FATORES DOS CASOS DE VIOLÊNCIA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES DURANTE A PANDEMIA: A LUTA DO ECA E SUA IMPORTÂNCIA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6632197


Autora:
Amanda Pereira Jacob Pireth1
Orientadora:
Laislla Ferreira Morais2


RESUMO

Atualmente, notícias sobre casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes no Brasil surgem constantemente, principalmente nas redes sociais, jornais e outros meios de comunicação, em especial no período da Pandemia As mudanças na vida dos alunos para se adaptarem ao sistema de ensino a distância e o acesso limitado a atividades em grupo e de lazer atrapalharam as rotinas sociais, expressando tensão e estresse. Por conta do distanciamento social e das medidas de combate à contaminação do corona vírus, muitas crianças e adolescentes não tiveram seus maiores aliados nas denúncias e no combate à violência doméstica, em sua maioria escolas, amigos e parentes. Dessa forma, o ECA determinou que todo caso alegado ou confirmado de violência contra a criança deve ser notificado ao Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras medidas legais. Mesmo que a subnotificação de incidentes violentos seja uma realidade, resultando em uma redução acentuada do número real de casos, ainda é perceptível a presença de muitas vítimas. A relevância do assunto para a sociedade é que os atos de violência cometidos pelos indivíduos, que tem por obrigação legal, proteger e preservar a integridade das crianças e adolescentes sob seus cuidados. Ressalta-se que não só a violência física, mas também a violência psicológica e sexual deve receber mais atenção do poder público e das instituições sociais, diminuindo dia a dia Número de casos. Quais foram os fatores de casos da violência intrafamiliar durante a pandemia? Este presente trabalho analisou os fatores da violência infanto-juvenil, suas causas e consequências na pandemia. A metodologia que foi empregada na monografia será a pesquisa exploratória, esse tipo de estudo possui finalidade de elucidar e desenvolver conceitos e ideias, tendo em vista a problematização que será pesquisada. Essa modalidade proporciona uma visão geral do tema a ser estudado, pois o assunto escolhido é pouco discutido, portanto há uma maior dificuldade de formular hipóteses plausíveis de argumentação e uma maior dificuldade para encontrar materiais para consulta. Por fim concluiu-se que a violência nas relações intrafamiliares muitas vezes revela a continuação de ciclos de violência, em que os adultos replicam a violência que vivenciaram quando crianças, enquanto as crianças são socializadas para usar a violência como estratégia de enfrentamento de conflitos e dificuldades no futuro. A violência doméstica precisa de todos: Estados, sociedade civil, instituições Educação, saúde e ajuda atuam em dois níveis. A primeira é a prevenção por meio da garantia de acesso a itens materiais e simbólicos que permitem às famílias compartilhar e desenvolver suas experiências na educação de seus filhos.

1. INTRODUÇÃO

A Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu o deputado federal Jairo Souza Santos Júnior, Dr. Jairinho e sua companheira, a professora Monique Medeiros, em 8 de abril de 2021, enquanto investigavam a morte de seu filho de 4 anos. Henrique Borel Medeiros morreu no dia 8 de março no Hospital Barra D’Or, na Barra da Tijuca. Ele foi levado para lá pelo casal, que alegou tê-lo encontrado desmaiado no quarto onde dormia. Henry foi encontrado com os olhos revirados, mãos e pés frios e com dificuldade para respirar. De acordo com o médico, o menino sofreu uma parada cardíaca quando chegou ao hospital. No início, a polícia considerou o caso como um acidente, como se o menino tivesse caído da cama. No entanto, os peritos identificaram a vítima como agressão. (FERRARI, 2021).

Atualmente, notícias sobre casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes no Brasil surgem constantemente, principalmente nas redes sociais, jornais e outros meios de comunicação, em especial no período da Pandemia (BARROS, et al., 2021).

As mudanças na vida dos alunos para se adaptarem ao sistema de ensino a distância e o acesso limitado a atividades em grupo e de lazer atrapalharam as rotinas sociais, expressando tensão e estresse. Por conta do distanciamento social e das medidas de combate à contaminação do corona vírus, muitas crianças e adolescentes não tiveram seus maiores aliados nas denúncias e no combate à violência doméstica, em sua maioria escolas, amigos e parentes. (BARROS, et al., 2021).

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) expõe que, violência intrafamiliar é toda ação ou tratamento com finalidade de castigo que utiliza-se do uso força física ou de meio cruel contra crianças e adolescentes, no qual o resultado é sofrimento e a inferiorização destes.

Dessa forma, o ECA determinou que todo caso alegado ou confirmado de violência contra a criança deve ser notificado ao Conselho Tutelar, sem prejuízo de outras medidas legais. (Brasil, 2019a). Mesmo que a subnotificação de incidentes violentos seja uma realidade, resultando em uma redução acentuada do número real de casos, ainda é perceptível a presença de muitas vítimas.

A relevância do assunto para a sociedade é que os atos de violência cometidos pelos indivíduos, que tem por obrigação legal, proteger e preservar a integridade das crianças e adolescentes sob seus cuidados. Ressalta-se que não só a violência física, mas também a violência psicológica e sexual deve receber mais atenção do poder público e das instituições sociais, diminuindo dia a dia Número de casos. Quais foram os fatores de casos da violência intrafamiliar durante a pandemia?

Sabe-se que crianças e adolescentes estão em processo de desenvolvimento físico e mental, de modo que a exposição à violência tem efeitos diretos e indiretos no desempenho escolar, no ajustamento social e no desenvolvimento orgânico da vítima (RITA, et al., 2020). Além disso, em geral, crianças e adolescentes que sofrem violência podem ter problemas futuros nos domínios social, emocional, cognitivo e físico (ALMEIDA, et al., 2013). A saúde mental está intimamente relacionada às relações familiares, pois os adolescentes correm aproximadamente três vezes risco de desenvolver problemas psicológicos quando a violência ocorre dentro da família em comparação com a violência urbana (BARROS A e FREITAS M, 2015).

Sobre as consequências geradas pela violência infantojuvenil, no tocante a agressão física pode citar como principais danos, lesões e hematomas, que constantemente passam despercebidos por se tratar de contusões leves. (RITA, et al., 2020). A exposição prolongada à violência pode levar à cegueira, retardo mental, comprometimento neurológico e hepático (BARROS A e FREITAS M, 2015) e até homicídio, embora com menor frequência. Segundo a UNICEF (2020), aproximadamente 191.000 crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos foram vítimas de homicídio no Brasil de 1997 a 2017.

O abuso psicológico é conhecido por ser o tipo de violência mais difícil de detectar e muitas vezes ocorre ao mesmo tempo que outros tipos de abuso. Portanto, não há indicações específicas de que um indivíduo esteja sofrendo, mas existem algumas características que sugerem mais atenção deve ser dada às crianças ou adolescentes (RITA, et al., 2020). Há também a questão dos abusos sexuais, assim como a presença de traumas físicos, infecções sexualmente transmissíveis, gravidez e distúrbios psicossomáticos também podem sugerir abuso. (PAVÃO MTB, 2013).

Neste momento de distanciamento social, é ainda mais importante estar atento a alguns dos sinais de que a vítima pode precisar de ajuda (REIS DM et al. 2018). Haja vista, fica claro que o cuidado e o acompanhamento das crianças e jovens sob ataque devem ser consistentes.

Este presente trabalho irá analisar os fatores da violência infanto-juvenil, suas causas e consequências na pandemia.

O capítulo um abordará sobre violência doméstica e tipos de violência, os conceitos e suas formas, já o capítulo dois trará sobre violência no contexto do distanciamento social, os fatores que levaram a essa situação e as consequências e no capítulo três versará sobre a importância do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e os dispositivos jurídicos para cuidados e proteção em favor dos menores.

A metodologia que será empregada na monografia será a pesquisa exploratória conforme esclarece Gil (2008), esse tipo de estudo possui finalidade de elucidar e desenvolver conceitos e ideias, tendo em vista a problematização que será pesquisada. Essa modalidade proporciona uma visão geral do tema a ser estudado, pois o assunto escolhido é pouco discutido, portanto há uma maior dificuldade de formular hipóteses plausíveis de argumentação e uma maior dificuldade para encontrar materiais para consulta.

Possuirá uma abordagem qualitativa, segundo Bonat (2009), por possuir uma análise na qual a natureza da pesquisa poderá ter interpretações ao estudo proposto de modo individual a cada consumidor e não apenas se restringir a uma contagem ou a descrição desse fenômeno. É também uma pesquisa prescritiva, tendo como objetivo solucionar problemas, dando solução ao mesmo conforme as normas legais, é interpretativa e ainda de acordo com a autora, é documental, pois serão utilizadas fontes primárias para sua realização.

O ambiente da pesquisa é bibliográfico, como observa Severino (2007), uma vez que é realizado a partir de registros disponíveis, e a escrita decorre de pesquisas anteriores realizadas por outros autores, por meio de livros, artigos e teses. A técnica escolhida para coleta de dados é a interpretativa, que consistirá em doutrinas, jurisprudência, legislação e em teses bibliográficas, ou seja, também bibliográfica, através de pesquisa documental.

A base da pesquisa será a documental, constata Cellard (2008), as análises documentais beneficiam a forma como vai ocorrer a análise de evolução dos indivíduos de determinados grupos, conceitos, conhecimentos, comportamentos, mentalidades, práticas, entre outros.

2. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E INTRAFAMILIAR

2.1 Conceito

Violência, conforme definição da Organização Mundial da Saúde, é definida como o uso deliberado da força ou do poder, por meio de atos ou ameaças, contra si mesmo ou contra outros, grupos ou comunidades, que cause ou possa causar dano físico ou psicológico, privação, morte, colapso de desenvolvimento. Cinco pontos emergem desse conceito: seu impacto, sua intenção, seu poder, seus objetivos e sua natureza (KRUG et al., 2002).

A violência que ocorre na vida cotidiana nas relações familiares é às vezes chamada de violência doméstica ou violência intrafamiliar. No entanto, a violência doméstica inclui outros membros da família, sem o papel do progenitor e, portanto, abrange a violência cometida ou sofrida por funcionários, familiares e outros que vivem esporadicamente no ambiente doméstico. Por outro lado, o conceito de violência intrafamiliar reconhece apenas a violência que ocorre nas relações familiares, ou seja, entre os membros da família. Pode ser realizado em ambientes domésticos e públicos (BRASIL, 2001)

Definição de violência doméstica é toda ação ou omissão praticada no intuito de causar sofrimento físico, psicológico, sexual e econômica através de ameaças, engano, coerção ou qualquer outro meio contra criança, jovem, adultos ou idosos, residente em residência comum ou que não se encontre no mesmo agregado familiar do autor, sendo cônjuge ou companheiro ou ex-cônjuge ou ex-companheiro(a). (MACHADO E GONÇALVES, 2003). É considerado um fenômeno antigo, mas só recentemente se tornou um problema social, devido à atual maior sensibilidade e intolerância social à violência. (MARTINS, 2021.)

Acredita-se que os fatores que levam à violência são: isolamento (geográfico, físico, emocional e social), divisão (como um mal que considera apenas uma pequena parte do problema e está relacionado ao rótulo dado a uma determinada pessoa), poder e dominância ou influência moral, tendências violentas baseadas em crenças e atitudes, situações estressantes (perda de emprego; problemas financeiros, gravidez; mudanças de papéis – como iniciar um curso ou mudar de emprego), frustração, uso de álcool ou drogas, agressão na infância ou experiência dos pais de violência, personalidade sádica, deficiência mental ou física. (MACHADO E GONÇALVES, 2003.)

O lar é um espaço privilegiado para aprender e desenvolver competências fundamentais para a interação e relacionamento, e para vivenciar extraordinárias relações interpessoais e afetivas, como as relações pais-filhos, a fraternidade, o amor e a sexualidade. Assim, a identidade pessoal deriva das emoções e emoções positivas ou negativas desenvolvidas na família e tem uma importância significativa na base da vida social de um indivíduo. Portanto, quando a violência ocorre em um sistema tão importante para o desenvolvimento individual, o impacto é compreensível (ALARCÃO, 2006)

A violência familiar caracteriza-se pela intimidade e proximidade que existe na relação entre o agressor e a vítima, abrangendo todos os membros que integram ou foram membros da família. O seu conceito inclui todos os tipos de abuso que ocorrem nas relações familiares, sejam eles temporários ou permanentes, e que podem acompanhá-lo ao longo do seu ciclo de vida (ALARCÃO, 2006; RESOLUÇÃO DE CONSELHO DE MINISTROS 88/2003).

A agressão contra crianças em contexto familiar há muito tempo é vista como uma questão intíma e mascarada pelos pais como educação, mas o abuso infantil é qualquer ato ou omissão (de um dos pais ou substituto), de forma não acidental, que possa colocar em risco a segurança das crianças e suprir suas necessidades humanas básicas e psicológicas/emocionais. (ALARCÃO, 2006; GABATZ et al., 2013).

Como resultado, alguns estudos mostraram que os perpetradores, geralmente os pais, abusam e abandonam as crianças, causando danos físicos (contusões, hematomas e lesões fatais ou crônicas), abuso sexual e emocional de crianças (assédio contínuo de crianças, isolamento e prisão). O abuso também é um tipo de agressão, entretanto passiva, em que não atende às necessidades humanas básicas da criança, enquanto no abandono emocional, suas necessidades psicológicas e emocionais são ignoradas. (ALARCÃO, 2006; REDONDO, PIMENTEL e CORRERIA, 2012; GABATZ et al., 2013; UNICEF, 2014)

Crianças expostas direta ou indiretamente à violência intrafamiliar apresentam risco aumentado para futuros problemas emocionais e comportamentais, como transtornos de conduta, terror noturno, alcoolismo, uso de drogas, depressão e ansiedade, estresse pós- traumático, distúrbios psicossomáticos, tentativas de suicídio e automutilação. (MARQUES et al., 2018).

O significado da violência intrafamiliar mudou ao longo da história, uma vez legitimada, agora é objeto de enfrentamento social e punição no campo jurídico. O combate a todas as formas de abuso contra crianças e adolescentes está na agenda dos tratados internacionais de direitos humanos, também é entendida como um problema de saúde. A violência contra crianças e adolescentes deixou de ser vista como um fato natural ou a forma “justa” com que os pais tratam seus filhos, e passou a ser observada como um problema grave a ser enfrentado pelo Estado, pela sociedade civil e as próprias famílias. (MOREIRA e SOUSA, 2012.)

O caminho para a desconstrução de práticas arraigadas é longo e tortuoso. Podemos ver isso claramente quando comparamos o histórico de violência de gênero contra a mulher com a violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes. No que se refere ao primeiro, é exemplar o distanciamento entre os princípios do decreto do reino vigentes durante o período colonial no Brasil e o princípio do amparo legal para que os maridos exerçam violência física contra suas esposas segundo Azevedo (1985), e a Lei Maria da Penha (2006), onde a violência contra a mulher é crime. (MOREIRA e SOUSA, 2012).

No que se refere às crianças e adolescentes, a Constituição Brasileira de 1988 e o Regulamento da Criança e do Adolescente (1990) asseguram que tanto Diferentemente da Lei do Menor, que vigorou entre 1927 e 1990, a criança e o adolescente são sujeitos de direitos e pessoas em desenvolvimento que devem ser tratados com absoluta prioridade. ―Menores‖, ou seja, crianças e adolescentes empobrecidos que foram submetidos à supervisão e punição do Estado e foram expulsos de suas famílias. (MOREIRA e SOUSA, 2012).

2.2 Tipos de Violência

A violência física, manifestada nas relações das crianças com os adultos, tem características próprias, mas também reflete como a sociedade se organiza e estabelece relações de poder. Como argumenta Arendt (2001), a violência é inerentemente instrumental e racional na medida em que é sempre projetada para atingir efetivamente um fim. A violência física não é apenas uma ferramenta para controlar o comportamento e o comportamento dos inferiores (crianças, mulheres, idosos) nas relações familiares. Ao longo da história, essa forma de violência serviu aos mecanismos de controle e punição das classes baixa e média da vida pública (servos, escravos, criminosos, inimigos). (SILVA, 2008).

Essa violência é resultado e consequência de uma dinâmica de poder/emocional envolvendo pais e filhos. Nesse sentido, a violência física é entendida como ferramenta de ensino, ora com função punitiva, ora disciplinar. São inúmeras as crenças que justificam e sustentam o modelo de educação para a violência. (SILVA, 2008).

Embora haja nuances nos conceitos de disciplina e castigo corporal, em ambos os casos trata-se, na verdade, de controlar o comportamento da criança por meio da dor e da dor física. “A punição física que não causa dor é uma falácia porque sem esse componente não é punição”, afirmam Azevedo e Guerra (1995, p.25). A intensidade da dor causada pode variar – alguns pais batem, outros espancam e torturam seus filhos em nome da educação. (SILVA, 2008).

Ao longo da história, a violência física permeou todo processo de socialização infantil. A prática de reprimir a educação infantil tem raízes profundas, é um costume, uma tradição enraizada na cultura brasileira. A construção da noção de que as crianças são sujeitos de direitos é relativamente recente. A punição, o uso de disciplina violenta, é muitas vezes visto pelos pais como um sacrifício necessário para o bom crescimento de uma criança. A palmada não é violência, mas um gesto de amor e compromisso com o desenvolvimento de pessoas honestas e gentis. O castigo corporal é um pecado necessário porque através do castigo corporal as crianças aprendem a respeitar as leis da família e, portanto, temem as leis sociais. Através do uso da violência física como meio de coerção e controle, a microestrutura familiar reproduz o padrão dominante da macroestrutura social. (SILVA, 2008).

Muitas vezes se ouve das crianças que são submetidas à violência física que elas merecem ser espancadas. Dizem que não sentem dor, que os pais têm o direito de bater e que as crianças devem apanhar quando fazem algo errado, deixando aparente a conformidade dos filhos para legitimar os espancamentos sofridos com finalidade educativa. Mas as crianças que vivem com métodos educacionais violentos não são isentas de dor. Sentimentos de raiva, conflito emocional e ódio, são ofuscadas por imagens idealizadas de autoridade familiar. A idealização de afeição, afirma que os pais são sempre bons com os filhos. Diante desse amor idealizado, os filhos ainda precisam aceitar a dor e o sofrimento que seus pais cometem, seja em benefício próprio ou em benefício da sociedade. (SILVA, 2008).

Os danos, lesões, traumas e mortes causados pela violência física contra crianças têm altos custos sociais, causando prejuízos econômicos, sobrecarregando os sistemas de saúde e aumentando os custos de emergência, assistência e reabilitação (Brasil, 2005). O custo da violência no país é mais de três vezes maior que o investimento em ciência e tecnologia (BRASIL, 2005).

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), junto ao Conselho Federal de Medicina (CFM) e ao Ministério dos Direitos Humanos, busca soluções para as agressões contra crianças e adolescentes menores de 19 anos. A série histórica (de 2009 a 2017) mostra que o número de agressões chegou a 471.178 registros. No primeiro ano da série, foram 13.888 notificações (média de 38 por dia). Do total de casos notificados ao serviço de saúde, 69,5% (59.293) foram por violência física, 27,1% (23.110) por violência psicológica e 3,3% (2.890) por tortura. (AGÊNCIA BRASIL, 2019)

A Sociedade Brasileira de Pediatria destacou que agressões a crianças e adolescentes resultaram em grande número de internações e óbitos. Entre 2009 e 2014, houve 35.855 encaminhamentos hospitalares e 3.296 óbitos. Cálculos baseados nas Informações do Sinan indicam que, em média, 13,5% das notificações para os três tipos de agressão, violência física, psicológica ou tortura, evoluíram para internação. Além disso, pelo menos uma criança ou adolescente morreu de abuso a cada dia durante o período de análise. (AGÊNCIA BRASIL, 2019)

O Sinan apresenta em números, ocorrências desse tipo de violência, em 2017, foram mais frequentes nos estados: São Paulo (21.639 casos), Minas Gerais (13.325), Rio de Janeiro (7.853), Paraná (7.297) e Rio Grande do Sul (5.254). Os dados representam, respectivamente, 25,3%, 15,6%, 9,2%, 8,5% e 6,1% do total de registros no ano. (AGÊNCIA BRASIL, 2019)

No caso da violência física, a maioria das vítimas tem até 19 anos de idade, já a violência sexual é o oposto, os dados de estupro e estupro de vulnerável demonstram que, entre os anos de 2017 e 2020, 81% das vítimas tinham até 14 anos de idade, ou seja, em números, nos últimos quatro anos, de 179.278 casos registrados, em 145.086 deles a vítima tinha até 14 anos. (UNICEF, 2021)

De acordo com o Código Penal, o estupro de pessoas vulneráveis é um tipo específico de crime de estupro contra vítimas menores de 13 anos e pessoas incapazes de dar seu consentimento, mas há muitos registros de incidentes que classificam essas características como estupro comum. De todos os registros analisados, 21.165.878 incluíam a simples idade da vítima, o que é fundamental para uma análise mais sensível do assunto. A distribuição das faixas etárias do crime mostra que, do total de vítimas de 0 a 19 anos, os de 10 a 14 anos representaram 45%. A partir dos 15 anos, o número de vítimas de estupro diminui significativamente. Nos últimos quatro anos, mais de 22.000 crianças de 0 a 4 anos, 40.000 crianças de 5 a 9 anos, 74.000 crianças e adolescentes de 10 a 14 anos e 29.000 foram estupradas no Brasil Adolescentes de 15 a 19 anos. (UNICEF, 2021)

Em média, isso significa que 36.000 meninas e meninos com menos de 14 anos são estuprados a cada ano cerca de 100 por dia. As meninas são a grande maioria das vítimas. Destes, a maior proporção de casos (47%) ocorreu entre 10 e 14 anos. Entre os meninos, o estupro é um crime que ocorre principalmente na infância, A faixa etária de 59% dos casos foi até 9 anos. A violência sexual ocorre principalmente em casa, e o autor do crime é alguém conhecido da vítima. (UNICEF, 2021)

Segundo Pitzner e Drummond (1997), ―abuso psicológico ou violência psicologica é uma condição na qual uma criança ou adolescente foi desqualificado em termos de suas habilidades, potenciais, desejos e emoções, ou foi acusado desproporcionalmente por outros significativos durante seu crescimento e desenvolvimento. (PINTO 2014)

A importância de diagnosticar, prevenir e compreender as consequências da violência psicológica é que ela prejudica severamente o desenvolvimento psicossocial de uma criança ou adolescente. Afeta o desenvolvimento da autoestima, do autoconceito, da competência social e da capacidade das crianças e adolescentes de formar relacionamentos. (PINTO 2014). Muitas vezes, crianças e adolescentes que sofrem esse tipo de abuso tendem a apresentar problemas comportamentais, distúrbios emocionais e respostas inadequadas. Pesquisas sobre processos de crescimento e desenvolvimento que são prejudiciais para crianças e adolescentes em diferentes contextos mostram que adolescentes com baixa autoestima sofrem violência psicológica de pessoas significativas quase duas vezes mais do que adolescentes com autoestima elevada. Para ser mais preciso, 21,6% dos adolescentes com alta autoestima e 45% dos adolescentes com baixa autoestima sofreram abuso psicológico grave por parte dos responsáveis por seus cuidados. (PINTO, 2014)

Adultos que sofreram violência psicológica na infância ou adolescência também tenderam a apresentar um quadro bastante peculiar. Porque na maioria das vezes, o adulto em questão não percebe que está sendo abusado. Por esse fato, o adulto vítima não consegue relacionar a violência que sofreu com os problemas que está enfrentando agora. Eliana Gil (1984), terapeuta especializada em crianças e adultos vítimas de abuso, observou as dificuldades que esses adultos vivenciam em decorrência do abuso: problemas em relação a confiança, autoproteção, realizações, dificuldades sociais, em relacionamentos e de autoestima. (PINTO, 2014).

Destaca-se que o abuso psicológico infantil não só põe em causa a dignidade da criança e do adolescente, mas também o seu direito à saúde, incluindo a saúde mental, o afeto, o respeito e a convivência familiar saudável. (PINTO, 2014).

3. VIOLÊNCIA NO CONTEXTO DO DISTANCIAMENTO SOCIAL

Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu que a COVID-19, doença causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), atingiu proporções pandêmicas. Essa doença desconhecida, para a qual ainda não há possibilidade de tratamento ou controle, por isso as entidades estão orientando para o distanciamento social como única forma de conter sua disseminação. Desde que o primeiro caso foi detectado no Brasil, nota-se o número devastador de infecções e mortes, e para evitar o contágio é obrigação sanitária haver distanciamento social. Com isso, crianças e adolescentes são proibidos de realizar atividades cotidianas fora de casa, como frequentar aulas, circular em ambientes públicos e até mesmo socializar com amigos, limitando os espaços sociais pessoais ao ambiente interno do lar. (PLAT, et al., 2020).

Segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), cerca de 1,5 bilhão de crianças e adolescentes em todo o mundo estão fora da escola devido ao fechamento de instituições de ensino como medida de contenção de casos de COVID-19. no brasil. Atividades em creches públicas e privadas, escolas e universidades também foram interrompidas. Como mencionado anteriormente, em muitas partes do país, o fechamento do comércio (exceto serviços considerados essenciais), empresas, etc., tem estimulado o trabalho remoto (teletrabalho) para maioria dos trabalhadores. Com isso, a dinâmica das famílias com crianças e adolescentes exige maior esforço dos pais, responsáveis e/ou cuidadores que precisam coordenar trabalho remoto, tarefas domésticas e cuidado dos filhos. (MORAES, et. al, 2020).

Os dados aqui apresentados é uma compilação de informações de boletins de ocorrência envolvendo violência letal e não letal contra crianças e adolescentes. Como tal, visa fornecer um panorama inicial da dinâmica das diferentes formas de violência que atingem crianças e adolescentes em estados selecionados do país. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021).

A pesquisa, apurada em dados de 12 unidades federativas selecionadas (a saber: Alagoas, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo) com base nas diferenças regionais e na disponibilidade de informações, tem como objetivo oferecer um olhar inédito sobre o contexto da violência contra a criança por meio da compilação de dados do Boletim de Ocorrências. Os delitos aqui considerados são: maus-tratos (art. 136 do Código Penal e art. 232 do Código da Criança e do Adolescente), lesão corporal dolosa em contexto de violência intrafamiliar (art. 129, §9º do Código Penal), exploração sexual (art. 218-B do código penal e artigo 244-A do ECA), estupro (inclui estupro de vulnerável) e morte violentas intencionais (homicídios dolosos, feminicídios, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenção policial). (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

A seleção dos crimes foi baseada em conversas com profissionais de segurança pública, bem como no entendimento geral da disponibilização de informações do órgão pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os dados considerados foram aqueles cujas vítimas de crimes tinham entre 0 e 17 anos entre 2019 e o primeiro semestre de 2021. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021).

A tabela abaixo apresenta o número total de crimes compilados, ou seja, no período de 2019 a 2021, foram identificadas 129.844 ocorrências de crimes selecionados contra crianças e jovens de 0 a 17 anos em 12 unidades federativas. Os dados são divididos em Faixas etárias, a parte de uso segue as divisões estabelecidas pelo DATASUS, que por sua vez seguem a Organização Mundial da Saúde (OMS). Portanto, optou-se por utilizar os três primeiros termos estabelecidos pela Organização (0-4 anos, 5-9 anos e 10-14 anos) e buscar respeitar a definição do grupo de crianças e adolescentes como 18, apenas o último intervalo foi alterado para 15-17 em vez de 15-19.  (Fórum Br de Segurança Pública, 2021).

FIGURA 1 – TOTAL DE CRIMES COM VÍTIMAS DE 0 ATÉ 17 ANOS

O primeiro semestre de 2019 (período de análise) apresentou o maior número de registros de estupro, lesão corporal intencional, abuso e exploração sexual no contexto de violência doméstica. No primeiro semestre de 2020, todos esses crimes apresentaram queda significativa no número de registros. No primeiro semestre de 2021, os números voltaram a aumentar, mas não atingiram os níveis observados no primeiro semestre de 2019. O primeiro semestre de 2020 foi o período mais severo de medidas de distanciamento social. No entanto, no primeiro semestre de 2021, houve uma segunda onda da pandemia do novo coronavírus, e as medidas de quarentena voltaram a ser rígidas, afetando a vida das pessoas. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

A morte violenta intencional foi o único tipo de crime sob investigação que se diferenciou de outros crimes. O semestre com mais registros foi o primeiro semestre de 2020. Ou seja, as mortes subiram do primeiro semestre de 2019 para o primeiro semestre de 2020, e caíram no primeiro semestre de 2021. As mortes violentas intencionais, crime menos sensível à subnotificação, tornaram-se um importante indicador de que é possível que um ano de pandemia é menos violento do que menos tempo, mas um tempo em que os registros criminais são mais propensos a serem subnotificados. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

FIGURA 2 – COMPARALIDADE TEMPORAL

Dos 129.844 registros compilados por 12 unidades federativas, as vítimas tinham entre 0 e 17 anos, 56,6% foram estupro, 21,6% abuso, 18,1% lesão corporal intencional em contexto de violência doméstica, 2,9% é intencional morte violenta, 0,8% exploração sexual. O crime com maior número de vítimas entre 0 e 17 anos foi o estupro, com 73.442 casos identificados. A faixa etária mais acometida por esse tipo de crime é de 10 a 14 anos. Nesse caso, há uma grave desigualdade de gênero, pois 85% das vítimas são mulheres. A desigualdade de raça/cor não foi significativa, mas a maioria das vítimas era negra (51,6% do total de registros de raça disponíveis). (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

Maus-tratos é o segundo tipo de crime que mais atinge crianças e jovens de 0 a 17 anos, com 28.098 casos identificados. 90% das vítimas eram menores de 14 anos, com a maioria entre 5 e 9 anos (35%). Não houve diferenças significativas entre os sexos das vítimas se considerado o número total de registros de abuso. As vítimas do sexo masculino representaram 51% e as vítimas do sexo feminino representaram 49%. Houve diferenças de gênero de acordo com as faixas etárias analisadas. Os meninos são a maioria das vítimas até os 12 anos e as meninas são a maioria. Do total de registros de raças disponíveis, 59% das vítimas de abuso eram brancas e 41% eram negras. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

Foram identificados 23.494 casos de lesão corporal intencional em contexto de violência intrafamiliar. O grupo mais afetado por esses comportamentos foram as meninas (77%) de 15 a 17 anos (51,7%). Não houve aparente desigualdade racial entre as vítimas, mas maioria eram vítimas brancas (51,9% do total de registros de raça disponíveis). A investigação identificou 3.717 casos de morte violenta intencional. A faixa etária com maior número de vítimas foi a de 15 a 17 anos, que representou 82% do total de crimes. A maioria das vítimas de IVM era do sexo masculino (86%), quanto maior a faixa etária, maior a desigualdade de gênero na distribuição das vítimas. Do total de vítimas de MVI com registros disponíveis Raça/cor, 78% eram negros. As disparidades raciais também se intensificaram com a idade das vítimas. (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

Os crimes de exploração sexual foram os menos registrados, com 1.093 casos identificados. Esses registros indicam que a maioria das vítimas estava nas faixas etárias de 10 a 14 (44%) e 15 a 17 (48%), sendo a maioria do sexo feminino (86%) e negra (56,3% total de registros com raça disponível). (Fórum Br de Segurança Pública, 2021)

FIGURA 3 – PERFIL DAS VÍTIMAS POR TIPO DE CRIME

A subnotificação e a violência doméstica generalizada, incluindo agressões a crianças e adolescentes, parecem ter aumentado desde a introdução do distanciamento social como estratégia de combate à pandemia de Covid-19. Portanto, deixar crianças e adolescentes já vulneráveis sozinhos com suas famílias por períodos tão longos e angustiantes pode tornar o ambiente domiciliar um local de medo e abuso, no qual indivíduos vulneráveis ficam em contato com o agressor por mais tempo. (RITA, et. al, 2020).

O fato de essa situação ser agravada em famílias de baixa renda que vivem em áreas superlotadas e com poucos cômodos amplia ainda mais as interações entre os membros durante a pandemia (MARQUES ES et al., 2020).

Além disso, é importante ressaltar que essa vida familiar estressante também envolve o excesso de trabalho dos pais que, em um ambiente mundial turbulento, precisam conciliar as tarefas domésticas e o próprio trabalho com o cuidado geral dos filhos. Essa nova rotina familiar gerou vários conflitos. (RITA, et. al., 2020). Dessa forma, acredita-se que as próprias crianças e adolescentes apresentem alguns comportamentos agressivos e desobedientes que se correlacionam com o nível de estresse que vivenciam (MARQUES ES, et al., 2020). Esta situação exige adaptação da dinâmica familiar através de ambientes atípicos que limitam a mobilidade, interações sociais e mudanças nas atividades diárias que devem ser interrompidas, que levam não só os pais, mas também as crianças a ficarem mais irritadas (Aliança para a Proteção da Criança) Crianças em Ação Humanitária, ano 2020).

Isso é acentuado pela falta de supervisão ou contato com ambientes externos, como educadores, colegas, médicos e outros profissionais de saúde que garantem a oportunidade de identificar sinais que indicam a necessidade de intervenção (GREEN P, 2020). Com isso, o acesso aos sistemas públicos e institucionais de apoio é reduzido, como escolas, creches, igrejas, o que dificulta a busca por ajuda e proteção.

A situação não é totalmente nova, pois registros anteriores semelhantes mostraram aumento das taxas de violência com o distanciamento social. Da mesma forma, de acordo com a UNICEF (2020), durante o surto de Ebola na África Ocidental, as taxas de abuso e exploração de crianças e adolescentes aumentaram, e foram registrados trabalho infantil, negligência e gravidez na adolescência, coincidindo com o período de fechamento das escolas. A tabela a seguir lista os principais motivos e riscos que essas pessoas sofreram durante a pandemia de Covid-19, o que não favorece as ações de proteção para crianças e adolescentes também observadas em surtos anteriores de doenças infecciosas (Tabela 1).

TABELA 1 – RISCOS PARA A PROTEÇÃO DA CRIANÇA

Em 2019, a Linha Direta de Direitos Humanos (disque 100), ferramenta telefônica disponibilizada pelo governo brasileiro para receber, analisar e encaminhar denúncias de violações de direitos humanos, incluindo casos de violência, divulgou 159.063 denúncias de abuso – um aumento de 15% em relação a 2018. Dessas denúncias, 86.837 (55%) de violência contra crianças e jovens, e Distribuição: 38% relacionados à negligência, 23% relacionados à violência psicológica, 21% relacionados à violência física, 11% relacionados à violência sexual, 3% relacionados à exploração infantil/trabalho e 3% relacionados a outras lesões violentas. O local mais comum é a casa da vítima. (Platt; Goodt; Coelho; 2021)

No início da pandemia, nota-se um aumento no número de casos em relação a 2019 e 2020, veja: Serviço de 100 ligações do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, que registrou 95.247 casos contra crianças só em 2020 9% aumento de 86.800 reclamações em 2019 antes da pandemia (SOUZA, 2021)

Comparando denúncias verificadas pelo disque 100, 180 e pelo aplicativo Direitos Humanos Brasil entre janeiro e junho de 2020 e 2021, respectivamente, segundo a equipe de dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), junto ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, tem-se os seguintes dados:

FIGURA 4 – COMPARATIVO DE DENÚNCIAS ENTRE JAN/JUN 2020 E JAN/JUN DE 2021

Fonte: Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos. Dados coletados até 11 de nov. de 2021.

Os dados mostram um aumento nos protocolos de denúncias em 2021 e uma diminuição nas denúncias em 2021.

Para o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (2021), entende-se por Protocolo de Denúncia o número de registros que o usuário pediu à ONDH para registrar uma reclamação. É importante ressaltar que um protocolo pode conter uma ou mais reclamações. Ainda de acordo com o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (2021), as denúncias referem-se ao número de denúncias de violações de direitos humanos envolvendo vítimas e suspeitos. As reclamações podem conter uma ou mais violações de direitos humanos. Agora analisando o período de julho de 2020 a novembro de 2021, temos o seguinte:

FIGURA 5 – COMPARATIVO DE DENÚNCIAS ENTRE JUL/NOV 2020 E JUL/NOV DE 2021

Fonte: Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos. Dados coletados até 11 de nov. de 2021.

Atualmente, os dados mostram um aumento nos protocolos de denúncia e denúncia em 2021. Ao fazer a comparação, tendo em conta o número total de denúncias, notou-se que foram registadas 88.405 reclamações entre janeiro e novembro de 2020. Em outro momento, entre janeiro de 2021 e novembro de 2021, foram registradas 87.663 reclamações. Platt observa um declínio no número de reclamações; Gerdt; Coelho (2021) argumentam que a queda pode ser justificado por uma série de fatores. Os dados em si não significam que a violência diminuiu.

A necessidade de reestruturação e adaptação dos serviços de saúde à realidade pandêmica, com direcionamento de servidores e de unidades de saúde para o atendimento exclusivo de casos de síndromes respiratórias agudas e sobrecarga das equipes de trabalhadores em saúde pelo aumento da demanda de atendimentos, pode ter dificultado o acesso dos usuários aos serviços habitualmente disponíveis para a população. Soma-se a isso a interrupção dos serviços de transporte coletivo, que impôs dificuldades de deslocamento e acesso aos serviços de saúde. O medo de contaminação, o isolamento social imposto, as limitações para afastamento do lar, somados às dificuldades financeiras decorrentes da pandemia, podem ter constituído entraves para a denúncia de violência e procura de assistência e a consequente diminuição de notificações (PLATT; GUEDERT; COELHO, 2021, p. 4).

Os autores articulam no sentido de que as mudanças necessárias para atender as exigências da pandemia podem afetar diretamente outras demandas na sociedade, como relatos de violência intrafamiliar. Portanto, um pequeno decréscimo nos abusos contra crianças e adolescentes não significa que elas estejam de fato diminuindo. A subnotificação é uma realidade nas delicadas circunstâncias que o país ainda enfrenta. (BARROS, et. al, 2021.)

As razões para a subnotificação podem estar relacionadas ao distanciamento social, fechamento de escolas e dificuldade que os menores tem em relatar casos que ocorrem em casa. Não há dúvida de que as escolas são importantes aliadas na condenação da hostilidade na sociedade infantil, a falta de sala de aula presencial é um fator importante que afeta jovens dificultando na realização da denúncia. (BARROS, et. al, 2021.)

3.1 Consequências

O atual quadro completo da pandemia causada pelo novo coronavírus chamou a atenção global, pois desencadeia ou exacerba a desregulação social, emocional e psicológica em populações propensas sentimentos de insegurança, impotência, ansiedade, depressão e até tentativa de suicídio. As normas e regras de distanciamento social adotadas para minimizar a propagação do vírus trouxeram mudanças decisivas no cotidiano da população mundial. (MARCOLINO, et. al., 2021)

No entanto, apesar dos benefícios do controle da doença, o distanciamento social aumentou a possibilidade de mulheres, crianças, adolescentes e idosos serem acometidos pela violência doméstica, pois as vítimas passam mais tempo no ambiente doméstico e, portanto, têm mais tempo para se relacionar com os perpetradores de situações violentas, além disso, as redes de apoio que conseguem falar com seus familiares reduziram significativamente, expandindo assim exposição ao ciclo de violência. (MARCOLINO, et. al., 2021).

Situações internacionais e nacionais mostram a magnitude da violência doméstica durante a pandemia. Um aumento significativo de casos violentos foi encontrado em países com restrições sociais, como China, Espanha, Itália e Brasil, registraram os incidentes de violência doméstica mais proeminentes. Segundo dados do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, o Brasil teve aumento estimado de 50% nas denúncias em comparação com período anterior a pandemia. Além disso, características sociodemográficas das vítimas de violência doméstica correlacionam-se com as características de vulnerabilidade, dependência econômica das vítimas e pela perda do contato com membros de sua rede de apoio social por meio do distanciamento. (MARCOLINO, et. al., 2021).

O confinamento também traz diferentes mudanças no trabalho e no descanso com membros da família, causando estresse e, se não forem tratados adequadamente, podem ter impacto em toda a dinâmica familiar. Essas consequências podem afetar a saúde física e mental de crianças e adolescentes, especialmente crianças pequenas, que não possuem as ferramentas necessárias para se adaptar ou superar o estresse, o que pode torná-lo particularmente prejudicial. (PLATT, et. al, 2020). Quando se trata de violência intrafamiliar, crianças e adolescentes podem ser vítimas diretas, quando a agressão é direcionada especificamente contra eles, e vítimas indiretas, quando presenciam violência a terceiros. Em ambos os casos, observam-se danos à sua saúde física e mental, que podem ocorrer a curto e longo prazo (ALMEIDA et al., 2013).

Entre as consequências emocionais de curto prazo, podem ser citados pesadelos repetidos, raiva, culpa, vergonha, medo, isolamento social, fobia, ansiedade e depressão aguda. Esses indivíduos também são mais suscetíveis ao desenvolvimento a longo prazo de transtornos psiquiátricos e psicossomáticos (ALMEIDA et al, 2013; REIS et al, 2018).

Sobre as complicações geradas, no tocante a agressão física pode citar como principais danos, lesões e hematomas, que constantemente passam despercebidos por se tratar de contusões leves. (RITA, et al., 2020). A exposição prolongada à violência pode levar à cegueira, retardo mental, comprometimento neurológico e hepático (BARROS A e FREITAS M, 2015) e até homicídio, embora com menor frequência. Segundo a UNICEF (2020), aproximadamente 191.000 crianças e adolescentes entre 10 e 19 anos foram vítimas de homicídio no Brasil de 1997 a 2017.

A importância de diagnosticar, prevenir e compreender as consequências da violência psicológica é que ela prejudica severamente o desenvolvimento psicossocial de uma criança ou adolescente. Afeta o desenvolvimento da autoestima, do autoconceito, da competência social e da capacidade das crianças e adolescentes de formar relacionamentos. (PINTO, 2014).

O abuso psicológico infantil é uma das formas mais sutis de violência que crianças e adolescentes vivenciam. As vítimas dessa forma de violência muitas vezes apresentam problemas de comportamento, distúrbios emocionais, respostas inadequadas, e as sequelas desse abuso podem ter efeitos na vida adulta, mesmo após a cessação da violência em questão. (PINTO,2014).

No campo da psiquiatria, um estudo mostra que as consequências da violência em crianças vão além de sequelas físicas imediatas ou distúrbios emocionais e comportamentais. Um estudo comparativo do Programa de Pesquisa em Psiquiatria Biológica do Belmont McLean Hospital da Harvard Medical School (TEICHER, 2002) identificou Alterações morfológicas e fisiológicas na estrutura cerebral em pessoas que sofrem violência no início da vida. (SILVA, 2008).

Há sérias preocupações de que a pandemia do COVID-19 tenha consequências imprevistas para a segurança e o bem-estar das crianças. Muitos grupos de saúde pública apontaram para uma desaceleração da economia dos EUA, especialmente a perda de empregos dos pais, aumentando o risco de abuso infantil (Substance Abuse & Mental Health Services Administration, 2020; The Alliance for Child Protection in Humanitarian Action, 2020; WHO Global, 2020).

Consistente com as suposições do estudo e observações anteriores de aumento das taxas de abuso infantil durante recessões (Brooks-Gunn et al., 2013; Schenck- Fontaine et al., 2017), a investigação atual identificou que desemprego dos pais durante a pandemia de COVID-19 foi um preditor de maus-tratos psicológicos e abuso físico contra jovens. (LAWSON, et al., 2020).

A realidade vivenciada, os estímulos, as dificuldades enfrentadas, a falta de afeto familiar, enfim, a possibilidade de não formar uma relação de apego na infância influenciará diretamente da capacidade de interação social, da compreensão, respeito e percepção das obrigações e direitos. Outros elementos essenciais de uma relação social equilibrada e digna para todos. (NALI, et. al, 2021.)

4. A IMPORTÂNCIA DO ECA NO CUIDADO E PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

A Lei da Criança e do Adolescente corresponde a um conjunto de normas jurídicas que regem as relações sociais entre crianças, adolescentes e adultos em diferentes contextos sociais, nomeadamente entidades familiares, sociedade civil e instituições formadoras do Estado. A legalização dessas relações implica em duas consequências: (i) o reconhecimento dos direitos da criança e do adolescente; e (ii) a atribuição de responsabilidades correspondentes aos adultos, sejam eles familiares, representantes de órgãos estatais ou a condição social de membros da sociedade civil. (ZAPATER, 2020).

Assim, confirma-se que o Estatuto é um instrumento multidisciplinar que articula de forma sistemática o direito civil, penal e administrativo em uma única norma jurídica, e no marco da estruturação do conjunto de direitos subjetivos que as crianças têm pessoas está condicionada ao cumprimento dos deveres atribuídos ao Estado, à sociedade e à família. (ZAPATER, 2020).

Regulamentos preliminares do ECA, dispostos nos artigos 1º a 6º estabelecem as regras gerais para a estruturação do sistema de direitos da criança e do adolescente, decorrentes do seu reconhecimento como sujeitos de direito. O reconhecimento legal da criança e do adolescente como seres humanos significa que eles são reconhecidos como sujeitos de direito e todas as consequências que daí advêm: ser titulares de direitos, responsáveis por seus atos e aptos a participar dos processos políticos inerentes à vida social. (ZAPATER, 2020).

Crianças e adolescentes estão em desenvolvimento físico e emocional e, nesse sentido, precisam de proteções específicas e bem elaboradas, medidas efetivas para garantir a tutela de seus direitos, evitar qualquer forma de abuso e promover o desenvolvimento saudável das famílias e demais grupos sociais. O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) é um marco na consolidação dos direitos da Criança e do Adolescente em nosso país, o qual seus procedimentos foram iniciados pela Constituição Federal. (NALI, et. al., 2021).

O artigo 3º do ECA trata explicitamente as crianças e adolescentes como titulares de direitos iguais a todos, observando sua situação particular durante o desenvolvimento:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.

Além de articular a condição humana e os direitos fundamentais dela derivados, o ECA também garante prioridade absoluta às crianças e adolescentes, decorrente do princípio da prioridade absoluta consagrado no artigo 4º do ECA:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

É notório o reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos legalmente protegidos. A importância do ECA decorre justamente disso: reiterar a segurança de crianças e adolescentes que vivem em tempos de intenso desenvolvimento psicológico, físico, moral e social. (NALI, et. al, 2021). A Constituição Federal de 1988 atribuiu responsabilidades a sociedade, Estado e família, o artigo 227 da Constituição afirma:

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A intenção do Estatuto da Criança e Adolescente, em sua origem, é de conferir em sua prática medidas de caráter pedagógico, psicológico bem como protetivo em sua denominação. (CF, 1988)

Desde que a lei foi promulgada, a violência intrafamiliar que atinge crianças e adolescentes no Brasil foi retirada de contextos ocultos e silenciosos. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990), ampara denúncias e desenvolve princípios para lidar com a violência doméstica e para atendimento psicossocial domiciliar. De fato, a violência intrafamiliar é vista como uma questão pública, não apenas do ponto de vista dos órgãos judiciários, mas também, a enfermagem e a saúde também ajudam a retirá-la da esfera privada exclusiva e colocá-la em questões públicas, possibilitando a análise do contexto histórico desse complexo fenômeno social. (MOREIRA, et. al, 2012).

No mesmo sentido, o art. O artigo 5º enfatiza que é responsabilidade de cada indivíduo prevenir ameaças ou violações dos direitos da criança ou do jovem, e declara que qualquer ato ou omissão que viole os direitos fundamentais da criança e do jovem de qualquer forma, é passível de punição.

A legislação brasileira reconhece a família como o meio básico no qual ocorre o processo de socialização de crianças e adolescentes. O ECA afirma o importante papel da família na proteção e defesa dos direitos das crianças e adolescentes. Um dos direitos elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) é o direito à convivência familiar. O Estado deve garantir condições necessárias para que a família desempenhe suas funções. A política pública de proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente apresenta em seus princípios é a centralidade da família. (MOREIRA, et. al, 2012.)

Crianças e adolescentes são sujeitos de direitos humanos universais (COSTA, et.al, 2014). O direito à liberdade, respeito e dignidade, estão amparados no artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil e no artigo 15 do ECA, que enfatiza:

A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. (BRASIL, 1990).

Esses direitos são inalienáveis e podem estar sujeitos a penalidades se de alguma forma não forem observados. O Estado, família e sociedade (incluindo as escolas) têm a responsabilidade de respeitar e garantir a efetivação desses direitos. Dessa forma, todo jovem ser amparado pela lei, e não estará sujeito a castigos e violências, sejam físicas ou emocionais, em qualquer ambiente em que se encontrem (COSTA, et. al, 2014). O artigo 16 do Estatuto, discorre sobre o direito à liberdade:

Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II – opinião e expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;
V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI – participar da vida política, na forma da lei;
VII – buscar refúgio, auxílio e orientação.

No que se refere ao direito à educação, o ECA, de acordo com o artigo 205 da Constituição  Federal, “a  educação,  direito  de  todos  e  dever  do  Estado  e  da  família,  será promovida e incentivada com colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DA REPÚBLICA, art. 205). Os artigos 53° e 54º rediz acerca esse direito, bem como, sobre a responsabilidade da União, dos Estados e municípios, dos pais ou responsáveis:

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito a educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II Direito de ser respeitado por seus educadores; Direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores;
III. Direito de organização e participação em entidades estudantis; IV. Acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. (BRASIL, p. 39).

Essas garantias possibilitam que crianças e adolescentes se desenvolvam em um processo educativo integrado, possibilitando a compreensão dos menores como titulares de direitos na sociedade. Além disso, de acordo com o Estatuto, os diretores devem contatar o Conselho Tutelar imediatamente em caso de maus-tratos, faltas não justificadas (30% da carga horária anual), desistências e altas taxas de repetência quando os recursos escolares se esgotarem. (COSTA, et. al, 2014).

O artigo 18 estabelece a obrigação geral de assegurar que todas as crianças e adolescentes sejam tratados com dignidade. Em 2014, a Lei nº 13.010/2014 introduziu os arts. 18-A e 18-B, originalmente, a lei seria conhecida como a “Lei da palmada” e depois a “Lei do Menino Bernardo” em homenagem ao menino Bernardo Bodrini, que foi assassinado aos 11 anos. Esta Emenda do ECA aborda a violência doméstica contra crianças e adolescentes e as obrigações e limitações da intervenção estatal na vida privada e familiar, analisando como as controvérsias sobre o tema são produzidas na legislação. A redação do art. 18-A e 18-B originados do Projeto n. 2.654/2003, de autoria da então deputada Maria do Rosário, que discute a legalidade do castigo corporal por pais ou responsáveis por crianças e adolescentes sob sua responsabilidade.

4.1 Medidas de Proteção

As medidas de proteção específicas podem ser descritas como intervenções das autoridades competentes, nomeadamente, os Conselhos Tutelares e os órgãos de Justiça da Infância e Juventude, que são exigidas quando os direitos da criança e do jovem são ameaçados ou efetivamente comprometidos. Existem duas hipóteses possíveis: (i) para crianças e adolescentes em situação de risco (ameaçados ou diretamente maltratados); (ii) Para crianças que cometeram ato infracional (Artigo 105 do ECA). (ZAPATER, 2020).

As medidas de proteção não correspondem a sanções ou punições de qualquer tipo (inclusive quando crianças infringem a lei), e suas recomendações são intervenções para acabar com violações de direitos ou remover riscos para jovens ou sua exposição. Como tal, podem ser aplicados de forma individual ou cumulativa, podendo ser substituídos a qualquer momento, tendo sempre em conta as necessidades pedagógicas e a necessidade de reforço dos laços familiares e comunitários (artigos 99.º e 100.º do ECA). (ZAPATER, 2020).

As medidas relacionadas aos pais ou responsáveis são intervenções das autoridades quando representam risco ou violam os direitos da criança e do adolescente. Estão vinculados aos artigos 129 e 130 do ECA. (ZAPATER, 2020).

O artigo 129 elenca suas características: encaminhamento para programas de tratamento social e de saúde e questões envolvendo problemas com entorpecentes; encaminhamento para aulas ou programas instrucionais; obrigação de matricular na escola, crianças ou adolescentes sob sua responsabilidade; obrigação de encaminhar jovens para tratamento especializado; advertência; perda de guarda; destituição de guarda; suspensão ou revogação dos poderes familiares. As disposições contidas no art. 130 do ECA, sobre a possibilidade de manutenção provisória da pensão alimentícia por meio de medidas preventivas em caso de abuso, opressão ou abuso sexual por parte de um dos pais ou responsável:

Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual im-postos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum. Parágrafo único. Da medida cautelar constará, ainda, a fixação provisória dos alimentos de que necessitem a criança ou o adolescente dependentes do agressor.

O texto deste artigo é importante, pois reforça a ideia de que retirar uma criança ou adolescente de sua casa e/ou de sua família é sempre a exceção, sendo preferível que o agressor, se afaste. No que diz respeito à autoridade competente de seu decreto, os juízes da Infância e Juventude têm competência exclusiva para determinar a perda da tutela; exonerar a tutela; suspender ou anular os poderes familiares (ou seja, tomar medidas para afastar uma criança ou jovem da família vida); removido da residência, conforme descrito acima nos termos do art. 130 do ECA. O Conselho Tutelar é responsável por todas as demais providências relativas aos pais ou responsáveis. (ZAPATER, 2020).

Os crimes contra crianças e adolescentes estão propostos nos artigos 228 a 244 do ECA, sem prejuízo das disposições pertinentes do Código Penal e do Código de Processo Penal, os quais são crimes de ação pública incondicional. Trata-se de crime regidos pelas normas pertinentes do Código de Processo Penal. (ZAPATER, 2020).

Em conjunto, esses delitos podem ser caracterizados como violações de direitos previstos na parte geral do ECA, seja por ação ou omissão, como a privação ilícita de liberdade do menor, ou a incapacidade da autoridade competente para ordenar liberação imediata após a descoberta da violação. As infrações na prestação de serviços a crianças e jovens também são tipificadas como crimes, como no caso dos arts. 228 e 229 do ECA. (ZAPATER, 2020).

Como já visto, no §4º do art. 227 da Constituição afirma que ―a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual de crianças e adolescentes‖. Tanto o Código Penal quanto o ECA regulamentam crimes sexuais contra crianças e adolescentes. Os tipos de crimes que definem os crimes contra a liberdade sexual seguem a seguinte estrutura geral: Descrição corresponde ao ato sexual praticado pela vítima (o que a lei diz de “realização de atos libidinosos”, ou seja, atos visando a gratificação sexual), que é legalmente conhecido como o vício da vontade. São considerados vícios da vontade (ou seja, condições que privam a vítima do livre arbítrio): Violência física/ameaças; fraude; e vulnerabilidade pessoal. (ZAPATER, 2020).

O crime de estupro previsto no art. 213 do Código Penal, que se refere a atos sexuais em que a vontade da vítima é comprometida (ou seja, legalmente nula) por violência física ou ameaça grave. Já o art. 217-A do CP dispõe sobre o crime de estupro de vulnerável, e sua formulação substitui a antiga figura da presunção de violência, até 2009, os crimes sexuais contra crianças e jovens menores de 14 anos eram incluídos nesta categoria. fornece o seguinte:

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência
§ 2º (vetado)
§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4º Se da conduta resulta morte:
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Isso significa que fazer sexo com menor de 14 anos constitui crime de estupro de vulnerável nos termos do art. Art. 217-A do Código Penal, é importante notar que é só configura crime caso ocorra a conduta criminosa, inobstante, se o autor apresentar transtorno de pedofilia. (ZAPATER, 2020).

Nas disposições gerais, da Lei 13.431/2017 no art. 4 há quatro formas de violência, que delimitam casos para sua aplicação de forma a retratar um conceito mais amplo que o crime, pois nem todos os atos de violência são legalmente caracterizados como crime, e nem todos os crimes (neste caso, atos definidos como tal por lei) são praticados por meio de violência:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipificação das condutas criminosas, são formas de violência:
I – violência física;
II – violência psicológica;

III – violência sexual;
IV – violência institucional.

Assim no inciso I, violência física é entendida como a ação infligida à criança ou ao adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe cause sofrimento físico.

Já o inciso II, descreve violência psicológica como qualquer comportamento discriminatório, humilhante ou desrespeitoso em relação a uma criança ou jovem por meio de ameaças, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, ataques verbais e xingamentos, ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática (bullying) que possa prejudicar seu desenvolvimento psicológico ou emocional. Alienação parental, entendida como intervenção na formação psicológica de criança ou adolescente, promovida ou induzida por um dos pais, avós, ou qualquer pessoa sob sua autoridade, tutela ou tutela, resultando na recusa em aceitar o dano causado a um dos genitores pela conexão. E também como, qualquer conduta que exponha um menor, direta ou indiretamente, a crimes violentos contra membros de sua família ou redes de apoio, independentemente do contexto em que seja realizado, especialmente quando isso os torne testemunhas.

O inciso III traz as definições sobre violência sexual, qualquer conduta que seja entendida para restringir uma criança ou jovem de se envolver ou testemunhar relações sexuais ou qualquer outro ato indecente, incluindo exposição física, com ou sem meios eletrônicos, em fotos ou vídeos, incluindo: a) Abuso sexual, entendido como qualquer ato de utilização de criança ou jovem para fins sexuais, seja relação sexual ou outro ato indecente, presencial ou eletronicamente, com o objetivo de estimular sexualmente agente ou terceiro; b) Exploração sexual comercial, entendida como a utilização de criança ou adolescente para atividade sexual em troca de pagamento ou qualquer outra forma de compensação, de forma independente ou com patrocínio, apoio ou incentivo de terceiro, presencial ou eletronicamente; c) Tráfico de pessoas, mediante ameaça, uso da força ou qualquer outra forma de coação, tráfico de pessoas, entendido como o recrutamento, transporte, transferência, colocação ou acolhimento de crianças ou adolescentes no país ou no exterior, sequestro , fraude, engano, abuso de autoridade, exploração de vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento.

E o inciso IV discorre que, a violência institucional é entendida como a praticada por instituição pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização.

Lista de direitos e garantias listados no art. 5 reproduz o que já está contido em outros dispositivos da Lei da Criança e do Adolescente, como direito à prioridade absoluta (inciso I), direito de ser livre de qualquer forma de discriminação (inciso IV), mas também outros direitos com intuito de minimizar o sofrimento causado por vivenciar ou testemunhar violência e sujeitar-se a procedimentos burocráticos de investigação e julgamento, como assistência jurídica e psicossocial qualificada (item VII), segurança em caso de ameaças ou intimidações (inciso X) e assistido por profissionais capacitados (inciso XI), etc. (ZAPATER, 2020).

O capítulo IV da lei prevê a articulação dos diversos setores da assistência social, saúde, segurança pública e justiça para a implementação de uma política pública totalmente voltada para o tratamento multidisciplinar de crianças e adolescentes expostos direta ou indiretamente à violência. (ZAPATER, 2020).

Com o objetivo de ampliar a proteção dos interesses da criança e do adolescente, bem como aos direitos individuais e coletivos, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê medidas judiciais e extrajudiciais de competência das Varas da Infância e Juventude, conforme art. 148 e incisos do ECA. (ZAPATER, 2020).

5. CONCLUSÃO

As crianças e os adolescentes ocupam atualmente uma importante posição como destinatários de direitos, formando e desenvolvendo indivíduos que não podem buscar sua proteção sem o apoio da lei, da justiça, da saúde, da educação, da família e de programas sociais. O Brasil tem uma legislação avançada que foca nos menores, pois eles precisam de prioridade absoluta e seus melhores interesses são atendidos, no entanto, a realidade mostra que apesar de dispositivos que focam na proteção, casos de abuso e desrespeito ainda são uma ocorrência cotidiana na sociedade em que fazem parte.

O ECA é o instrumento jurídico mais importante cujo texto reconhece as crianças e os jovens como indivíduos únicos que não podem ser tratados com base em interesses diferentes, mas devem ser apoiados, protegidos, motivados, dadas diferentes oportunidades e desenvolvidos para um futuro melhor, incluindo eles mesmos e sociedade como um todo.

A violência nas relações intrafamiliares muitas vezes revela a continuação de ciclos de violência, em que os adultos replicam a violência que vivenciaram quando crianças, enquanto as crianças são socializadas para usar a violência como estratégia de enfrentamento de conflitos e dificuldades no futuro. A violência doméstica precisa de todos: Estados, sociedade civil, instituições Educação, saúde e ajuda atuam em dois níveis. A primeira é a prevenção por meio da garantia de acesso a itens materiais e simbólicos que permitem às famílias compartilhar e desenvolver suas experiências na educação de seus filhos.

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1Discente do curso de Direito do Centro Universitário de Goiatuba (UNICERRADO).
2Graduada em Direito pela Universidade Luterana do Brasil (ULBRA). Mestre em Direito pelo Centro Universitário do Distrito Federal (UDF). Docente do curso de Direito do Centro Universitário de Goiatuba (UNICERRADO).