao cumprimento à ordem do Ministro do Exército, nunca foi a referida punição transcrita em suas Alterações, (livro contando toda a vida militar do oficial) que continuavam virgens, como sempre foram desde seus dias de Cadete em Realengo.

No fim de março de 1969, saiu o decreto com a transferência de Hugo Ligneul para a Reserva. Saiu errado com grande prejuízo para ele. Reclamou e foi feita nova publicação, ainda assim errada. Hugo acabou desistindo de reclamar com os senhores da ditadura. Como dizia seu amigo Alckmin, aos inimigos não se pede nem demissão.

Somente em 1981, já nos tempos de Figueiredo, resolveu voltar a reclamar seus direitos. Levaram um ano para consertarem a contagem de seu tempo de serviço e, ao lhe pagarem, não corrigiram a inflação. Hugo deixou para lá… Não precisava usar o dinheiro do Exército, ganhava muito mais aqui fora.

Passou a chefia do CSM 1 ao seu substituto legal, na maior discrição. Só apareceu lá para o cumprimentar a Coronel Elmo Figueiroa Silvado, seu companheiro dos tempos de instrutor na Escola de Comando e Estado Maior em 1963/64.

Ao se apresentar na 1ª Região Militar, Hugo teve a sorte de não encontrar os Generais. Preencheu uma ficha, entregou a um soldado, o único presente e se despediu do Exército. Foi isso que a “paranóia” política ensinou aos “chefes” do tempo de ditadura. Acabou a camaradagem, a elegância, o cavalheirismo, a simpatia e a amizade. Tudo foi substituído pela suspeita, pela traição, pela denúncia, pela delação.

Hugo saiu do Exército aliviado. Já estava empregado numa empresa de engenharia onde iria exercer a função administrativa e financeira, como adjunto de diretoria. Ia ter um salário que era o dobro de seus vencimentos como coronel, com todos os cursos e trinta anos de serviço.   

Em suas memórias, Hugo diz que deve ao Exército toda uma formação, ótimas oportunidades de aprendizagem, inclusive dois anos de curso nos Estados Unidos. Teria muito boas lembranças para recordar, mas queria distancia daquele Exército de Liras Tavares, Frotas, Fiuzas, Portelas, Jansens, Malans, Samueis, Sobreiras, Barretos, Garcias, etc. 

CONCLUSÃO

A sua maneira de pensar, os acontecimentos em Crateús, o fato de ser genro do Marechal Lott, tudo isso, contribuiu para a perseguição dos “Militares Linha Dura” para com Hugo Ligneul. Ele que sempre foi muito disciplinado, um dos melhores alunos nos cursos do Exército, sem necessidade de pistolão ou amizades para subir de patente. Hugo sempre foi neutro politicamente e nunca foi ligado ao seu sogro – tanto nas épocas de gloria, quanto nas épocas de perseguição, até porque, como todos sabem o Marechal Lott, nunca foi homem de nepotismo, muito pelo contrário, desautorizava o que já estava autorizado, se fosse para favorecer alguém da família. Estaria sem perspectiva de crescimento na carreira militar, pois na época não se tinha esperança na abertura política. Hugo não poderia ficar esperando e vendo seus colegas passarem a sua frente no generalato. Pois a promoção à General, não é um direito, é feita por escolha, escolha política, então ele preferiu partir para sua carreira como civil.

O Exército perdia um profissional capacitado e dedicado, que ainda podia render muito a eles, sorte da população que ganhava um excelente cidadão, culto e experiente.

Hugo inicia sua carreira como civil em uma firma de Engenharia, fica lá por um ano, e depois entra em um projeto de construção de escolas que o Ministério da Educação criou. A princípio ele não poderia ter seu nome ligado a este projeto, pois em seu dossiê, feito pelo SNI estava rotulado como subversivo, e por isso não poderia trabalhar em nada ligado ao governo, – assim como milhares de pessoas e seus familiares, os quais foram presos e perseguidos, durante todos os anos de governo militar. Mas o Jarbas Passarinho[74], que era seu colega de turma, e ministro da Educação no governo Garrastazu Médici, disse que ele poderia trabalhar para o governo, já que tinha sido chamado.

Então, Hugo trabalhou nesse projeto por cinco anos, gerenciando a construção de trezentas e quatorze escolas, todas de ótima qualidade, em todo o Brasil. As escolas de Nível Médio tinham o objetivo de formar um aluno para o mercado de trabalho, estas escolas tinham salas de turmas de: Técnicas Agrícolas, Técnicas Comerciais, Técnicas Industriais, Educação para o Lar e dois laboratórios de ciências, assim como, uma boa biblioteca e um campo de esportes. Eram escolas construídas em terrenos de vinte mil metros quadrados, todos muito bem escolhidos, com toda técnica, não eram como essas construções de hoje em dia que são colocadas na frente de estradas para que todo mundo as veja. Escolas são para serem construídas onde não haja barulho, onde não haja cheiro, poluição, enchentes. Há uma técnica para escolher o lugar da escola, ele tem que ficar junto à população que vai ser atendida, de preferência para todos chegarem a pé, sem precisar de condução. Então se determina primeiro a demografia e, em função dela, constrói-se a escola.

“Foi uma pena que este projeto tenha durado somente cinco anos”, comenta Hugo, “e o mais engraçado é que foi durante o Governo Médice[75], logo o governo mais duro da ditadura, mas eu não posso disser nada, eu servi a esse governo”, completa Ligneul.

Depois veio o Governo Geisel e substituiu o Passarinho no Ministério da Educação pelo Ney Braga[76]. Ney Braga era um militar bem diferente do Jarbas Passarinho, junto com ele veio bastante gente do Paraná, algo que estamos vendo bastante hoje em dia. Com tantos “ajudantes” no ministério, um dia Hugo foi chamado a Brasília, o Secretário Geral era um engenheiro paranaense, e ele disse a Ligneul: “Você ganha muito dinheiro nesse emprego, você tem que fazer um exame para trabalhar no Ministério de Educação”. Hugo, muito calmamente, argumentou que já era estatutário, como ex-oficial do exército, e que achava que não poderia ter outra matrícula com o governo (na época não poderia), e completou dizendo: “Se você acha que eu ganho muito, me manda embora, eu tenho carteira assinada aqui pela CLT”. O resultado foi que eles não lhe mandaram embora, mas Ligneul já não tinha clima para trabalhar com aquele Ministério, e acabou pedindo as contas.

Hugo então foi trabalhar na consultoria de Engenharia de uma empresa chamada, ENGEVIX[77]. Lá ele participou como administrador em inúmeros projetos sensacionais. Assistiu à elaboração dos projetos de Tucuruí, Itaipu, Palmar, Metro de Bagdá. Atuou na remodelação dos subúrbios ferroviários do Rio de Janeiro, em um projeto para a fundação Getúlio Vargas onde coordenou um grupo de professores do MEC para implantar habilitações básicas no ensino médio brasileiro, no Projeto Rio de urbanização das favelas da orla da Bahia de Guanabara, na SUDAM na elaboração de planos diretores para cidades médias da Amazônia, etc.

Todos os trabalhos e projetos eram muito bons, pois ele trabalhava com uma equipe muito eficiente e honesta, tipo de trabalho que dá orgulho de fazer. Por fim, Hugo chegou a diretor de uma firma de informática que fazia a automação da Hidroelétrica de Itaipu, chegando a coordenar sessenta analistas de sistema, era um projeto imenso. Terminou tudo com o Presidente Collor[78]. Ligneul comenta que: “O Collor destruiu a engenharia brasileira. Com a sua entrada no governo milhares de projetos foram abandonados. A engenharia brasileira estava em uma situação excelente, capaz de fazer engenharia em qualquer lugar do mundo e, de repente, ela desmoronou”. Nessa época, Ligneul assistiu ao desmonte dessa equipe. Dos sessenta analistas só seis puderam ficar. Até que a própria empresa teve que se reestruturar devido a esta crise dos anos 80, Hugo também acabou saindo, ele já estava aposentado e resolveu parar.

Mas pessoas competentes não conseguem ficar paradas, mesmo que aposentadas. Nesse momento apareceu a CECIP na vida do nosso personagem. Seu diretor, Claudius Ceccon[79], era muito amigo de sua irmã Letícia, e ela lhe pediu que, já que estava com tempo, podia das uma passadinha na ONG para ajudar o Claudius pois ele esta precisando de alguém para fazer uma auditoria na companhia.

E lá foi Hugo… Olhou a papelada a fez um exame da situação, e disse ao Claudius: “Sua Ong tem três meses de vida”. O Claudius ficou alarmado e o perguntou o que faria, e se Hugo não gostaria de trabalhar para ele. Hugo lhe respondeu, que a ONG não tinha fins lucrativos e que não teria dinheiro para pagar seu salário, mas se prontificou em ajudá-los uma vez por semana, sem receber nada. À noite, Claudius liga para sua casa e diz: “Hugo, não é isso que eu quero, não quero que trabalhe de graça, eu preciso de você todos os dias, direto, aqui na empresa, tenho que ter alguém que me ajude a administrá-la”. Hugo, então acabou cedendo, e abraçando este novo desafio. Combinou com Claudius uma forma de remuneração, pois não queria ficar em uma situação de dependência; então disse a Claudius que o que ele conseguisse ganhar que lhe pagasse. Assim seria a sua remuneração.

Então, na CECIP, passaram-se mais cinco anos. Quando Hugo chegou, o pessoal não tinha carteira assinada, a desorganização era grande, não é porque fosse uma organização sem fins lucrativos, que a contabilidade teria que ser tão desorganizada. Registrou todos os funcionários, digitalizou a folha de pagamento, assim como o resto da empresa. Acabou ajudando o Claudius a entrar na era da computação. Diante disso, tudo começou a mudar, o CECIP tem hoje muitos computadores, todos de última geração, Hugo acabou aprendendo muito com eles também.

O Claudius Ceccon é uma pessoa muito capaz, domina uns quatro idiomas, fala e escreve, arranja dinheiro para a ONG viajando o mundo todo. Pelos quatro continentes, ele arrecada verbas para os projetos sociais aqui do Brasil. É uma pessoa muito competente, escreve muito bem, tem muitos talentos, é um ilustrador da melhor qualidade, seus livros são uma maravilha, assim como suas caricaturas, Hugo aprendeu muito com ele, e não poderia ter arranjado trabalho melhor, para fechar com chave de ouro a sua vida profissional. Só para ter uma idéia do CECIP:

Produz vídeos e filmes sobre a realidade e cultura brasileiras, produz materiais educativos e realiza cursos e seminários com e para educadores. “Uma experiência mais recente é a de conceber e realizar campanhas de interesse público, pondo em evidência assuntos que normalmente são considerados ‘difíceis’ ou polêmicos demais, como o do disfarçado preconceito racial na sociedade brasileira. Essas campanhas aliam a comunicação de massa e o trabalho na escola, uma combinação das mais felizes”.

O CECIP realiza ainda projetos de inclusão digital com alunos de escolas públicas do Rio de Janeiro. O mais recente é o projeto SITE – Sala de Informação, Tecnologia e Educação, que reuniu jovens para a produção do site “Geração Digital”, lançado no dia 18 de junho no OI Futuro.

A lista de projetos realizados pela ONG e prêmios recebidos é extensa. São cerca de 80 prêmios, dentre eles, o Prêmio Itaú-UNICEF Educação & Participação, categoria Mobilização pela Educação, para o Projeto Estatuto do Futuro e o Certificado de Tecnologia Social, da Fundação Banco do Brasil, para o Projeto Botando a Mão na Mídia, que a partir de oficinas, estimula uma leitura crítica dos meios de comunicação de massa.

“Somos uma ONG que teve três longas exibidos no circuito comercial”, comemora Ceccon. Entre os filmes premiados e elogiados pela crítica estão o Santo Forte e Babilônia 2000, documentários de Eduardo Coutinho (um dos fundadores do CECIP) e Bendito Fruto, dirigido por Sérgio Goldenberg. Para a TV a ONG já produziu uma série de documentários, em co-produção com BBC, Channel 4, Canal Plus, ARTE, ZDF, todas televisões européias[80].

Em 1994, Hugo resolve realmente se aposentar, estava com 70 anos e queria descansar, já não agüentava a correria do centro do Rio de Janeiro, já tinha trabalhado 51 anos de sua vida. Então, vendeu tudo que tinha no Rio e veio morar em Teresópolis, aqui no seu refúgio.

Entre tantas alegrias, ainda ficam algumas mágoas. E Hugo, mais uma vez, refere-se ao ano de 1968. Na ocasião das tempestades, lembra- se de seu pai, que naquela época estava muito frágil e semi-consciente. Não tinha lucidez completa para compreender o que se passava com seu filho, por isso, não teria sofrido muito com sua decisão, que era tudo o que, segundo ele, Hugo deveria evitar. Por mais uma vez, seu pai lhe disse, que não gostaria de ver o filho transferido para a reserva, para disputar o mercado de trabalho com os contribuintes que pagam o seu soldo. Mas, mesmo sem saber se seu pai o compreenderia, Hugo disse:

“Desculpe meu pai, não deu. Eu não agüentaria ficar sofrendo mais doze anos as injustiças da Ditadura a serviço das ambições de meus amigos de ontem, eu não posso ficar no Exército e deixar de cumprir as orientações dos chefes. Prefiro sair, não agüentaria viver os tempos futuros, estou prevento uma agravação da repressão e haverá ordens muito difíceis a serem cumpridas. Não posso fazer o papel de agente duplo. Não quero ser tropa de ocupação de meu próprio território”.

Com estas palavras, Hugo que se despede de um período no qual toda uma geração ficou mutilada. Porém, como uma ave Fênix, que ressuscita das cinzas, os que sobreviveram e resistiram, voltaram com uma imensa força e perseverança, trazendo tanta bagagem, que acabou por reconstruir uma nação, um Brasil novo e democrático, capaz de superar seus próprios limites.

Em sua casa aconchegante, na sua varanda fresquinha, de frente para o jardim tão florido de mais uma primavera, Hugo conta as suas histórias. Apreciando as flores do pomar, seguimos nossas manhãs de setembro e outubro.

REFERÊNCIAS

[1] LE GOFF, Jacques. História e memória. Campinas: UNICAMP, s/d. p. 423.

[2] PORTELLI, Alessandro. O massacre de Civitella Val di Chiana (Toscana, 29 de junho de 1944): mito e política, luto e senso comum. In: FERREIRA, Marieta de Moraes, AMADO, Janaína (orgs.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: FGV, 1996. p 109.

[3] HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice; Editora Revista dos Tribunais, 1990.

[4] ROUSSO, Henry. A memória não é mais o que era. In: FERREIRA e AMADO (orgs), Op. Cit., p. 94-95.

[5] POLLAK, Michael. “Memória e identidade social”. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, 5 (10), p. 200-212, 1992.

[6] LE GOFF, Op. Cit., p. 426.

[7] POLLAK, Michael. Memória, esquecimento e silêncio. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, 2 (3), p .3-15, 1989.

[8] REIS, Daniel Aarão , Ditadura militar, esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002.

[9] THOMPSON, Paul. A voz do passado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

[10] POLLAK, “Memória e identidade social”, Op. Cit., p. 207.

[11] HALBWACHS, Op.Cit.

[12] LEVI, Giovanni. Usos da biografia. In: FERREIRA e AMADO (orgs.), Op. Cit., p. 175.

[13] Idem, ibidem. p.176.

[14] NAVA, Pedro, Balão Cativo. 3. Ed. Rio de Janeiro, José Olympio, 1978, p.221.

[15] GUSDORF, Georges, Lês Écritures Du moi, Paris, Éditions Odile Jabob, 1991, p.251.

[16] LEJEUNE, Philippe. Jê est un autre. Paris, Éditions Du Seuil, 1980, p.9.

[17] Federação de Xadrez do Estado do Rio de Janeiro

[18] CECIP – Centro de Criação e Imagem Popular – http://www.cecip.org.br.

[19] www.4becnst.eb.mil.br – Institucional/Comandantes/ Comandantes em Crateús (1955-1973).

[20]JOÃO BAPTISTA DE OLIVEIRA FIGUEIREDO – Militar nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 15 de janeiro de 1918. Estudou no Colégio de Porto Alegre, na Escola Militar de Realengo, na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais da Armada, na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e na Escola Superior de Guerra. Durante o governo Jânio Quadros integrou a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional. Participou do movimento político-militar que originou o golpe de 1964, tendo sido nomeado chefe de agência do Serviço Nacional de Informações (SNI) no Rio de Janeiro (1966-1967), do 1º Regimento de Cavalaria de Guardas – Dragões da Independência (1967-1969) e chefe do estado-maior do III Exército (1969). Chefe do Gabinete Militar do governo Médici (1969-1974), tornou-se ministro-chefe do SNI durante o governo de Geisel (1974-1979), sendo promovido a general-de-exército em 1977. Através de eleição indireta, passou a exercer o cargo de presidente da República em 15 de março de 1979. Faleceu no Rio de Janeiro, em 24 de dezembro de 1999. http://www.portalbrasil.net/politica_presidentes_figueiredo.htm. Acesso em 01 ago. 2009.

[21]Henrique Batista Duffles Teixeira Lott (Antônio Carlos, 16 de novembro de 1894 — Rio de Janeiro, 19 de maio de 1984) foi um militar brasileiro. Foi marechal do exército.
Estudou no Colégio Miliar do Rio de Janeiro, foi Comandantes do Batalhão Escolar em 1910, na Escola Militar de Realengo. Sua formatura como aspirante a oficial foi em 1914. Foi adido militar do Brasil em Washington, Estados Unidos da América. Em 1944 chegou ao generalato. Na crise de 1954, quando as forças conservadoras à direita se opuseram ao sindicalismo à esquerda, assinou o documento em que os generais exigiam o afastamento de Getúlio Vargas do poder.
Caracterizava-se pelos seus hábitos metódicos, pelo seu respeito à hierarquia militar e ao governo constituído. Após o suicídio de Vargas, Café Filho assumiu a presidência da República e nomeou Teixeira Lott ministro da Guerra – visando especialmente, com tal ato, afastar a influência do general pró-Vargas Newton Estillac Leal sobre os militares. Quando Juscelino Kubitschek e João Goulart venceram as eleições em outubro de 1955, respectivamente para presidente e vice-presidente da República, houve uma divisão das Forças Armadas, pró e antigetulistas. A facção antigetulista, com o apoio do principal partido político de direita do país, a UDN, procurou invalidar a eleição, sob a alegação de que JK tinha a simpatia dos comunistas, e não tivera maioria absoluta dos votos. Em 11 de novembro o general desencadeou o movimento militar, dito “de retorno ao quadro constitucional vigente”. Houve então a declaração do impedimento do presidente em exercício, Carlos Luz (Café Filho havia sofrido enfarte e afastado da presidência), a entrega de seu cargo ao presidente do senado Nereu Ramos e a garantia da posse dos eleitos, em obediência à Constituição. No início de 1956, continuou como ministro da Guerra no governo de JK.
Nas décadas de 1950 e 1960, se distinguiu pelo legalismo e por suas convicções democráticas. Em 1960, marechal na reserva, concorreu à eleição presidencial pela mesma coligação entre PTB e PSD que elegera JK. Recebeu um apoio frio de Juscelino – então mais interessado em voltar ao poder para um segundo mandato eletivo em 1965 – e foi muito atacado pelos setores da direita, inclusive pela Igreja Católica, apesar da sua bem conhecida devoção, pelo apoio recebido dos comunistas. Derrotado por Jânio Quadros, tentou ainda permanecer na vida pública. Em 1961 declarou-se contrário à tentativa de golpe planejada pelos ministros militares para impedir a posse de João Goulart após a renúncia de Jânio, o que lhe rendeu uma prisão domiciliar. Por fim, após o Golpe Militar de 1964, residindo em Teresópolis, no Estado do Rio de Janeiro, foi declarado inelegível por falta de domicílio regular pela Justiça Eleitoral ao se lançar em 1965 a candidato ao governo do então estado da Guanabara. Disponível em: <http://www.aman.ensino.eb.br>. Acesso:  19 de setembro de 2009.

[22] A Revolução Federalista ocorreu no sul do Brasil logo após a Proclamação da República, e teve como causa a instabilidade política gerada pelos federalistas, que pretendiam “libertar o Rio Grande do Sul da tirania de Júlio Prates de Castilhos”, então presidente do Estado. Empenharam-se em disputas sangrentas que acabaram por desencadear uma guerra civil, que durou de fevereiro de 1893 a agosto de 1895, e que foi vencida pelos pica-paus, seguidores de Júlio de Castilhos.
Maragato foi o nome dado aos sulistas que iniciaram a Revolução Federalista no Rio Grande do Sul em 1893, em protesto a política exercida pelo governo federal representada na província por Julio de Castilhos . Os maragatos eram identificados pelo uso de um lenço vermelho no pescoço. Por ocasião do Segundo Reinado, no Brasil, os partidários gaúchos do Partido Liberal receberam a alcunha pejorativa de “ximangos”, em alusão à ave de rapina, e faziam oposição ao Partido Conservador. A partir de 1842 os liberais dividiram-se entre ximangos e luzias. Após a Proclamação da República os federalistas apelidaram os governistas de ximangos. FLORES, Moacyr. História do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Nova Dimensão, 1996.

[23] Marie François Sadi Carnot (11 de agosto de 1837, Limoges25 de junho de 1894, Lyon), mais freqüentemente chamado Sadi Carnot, foi um político francês cuja carreira culminou com sua passagem pela presidência da República de 1887 a 1894. Em Lyon, no dia 24 de junho de 1894 Sadi Carnot foi apunhalado até a morte pelo anarquista Sante Geronimo Caserio dentro de sua carruagem. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Marie_Fran%C3%A7ois_Sadi_Carnot> Acesso em: 19 set.

[24] Hoje, o prédio do Palácio Duque de Caxias.

[25] O suíço Joseph Villiger inaugurou em 1888 a Manufactura de Cerveja Brahma Villiger & Companhia, na Rua Visconde de Sapucahi número 128, Rio de Janeiro, em 1904 a empresa se expandia com a aquisição e fusão com outras empresas, surgindo a Companhia Cervejaria Brahma. A partir de 1999, a BRAHMA faz parte da Companhia de Bebidas das Américas (AmBev), resultado da fusão entre as cervejarias BRAHMA e Antarctica. Disponível em: <http://www.cervejasdomundo.com/Brasil.htm>>. Acesso em: 01 jun. 2009.

[26] A Passarela do Samba do Rio de Janeiro, popularmente conhecida como Sambódromo, localiza-se na rua Marquês de Sapucaí, na cidade do Rio de Janeiro, Brasil. <http://www.inepac.rj.gov.br> Acesso set 19 2009.

[27] No prédio de número 83 da rua da Assembléia , no centro da cidade do Rio de Janeiro, foi instalada em 1912, uma filial da firma Mestre & Blatgé, com sede em Paris e especializada no comércio de máquinas e equipamentos. A filial brasileira tinha pouca importância dentro da organização francesa espalhada pelo mundo. Quatro anos depois de sua instalação, sua administração foi entregue ao francês Luiz La Saigne, que transformou o estabelecimento carioca numa firma autônoma, com o nome de Sociedade Anônima Brasileira Estabelecimentos Mestre et Blatgé, que em 1939 passou a denominar-se Mesbla S.A. Uma combinação das primeiras sílabas do nome original. . A preocupação era que no início da 2ªGuerra Mundial, a França se manifestou solidária à Hitler, o que poderia ocasionar represálias no Brasil com referência ao nome. Depois de 60 anos, e tendo ocupado o posto de maior loja de departamento do Brasil, a Mesbla decreta falência e fecha a sua ultima loja em julho de 1999. <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Mesbla&oldid=16350658>. Acesso em: 7 out. 2009.

[28] Tratava-se de aviões franceses, ainda de dupla asa e cobertos de lona.

[29] Vide texto “Mangueira Querida” no anexo II.

[30] GALHARDO, Thomaz. Cartilha da Infância: ensino da leitura. 141. Ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1939 – Thomaz Paulo do Bom Sucesso Galhardo, professor formado pela Escola Normal de São Paulo. A cartilha se baseia no método da silabação e foi publicada no início da década de 1880; em 1890, foi modificada e ampliada por Romão Puiggari, tendo atingido sua 233ª edição, em 1992.

[31] Entre os dias 23 e 27 de novembro de 1935, algumas guarnições militares sediadas em Natal (RN), Recife (PE) e no Rio de Janeiro rebelaram-se, em nome da Aliança Nacional Libertadora, contra o governo constitucional de Getúlio Vargas. Rapidamente a revolução militar foi sufocada (denominada de Intentona Comunista de 1935), provocando como reação a ela a maior onda de prisões até então vista na história do país. Prestes e o Levante Comunista de 1935. Disponível em: <http://educaterra.terra.com.br/voltaire/brasil.htm> Acesso: 17 de setembro 2009.

[32] A Ação Integralista Brasileira (AIB) foi um partido político brasileiro, fundado em 7 de outubro de 1932, por Plínio Salgado, escritor modernista, jornalista e político. O partido iniciou suas atividades, influenciado pelo fascismo italiano e pelo nazismo alemão. Assim como outros movimentos nacionalistas, o Integralismo brasileiro é considerado um movimento da classe média. Os integralistas também ficaram conhecidos como camisas-verdes ou galinhas-verdes, devido aos uniformes que utilizavam. A AIB, assim como todos os outros partidos políticos, foi extinta após a instauração do Estado Novo, efetivado em 10 de novembro de 1937 pelo então presidente Getúlio Vargas. Devido à dissolução da AIB, alguns integralistas insurgiram-se tentando dar um contra-golpe à ditadura de Vargas, em 1938. ARAÚJO, Ricardo Benzaquen de. Totalitarismo e revolução: o integralismo de Plínio Salgado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.

[33] Estado Novo é como ficou conhecido o período da história republicana brasileira que vai de 1937 a 1945, quando foi Presidente do Brasil Getúlio Vargas.

[34] Armando Ribeiro Falcão (Fortaleza, 11 de novembro de 1919) é um ex-político brasileiro, mais conhecido por ter sido o ministro da Justiça do Brasil durante o governo de Ernesto Geisel, de março de 1974 a março de 1979. Sucedeu a Alfredo Buzaid no ministério da Justiça, e foi o responsável pela maioria das normas jurídicas de exceção durante o regime militar brasileiro. Biografia de Armando Falcão no sítio da Fundação Getúlio Vargas,<http://www.cpdoc.fgv.br/nav_jk/htm/biografias/Armando_Falcao.asp> Acesso em: set 19 2009.

[35] A Escola Militar do Realengo 1940/1943, assim denominada desde 1913 quando foi criada, destinava-se ao preparo de oficiais a fim de suprir os quadros permanentes do corpo de tropa do Exército nas diferentes Armas, que até 1942 eram: Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Engenharia e Aviação. Escola foi fechada quando foi criada, em 1941, a Academia Militar das Agulhas Negras, inicialmente Escola Militar de Resende, que a substituiu.
O Curso tinha a duração de três anos, sendo o primeiro constituído das mesmas matérias e exercícios para todos os cadetes, destinado a formar o soldado de Infantaria, o reservista, e os dois anos restantes dedicados, na parte da instrução militar, à formação do tenente de uma das Armas. A partir de 1941 passou o Curso a ter a duração de quatro anos, aumentando-se para dois anos o tempo de preparo do soldado. Além do preparo profissional, o cadete, indistintamente de Arma, recebia um preparo intelectual cuidadoso e exigente, com a duração de quatro anos. <http://www.aman.ensino.eb.br>. Acesso: 19 de setembro de 2009.

[36] Rubens Mario Brum Negreiros, nascido em 10 de maio de 1922, em Dom Pedrito (RS), General-de-exército, foi declarado Aspirante-a-oficial da Arma de Engenharia, pela Escola Militar do Realengo, em março de 1943 e, no período de 1944 a 1945, foi nomeado, já como Tenente, Oficial de Reconhecimento e Informações do 9° Batalhão de Engenharia, integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália. Instrutor da EsAO e da ECEME. Instrutor-Chefe do Curso de Engenharia da Academia Militar das Agulhas Negras cursou ainda a Escola de Comando e Estado-Maior dos Estados Unidos da América, em Fort Laevenworth. Foi assistente do Conselho de Segurança Nacional, da Assessoria de Planejamento do Gabinete do Ministro da Guerra Orlando Geisel e Adido do Exército junto à Embaixada do Brasil na França, além de Diretor de Processamento de Dados, Comandante do I ° Grupamento de Engenharia e Construção e Secretário de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro. Diretor de Obras e Cooperação, Vice-Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. Chefe do Departamento Geral de Serviços, Chefe do Departamento de Engenharia e Comunicações e Comandante do 1º Exército. Clube Militar. Disponível em:< http://www.clubemilitar.com.br/site/pres/revista/432/6.pdf>. Acesso em: 19 de set. 2009.

[37] Ivan de Souza Mendes, nascido em 23 de fevereiro de 1922. Formou-se pela Escola Militar de Realengo em 1943. No período do governo João Goulart, era tenente-coronel e servia no 9º Batalhão de Engenharia do Mato Grosso. Transferindo-se para o Rio de Janeiro no início de 1964, uniu-se então ao grupo castelista. Após o Golpe Militar, foi nomeado interventor na prefeitura de Brasília, cargo que exerceu até maio, tendo servido em seguida no gabinete militar de presidência da República, chefiado pelo General Ernesto Geisel, até ser nomeado, em julho, adido militar no Peru. Regressando ao Brasil em 1967, permaneceu no gabinete do ministro Lira Tavares durante todo o governo Costa e Silva e no gabinete do General Ernesto Geisel, então presidente da Petrobrás, ao longo do governo Médice. Em 1974 foi promovido a General de Brigada, posto em que comandava a 8ª Região Militar, sediada em Belém, e a Escola de Estado Maior do Exército (ECEME), integrando ainda o corpo permanente da Escola Superior de Guerra (ESG). Em 1979 foi promovido a General-de-divisão.  Foi ministro-chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) no governo de José Sarney. Passou para reserva em 1986 na patente de General-de-exército. Clube Militar. Disponível em:< http://www.clubemilitar.com.br>. Acesso em: 19 de set. 2009.

[38]  O CPOR/RJ – Centro de Preparação de Oficiais da Reserva. Tem por objetivo realizar a formação militar inicial dos recursos humanos necessários à ocupação de cargos e ao desempenho das funções inerentes aos Oficiais da Reserva de 2º classe de Exército Brasileiro, seja da linha bélica, de saúde, ou técnica, por intermédio do Curso de Formação de Oficiais da Reserva (CFOR), do Estágio de Adaptação e Serviço (EAS) e do Estágio de Serviço Técnico (EST). <http://www.cporrj.ensino.eb.br/>. Acesso em: 19 de set. 2009.

[39] Na Lapa, na Rua Conde Lage e adjacências, localizavam-se os bordéis elegantes da cidade – os prostíbulos ordinários ficavam na “Zona do Mangue”, próximo da Praça 11, onde surgiu o samba. (“Zona” passou a significar local de prostituição. Quando se queria dizer que uma mulher se prostituíra dizia-se que ela “caiu na zona” ou era “uma mulher da zona.”). Disponivel em: Portal Literário: <http://literal.terra.com.br/literal/calandra.nsf/0/922D7A1EF157DD81032572D70071AB76?OpenDocument&pub=T&proj=Literal&sec=Rubem%20LadoB> Acesso em 01 nov. 2009.

[40] Getúlio Vargas foi deposto em 29 de outubro de 1945, por um movimento militar liderado por generais que compunham o próprio ministério, na maioria ex-tenentes da Revolução de 1930, como Góis Monteiro, Cordeiro de Farias, Newton de Andrade Cavalcanti e Ernesto Geisel, entre outros. Getúlio renunciou formalmente ao cargo de presidente da República. Terminara assim, o que Getúlio chamou, na comemoração do dia do trabalho de 1945, de “um curto espaço de 15 anos” onde, segundo ele, o Brasil progredira muito. O pretexto para o golpe de estado foi à nomeação de um irmão de Getúlio, Benjamim Vargas, o Bejo, para chefe da polícia do Rio de Janeiro. O Coronel João Alberto Lins de Barros deixara o cargo por se opor às manifestações públicas do movimento queremista. Getúlio foi substituído por José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal e o substituto direto, pois pela Constituição de 1937 não existia a figura do vice-presidente. José Linhares tornou-se, então, presidente interino, ficando três meses no cargo, até passar o poder ao presidente eleito Eurico Gaspar Dutra. Dutra foi eleito em 2 de dezembro de 1945, e tomou posse na presidência da república em 31 de janeiro de 1946. HENRIQUES, Afonso, Ascensão e queda de Getúlio Vargas, 3 volumes, Editora Record, São Paulo, 1964.

[41] A Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) é um estabelecimento da linha de ensino militar bélico de nível superior, do Exército Brasileiro, responsável pela formação dos oficiais da ativa, futuros chefes militares, das Armas de Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Engenharia e Comunicações, do Serviço de Intendência e do Quadro de Material Bélico. <http://www.aman.ensino.eb.br>. Acesso: 19 de setembro de 2009.

[42] Fort Belvoir, Virginia 22060 – é o lar de uma sede grande comando do Exército e elementos de outros 10; 19 diferentes agências e unidades de referência direta do Departamento do Exército, oito elementos do Exército E.U. Reserva do Exército e da Guarda Nacional, e 26 agências do DoD. Assim como também localizados um descolamento Marine Corps, uma atividade E.U. Air Force, e uma agência do Departamento do Tesouro. Welcome to Fort Belvoir. Disponivel em: <mhttp://www.belvoir.army.mil/welcome.asp>. Acesso em: 19 set. 2009.

[43] Disponível em: <http://www.esie.ensino.eb.br/>. Acesso em: 19 set. 2009.

[44] Roupas e acessórios militares – http://www.military-quotes.com/army-avy/subcatlist.php?cat=Military-Clothing-Fatigues-Camouflage. Acesso em 19 set. 2009.

[45]  Chiang Kai-shek (31 de Outubro de 1887 – 5 de Abril de 1975) foi um militar e político chinês que assumiu a liderança do Kuomintang (um partido político conservador da China na época) depois da morte de Sun Yat-sen, em 1925. Ele comandou a Expedição do Norte, que tinha como objetivo unificar a China contra os chamados senhores da guerra, que dominavam algumas regiões do país. Saiu vitorioso em 1928, como o líder da República da China. A China caiu na Segunda Guerra Sino-japonesa com o Japão invadindo a Manchúria, em 1937; o que fragilizou a imagem de Chiang dentro da China, mas cresceu externamente. Durante a Guerra Civil Chinesa (1926-1949), ele tentou erradicar os comunistas chineses, mas falhou nessa tentativa, e se viu tendo que recuar seu governo para Formosa (também conhecida como Taiwan), onde continuou atuando, agora como presidente da recém-formada República da China nessa ilha. Em 27 de julho de 1953,foi assinado um acordo de paz em Pan Munjon,estabelecendo as fronteiras sobre o paralelo 38º Norte e a aproximando a União Sovietica e os Estados Unidos.Encerrava-se a fase crítica. . Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Chiang_Kai-shek&oldid=17031134>. Acesso em: 7 out. 2009.

[46] Fort Leavenworth. Disponível em: <http://garrison.leavenworth.army.mil/sites/local/>. Acesso em: 19 set. 2009.

[47] A Invasão da República Dominicana pelos Estados Unidos (sob o nome de Operação Power Pack) ocorreu em 1965. O Presidente Lyndon Johnson, convencido da derrota das forças Lealistas e temendo a criação de “uma segunda Cuba” na América, ordenou forças para restaurar a ordem. Citando como razão oficial para a invasão a necessidade de proteger a vida dos estrangeiros, nenhum dos quais haviam sido mortos ou feridos, uma frota de 41 navios foi enviado ao bloqueio à ilha, e uma invasão foi lançada pelos Marines e elementos das Nações Membros do Exército 82a Divisão Aerotransportada. Em última análise, 42.000 soldados e fuzileiros foram ordenados para a República Dominicana. Os Estados Unidos juntamente com a Organização dos Estados Americanos (OEA) formaram uma força militar inter-americana para ajudar na intervenção na República Dominicana. Posteriormente, a Junta Interamericana de Paz (IAPF) foi formalmente criada em 23 de Maio. Além da presença militar dos Estados Unidos, as seguintes tropas foram enviadas por cada país; Brasil 1130, Honduras 250, Paraguai 184, Nicarágua 160, Costa Rica 21 policiais militares, e El Salvador 3 funcionários oficiais. Os combates continuaram até 31 de Agosto de 1965, quando foi declarada uma trégua. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Invas%C3%A3o_da_Rep%C3%BAblica_Dominicana_pelos_EUA_em_1965&oldid=17399585>. Acesso em: 1 nov. 2009.

[48] Euler Bendes Monteiro – Rio de Janeiro, 1917, 23 de julho de 2002. foi um general brasileiro. Em 1933, ingressou na Escola Militar do Realengo. Já capitão, em 1945, apoiou a conspiração contra Getúlio Vargas. Em 1950, defendeu o monopólio estatal do petróleo na eleição para o Clube Militar, integrando a chapa nacionalista. Formou-se na Escola Superior de Guerra, turma de 1961. Em 1964, negou-se a participar do golpe que depôs João Goulart. Mesmo assim, chegou a general-de-brigada, em 1965, e dois anos depois foi nomeado, pelo general Albuquerque Lima, presidente da SUDENE, cargo que ocupou até 1968. Com a posse de Ernesto Geisel, em 1974, foi promovido a general-de-exército; no cargo de chefe do Departamento de Material Bélico, criou a estatal Imbel. Uma frente de oposição à ditadura militar, articulada por Severo Gomes, levou-o a se candidatar à presidência da República, pelo MDB, na eleição indireta de 1978, tendo como vice na chapa o senador Paulo Brossard, mas foi derrotado pelo general João Figueiredo, por 355 votos contra 226.

[49] A Indústria da seca refere-se à estratégia dos grupos políticos e econômicos que se aproveitam do fenômeno natural da seca da região Nordeste do Brasil em beneficio próprio como receber doações do governo de outro estado e usá-las para seu proprio uso.  Trata-se de um fenômeno político segundo o qual latifundiários nordestinos e seus aliados políticos, nas diversas esferas de governo, utilizam a seca para angariar recursos públicos a pretexto de combatê-la. Tais recursos são aplicados em benfeitorias em suas propriedades particulares, como por exemplo, a utilização de “frentes de trabalho”, pagas pelo governo, para construir açudes em suas terras. Não raro, os recursos são desviados para finalidades distintas das atividades agropecuárias ou combate à seca. Finalmente, o mesmo argumento da seca é utilizado para não pagarem as dívidas contraídas. Desta forma, os recursos governamentais destinados ao combate à seca não atingem a população que é mais castigada, beneficiando às elites locais. Como consequência, políticas mais eficazes são proteladas, uma vez que é do interesse dos latifundiários a eternização do problema. Junto a isto, está o voto de cabresto, no qual as mercadorias vindas em prol da seca são desviadas e usadas pelos “industriais da seca”, para comprar votos dando-as aos latifundiários, fazendo com que eles peçam aos seus trabalhadores que votem no político o qual lhe deu a mercadoria. Algumas soluções para a seca foram formuladas, entretanto, têm-se interesse na continuidade do problema, para que a população continue apoiando os políticos através da venda de votos. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Ind%C3%BAstria_da_seca&oldid=16890914>. Acesso em: 24 set. 2009.

[50] Dom Antonio Batista Fragoso foi bispo da Diocese de Crateús durante 34 anos, de 1964 a 1998. Defensor dos princípios da Teologia da Libertação notabilizou-se pelo trabalho pastoral junto aos pobres e trabalhadores rurais. No período da ditadura, combateu severamente as atrocidades cometidas pelos militares, solidarizando-se com as vítimas do regime militar e denunciando no exterior as torturas praticadas contra os presos políticos.
Dom Fragoso ganhou projeção internacional por ter implantado, de forma pioneira, um novo estilo de Igreja, que serviu de modelo na América Latina. Líder religioso respeitado no Brasil e exterior dedicou quase toda a sua vida à missão pastoral. Depois que deixou a Diocese de Crateús, em 1998, aposentou-se e foi morar com a família, num bairro popular de João Pessoa. Filho de José Fragoso da Costa e de Maria José Batista da Costa nasceu aos 10 de dezembro de 1920 no sítio do Riacho Verde, PB. Entrou no Seminário Arquidiocesano em João Pessoa, em 1934, ordenando-se sacerdote no dia 2 de julho de 1944.
Foi Assistente Eclesiástico do Círculo Operário de João Pessoa e da Juventude Operária Católica (JOC) do Nordeste. Em maio de 1957, assumiu a função de Bispo Auxiliar de São Luiz do Maranhão até 1964. Foi ‘Padre Conciliar’ no Vaticano II, de 1962 a 1965. Foi nomeado Bispo Diocesano de Crateús, em 1964, onde permaneceu até maio de 1998.
Sobre a experiência de mais de três décadas no comando da Diocese de Crateús, dom Fragoso fez, em uma de suas últimas entrevistas, o seguinte comentário: “O sonho que, durante anos foi sendo inspirado dentro de mim, encontrou, nos 34 anos de pastoreio em Crateús, o chão para germinar. Fui descobrindo que esse povo, marcado pela dureza do Polígono das Secas, nos Sertões de Crateús e dos Inhamuns, tem uma resistência e uma sabedoria humana que desafia os séculos”. Disponível em: <http://diariodonordeste.globo.com> Acesso em: 24 set. 2009.

[51] O Serviço Nacional de Informações (SNI) foi criado pela lei nº. 4.341 em 13 de junho de 1964 com o objetivo de supervisionar e coordenar as atividades de informações e contra-informações no Brasil e exterior. Em função de sua criação, foram absorvidos o Serviço Federal de Informações e Contra-Informações (SFICI-1958) e a Junta Coordenadora de Informações (JCI-1959).

[52]  Dois meses depois da posse de Costa e Silva o CIEx foi inaugurado em julho de 1967. O presidente nomeou para primeiro diretor do CIEx o coronel Adyr Fiúza de Castro, um conhecido radical. Fiúza era favorável ao uso de tortura, sobretudo psicológica. Quando de sua nomeação já ocupava um cargo de um serviço de inteligência do Exército; o D2 onde era encarregado de monitorar “subversivos”.  A especialidade do CIEx nesse começo de função era infiltrar agentes em movimentos estudantis, sindicais ou qualquer outro de fundo liberal. Os agentes eram treinados para parecerem apoiar legitimamente à esquerda e suas verdadeiras intenções eram conhecidas por pouquíssimas pessoas dentro das Forças Armadas. Por conta disso, várias vezes sargentos a serviço do CIE eram presos pela polícia e liberados só depois de revelar uma senha combinada com os superiores.  Além de agir usando seu próprio pessoal, o CIEx também patrocinou um grupo radical de direita conhecido como Grupo Secreto. Estes terroristas plantavam bombas em lugares considerados focos da esquerda, geralmente teatros e faculdades. O CIEx lhes fornecia os explosivos e assessoria estratégica. Quando um integrante do Grupo era preso o CIEx, o SNI ou um membro da própria polícia providenciava sua soltura. Governo Costa e Silva (1967-1969) – História do Brasil. UOL Educação <http://educacao.uol.com.br/historia-brasil/ult1689u69.jhtm>. Acesso em: 2 out.2009

[53] ALVES, Márcio Moreira. Torturas e Torturados. Rio de Janeiro: s/e, 1966 – O livro foi escrito ao longo de uma árdua campanha de imprensa. A maior parte dos documentos e testemunhos que o autor reuniu foram lançados em uma batalha que sensibilizou a consciência dos homens de bem do Brasil a tal ponto que o próprio marechal Castelo Branco, sob cujo governo as torturas ocorreram e os torturadores continuaram impunes, teve de mandar ao Nordeste seu chefe da Casa Militar, general Ernesto Geisel. A missão Geisel teve como resultado a permissão para que o autor tivesse condições de penetrar nas prisões do Recife e confirmar as denúncias recebidas. Segundo o autor, “a exposição da onda de crimes oficiais que varreu o Brasil nos primeiros meses do golpe militar de 1964 (…) foi feita com objetividade e com o propósito de deixar estes crimes documentados para o julgamento do futuro”.

[54] A SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, criada pela Lei no 3.692, de 15 de dezembro de 1959, foi uma forma de intervenção do Estado no Nordeste, com o objetivo de promover e coordenar o desenvolvimento da região. Sua instituição envolveu, a definição do espaço que seria compreendido como Nordeste e passaria a ser objeto da ação governamental: os estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e parte de Minas Gerais. Esse conjunto, equivalente a 18,4% do território nacional, abrigava, em 1980, cerca de 35 milhões de habitantes, o que correspondia a 30% da população brasileira.
A criação da SUDENE resultou da percepção de que, mesmo com o processo de industrialização, crescia a diferença entre o Nordeste e o Centro-Sul do Brasil. Tornava-se necessário, assim, haver uma intervenção direta na região, guiada pelo planejamento, entendido como único caminho para o desenvolvimento.
Como causa imediata da criação do órgão, pode-se citar uma nova seca, a de 1958, que aumentou o desemprego rural e o êxodo da população. Igualmente relevante foi uma série de denúncias que revelaram os escândalos da “indústria das secas”: corrupção na administração da ajuda dada pelo governo federal através das frentes de trabalho, existência de trabalhadores fantasmas, construção de açudes nas fazendas dos “coronéis” etc. Ou seja, denunciava-se que o latifúndio e seus coronéis – a oligarquia agrária nordestina – tinham capturado o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), criado em 1945, da mesma forma como anteriormente tinham dominado a Inspetoria de Obras Contra as Secas, de 1909. (…). A partir de 1964 a SUDENE foi incorporada ao novo Ministério do Interior, e sua autonomia, seus recursos e objetivos foram enfraquecidos e deturpados. A SUDENE foi fechada em maio de 2001, a partir de denúncias de que estava favorecendo clientelas.
Órgão criado para diminuir as diferenças entre o Nordeste e o Sul-Sudeste, a SUDENE falhou, segundo a análise do sociólogo Francisco de Oliveira. O número de empregos indústrias criado foi insuficiente para resolver os problemas estruturais da região, os padrões de miséria foram mantidos, e as migrações não cessaram. Em termos de concentração de renda, nada mudou. FGV – CPDOC. Disponível em: <http://www.cpdoc.fgv.br/nav_jk/htm/o_Brasil_de_JK/a_criacao_da_sudene.asp>. Acesso em: 28 set 2009.

[55] Kodak Brownie Target Six-20 Caixote, uma câmera bem grande. Fundação Konrad Adenauer no Brasil -< http://www.adenauer.org.br/index.asp>. Acesso em: 2 out. 2009.

[56] A Casa de Saúde Dr. Eiras, é o único estabelecimento hospitalar privado, que começa do tempo do Brasil Império e a sua história acompanha a história da saúde no Rio de Janeiro até os dias atuais. Localizada em  Botafogo no início da segunda metade do século XIX concentrava uma significativa parte da elite da sociedade do Rio de Janeiro, representada pelos nobres e grandes comerciantes da cidade, que passaram a habitar o bairro e seus arredores, em suntuosos palacetes, tornando-o um local aristocrático. História da casa de saúde. Disponível em: <http://ww.hmattos.kit.net/historiadacasadesaude.html>. Acesso em 28 de set de 2009.

[57] Assim como no mundo todo, o ano de 1968 no Brasil foi marcado por manifestações e revoltas estudantis. Estes movimentos tinham alguns aspectos em comum com o que acontecia na Europa, mas também algumas diferenças importantes. No Brasil, a ditadura militar implantada em 1964 fechara os partidos políticos e as associações civis de oposição – inclusive as entidades estudantis. O movimento estudantil que eclodiu em 1968 era, essencialmente, um movimento de luta contra a ditadura. Apesar desta distinção bastante significativa, algumas posturas políticas aproximavam as manifestações estudantis que ocorriam no Brasil das revoltas que eclodiam em várias partes do mundo: um sentido radical de liberdade, o culto à ação, o desprezo pelas formas tradicionais de fazer política. O movimento estudantil que se gestou entre 1966 e 1968, no Brasil, também trazia em seu bojo uma crítica ao Partido Comunista Brasileiro, acusado de reformismo e de imobilismo frente ao regime. Disponível em:<http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=747>.Acesso:29 set 2009.

[58] Mario David Andreazza (Caxias do Sul, 20 de agosto de 1918 — São Paulo, 19 de abril de 1988) foi um militar e político brasileiro. Foi ministro dos Transportes nos governos Costa e Silva e Médici, tendo sido responsável por obras como a Ponte Rio-Niterói e a Transamazônica, entre muitas outras. Destacou-se também pelo que ficou conhecido como “Batalha dos Fretes”, em que conseguiu situar a Marinha Mercante brasileira no cenário antes dominado pelas potências marítimas internacionais.  No governo de João Figueiredo, foi ministro do Interior e responsável por programas habitacionais como o Promorar, que erradicou as palafitas, por exemplo, das favelas da Maré, no Rio de Janeiro, e dos Alagados, em Salvador. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=M%C3%A1rio_Andreazza&oldid=15010896>. Acesso: 29 set. 2009.

[59] O Método Paulo Freire consiste numa proposta para a alfabetização de adultos desenvolvida pelo educador Paulo Freire, que criticava o sistema tradicional, o qual utilizava a cartilha como ferramenta central da didática para o ensino da leitura e da escrita. As cartilhas ensinavam pelo método da repetição de palavras soltas ou de frases criadas de forma forçosa, que comumente se denomina como linguagem de cartilha, por exemplo, Eva viu a uva, o boi baba, a ave voa, dentre outros. Educação Como Prática da Liberdade. Introdução de Francisco C. Weffort. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1967 (19 ed., 1989, 150 p).

[60] MEB (Movimento de Educação de Base). É um organismo da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), em colaboração com o Ministério da Educação e Desporto, que atua há 37 anos a serviço da Educação Popular. Foi criado na década de 60, com a implantação de Escolas Radiofônicas, permitindo um amplo processo de alfabetização nas diversas regiões do País, principalmente, no Nordeste e Norte do Brasil. O objetivo é alfabetizar pessoas jovens ou adultas entre as populações mais carentes. Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=272> . Acesso em: 29 set. 2009.

[61] Leonel de Moura Brizola –  Carazinho, 22 de janeiro de 1922Rio de Janeiro, 21 de junho de 2004) foi um político brasileiro. Lançado na vida pública por Getúlio Vargas, foi o único político eleito pelo povo para governar dois estados diferentes (Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro) em toda a História do Brasil. Exerceu também a presidência de honra da Internacional Socialista. Foi prefeito de Porto Alegre, deputado estadual e governador do Rio Grande do Sul, deputado federal pelo Rio Grande do Sul e pelo extinto estado da Guanabara, e duas vezes governador do Rio de Janeiro. Sua influência política no Brasil durou aproximadamente cinqüenta anos, inclusive enquanto exilado pelo Golpe de 1964, contra o qual foi um dos líderes da resistência. Por duas vezes foi candidato a presidente do Brasil pelo PDT, partido que fundou em 1980, não conseguindo se eleger. Morreu aos 82 anos de idade, vitimado por problemas cardíacos. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Leonel_Brizola&oldid=16626518>. Acesso em: 29 set. 2009.

[62] OS GRUPOS DOS ONZE E O EXÉRCITO POPULAR DE LIBERTAÇÃO – Em outubro de 1963, Leonel de Moura Brizola, então Governador do Rio Grande do Sul, considerava que o Brasil estava vivendo momentos decisivos e que, rapidamente, se aproximava o desfecho que poderia colocar o País numa nova linha política. Sucessivamente, em 19 e 25 de outubro, Brizola fez inflamados pronunciamentos à Nação, através dos microfones de uma cadeia de estações de rádio liderada pela Mairink Veiga, que detinha, na época, o maior percentual de ouvintes das classes média e baixa. Nesses pronunciamentos, eivados, como sempre, de metáforas e redundâncias, conclamou o povo a organizar-se em grupos que, unidos, iriam formar o “Exército Popular de Libertação” (EPL). Com sua habitual e singular loquacidade, comparou esses grupos com equipes de futebol e os 11 “jogadores” seriam os “tijolos” para “construir o nosso edifício”. No início de 1964, Brizola lançou seu próprio semanário, “O Panfleto”, que veio se integrar à campanha agitada já desenvolvida pela cadeia da Rádio Mairink Veiga. Chegou a organizar 5.304 grupos, num total de 58.344 pessoas, distribuídas, particularmente, pelos Estados do Rio Grande do Sul, Guanabara, Rio de Janeiro, Minas Só faltava algum simples episódio que inflamasse o povo e que fizesse proliferar os Grupos dos onze, provocando o surgimento de seu “Exército Popular de Libertação”. Brizola. Disponível em: <http://www.ternuma.com.br/brizola.htm> – Acesso em: 29 set. 2009.

[63]   Alfredo Souto Malan filho do Gen. Alfredo Malan D’Angrogne. Nasceu no dia 08 de junho de 1908, na cidade de Porto Alegre – RS. Concluiu a Escola Militar do Realengo em 1928, sendo declarado Aspirante-a-Oficial da Arma de Engenharia, em 19 de janeiro de 1929. Durante sua carreira realizou todos os cursos obrigatórios com a peculiaridade de ser convidado a permanecer como instrutor após a conclusão dos mesmos, fato inédito de concludentes da Escola Superior de Guerra da França, quando o então Tenente-Coronel Malan foi convidado a permanecer no Corpo Permanente da Escola, uma vez que não era aberto a estrangeiros. Em 1950, se forma na Escola Superior de Guerra. Comandou o Batalhão Escola de Engenharia,. Fez parte do Gabinete do Ministro Espírito Santo Cardoso, foi Subcomandante da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN).  No Estado Maior das Forças Armadas (EMFA), chefiou a 3ª seção do Estado-Maior do Marechal Mascarenhas de Moraes.   Foi promovido a General – de Brigada em 25 de novembro de 1960, quando exercia a chefia do Estado-Maior da 7ª Região Militar (RM), em Recife-PE. Como General foi Chefe do Estado-Maior do IV Exército, Chefe de Gabinete do EME, Subchefe do EMFA, no período (1962-1964), sendo representante pessoal do Chefe do Estado-Maior do Exército, que era no momento o Gen. Castello Branco. Exerceu o Comando da AMAN, Comando da 4ª RM, Diretor de Engenharia e Comunicações, Comando do IV Exército, Chefe do Departamento de Provisão Geral e Chefe do Estado-Maior do Exército (EME). Em 10 de maio de 1972, foi para a reserva. Disponível em: <http://64.233.163.132/search?q=cache:h09hBGxijF4J:www.ihtrgs.org/informativo/56.doc+biografia+do+General+Malan+D%27Angrogne+-&cd=7&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br >. Acesso em 29 se set. 2009.

[64] O Muro de Berlim (“Berliner Mauer” em alemão) foi uma barreira física, construída pela República Democrática Alemã (Alemanha Oriental) durante a Guerra Fria, que circundava toda a Berlim Ocidental, separando-a da Alemanha Oriental, incluindo Berlim Oriental. Este muro, além de dividir a cidade de Berlim ao meio, simbolizava a divisão do mundo em dois blocos ou partes: República Federal da Alemanha (RFA), que era constituído pelos países capitalistas encabeçados pelos Estados Unidos; e República Democrática Alemã (RDA), constituído pelos países socialistas simpatizantes do regime soviético. Construído na madrugada de 13 de Agosto de 1961, dele faziam parte 66,5 km de gradeamento metálico, 302 torres de observação, 127 redes metálicas eletrificadas com alarme e 255 pistas de corrida para ferozes cães de guarda. Este muro provocou a morte a 80 pessoas identificadas, 112 ficaram feridas e milhares aprisionadas nas diversas tentativas de atravessá-lo. O Muro de Berlim começou a ser derrubado no dia 9 de Novembro de 1989, ato inicial da reunificação das duas Alemanhas, que formaram finalmente a República Federal da Alemanha, acabando também a divisão do mundo em dois blocos. Muitos apontam este momento também como o fim da Guerra Fria.. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Muro_de_Berlim&oldid=17050264>. Acesso em: 30 set. 2009.

[65] A Ação Católica Brasileira foi criada em 1935 pelo cardeal Sebastião Leme da Silveira Cintra no Rio de Janeiro.  Era dirigida por Alceu Amoroso Lima, com a participação de outros intelectuais católicos, muitos dos quais ligados ao Integralismo e filiados à Ação Integralista Brasileira (AIB). Com a instauração do Estado Novo, em 1937, a AIB foi extinta, assim como todos os partidos políticos, pelo então presidente Getúlio Vargas.  No início da anos 1960, já sob o pontificado de João XXIII, o Concílio Vaticano II, suscitou uma cisão ideológica da Igreja no Brasil, em uma corrente mais à esquerda, liderada por Dom Hélder Câmara, e outra à direita, ligada a Dom Jaime de Barros Câmara e Dom Vicente Scherer.  A Ação Católica contava então com três organizações destinadas aos mais jovens: a Juventude Estudantil Católica (JEC), formada por estudantes secundários, a Juventude Operária Católica (JOC), que atuava no meio operário, e a Juventude Universitária Católica (JUC), constituída por estudantes de nível superior. O crescente envolvimento do movimento estudantil na discussão dos problemas nacionais e das chamadas “reformas de base”, tais como a reforma agrária, acabou por engendrar a criação de uma organização política desvinculada da Igreja – a Ação Popular, constituída por antigos membros da JUC.  Posteriormente, em 1971, no auge da ditadura militar, a Ação Popular (AP) adere à luta armada, passando a se chamar Ação Popular Marxista-Leninista do Brasil. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=A%C3%A7%C3%A3o_Cat%C3%B3lica_Brasileira&oldid=17111464>. Acesso em: 31 out. 2009.

[66] Márcio Moreira Alves (Rio de Janeiro, 14 de julho de 1936 – idem, 3 de abril de 2009) foi um jornalista e político brasileiro, filho do ex-prefeito de Petrópolis Márcio Honorato Moreira Alves. Sua família era proprietária do celebrado Hotel Ambassador, no Rio de Janeiro, onde funcionou o Juca’s Bar, ponto de encontro de intelectuais e políticos na década de 1960.
Marcito, como era conhecido, participou em 1965 de uma manifestação promovida por intelectuais e estudantes no Rio de Janeiro em frente ao Hotel Glória, onde se reunia o Conselho da Organização dos Estados Americanos, a OEA. Esta entidade vinha servindo praticamente para facilitar o controle dos governos latino-americanos pelo governo norte-americano. Neste dia, estaria presente para a abertura da reunião o marechal Humberto Castello Branco, presidente imposto pelo golpe militar. Houve a manifestação e a polícia política prendeu várias personalidades. Márcio Moreira Alves não havia sido preso, mas logo correu atrás da kombi da polícia e exigiu seguir junto de seus companheiros de protesto e idéias.
É lembrado como o provocador do AI-5, ao proferir no início de setembro de 1968. Como deputado, um discurso no Congresso Nacional em que convocava um boicote às paradas militares de celebração à Semana da Pátria e solicitava às jovens brasileiras que não namorassem oficiais do Exército, em função deste discurso, o Ministro da Justiça à época enviou à Câmara de Deputados pedido de autorização para que o deputado Márcio Moreira Alves fosse processado. Assim dizia a Constituição, mesmo com todas as limitações: era preciso obter o consentimento da Câmara de Deputados para processar um membro seu. A crise foi se aguçando e por fim em 11 de dezembro de 1968 os deputados votaram o pedido, recusando-o. Foi um momento emocionante, em que todo o plenário da Câmara, após a conclusão da votação, levantou-se e cantaram todos o hino nacional. Em represália, o governo determinou o fechamento (recesso) da Câmara e os deputados tiveram que se retirar atravessando uma ameaçadora e humilhante fileira de soldados. Márcio Moreira Alves estava obviamente “jurado de morte” e teve que rapidamente exilar-se. . Disponível em: <http://www.marciomoreiraalves.com/index.htm>. Acesso em: 28 set. 2009.

[67]  O navio de passageiros PRINCESA ISABEL, primeiro de uma série de dois navios da mesma classe encomendados a dois estaleiros espanhóis pela Companhia Nacional de Navegação Costeira Autarquia Federal, Rio de Janeiro, RJ. Especificamente foi construído pelo estaleiro Societa Espanola de Construccion Naval S.A., Bilbao, Espanha. Foi batizado em homenagem à Princesa Imperial e herdeira do trono brasileiro Isabel Cristina Leopoldina Augusta Michaela Gabriela Raphaela Gonzaga, segunda filha do Imperador D.Pedro II e da Imperatriz Dona Tereza Cristina. Disponível em: <www.naviosmercantesbrasileiros.hpg.ig.com.br/nm_princesa_isabel.htm>. Acesso em 18 de set. 2009.

[68] Aspirante a oficial (ou, simplesmente, aspirante) é o posto de um membro das forças armadas ou forças de segurança, durante o período final da sua formação para oficial, antes de ser promovido ao posto inicial de oficial subalterno.

[69] General Lira Tavares -(João Pessoa, 7 de novembro de 1905 – Rio de Janeiro, 18 de novembro de 1998) foi um general-de-exército brasileiro, membro da junta provisória que governou o Brasil durante sessenta dias, de 31 de agosto a 30 de outubro de 1969.  Aluno da Escola Militar do Realengo, no Rio de Janeiro, formou-se também em direito e em engenharia. Comandou a Escola Superior de Guerra e foi ministro do Exército no governo Costa e Silva. Com o afastamento do presidente da República por motivos de saúde, Lira Tavares integrou um triunvirato formado também pelo almirante Augusto Rademaker e pelo brigadeiro Márcio de Sousa e Melo, tendo governado o país até que o general Emílio Garrastazu Médici fosse escolhido presidente da República.  Foi membro da Academia Brasileira de Letras, eleito em abril de 1970. Em suas poesias usava o epíteto de Adelita. Depois de compor a junta militar, foi embaixador do Brasil em Paris, de 1970 a 1974. . Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Aur%C3%A9lio_de_Lira_Tavares&oldid=15928261>. Acesso em: 2 out. 2009.

[70] Nascido em 1876, Konrad Adenauer teve uma notável carreira política. Em 1917, foi eleito como primeiro Prefeito da cidade de Colônia. Durante o regime nacional-socialista foi destituído desse cargo e perseguido politicamente. Em 1949, foi eleito como primeiro Chanceler da República Federal da Alemanha. Quando ele deixou esse cargo, em 1963, havia realizado uma obra histórica: a reconstrução da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial, a consolidação da democracia e a inserção de seu país na comunidade dos países livres. Adenauer tinha 73 anos quando, em 1949, foi eleito como primeiro Chanceler l da República Federal da Alemanha. Foi reeleito em 1953, 1957 e 1961, e renunciou ao cargo em 1963, aos 87 anos de idade. (…) Sua visão política era a de uma Alemanha livre e unificada, dentro de uma Europa livre e integrada. A sua meta consistia em chegar a um novo ordenamento europeu, com liberdade e democracia e, para, além disso, em aproximar o mundo de uma cooperação de alcance global. www.sustentavel.inf.br.

[71] Em suas poesias Lira Tavares usava o epíteto de Adelita.

[72] Em 21 de dezembro de 1968, Frank Borman, Jim Lovell e Bill Anders foram os protagonistas de um show inusitado. A missão Apollo 8 durou sete dias e seis noites e foi a primeira a levar o homem à órbita da Lua. Os Estados Unidos davam um passo à frente da União Soviética. Os tripulantes, porém, não conseguiram pousar na Lua. A nave apresentou defeitos graves, enfrentou um choque com um meteorito e uma tempestade solar. Mesmo assim, a operação foi considerada um sucesso: os três conseguiram retornar aos Estados Unidos e o sentimento geral era de que o homem estava pronto para receber o futuro. Disponivel em:<http://blogdtup.blogspot.com/2009/07/40-da-chegada-do-homem-lua.html>. Acesso em: 2 out. 2009.

[73] Em 1978, o Governo Geisel criou a Secretaria Especial de Informática (SEI), que instituiu a política de reserva de informática no País, que tinha por objetivo inventar a roda, ou seja, o computador, que seria genuinamente nacional. Propostas de instalações de fábricas da IBM e da Hewlett Packard no Brasil foram rejeitadas; não foi sequer permitida à produção desses equipamentos no Brasil, que seriam destinados exclusivamente para a exportação. Agradecem, até hoje, o Japão, a Coréia do Sul e a China, que estão pelo menos a duas décadas na nossa frente – os três países, em termos de produção de hardware e software; os dois primeiros, em termos de inclusão digital de sua população.
A xenofobia informática não era exclusiva dos militares retrógrados: “personalidades e associações profissionais e culturais de todo o país formavam um grande bloco com os cidadãos fardados, imitando a campanha do petróleo dos anos 50” (PAIM, 2002: 81).

[74] Jarbas Gonçalves Passarinho (Xapuri, 11 de janeiro de 1920), foi um militar e político brasileiro. Filho de Inácio de Loiola Passarinho e Júlia Gonçalves Passarinho, casado com Ruth de Castro Gonçalves Passarinho, pai de cinco filhos. Militar da arma de artilharia, tenente-coronel, foi indicado governador do estado do Pará (1964-1966). Foi depois senador da República (1967-1983 e 1987-1995) pelo Pará, ministro do Trabalho e Previdência Social no governo Costa e Silva (1967-1969), ministro da Educação no governo Garrastazu Médici (1969-1974), ministro da Previdência do governo João Figueiredo e ministro da Justiça no governo Fernando Collor. Foi presidente do Senado de 1981 a 1983. Concorreu ao governo do Pará em 1994, derrotado por Almir Gabriel no segundo turno. . Disponível em: http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Jarbas_Passarinho&oldid=15251327>. Acesso em: 7 out. 2009.

[75] General Emílio Garrastazu Médici (Bagé, 4 de dezembro de 1905 — Rio de Janeiro, 9 de outubro de 1985) foi um militar e político brasileiro, presidente do Brasil entre 30 de outubro de 1969 e 15 de março de 1974. – Médici exigiu que, para sua posse na presidência, o Congresso Nacional fosse reaberto, e assim foi feito. Em 25 de outubro, foi eleito presidente da República por uma sessão conjunta e tomou posse no dia 30, prometendo restabelecer a democracia até o final da sua gestão. No entanto, seu governo é comumente considerado o mais repressivo de toda a história do Brasil independente. As denúncias de torturas contra presos políticos correram o mundo durante o ano de 1970 e provocaram um grave embaraço para o governo brasileiro que preferiu atribuí-las a uma campanha da esquerda comunista contra o Brasil. O seu governo também ficou marcado por um excepcional crescimento econômico que ficou conhecido como o Milagre brasileiro, que se confundiu com o aumento da miséria e da concentração de renda. . Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index. php?title=Em%C3%ADlio_Garrastazu_M%C3%A9dici&oldid=17114497>. Acesso em: 7 out. 2009.

[76] Ney Aminthas de Barros Braga (Lapa, 25 de julho de 1917 — 16 de outubro de 2000) foi um militar e político brasileiro. Foi prefeito de Curitiba, deputado federal, senador e governador do estado do Paraná. Foi também ministro da Agricultura, ministro da Educação e Presidente da Itaipu Binacional. NEI BRAGA. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2009. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Nei_Braga&oldid=16613137>. Acesso em: 31 out. 2009.

[77] Fundada em 1965 e com mais de 40 anos de experiência, a Engevix é a maior empresa do segmento de engenharia consultiva do Brasil. Presta serviços na elaboração de estudos, de projetos, no gerenciamento de obras e em empreitadas integrais (EPC- Engineering Procurement Construction). A Engevix atua nos setores público e privado, do Brasil e do exterior, em empreendimentos das áreas de energia (geração, transmissão e distribuição), óleo, gás, petroquímico, indústrias de base (celulose e papel, siderurgia, mineração, entre outras) e infra-estrutura (transportes e saneamento básico). Via 6 – Empresa – Engevix Engenharia.  http://www.via6.com/perfil.php?mid=83803. Acesso em 19 out. 2009.

[78] Fernando Affonso Collor de Mello (Rio de Janeiro, 12 de agosto de 1949) é um empresário e político brasileiro, atualmente filiado ao Partido Trabalhista Brasileiro. Foi o trigésimo segundo presidente da República Federativa do Brasil, cargo que exerceu de 15 de março de 1990 a 29 de dezembro de 1992. Foi também o primeiro presidente eleito por voto direto após o Regime Militar, em 1989. O governo foi marcado pela implementação do Plano Collor, pela abertura do mercado nacional às importações e pelo início do Programa Nacional de Desestatização.  Renunciou ao cargo na tentativa de evitar um processo de impeachment fundamentado em acusações de corrupção. Embora tenha renunciado, o processo prosseguiu e Fernando Collor teve seus direitos cassados por oito anos por determinação do Senado Federal, e só foi eleito novamente para cargo público em 2006, tomando posse como senador por Alagoas em 2007. . Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Fernando_Collor_de_Mello&oldid=17441801>. Acesso em: 31 out. 2009.

[79] Mestre do desenho e do humor gráfico, Claudius Ceccon estreou aos 19 anos no Jornal do Brasil, passando posteriormente pela Revista Manchete, pelos jornais A Noite, Diário Carioca, Correio da Manhã, O Globo, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo. “Não quero deixar de mencionar a revista Senhor e O Pif Paf, do Millôr, que deixaram saudades”, relembra. O cartunista também foi um dos cinco fundadores do Pasquim, famoso folhetim que desafiava a censura e ditadura militar, com qual colaborou até a sua extinção, em 1982. Disponível em: <www.cecip.org.br> . Acesso em 19 out. 2009.

[80] Disponível em: <www.cecip.org.br>. Acesso em 19, out. 2009.


SOUZA, Margareth Lopes de; As Primaveras de Hugo José Ligneul.
Orientador: Rodrigo Fialho. Além Paraíba, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Professora Nair Fortes Abu – Merhy, Fundação Educacional de Além Paraíba / Departamento de História, 2009. Monografia (Licenciatura em História).