CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS FIXOS EM DESCALVADO-SP: TRAJETÓRIAS DE VIDA, TRABALHO E COOPERAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.6607044


Autores:
Fabiana Hesketh de Oliveira Nunes1
Orientadora:
Alessandra Santos Nascimento2


RESUMO

O modelo de desenvolvimento econômico vigente no Brasil tem propiciado um aumento da desigualdade social. Por outro lado, o padrão de consumo industrial tem feito com que a sociedade produza um excessivo volume de resíduos inservíveis, que poluem o meio ambiente, e um montante de resíduos que tem sido usado como matéria-prima do trabalho dos catadores de recicláveis. Diante do contexto de agravamento dos índices de desenvolvimento econômico e social desta população, a pesquisa se propôs a analisar as condições de vida e as experiências de trabalho dos catadores de materiais recicláveis fixos do município de Descalvado-SP, entre os anos de 2002 e 2020. Para tanto, buscamos realizar uma pesquisa descritiva e qualitativa, capaz de reconstruir e interpretar parte das trajetórias de vida, de trabalho e de organização dos catadores, a partir de diálogos com as dimensões sugeridas na literatura especializada sobre o tema no Brasil (a saber, a exclusão social, o trabalho informal e a atuação do catador como agente ambiental). Como resultado desta investigação encontramos questões inerentes aos catadores de materiais recicláveis fixos em Descalvado-SP, identificando o que foi mais proeminente nesta realidade em comparação às dimensões pesquisadas por outros autores sobre essa temática. As trajetórias aqui reconstruídas não se resumiram apenas a dados ou a números sobre a reciclagem, mas refletiram parte das experiências, forças, fragilidades e desafios de mulheres e homens trabalhadores vulneráveis na busca pela sobrevivência, estes que possuem visibilidade apenas nas localidades que habitam, onde encontram apoio e colaboração da comunidade.

Palavras-chave: Exclusão social; Trabalho informal; Catador; Agente ambiental.

1. INTRODUÇÃO

O processo de desenvolvimento econômico capitalista, desde a Revolução Industrial, tem por base a geração de riqueza a partir do progresso tecnológico e da produção intensiva de bens de consumo. Essa lógica tem levado ao descarte cada vez maior de resíduos inservíveis ao meio ambiente, sejam eles provenientes do ambiente de trabalho (industrial ou não) ou das próprias residências. Semelhante lógica também tem sido responsável pelo aumento do acúmulo de capital e das desigualdades sociais, seja em países desenvolvidos, seja em países subdesenvolvidos, a exemplo do Brasil.

Segundo dados divulgados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 2019), o Brasil se encontra na 84ª posição no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), ainda apresentando uma distribuição de renda bastante desigual, 1/3 de todas as riquezas se concentra nas mãos de 1% da polução, tal quadro é acompanhado por políticas educacionais e de saúde subfinanciadas. Em outras palavras, tais informações demonstram que no território nacional tem persistido um padrão desigual, em que há enriquecimento de um lado e, de outro, aumento do contingente de excluídos sociais.

É nesse contexto de desigualdades sociais, e de excedentes de resíduos sólidos, principalmente nos grandes centros urbanos, que surgem os catadores de materiais recicláveis como pertencentes a uma parcela da população mais vulnerável, isto é, desprovida de meios de subsistência minimamente dignos, estando geralmente caracterizados como abaixo da linha de pobreza e com nível de escolaridade insuficiente. Tal caracterização encontra respaldo na reflexão de Yazbek (2018), segundo a qual vulneráveis são os indivíduos ou grupos que se diferenciam por suas condições precárias de vida (condições sociais, de classe, culturais, étnicas, políticas, econômicas, educacionais e de saúde).

Neste cenário de vulnerabilidade, à margem da sociedade do trabalho e do consumo, inicia-se a atividade de catação com a finalidade única de coletar para o uso próprio os materiais encontrados nos lixões (resíduos alimentícios e de vestuário). Com o tempo, de acordo com Bosi (2016), essa atividade foi tomando corpo e fluxo, e se tornando, além de um meio de sobrevivência, uma fonte de renda mínima aos catadores, uma vez que os resíduos sólidos urbanos passaram a lhes servir como matéria-prima de trabalho, sendo o aproveitamento do lixo imprescindível para sua comercialização.

Por pertencerem a um grupo, muitas vezes invisível ao poder público nas diferentes instâncias, os catadores foram, em seus primórdios, foco da ação de várias organizações sociais, de universidades, da filantropia religiosa e dos princípios da economia solidária. Na década de 1980, tais organizações passaram a dar lugar a diversas associações e cooperativas pelo país (BOSI, 2016). A partir da cooperação mútua, e de uma maior organização dessa categoria, os movimentos dos catadores entram em cena em busca de melhores condições de trabalho, de maior consciência sobre seus direitos e de reconhecimento de sua atividade como profissão.

O primeiro passo relevante no processo de institucionalização da atividade dos catadores de recicláveis ocorreu em 2002, com o reconhecimento oficial da profissão de catador pela legislação brasileira, compondo a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) sob o número 5192-05, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (BRASIL, 2013). Ainda de acordo com a descrição da CBO, os catadores podem ser divididos em três atividades: 1) a de catar o material; 2) a de selecionar, e a 3) de operar a prensa desses materiais recicláveis. Tais trabalhadores também são responsáveis por: “[…] catarem, selecionarem, prepararem e venderem materiais recicláveis como papel, papelão, vidro, bem como materiais ferrosos e não ferrosos e outros materiais reaproveitáveis” (BRASIL, 2013). Para ingressar neste tipo de trabalho não há exigência de escolaridade e tampouco de formação profissional. Aqueles que trabalharem em associações ou cooperativas ainda são responsáveis por realizar a manutenção do ambiente e dos equipamentos, administrar os recursos e garantir a segurança de todos no processo de reciclagem (BRASIL, 2013).

Outra conquista relevante para a categoria foi a aprovação, em 2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que incluiu como um de seus principais instrumentos o incentivo ao desenvolvimento das cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de recicláveis em seu artigo 8° da Lei 12.305/10. Como também o artigo 18 que trata da elaboração dos planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos, dando ênfase à prioridade de acesso aos recursos da União àqueles que implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas, ou outras formas de associação de catadores de materiais recicláveis composta por pessoas de baixa renda (BRASIL, 2010). Essas cooperativas, desde que devidamente organizadas, poderiam passar a receber o apoio da administração pública, incluindo galpões de triagem, equipamentos de proteção individual (uniformes, botas, bonés, luvas e máscaras) e outros equipamentos (máquina de prensa, esteira, caminhão etc.), com a finalidade de dar melhor tratamento ao material coletado, valorizando o produto para ser vendido (BRASIL, 2010).

Na literatura especializada encontramos estudos a respeito da vida e da atuação dos catadores de materiais recicláveis no Brasil. Cerca de 90% dos materiais coletados que chegam às indústrias de reciclagem advêm do trabalho dos catadores, que possuem habilidades para identificar, coletar e separar o material desprezado pela sociedade (SILVA; JOIA, 2008). O Anuário da Reciclagem, que compilou dados do período entre 2017 e 2018 e foi lançado em São Paulo, consiste em um documento elaborado pela Associação Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (ANCAT). De acordo com tal documento, a reciclagem, a partir do trabalho dos catadores, gerou para o Brasil cerca de 70 milhões de reais, com 465.814 toneladas de materiais recuperados, nesse período.

Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), baseado no Censo 2010, existiam no Brasil cerca de 388 mil pessoas exercendo atividade de catação de material reciclável e reutilizável como fonte principal de renda. Até o início de 2020, de acordo com o Movimento Nacional de Catadores de Recicláveis (MNCR), o país passou a contar com aproximadamente 800 mil pessoas realizando essa atividade, com possibilidade de ter aumentado para um milhão com a pandemia de COVID-19.

A literatura pesquisada nos permite partir de dois pressupostos: primeiro, o de que os catadores possuem um papel importante na cadeia da reciclagem e, consequentemente, no seu efeito benéfico ao meio ambiente. E segundo, o de que, apesar dessa contribuição ambiental, aqueles que trabalham informalmente ainda continuam na base da cadeia de produção, tendo ganhos inferiores em comparação ao volume e relevância do trabalho executado, uma vez que os catadores contratados e com registro em carteira profissional correspondem a 2% dessa população e ganham em média R$ 1.320,60 (salário mínimo no período de R$ 1.039,00) no mercado de trabalho brasileiro para uma jornada laboral de 44 horas semanais, de acordo com pesquisa junto a dados oficiais do Novo CAGED, eSocial e Empregador Web, no período de maio de 2020 a abril de 2021 (SALÁRIO, 2021).

Esse cenário pandêmico, com o aumento do número de pessoas exercendo a catação por falta de oportunidade de emprego, sugere a relevância de se desenvolver novos estudos sobre o tema. Decorreu desta necessidade, a proposta de realizar esta pesquisa descritiva e qualitativa que visa contribuir para lançar luz sobre a realidade dos catadores de materiais recicláveis do município de Descalvado-SP. Como recorte temporal, tem-se o período de 2002, ano de criação e encerramento da primeira cooperativa estabelecida no referido município (Cooper-rede), até o ano de 2020 – por ser um momento atípico em virtude da pandemia de COVID-19, que impactou a conjuntura política, social e econômica, trazendo novos elementos para pensar a questão da vulnerabilidade social, inclusive, acentuando os riscos à profissão de catador. Os principais sujeitos da pesquisa são os catadores fixos que vivem da coleta de resíduos sólidos urbanos e/ou domiciliares de forma autônoma. Devido à inexistência de dados anteriores mais elaborados a respeito do perfil desses catadores, tomamos como referência a listagem – que conta com 73 pessoas – fornecida pela municipalidade. Houve a tentativa de contactar as 73 pessoas, porém, participaram efetivamente da pesquisa 37.

Foi levantado como hipótese da pesquisa que os catadores fixos de recicláveis do município de Descalvado-SP estariam à margem da sociedade, enfrentando desigualdades sociais relevantes em virtude de suas condições de trabalho, inclusive, da ausência de conhecimento sobre o funcionamento e os possíveis benefícios da atuação profissional por intermédio da ação baseada na organização cooperativista. Tal conjectura foi comprovada durante a aplicação dos questionários junto aos catadores e informações dos demais atores sociais.

Frente às mudanças na legislação, na conjuntura nacional e local, em razão também da pandemia, e a continuidade e sobrevivência da atividade dos catadores de recicláveis numa sociedade que nega emprego, o estudo pretende contribuir com reflexões sobre a inclusão social desses profissionais, a partir da caracterização de sua experiência de trabalho como catador, para que os próprios catadores e demais atores envolvidos possam tomar conhecimento das fragilidades e forças nesta área e, ao mesmo tempo, tirá-los da invisibilidade, sejam nas relações com o poder público municipal (inclusive, fazendo jus ao recurso de tentar inserir o trabalho com a reciclagem na agenda pública), seja nas relações com as empresas ligadas ao setor e com a sociedade de modo geral. Essa invisibilidade social é aqui entendida como sendo o fenômeno pelo qual uma parcela da população desperta o preconceito e a indiferença do poder público e da sociedade quanto a sua situação.

Este trabalho é resultado da pesquisa de dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Territorial e Meio Ambiente da Universidade de Araraquara-SP (UNIARA), e foi organizado e estruturado da seguinte forma: inicialmente é feita a apresentação do tema; a importância da pesquisa, delimitação dos objetivos geral e específicos e da metodologia utilizada. Dando sequência, discutimos a trajetória de vida e experiências de trabalho dos catadores, dividindo em duas subseções os dados obtidos a partir dos questionários aplicados. Por último, exibimos os resultados da pesquisa com suas respectivas análises à luz da literatura especializada e tecemos as considerações finais.

Como um dos resultados foram observadas algumas semelhanças entre os catadores de materiais recicláveis fixos em Descalvado-SP e os de outras localidades, ao se considerar as seguintes características das categorias pesquisadas na literatura: baixa escolarização; prevalência de pessoas com idade acima de trinta anos; existência de problemas de saúde e insalubridade na execução da atividade de catação. Tais condições reforçam as desigualdades sociais e a precariedade do trabalho desses profissionais neste e em outros estudos.

2. OBJETIVOS

2.1 Objetivo Geral

Analisar as condições de vida e as experiências de trabalho dos catadores de materiais recicláveis fixos, sob as dimensões sociais, econômicas e ambientais no município de Descalvado-SP.

2.2 Objetivos Específicos

◉ Caracterizar o perfil socioeconômico dos catadores: renda, moradia, saúde, doenças, composição familiar, história de vida, presença ou ausência de benefícios assistenciais e quais tipos, dentre outros.

◉ Caracterizar as condições de trabalho, estrutura física e operacional (utilização de luvas, carrinho, bags, carga horária de trabalho diária etc.) e as condições de depósito e comercialização dos recicláveis, destacando a origem dos materiais reciclados (residências, comércio e empresas em geral) e o destinodos mesmos (vendas diretas ou indiretas, onde armazenam, como vendem).

3. METODOLOGIA

Ao entender que a metodologia de pesquisa é indispensável para a qualidade e confiabilidade do trabalho de investigação, faz-se necessário classificá-la quanto à sua natureza, que foi exploratória e descritiva, sua maneira de abordar o problema que foi qualitativa, e os procedimentos técnicos utilizados: instrumentos de coleta de dados estruturado e semiestruturado (aplicação de questionários com perguntas semiabertas no caso dos catadores e demais atores sociais) e a pesquisa documental (legislações, atas, processos envolvendo a temática da reciclagem no município escolhido).

Houve também o levantamento bibliográfico nas bases de dados Google Acadêmico; na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da CAPES e SciELO durante o primeiro e segundo semestre de 2020, e o primeiro semestre de 2021, o que reforçou a escolha para desenvolver a presente investigação com uma abordagem qualitativa com objetivos exploratórios e descritivos, tendo como palavras-chave: exclusão social, trabalho informal, catador e agente ambiental.

Concomitante ao levantamento bibliográfico da literatura especializada no tema dos catadores de recicláveis, para citarmos alguns exemplos desta: Bosi (2016), Bortoli (2009) e Miúra (2004), fizemos uma investigação em sites oficiais do poder público municipal (Prefeitura, Câmara Municipal e Jornal Oficial do Município de Descalvado-SP) e de outras instâncias para a caracterização do público pesquisado, identificando algumas leis sancionadas voltadas aos catadores e à reciclagem; trabalhamos com outras fontes: atas e/ou outros documentos relativos às cooperativas; registros das empresas de reciclagem no site CNPJ Biz e nos sites oficiais das próprias empresas.

Os autores considerados os principais interlocutores da presente pesquisa foram escolhidos a partir da identificação da recorrência de seus trabalhos para o tratamento de diferentes questões que envolvem a temática dos catadores no país. Além disso, verificou-se que houve uma maior incidência de publicações de artigos e trabalhos científicos sobre o tema dos catadores num determinado período que antecedeu e sucedeu a PNRS, em 2010. Nos estudos de caso de diferentes localidades, observou-se a prevalência de investigações que analisaram as seguintes abordagens: 1) os catadores cooperados e suas relações com as cooperativas específicas; 2) o papel do movimento social dos catadores; 3) os catadores avulsos/autônomos e a coleta em lixões ou aterros. A pesquisa sobre Descalvado-SP dialoga com tais abordagens, mas dedica-se a caracterizar as especificidades das condições de vida, trabalho e cooperação dos catadores. A reflexão de Yin (2016, p.19), sobre as características e vantagens da investigação qualitativa, nos propicia sinalizar como nossa abordagem soma-se e ao mesmo tempo, difere-se das já existentes.

Considerando como recorte temporal o período compreendido entre os anos de 2002 e 2020, e o recorte espacial o município de Descalvado-SP, foi realizada sua caracterização prévia e inicial exibida na Figura 1. Trata-se de um município localizado na região centro-leste do Estado de São Paulo, e, segundo a PNAD (2021), conta com aproximadamente 34.097 habitantes. Na sua economia destacam-se a cana-de-açúcar e a produção e comercialização de produtos para animais de pequeno e médio porte.

A amostra de catadores de materiais recicláveis fixos se deu a partir de dois dados: o primeiro, da Secretaria Municipal da Assistência e Desenvolvimento Social, que forneceu o quantitativo de 16 catadores, com sete destes como beneficiários do antigo Programa Bolsa Família; e, o segundo, da Secretaria Municipal de Saúde, como dito em item anterior, fornecendo lista mais completa e que incorpora a primeira, com nomes e endereços, no total de 73 catadores fixos. Cabe destacar que esta lista foi elaborada por meio da coleta de autodeclaração dos catadores aos postos de saúde do município, Unidades de Saúde da Família (USF’s), dos seus respectivos bairros de referência.

Ainda segundo a Figura 1, acima exemplificados, os 73 catadores fixos estão distribuídos, em sua maioria, nos bairros periféricos da cidade:  21 no bairro Jardim Albertina; 11 no Parque Morada do Sol; 11 no Bosque do Tamanduá; 09 na Vila Brasil; 08 no Centro; 07 no São Sebastião; e 06 no Santa Cruz.

Desse universo, foram sujeitos da pesquisa 37, equivalente a 50% do total, todos catadores fixos autônomos e sem vínculo empregatício atual no setor da reciclagem, sendo 27 mulheres e 10 homens. Ainda que o objetivo fosse entrevistar a totalidade dos catadores fixos do município, ocorreram alguns entraves, foram eles: a) algumas pessoas não foram localizadas nos endereços informados (mudaram ou nunca residiram naqueles imóveis); b) houve casos em que agendamos e visitamos a residência mais de uma vez, mas ainda assim não encontramos os catadores, isso devido à grande carga horária de trabalho imposta pela concorrência com outros catadores no período da pandemia; c) tiveram também os que se recusaram a participar da pesquisa com qualquer informação; e, por fim, d) os que não trabalhavam mais com a coleta de recicláveis.

Mesmo com as dificuldades apresentadas no parágrafo anterior, conseguimos entrevistar um número significativo de catadores, num percentual proporcional à quantidade de catadores por bairro, ou seja, todos os bairros foram contemplados pela amostra. Isto possibilitou averiguar que a realidade dos catadores no município é, de certa forma, homogênea em todos os bairros.

Após levantamento documental a respeito das tentativas cooperativistas no município, foi possível identificar a existência de duas cooperativas fundadas, respetivamente, em 2002 e 2007 (Cooper-rede e Cooperambiente), e sua situação atual de desativação. Ainda nesse levantamento, foi identificado no município a existência de quatro empresas de reciclagem e uma de sucata as quais incorporam parte dos resíduos sólidos nessa cadeia de produção (Recicla Tom, D.F. Reciclagem ou Reciclagens Franzin, Sierro Dias Reciclagem, M.M. Reciclagens e Sucatas Chiaratti ou JP Sucatas). Destas empresas/sucata, apenas três mantêm relações comerciais com os catadores pesquisados.

Os questionários não geraram ônus aos pesquisados e para sua aplicação e utilização tiveram o aceite dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido e de Consentimento de Uso de Imagem (que foram adaptados a partir das normativas do Comitê de Ética da Plataforma Brasil). No processo de preenchimento dos questionários, foram respeitados os protocolos sanitários impostos pelo contexto atual de pandemia, isto é, foi mantido distanciamento social e utilizados máscara e álcool gel. A aplicação dos questionários com os 37 catadores foi realizada por meio de entrevistas presenciais individualmente nas residências destes.

Para elaboração e aplicação dos questionários com os catadores, criamos um questionário pré-teste que foi aplicado com dois catadores e depois adaptado para o questionário definitivo. Em geral, os questionários dos catadores foram elaborados de forma objetiva para facilitar a compreensão dos pesquisados, por estes terem em sua maioria baixa escolaridade e dificuldade de interpretação das perguntas. Tais instrumentos foram organizados visando contemplar diferentes categorias, ou seja, cada conjunto de questões buscou satisfazer uma categoria central. Primeiro, foram formuladas questões que buscaram abordar a origem dos catadores, sua renda, moradia e composição familiar. Segundo, foram propostas questões referentes à luta pela sobrevivência, condições de saúde e inclusão social. E, terceiro, foram desenvolvidas perguntas relativas as condições de trabalho, estratégias de organização e visibilidade, além das principais dificuldades enfrentadas enquanto catador.

Durante a aplicação dos questionários com os catadores, não foi possível restringir nossa pesquisa ao preenchimento dos questionamentos nele contidos, pois verificou-se a necessidade de ouvir as narrativas dos catadores, suas histórias e desabafos. Vários deles nunca tinham tido a oportunidade de contar sobre sua atuação profissional. A previsão de tempo para aplicação de cada questionário era inicialmente de uma hora, mas na prática, diante desse contexto, alguns encontros duraram horas.

As perguntas buscaram conhecer e caracterizar os sujeitos, como também, suas experiências vivenciadas de forma cooperada e não-cooperada, visando lançar luz sobre as seguintes indagações: O que ocorreu para que ele(a) se tornasse um(a) catador(a)? Como tem sido seu cotidiano de trabalho? Outras pessoas de sua família já trabalharam com materiais recicláveis? Como é sua relação com outros catadores, inclusive, com os não cadastrados? E com os moradores? E com o setor público? E com os compradores dos recicláveis? Qual a razão de continuar exercendo essa profissão? A profissão como catador(a) tem garantido condições dignas de trabalho e de vida para sua família?

Após a conclusão dessas etapas, analisamos os dados obtidos (documentos e questionários aplicados). Transcrevemos e organizamos as respostas abertas e semiabertas para sua posterior análise. Também organizamos os dados fechados em forma de tabelas e colocamos em evidência alguns aspectos que, no decorrer da apresentação dos resultados da dissertação, serão correlacionados às dimensões trabalhadas pela literatura especializada (exclusão social, trabalho informal e catadores como agentes ambientais), além de verificar nossas hipóteses iniciais no que se refere aos catadores e suas experiências.

4. TRAJETÓRIA DE VIDA E EXPERIÊNCIAS DE TRABALHO DOS CATADORES

Neste item identificamos as condições e trajetórias de vida e as experiências de trabalho de 37 catadores individuais fixos sujeitos da pesquisa (27 mulheres e 10 homens), trazendo uma perspectiva de análise para estudar e compreender a realidade destes no município de Descalvado-SP. Há uma observância no recorte temporal que incorpora o momento da pandemia nesse contexto, busca-se enfatizar como era antes e depois (ainda que ela não tenha terminado) da crise sanitária decorrente da COVID-19.

No decorrer desta pesquisa, nos deparamos com pessoas simples e, na maioria das vezes, muito receptivas ao nosso contato, principalmente ao serem esclarecidas sobre o objetivo de nossa investigação. Observamos em seus relatos de vida e experiência que a invisibilidade ainda é um problema enfrentado por esses trabalhadores, por isso a realização de uma escuta interessada enriqueceu a presente pesquisa. Compartilhamos da ideia segundo a qual:

[…] toda experiência social produz conhecimento e pressupõe uma epistemologia, definida como um modo de conceber as coisas e os pressupostos sobre o que consiste em conhecimento válido. Não há, pois, conhecimento sem práticas e sem atores sociais engajados em produzi-las. Interessam-nos os saberes produzidos por esses grupos de pessoas consideradas “inferiores” na lógica hegemônica de hierarquização do conhecimento e do reconhecimento social. (VERONESE, 2016, p. 214).

Na forma de delinear e de conduzir esta investigação, convergimos com a visão de Thompson (1998), de acordo com a qual o estudo das experiências é considerado uma forma de percepção com clareza de determinadas nuances, onde o princípio ontológico se baseia no processo histórico, isto é, na história real e concreta em sua dinamicidade e fluidez. É a partir da agilidade histórica que as ações sociais acontecem, formando as lutas de classes. Para este autor, o ser humano é dinâmico e é essa dinamicidade que constrói as experiências e as lutas coletivas, perpassando a existência humana e se organizando em função das constituições religiosas, das ações e do exercício profissional.

Desse modo, o trabalho por fazer parte das estruturas sociais é também um construtor de experiências (vividas e percebidas), que colaboram para que os indivíduos adquiram consciência do seu papel social e da luta de classes, reagindo como sujeitos que vivenciam as situações de acordo com sua cultura e interesses (Thompson, 1998). Assim, à medida que colhíamos as informações necessárias ao aplicarmos os questionários, íamos aprendendo e construindo conhecimento, dando voz aos catadores e, ao mesmo tempo, mantendo a subjetividade reflexiva da pesquisadora, isto é, uma postura metodológica crítica e necessária em relação aos sujeitos do estudo.

De acordo com a tipificação a partir do estudo de Sicular (1991), vista em capítulo anterior, os catadores analisados no município de Descalvado-SP pertencem a categoria dos trabalhadores que exercem a catação somente na zona urbana da cidade, de porta-a-porta, de maneira individual; alguns anos atrás chegaram a fazer uso de parte do material coletado, pela fartura de objetos descartados e em ótimo estado (fogões, panelas de pressão, ventiladores, forno micro-ondas, demais utensílios domésticos, roupas, jogo de sofás, conjunto de mesa e cadeiras de jantar etc.), restringido atualmente a coleta apenas para venda.

4.1 Trajetória e condições de vida

No item trajetória e condições de vida analisamos os aspectos sociais e econômicos que caracterizam os catadores de materiais recicláveis pesquisados, assim como sua origem e as questões referentes ao gênero e suas condições de saúde.

Ao relacionarmos as informações sobre origem e gênero dos catadores foi possível verificar que cerca de 50% dos homens são provenientes do meio urbano e 50% do meio rural; enquanto no caso das mulheres, a maioria delas é proveniente do meio rural, como especificado na Tabela 1.

TABELA 1 – ORIGEM DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS) POR GÊNERO

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Os(as) catadores(as) com histórias provenientes do meio rural têm duas características comuns: os ascendentes também serem do campo e, os primeiros, terem iniciado em tenra idade sua vida laboral na roça. Quando jovens, com pouca ou nenhuma escolaridade, se viram desempregados(as), e sem a propriedade da terra, tiveram que ingressar na atividade de coleta de resíduos sólidos para sobreviver na cidade de Descalvado-SP, com suas famílias.

De modo semelhante ao que encontramos na literatura especializada sobre catadores (MEDEIROS; MACEDO, 2006; BOSI, 2008; SEVERO, 2008), é possível afirmar que os catadores fixos descalvadenses são em sua maioria originários do campo (26), com experiência de trabalho rural, com pouca ou nenhuma qualificação profissional, baixa escolaridade e, consequentemente, inabilitados, segundo a visão de mercado, para o exercício de outras atividades mais elaboradas no contexto das cidades.

Há predominância daqueles que não foram alfabetizados ou que não concluíram o ensino fundamental por terem de substituir a escola pelo trabalho braçal, ainda pequenos, para ajudar na composição da renda familiar. Exemplo dessa situação tem-se o caso do catador, C1, este iniciou o trabalho na roça aos 6 anos de idade para ajudar a família; e, mais tarde, com a separação dos pais, veio para a cidade (centro urbano) em companhia da mãe separada e dos irmãos, passando a catar os materiais nas ruas junto com a genitora e não podendo mais estudar.

Os relatos das catadoras evidenciaram que a falta de estudo por elas vivenciada deu-se, até certo ponto, por uma questão cultural, envolvendo os valores de seus pais. Segundo a catadora, C2, os pais achavam que meninas não precisavam de estudo, apenas de um bom casamento, por isso ela foi mantida por pouco tempo na escola.

O analfabetismo trouxe como uma de suas implicações para esta pesquisa a dificuldade de interpretação e compreensão de parte do questionário por alguns dos investigados, diante disso, foi realizada a leitura e também perguntado, pela pesquisadora, de diferentes formas a mesma informação para que os pesquisados pudessem entender e, assim, pudessem se sentir esclarecidos e confortáveis ao responder. Vários deles tinham dificuldades até mesmo para explicar a maneira como vendiam os materiais coletados e o valor recebido. Diferentemente, os catadores com alguma escolarização se mostraram mais conhecedores do seu ofício e capazes de descrevê-lo com riqueza de detalhes.

Na Tabela 2, referente ao nível de escolaridade dos catadores, se destacam como maiores taxas a de catadores com ensino fundamental incompleto 52% e a de analfabetismo representando 33% dos pesquisados. Com 85% dos pesquisados sendo pessoas analfabetas ou com ensino fundamental incompleto, confirma-se o baixo perfil educacional dos catadores encontrado na literatura especializada.

Refletindo sobre este perfil, Magera (2003) destaca que a pouca escolaridade, além de dificultar o ingresso do catador em outra atividade mais bem remunerada, também cria barreiras para que ele compreenda os aspectos logísticos que envolvem o circuito da reciclagem, algo que obstaculiza a obtenção de melhores ganhos com a atividade de catação.

TABELA 2 – NÍVEL DE ESCOLARIDADE DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Em geral, a maioria dos catadores se classifica como de etnia parda 48%, com ascendência variando entre brasileiros natos e, em número decrescente, de italianos, portugueses e espanhóis. Um pequeno percentual do total (1,8%) é originário de outros estados da região Nordeste do país; 0,1% do Paraná e os demais são paulistanos. Em vista desses dados, verifica-se que há uma falsa percepção de que são migrantes.

Em relação as características de gênero e etnia dos pesquisados, as Tabelas 1 e 3 apresentam um padrão semelhante ao encontrado em várias regiões do país, com um número expressivo de pessoas negras e pardas e maior contingente feminino. 

TABELA 3 – CARACTERIZAÇÃO ÉTNICO-RACIAL DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

No que se refere ao estado civil dos catadores (Tabela 4), há poucos homens solteiros na amostra e estes possuem idade acima de 50 anos, sendo uma característica deste grupo o fato de apresentarem questões associadas a problemas de saúde mental. No caso das mulheres solteiras, estas são mais jovens que os homens, apresentando idades abaixo de 41 anos. Entre os catadores(as) prevalece a união estável e o casamento. E no aspecto religioso tais atores sociais são bem ecléticos: umbandistas, espíritas, católicos e evangélicos. Esses aspectos sobre o estado civil e o perfil religioso não são abordados nos estudos sobre os catadores, mas na presente investigação consideramos que tais questões também compõem a caracterização identitária dos pesquisados.

TABELA 4 – ESTADO CIVIL DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Quanto ao número de descendentes por catador(a), predomina entre ambos os sexos de 01 a 06 filhos (Tabela 5). Sobre estes últimos, na sua maioria, são adultos e já constituíram novos arranjos familiares. Uma parte dos filhos, que se encontra na faixa etária de 18 a 25 anos e ainda reside com seus pais catadores, são adultos que não têm renda suficiente para manter uma moradia ou que, por desenlace conjugal, continuam necessitando do suporte familiar. A residência dos pais torna-se um porto seguro em meio às incertezas da vida cotidiana numa sociedade cada vez mais excludente e sem emprego para todos.

TABELA 5 – NÚMERO DA PROLE DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Desse modo, é possível perceber que os catadores e suas famílias integram o grupo dos excluídos, ou seja, um grupo com direito de acesso restrito às instituições sociais como educação, comunidade, trabalho, lazer etc. (SOUZA; SILVA; BARBOZA, 2014).

Em geral, as moradias dos catadores são de alvenaria e telhado cerâmico, e apresentam de três a cinco cômodos. São construções antigas e com poucas reformas, contendo: jardim, quintal, sala de estar, copa/cozinha, banheiro e dois quartos. Muitas delas são herdadas, outras cedidas por ainda se encontrarem em processo de inventário entre diversos herdeiros. E, em menor número, as residências são adquiridas a partir de programas de habitação de interesse social e/ou alugadas. Uma característica geral é que elas necessitam de manutenção.

Ainda sobre o tema da moradia (Tabela 6), os catadores fixos descalvadenses estão dentro da categoria dos profissionais que residem nas periferias das cidades e não nos lixões ou nas ruas (SICULAR, 1991). Eles estão, neste caso, em melhores condições habitacionais em comparação àqueles que vivem nos grandes centros urbanos, a exemplo dos catadores das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, que residem em estruturas improvisadas e em situação de risco iminente.

TABELA 6 – TIPO DE MORADIA DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Quando se trata da faixa etária (Tabela 7), percebemos que os catadores homens são mais velhos, tendo entre 59 e 75 anos de idade; enquanto as mulheres variam de 37 a 75 anos. Isto pode indicar uma baixa renovação do número de homens nessa atividade e, de outro modo, uma maior inserção e renovação das mulheres na profissão. Desse modo, em Descalvado-SP, as catadoras continuam ocupando o mercado de trabalho informal, em virtude da falta de oportunidade de emprego, e têm contado com o ingresso de mulheres mais jovens, que não são, necessariamente, descendentes de catadores.

O trabalho de Severo (2008) contribui para pensar sobre a questão etária envolvendo os catadores. De acordo com este estudo, há dois tipos de catadores: os que são mais velhos e que, depois de perderem emprego, não conseguem mais ingressar no mercado de trabalho formal pela baixa escolaridade, pela idade avançada e pelo acometimento de doenças; e os jovens, que nunca experimentaram o trabalho formal, por pertencerem a uma geração alijada em termos sociais e econômicos que lhes possibilitassem concorrer equitativamente por posições mais vantajosas de trabalho.

Interessante perceber que nos estudos realizados, não identificamos na literatura a prevalência de pessoas acima dos 55 anos para ambos os gêneros de catadores fixos ativos, demonstrando que no município pesquisado há um quantitativo significativo de homens e mulheres idosos ainda exercendo a profissão de catador. 

TABELA 7 – FAIXA ETÁRIA DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Com relação aos programas governamentais de que fizeram uso: dez catadores(as) receberam apenas o Auxílio Emergencial em 2020; entre 2002 a 2020, três receberam somente o Bolsa Família (PBF); três receberam antes o Bolsa Família e depois o Auxílio Emergencial; dez passaram a receber o Benefício de Prestação Continuada (BPC); onze não foram beneficiários de qualquer programa por contarem com aposentadoria (10 pessoas) e uma pessoa por ter pensão por viuvez; no caso desses benefícios é importante destacar que eles não ultrapassam o valor de um salário mínimo mensal.

Uma característica que merece destaque no perfil desses entrevistados é que, por não possuírem renda suficiente e não terem vínculo empregatício, eles não contribuíram com o sistema previdenciário, assim, se utilizam do BPC como se fosse sua aposentadoria devida por anos de trabalho dedicado à catação. Desse modo, são raros os casos de catadores que conseguiram se aposentar por meio de cooperativas rurais, a partir de ação judicial e pagamento de taxa de adesão para comprovar seu vínculo.

Na literatura, esta característica se confirma, pois de acordo com Miúra (2004), o maior entrave enfrentado pelos catadores consiste em conseguir assegurar seu bem-estar recorrendo apenas com o fruto do seu trabalho. O que significa que, mesmo com muito esforço, inclusive físico, a renda advinda exclusivamente do trabalho como catador continua sendo insuficiente para garantir sua subsistência e de sua família e, ao mesmo tempo, para lhe proporcionar uma segurança ao final de sua jornada laboral.

A renda do catador fixo descalvadense varia em média entre R$ 300,00 (trezentos reais) a R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) ao mês, proveniente apenas da venda de recicláveis e dependendo da quantidade de produtos coletados para isso. Os(as) catadores(as), em virtude da representatividade das mulheres nesta profissão, são na maioria dos casos as principais fontes mantenedoras da família. Os aposentados, por outra atividade profissional, têm, por sua vez, geralmente seu salário mínimo comprometido com empréstimos bancários de longa duração, tendo na catação um complemento da renda.

A média nacional de renda dos catadores fixos não cooperados é inferior a um salário mínimo mensal, variando entre R$ 400,00 (quatrocentos reais) e R$ 600,00 (seiscentos reais). Já os catadores cooperados ou contratados por empresas ganham em torno de R$ 1.320,00 (mil e trezentos e vinte reais) ao mês (SALÁRIO, 2021). Ainda que este último valor esteja abaixo do necessário para suprir os gastos da família como habitação, educação, saúde, alimentação, transporte etc., ele sinaliza a importância do exercício da atividade de catação como a presença de uma organização como a cooperativa.

Cerca de 90% dos pesquisados declararam já ter passado dificuldades para se manter e manter a família, algumas vezes recorrendo à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, em busca de ajuda com cesta básica ou outro tipo de auxílio. Isto ocorreu em períodos anteriores e também, com maior frequência, na vigência da pandemia de COVID-19. Este cenário lança luz sobre a “invisibilidade” da vulnerabilidade social de parte da população de Descalvado-SP. Os catadores deste município passaram a fazer parte de um grupo da população em estado de insegurança alimentar. Segundo pesquisa do IPEA (2020), quanto à revisão do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), nesse mesmo ano, houve uma alta no repasse dos preços de 4,6% para 5,3%, e esta aceleração está ligada ao aumento significativo dos preços dos alimentos.

Prejuízo maior com a pandemia foi a queda no faturamento no mercado reciclador, segundo relato dos próprios catadores e gestores privados. Segundo a OCDE (2020), ao avaliar o impacto da COVID-19 nos trabalhadores informais, identificou como fatores prejudiciais desse tipo de economia, que afetaram as receitas: as proibições de trabalhar no espaço público, a redução da demanda, o aumento dos custos dos insumos, a incapacidade de acessar os mercados e um aumento nas responsabilidades com os filhos (OECD, 2020).

Dos itens da cesta básica mais usados por todos os catadores pesquisados estão: feijão, arroz, macarrão, óleo, café, leite e fubá. Mas também foram incluídos, com menor frequência, os legumes, verduras e frutas em geral. Com relação a mistura/guarnição (carnes), a maioria relatou que consumia com regularidade antes da pandemia de COVID-19; a partir de 2020 é recorrente sua substituição pela proteína encontrada nos ovos, salsichas, pés de galinha e de porco e, eventualmente, na carne moída (“Quando dá!”). Já o gás de cozinha passou a ser nesse último ano, 2021, um item de luxo. Também foram relatadas situações de furto do botijão de gás assim que comprado; de término do gás antes do previsto, sinalizando uma suspeita de que a quantidade do gás parece ser inferior a esperada e de ter deixado de comprar gás por quarenta dias por falta de dinheiro. Além do relato de casos em que a lenha passou a ser utilizada em definitivo pelos(as) catadores(as) para cozinhar os alimentos, algo análogo ao que ocorria na década de 1970 com a população carente, quando o uso de lenha era comum no cotidiano.

Assim, o poder de consumo dos catadores foi sendo reduzido consideravelmente nos últimos anos. De acordo com as falas dos catadores mais experientes, antigamente, havia maior fartura em relação aos materiais coletados. Eles achavam muitos produtos em ótimo estado de conservação durante o trabalho de coleta, passando a utilizá-los para benefício próprio ou para a venda com um bom retorno. A partir de 2016, o que aparece na fala deles como: depois do governo da Dilma, tem sido maior a escassez dos produtos básicos para comercialização devido à grande disputa entre seus pares.

Para Bortoli (2008), a atividade do catador sempre esteve entre coletar para uso próprio e para a comercialização em decorrência da fragilidade social em que está inserido. É a partir dessas duas destinações (uso próprio e venda) dos resíduos coletados pelos catadores que foi possível estruturar suas casas e adquirir bens, que de outra forma não lhes seriam acessíveis.

No que se refere às questões de saúde, o total de catadores(as) declarou nunca ter sofrido acidentes durante o trabalho de catação ou ter adoecido a partir dessa atividade. Ao aplicarmos o questionário pré-teste, identificamos que os catadores não conseguiam perceber que parte dos problemas de saúde adquiridos era consequência do trabalho insalubre que realizavam. Por essa razão, adaptamos os questionários para identificar e esclarecer tal temática. Com a adequação foi possível observar que 40% dos(as) catadores(as) sentiam (e sentem) dores frequentemente (dores nas costas, pernas e braços).

O fato de não associarem as comorbidades adquiridas à execução do trabalho como catador é retratada por alguns autores como sendo recorrente, pois, de acordo com a literatura especializada, estes atores sociais têm dificuldades para relacionar causa-efeito. Contudo, os sinais de sobrecarga de trabalho podem ser identificados por sintomas físicos e mentais como: dor na musculatura, cansaço, dores frequentes pelo corpo e na cabeça, erupções na pele, indigestão, insônia, perda de memória ou dificuldade de concentração, dentre outras (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013). Ainda, para esses autores, o catador só reconhece como acidente de trabalho situações mais graves, que possam interferir diretamente em seu trabalho e alterar de imediato suas condições de vida drasticamente, importando também o tempo de cura.

Dentre os problemas de saúde declarados pelos pesquisados estão: hipertensão, diabetes, rinite, enfisema pulmonar, alcoolismo, bursite, epilepsia, próstata, catarata, hepatite, reumatismo, tontura, osteoporose, taxa de colesterol elevada, depressão e hipertireoidismo. Todos com acompanhamento médico pelos postos de saúde locais e também por unidades hospitalares específicas em outras cidades conveniadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, os que necessitam de cirurgias eletivas e exames pré-operatórios, como a cirurgia de correção da catarata, aguardam agendamentos por meses, diminuindo a cada dia sua qualidade de visão e, consequentemente, de vida; e aumentando os riscos durante o labor. Todos os pesquisados tiveram cobertura vacinal completa para COVID-19.

Mesmo com o início da pandemia, em 2020, alguns catadores continuaram trabalhando para seu sustento diário, outros com mais idade e comorbidades, ficaram reclusos em suas residências até meados do ano sem saber como seriam as previsões futuras. Outros ainda conseguiram, por conta da idade e problemas de saúde crônicos, obter o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e se afastar de vez do trabalho de catação.

A esmagadora maioria dos(as) catadores(as) já passou por intemperes climáticas (chuva, vento e sol) durante a execução do trabalho nas ruas. Tais trabalhadores(as) também não costumam se alimentar durante a jornada laboral, mas se hidratam com água durante sua realização.

Como já vimos, a profissão de catador é considerada, com base na Norma Reguladora n.º 15 do MTE que elenca diversos fatores de risco, como sendo um trabalho insalubre exatamente por estarem submetidos: ao calor excessivo, chuva, contato com produtos químicos, ruídos, risco de acidente ou de atropelamento, contato com insetos, dentre outros.

Alguns acidentes, como pequenos cortes e arranhões, são provocados por terem que lidar com vidros e materiais perigosos descartados inadequadamente nas lixeiras comuns domiciliares, exemplo: seringas e vidros de medicamentos (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013).

3.2 Experiências de trabalho

A atividade de trabalho dos 37 catadores fixos em Descalvado-SP se resume a executar: a cata, a seleção e a separação dos materiais por tipo de produto, a limpeza e o ensacamento nos bags. Depois desse processo minucioso e trabalhoso, o produto é levado até o comprador ou os catadores solicitam que o comprador busque o material. Eles utilizam com frequência os equipamentos adquiridos com recursos próprios: carrinhos, luvas de couro, boné, botina e máscara.

TABELA 8 – LOCAL DE COLETA DOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Com relação às experiências de trabalho (Tabela 8), os(as) catadores(as) do município realizam sua atividade de forma peculiar, pois além de catarem nas ruas (95%), e alguns poucos também no comércio, cerca de 27%, contam com residências fixas que separam especificamente o material para cada catador(a). Esses pontos fixos de coleta funcionam como fornecedores pré-estabelecidos que, por consideração, garantem para os(as) catadores(as) um mínimo de renda ao mês. Esses fornecedores são fundamentais, principalmente diante dos desafios atuais enfrentados por esses profissionais com o aumento da concorrência pelos catadores eventuais, estes que têm contribuído para a diminuição dos materiais disponíveis para a coleta nas ruas, de porta-a-porta, e no comércio.

Não encontramos na literatura especializada situação semelhante, pois as experiências dos catadores são em geral analisadas em pesquisas que envolvem o trabalho em cooperativas específicas, em áreas de aterros/lixão ou diretamente nas ruas. No caso da coleta nas ruas, a destinação ao catador, quando ocorre, é feita pelos lojistas e comerciantes, mas sem mencionar domicílios que o façam dessa forma. Isso parece ser uma especificidade da atividade dos catadores de Descalvado-SP

Convergimos com a afirmação de Miúra (2004), segundo a qual o trabalho do catador consiste em uma forma alternativa de inclusão social, pois mesmo não alterando suas condições de vida ou relações de trabalho desigual, o insere na sociedade e lhe fornece utilidade social aos olhos de parte do poder público e da população. Logo, a colaboração dos moradores locais com a atividade do catador é uma demonstração de reconhecimento de sua utilidade socioambiental e de pertencimento à comunidade da qual faz parte.

Um aspecto importante que mudou, de 2002 a 2020, foi justamente o supracitado aumento da concorrência entre os catadores fixos (pesquisados) e os catadores eventuais, em decorrência do aumento do desemprego e do subemprego, além do crescimento da inflação, fazendo com que muitas pessoas recorressem a atividade de catação para sustentar a família ou para complementar a renda. Exemplo disso são os garis da prefeitura que também passaram a recolher materiais recicláveis para venda, uma vez que o salário mínimo que recebem se mostra cada dia mais insuficiente para manter satisfatoriamente suas despesas.

Para Bosi (2008), o fato de a profissão de catador não exigir qualificação ou pré-requisitos para ser executada, facilita a entrada de pessoas em situação de desemprego ou baixa renda no mercado da coleta seletiva, colaborando para aumentar a concorrência entre catadores e, ao mesmo tempo, impulsionar o processo de reciclagem no país.

Um caso diferente que identificamos na pesquisa foi de um catador que, a partir da empresa privada em que trabalha, adquire gratuitamente e vende materiais recicláveis (chapa e cabo de alumínio e cobre) a cada 45 dias, tendo ganhos de R$ 1.500,00 reais acrescidos em sua renda. Este catador também nos relatou que realiza a cata nas ruas de forma eventual, pois sua composição familiar é extensa, com esposa e quatro filhos pequenos, sendo ele o único provedor.

Segundo o catador, C4, a concorrência não era tão grande como nos últimos dois anos. Para ele, há cerca de 80 catadores pela cidade, o que exige de cada catador maior agilidade na coleta, para garantir os melhores materiais a serem comercializados. Ainda segundo seu relato, passou a ser necessário percorrer um caminho maior na busca pelos recicláveis.

A disputa por materiais recicláveis se tornou acirrada e algumas vezes violenta[1], de acordo com a fala dos(as) catadores(as). Para eles, levam vantagem os profissionais que iniciam seu labor ainda durante a madrugam, entre 4 e 5 horas da manhã, e àqueles que possuem veículos motorizados. O que ocorre é que quem passa primeiro cata os melhores materiais, por isso a importância de manterem entre a população os fornecedores fixos residenciais mencionados acima.

Nesse jogo de concorrência, as mulheres catadoras ficam novamente em desvantagem, haja vista que nenhuma utiliza veículo motorizado e, quando não têm companheiros e possuem filhos pequenos, acabam restringindo seu horário de trabalho aos horários da creche e escola. Tem-se como exemplo a catadora, C5, que nos relatou que deixa de trabalhar quando a filha pequena não tem aula. Isso ocorreu também no período de fechamento dos estabelecimentos de ensino municipais para prevenção da pandemia, em 2020.

Além disso, várias dessas mulheres têm outra desvantagem que é o fato de possuírem menor força física para empurrar os carrinhos de ferro. Em algumas ocasiões, elas são obrigadas a disputar os materiais “no braço”, como foi o caso vivenciado pela catadora C 6, ela teve o material reciclável arrancado de suas mãos por outro catador no meio da rua. Infelizmente, tal relato encontra respaldo na literatura sobre catadores. Desse modo, nos estudos de Silva (2014) e Alves (2018), a vulnerabilidade social da mulher é multifacetada, pois se dá em diferentes dimensões: nas relações de trabalho, domiciliares, amorosas e sociais; e estão enraizadas nas questões culturais de nossa sociedade, reproduzindo constantemente e naturalizando as desigualdades entre os gêneros, principalmente no que se refere ao trabalho.

Um aspecto que chamou nossa atenção durante o diálogo com alguns catadores foi o nível de cuidado com a separação e limpeza dos materiais, associado à confiabilidade e compromisso demonstrado pelo(a) catador(a) à empresa compradora, vir a agregar valor ao material reciclável. Isto se evidencia quando o(a) catador(a) mais cuidadoso(a) com a limpeza recebe o bag mais novo e de melhor qualidade, assim como, quando este perfil de catador vende o seu material por um preço relativamente mais alto. Diferentemente é o tratamento dado aos(as) menos esclarecidos(as) e cuidadosos(as), que acabam trabalhando com bags rasgados e sujos e, na venda, ganham por seus materiais coletados valor inferior.

Na relação comercial com as empresas de reciclagem ou de sucata do município, além de receber os bags, parte dos catadores desenvolve laços de confiança/dependência. Somente para os catadores cuidadosos é colocado à disposição vales de retirada (possibilitando que a entrega dos materiais pelo profissional seja feita aos poucos e o pagamento acumule até ser retirado de uma só vez na empresa compradora) e antecipação de valores ou empréstimo (pagamento feito pela empresa antes da entrega do material coletado pelo catador).

Para Antunes (1995), essas relações de poder, de dependência e de precarização do trabalho vão ao encontro do modo de produção capitalista, onde o trabalho é fruto de relações de poder entre o catador, sem poder de argumento, e as empresas compradoras, estas que têm ganhos maiores que os catadores por terem os meios de armazenar, prensar e revender os materiais às indústrias da reciclagem.

Os(as) catadores(as) catam e vendem: papel branco e misto, sucata e ferragem, lata de comida/temperos, lata de refrigerantes/cervejas, plástico mole e duro, garrafa pet, vidro, papelão, caixa de leite longa vida, alumínio e aço. Os preços variam de produto para produto e também dependem de como o(a) catador(a) trata o material (se de forma cuidadosa, ou se de modo descuidado). O material é orçado por quilo coletado e pesado nos bags. Estes bags utilizados geralmente comportam 80 kg de material reciclável.

TABELA 9 – VALORES DAS VENDAS POR TIPO MATERIAL E PESO (KG) INFORMADOS PELOS(AS) CATADORES(AS) PESQUISADOS(AS)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Na Tabela 9 fica nítida a variação de preços de um mesmo material, independentemente de ser pela mesma empresa compradora, variando de catador para catador como explicado.

Os preços dos materiais recicláveis também variam ao longo do ano, e o fazem com certa frequência e em períodos distintos, por serem diretamente influenciados pelos preços das commodities[2] utilizadas em cada processo de produção de matéria-prima virgem, como petróleo, celulose e minérios (PACHECO, 2013).

Os(as) catadores(as) fixos, que são um pouco mais jovens, se encontram inseridos(as) no mercado da reciclagem em média de 5 a 6 anos (32%), enquanto os da terceira idade (acima de 60 anos) estão por cerca de 20 a 25 anos no mercado (18%), como pode ser observado na Tabela 10.

TABELA 10 – TEMPO DE ATUAÇÃO COMO CATADOR(A)

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

Os estudos mostram que o tempo de atuação na profissão de catador em outras localidades é em média de 6 a 10 anos ou um pouco mais, deixando evidente que o(a) catador(a) fixo(a) descalvadense prolonga por tempo maior sua permanência na atividade (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013).

Dos catadores pesquisados, apenas dois chegaram a participar de experiências cooperativistas por um curto período de tempo (dois meses), ambos associados à Cooperambiente, no ano de 2008. Essa experiência, segundo tais catadores, não foi gratificante por terem se sentido injustiçados, já que, à época, enquanto estiveram cooperados obtiveram seus rendimentos reduzidos em comparação ao trabalho como catador individual.

Segundo o catador, C1, os membros da diretoria executiva, da então cooperativa, não realizavam a atividade de catação nas ruas e tampouco auxiliavam dentro do galpão de triagem e armazenamento, mas ele observava que a situação econômica de alguns desses membros foi sendo melhorada durante o funcionamento da cooperativa. Mencionou, com certa revolta, que a presidente chegou nesse período a adquirir um carro zero quilômetro para uso próprio, enquanto ele e os demais não conseguiam honrar suas dívidas e ao mesmo tempo sustentar suas famílias, fazendo com que ele decidisse deixar de ser cooperado.

Esses catadores ex-cooperados não souberam especificar como ocorria o processo de comercialização dos materiais pela cooperativa, demonstrando não ter conhecimento sobre os aspectos relativos à parte burocrática e administrativa da associação, pois estas atribuições eram de responsabilidade exclusiva da diretoria executiva, assim como a tomada de decisão a respeito do trabalho executado. Esta experiência vivenciada em Descalvado-SP pelos catadores corrobora a análise de Singer (2002) e Leite (2008), no que se refere ao volumoso surgimento de cooperativas pelo país com intuito de flexibilizar as relações de trabalho. De acordo com estes estudos, a gestão se dá de forma hierarquizada e a participação nos lucros também. Nesse sentido, tais experiências são conhecidas como “falsas cooperativas” ou “cooperfraudes” por não preservarem os princípios da autogestão e autonomia e manterem relações desiguais de poder típicas das empresas capitalistas.

Do relato dos catadores mais antigos, ficou um questionamento quanto a composição da primeira cooperativa de reciclagem criada no município (Cooper-rede), pois os mesmos nunca ouviram falar dela. Como esclarecido em capítulo anterior, não há informações sobre seus membros e a forma de funcionamento. E o poder público ao ser questionado também não colaborou com nenhuma informação a este respeito.

Cerca de 87% dos(as) catadores(as) pesquisados(as), manifestaram não desejar fazer parte de associações ou cooperativas, pois eles ainda vêem vantagens na profissão como catador fixo individual. Uma delas é ter autonomia de estipular seu próprio horário de trabalho e de descanso; outra é realizar o trabalho no seu próprio ritmo e de acordo com sua necessidade/dificuldade; não ser cobrado(a) por outras pessoas durante a execução do trabalho; e, por fim, ter a real noção do valor aproximado que irá receber ao vender seus materiais.

À exemplo da Figura 1, a totalidade dos(as) catadores(as) pesquisados(as) utiliza as próprias residências como depósito/armazenagem dos materiais coletados, uma vez que por serem catadores individuais não contam com galpões ou locais mais adequados para essa finalidade. O que evidencia, dentre outros problemas, maiores riscos de contaminação, inclusive, da família. Alocam no jardim, nas áreas laterais da residência e no quintal.

FIGURA 1 – ARMAZENAMENTO DE MATERIAIS COLETADOS: RESIDÊNCIA DE CATADOR

Fonte: Catador em sua própria residência, 2021.

Nas residências com menor espaço físico disponível, são utilizadas também as calçadas para depositar os bags. Para evitar a fiscalização municipal, vendem os bags assim que preenchidos.

FIGURA 2 – MATERIAIS COLETADOS EM BAGS ALOCADOS NA CALÇADA EM VIA PÚBLICA

Fonte: Foto tirada em via pública, 2020.

Considerando a questão do depósito/armazenagem dos materiais coletados, o trabalho por meio de associações cooperativistas proporcionaria ao catador uma melhor estrutura física para armazenar e tratar os materiais coletados, de um lado, agregando valor ao produto e, de outro, reduzindo os riscos de contaminação ao utilizar sua residência como depósito (IPT, 2003).

Nos estudos de caso sobre outras localidades, predomina a existência de trabalho com carga horária de 8 a 9 horas por dia em virtude de parte da atividade ser realizada dentro dos espaços das cooperativas, requerendo assim maior rigidez no tempo de trabalho e respeito as normas trabalhistas e horários comerciais (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013).

Já o trabalho dos(as) catadores(as) descalvadenses é executado em jornadas de 6 a 10 horas diárias, pois utilizam o período matutino (desde a madrugada), com temperaturas mais amenas, para catar nas ruas, comércios e casas. No período da tarde, na própria residência, fazem a triagem dos materiais e demais procedimentos de separação, limpeza e acondicionamento nos bags. Os que dependem exclusivamente da catação para sobreviver laboram todos os dias; já os que possuem outras fontes de renda, laboram de três a cinco dias por semana.

No caso dos catadores do sexo masculino, que são casados ou amasiados, suas esposas/conviventes, apesar de não serem reconhecidas como profissionais catadoras, uma vez que não participam da coleta nas ruas, geralmente os auxiliam na separação, limpeza e acondicionamento dos materiais, configurando mais uma mão de obra que não é contabilizada nesse processo. Quando se trata do inverso, os maridos ou conviventes das catadoras, estes as auxiliam muito pouco.

Assim, observando a atuação do núcleo da família dos(as) catadores(as), mais uma vez as questões de gênero aparecem demonstrando que as relações de trabalho são ainda pautadas pela presença das mulheres como mão de obra barata ou não remunerada. Além disso, percebe-se uma maior facilidade de os homens exercerem outras atividades (bicos) que complementam a renda familiar. Fica evidente que a jornada de trabalho das profissionais catadoras não é dupla, é tripla, pois elas se dividem entre as atividades laborais de catadora, os afazeres domésticos e os cuidados com a prole (SILVA, 2014).

A venda do material reciclável coletado no município, pelos catadores fixos, é feita semanalmente por cerca de 8% dos catadores totais, quinzenal 16%, mensal 54% e a cada quarenta e cinco dias 22%. Quanto à média de material coletado e vendido, varia muito de catador para catador e do tempo que levam para vender. Enchem por período uma variação de 5 a 35 bags, com aproximadamente 70 kg em cada um. Dependendo da quantidade de bags e da qualidade dos materiais neles contidos, conseguem obter, a cada venda, uma renda variável de R$ 300,00 (trezentos reais) a R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais). Cabe destacar que os catadores que conseguem alcançar o valor máximo referido de renda com os materiais recicláveis, correspondem a apenas 8% e todos são do sexo masculino.

No estudo que compara as regiões Sul, Sudeste e Nordeste do país quanto ao trabalho do catador, há prevalência dos melhores rendimentos na região Sul, mesmo assim não ultrapassa significativamente um salário mínimo (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013).

Considerando a média de produtos que é ensacada nos bags com capacidade máxima de 80 kg, no caso 70 kg, multiplicado pelo menor número de bags (5), vendidos no período mais recorrente (mês), e pelo número de catadores(as) pesquisados(as) (37), tem-se como resultado mínimo 12.950 kg ao mês de material reciclável que não foi direcionado para aterros sanitários, tendo a destinação correta com base na política de logística reversa e graças ao trabalho desses profissionais. Número real da contribuição ambiental dessa categoria é bem maior, demonstrando a importância que estes têm para a proteção do meio ambiente dentro do município e sua capacidade produtiva na cadeia da reciclagem.

Para Ferraz, Gomes e Busato (2012), os resíduos sólidos são um grande problema para as cidades, pois sua produção é progressiva e seu descarte nem sempre é adequado por falta de sistemas de gerenciamento desse material, sendo muitas vezes despejado em áreas sem controle ou qualquer tratamento. Diante do exposto, convergimos com tais autores ao afirmarem que o papel do catador se torna preponderante na preservação dos recursos naturais e na contribuição para desafogar os esgotados espaços físicos que servem de armazenamento dos resíduos produzidos pela geração e acúmulo de lixo.

TABELA 11 – TRANSPORTE DE MATERIAL

Fonte: Dados da pesquisa, 2021.

A Tabela 11 e a Figura 3, ilustram bem os dois tipos de transportes mais utilizados pelos catadores fixos descalvadenses: o carrinho de ferro construído ou adaptado de propriedade do(a) catador(a) por 52% e o carrinho de bebê por 22%, este último usado apenas por mulheres. Algumas delas possuem os dois meios para carregar os recicláveis, 9%.

Segundo a catadora, C8, a utilização do carrinho de bebê se justifica por ser um meio mais fácil de transportar os materiais coletados, uma vez que o mesmo é menos pesado que o carrinho de ferro. Contudo, sua utilização compromete a quantidade de material recolhido devido seu tamanho menor, acarretando a necessidade de várias viagens aos locais de coleta para transportar todo o material encontrado. Nessas várias idas e vindas, ela corre o risco também da perda do material para outros catadores concorrentes, sendo mais uma desvantagem em seu trabalho.

Sobre os meios de transporte de materiais recicláveis mais utilizados pelos catadores no país estão: os carrinhos de ferro sem motor – tipo gaiola, geralmente disponibilizados pelas cooperativas; bicicletas adaptadas e carroças (CASTILHOS JR; RAMOS; ALVES; FORCELLINI; GRACIOLLI, 2013).

FIGURA 3 – TRANSPORTE DE MATERIAIS RECICLÁVEIS: CARRINHOS DE FERRO E DE BEBÊ

Fonte: Fotos tiradas em vias públicas, 2021.

O peso e a forma de transportar os materiais recicláveis trazem sérios prejuízos à saúde dos catadores e demonstram o quanto o trabalho requer um esforço físico muito além da capacidade de muitas mulheres catadoras e de catadores idosos.

Para Medeiros e Macedo (2006), os catadores de materiais recicláveis, por fazerem parte do processo de produção capitalista, realizam seu trabalho numa realidade perversa, sem condições dignas para executá-lo, precarizando a atividade e lhes mantendo em situação de exclusão social. Essa realidade ambígua influencia na invisibilidade que os catadores sofrem ao longo de sua trajetória.

Ainda, para esses autores, a precariedade do trabalho do catador pode ser identificada a partir da baixa renda adquirida com a atividade, pelo pouco reconhecimento, instabilidade e risco, dificuldade de acesso à direitos sociais e trabalhistas, e falta de oportunidade para crescer profissionalmente.

Quando perguntado aos(às) catadores(as) sobre a razão que os(as) levou a trabalhar nessa atividade, em média responderam que as principais causas foram a baixa ou a ausência de renda e pouca escolaridade, seguida pela perda de emprego e impossibilidade de recolocação. Tais profissionais reconhecem a grande dificuldade que tiveram, e ainda têm, em ingressar e em se manter no mercado de trabalho formal, seja devido a idade avançada, seja pela escolaridade insuficiente, ou ainda, em virtude dos problemas de saúde.

Essa pouca renda e escolaridade baixa está diretamente relacionada à sua origem rural e, consequentemente, a falta de qualificação profissional para ocupar melhores espaços de trabalho nas cidades (YAZBEK, 2001; BOSI, 2008).

Os poucos de origem urbana relataram situações que os levaram a trabalhar como catador. Por exemplo, a catadora, C5, que ao se separar do marido, de quem dependia financeiramente por longa data e convivia numa relação marcada pela vítima de violência doméstica, se deparou sem o devido preparo para ingressar no mercado de trabalho competitivo, exigente e cada vez mais restrito, passando a catar para seu sustento. Já a catadora, C9, vivia bem até seu primogênito ir para a unidade prisional, tal fato ocasionou inúmeras dívidas e contribuiu para rebaixar ainda mais a renda familiar, tendo ela entrado na atividade como catadora no lugar do filho para suprir sua ausência.

Para Pochmann (2003), ao aderir às políticas neoliberais de desregulamentação, flexibilização e redução considerável da proteção social, o Brasil tem contribuído paulatinamente para o aumento da precarização do trabalho e para a elevação do índice de subemprego e desemprego.

Ao indagar sobre a maior dificuldade enfrentada pelos catadores aparece em primeiro lugar em suas respostas os problemas de saúde. Na sequência, aparecem como respostas: a renda insuficiente e a competição entre os catadores fixos e entre estes e os eventuais; a falta de consciência da população em não separar adequadamente o resíduo ao descartar; o local de armazenagem ser a própria residência e ocupar demais o espaço; o forte odor que incomoda e o manuseio dos materiais muitas vezes coletado sujo; e, por último, a falta de políticas públicas de incentivo ao trabalho do catador.

No que se refere a questão de a população reconhecer o trabalho do catador como agente ambiental, foi respondido pelos pesquisados que parte dela reconhece, mas outra parte não. Há uma minoria, segundo os relatos, que demonstra não gostar da presença do catador mexendo em seu lixo. Situações constrangedoras foram relatadas, como o caso da senhora que pôs fezes de animais nas garrafas de vidro para provocar certa catadora. E, outra, em que uma criança falou alto “lá vai a lixeira” se referindo à catadora na tentativa de desmerecer seu trabalho.

O estudo de Migueles (2004) retrata o significado social do lixo como negativo e o correlaciona com a formação da identidade do catador em que, por muito tempo, o levou a acreditar que não possuía valor o fruto do seu trabalho. Contudo, com o passar dos anos tem se observado o crescimento da consciência ambiental e também a emergência de novas discussões sobre as contribuições da reciclagem para a sociedade, inclusive, com a valorização no mercado competitivo do material reciclável, essa visão a respeito do trabalho do catador tem sido alterada.

Muitos(as) dos(as) catadores(as) vêem o seu trabalho como uma atividade prazerosa e gostam do que fazem, pois, a partir dela conquistaram bens e o reconhecimento, mesmo que parcial, da sociedade. Em outras palavras, trabalhar com o material reciclável representa seu sustento e uma ocupação, uma forma de continuar ativo(a)/produtivo(a) diante da família, amigos e da comunidade da qual fazem parte.

4. RESULTADOS

Nesta pesquisa aplicamos questionário e analisamos uma amostra de trinta e sete catadores(as) fixos individuais que realizam efetivamente esse trabalho no município de Descalvado-SP (de um público estimado pelos órgãos oficiais em 73 pessoas). Buscamos informações complementares sobre suas condições vida e as experiências cooperativistas e não cooperativistas que existiram anteriormente e a respeito das relações criadas entre esses mesmos catadores e outros atores sociais da cadeia de reciclagem (gestores públicos e privados). Sobre o contato com tais atores, obtivemos retorno somente da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, uma vez que houve a recusa dos mesmos em prestar tais informações por meio formal, via formulário e termo de consentimento, sob a alegação de inabilidade com recursos digitais e ausência de tempo.

Após a coleta dos dados documentais, e das informações provenientes da aplicação dos questionários, procuramos correlacioná-los com algumas categorias presentes na literatura especializada (a saber: exclusão social, trabalho informal e catadores como agentes ambientais). É este processo, de forma mais sistemática, que será delineado a seguir.

Ficou evidenciado com a pesquisa que mais da metade dos(as) catadores(as) pesquisados(as) é proveniente da zona rural, assim como seus ascendentes, corroborando as discussões a respeito de como surgiu o catador ao longo da história e de como sempre enfrentaram dificuldades para se manter em meio ao mercado de trabalho informal na área urbana, o qual, assim como o formal, é concorrido e excludente.

Como destacou Yazbek (2001) e Bosi (2008), trata-se de uma população que, sendo expulsa do meio rural e da atividade da roça que realizava com propriedade, se viu amontoada nas cidades e sem trabalho, devido a pouca escolaridade e, consequentemente, com pouca capacitação para outros trabalhos mais elaborados. Sem emprego e renda fixa, passou a ocupar as áreas periféricas das cidades (BONDUKI, 2000). Isto indica que o êxodo rural não é uma busca por melhores condições e sim uma expulsão do campo, demonstrando indiretamente o potencial social da reforma agrária popular.

Por nem sempre serem capazes de suprir suas necessidades básicas como catador, recorrem ao poder público local para solicitar auxílio de cestas básicas ou de inclusão em programas socioassistenciais de complementação de renda (ex.: Bolsa Família, Auxílio Emergencial e BPC). O BPC é uma alternativa, utilizada somente após os 65 anos completos, em substituição a aposentadoria da qual eles não têm direito, apesar de terem trabalhado por toda a vida, uma vez que a renda não é suficiente para contribuir com a previdência social e se tornar um segurado. Tais atores dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde para atendimento médico-hospitalar, alguns aguardando por meses na lista de espera para realizar cirurgia de catarata e também exames. Os que precisam de remédios de alto custo nem sempre os conseguem, logo, para sua obtenção é necessário recorrer a judicialização.

Levando em consideração o que identificamos nos(as) catadores(as) fixos estudados(as) quanto a sua caracterização: baixa escolaridade (predominância de pessoas com ensino fundamental incompleto e analfabetas), baixa renda (variável a partir de R$300,00), origem rural, maioria de mulheres, relações de trabalho precárias e nem sempre tendo acesso às estruturas sociais (educação, saúde, trabalho etc.); é possível, em diálogo com trabalhos a exemplo do de Quinelato (2012), caracterizá-los(as) como pertencentes a uma parcela da população em situação de desigualdade social ou de exclusão.

A relação comercial existente entre a empresa compradora e o catador é de dependência e de exploração, típica do processo de produção capitalista, pois não existe vínculo empregatício, tampouco seguros sociais que resguardem os catadores caso fiquem doentes ou, pela idade avançada, percam a capacidade de trabalhar. Esses atores exercem trabalho informal e precário por sua conta e risco, empurrando a pé carrinhos de ferro ou de bebê, carregados com uma enorme quantidade de materiais recicláveis pelas ruas da cidade, expostos a intemperes climáticas e outras situações de risco por lidarem com o lixo, com a concorrência e com o preconceito de uma parcela da população.

Mesmo assim, é a partir da atividade de coleta de materiais recicláveis que esse grupo social se vê inserido na sociedade, mesmo que de forma parcial, por ela promover seu sustento e dignidade (MIÚRA, 2004).

Ao mesmo tempo que os(as) catadores(as) compõem a base da cadeia produtiva da reciclagem, ao executarem o trabalho pesado de coleta, seleção e separação desses materiais e os venderem por preços, muitas vezes irrisórios (exemplo: dez centavos por um quilo de papel), são eles os principais responsáveis pela movimentação desse mercado lucrativo aos grandes empresários de ponta, contribuindo diretamente para um desenvolvimento mais sustentável, em que a exploração dos recursos naturais é substituída por materiais recicláveis. Para Bosi (2008), os catadores são propulsores de novas tecnologias e da expansão do processo de reciclagem no país. Já na visão de Souza (2011) o baixo custo do trabalhado do catador é o que torna possível sua utilização no lugar da extração de produtos in natura.

Ao longo do estudo no município de Descalvado-SP, identificamos instituições envolvidas com as atividades de recolha de resíduos recicláveis pelos catadores (ex-cooperativas, prefeitura, empresas ou sucateiros), no período de 2002 a 2020.

Das empresas privadas que lidam com materiais recicláveis e mantêm relações com os catadores foram localizadas três, destas, duas empresas de médio porte e uma empresa menor de sucata, todas elas sociedades limitadas que trabalham com os mesmos materiais recolhidos pelos catadores. São consideradas centros de triagem, beneficiamento e transbordo. Junto ao poder público, soubemos da existência de aterro de transbordo que recebem os resíduos domiciliares para depois serem transferidos ao aterro sanitário de Guatapará-SP. Assim como, constatamos a existência do Projeto Vidro Social, em execução, mas com pouca expressividade e eficácia, enquanto outras legislações mais importantes instituídas por outros gestores públicos caducaram e foram engavetadas.

Quanto à nossa hipótese inicial, de que os catadores fixos de recicláveis do município de Descalvado-SP estariam à margem da sociedade, enfrentando desigualdades sociais relevantes em virtude de suas condições de trabalho, inclusive, da ausência de conhecimento sobre o funcionamento e os possíveis benefícios da atuação profissional por intermédio da ação baseada na organização cooperativista, esta se confirmou à medida que, nos relatos dos catadores, foram identificadas condições precárias de trabalho (desde a coleta com carrinhos-gaiola até a separação e ensacamento dos materiais, inclusive, com os materiais sendo acondicionados nas próprias residências dos catadores); constatada a existência de concorrência acirrada entre os catadores fixos e os eventuais (o que tem obrigado os catadores fixos a iniciar sua jornada laboral durante a madrugada para garantir seu sustento); observada a necessidade de complementação de renda por meio de programas sociais, e por fim, foi verificada a inexistência seja de experiências cooperativistas, seja de experiências cooperativistas autogestionárias.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Constatamos na literatura especializada vários aspectos que envolvem a vida e o trabalho dos catadores de materiais recicláveis pelo país. Destes, os que mais foram identificados como sendo um ponto de congruência característico dessa categoria está relacionado à exclusão social, agregado ao trabalho precário e ao papel como agente ambiental. Neste último aspecto, os catadores, apesar de fornecerem uma grande contribuição ambiental, acabam por fazê-la como uma consequência indireta, pois o foco está voltado para garantir a subsistência de sua família.

A realidade dos(as) catadores(as) fixos pesquisados(as) no município de Descalvado-SP não se difere daquela encontrada na literatura de modo geral, pois esses sujeitos continuam pertencendo a uma parcela da população excluída do mercado de trabalho formal, sem direitos trabalhistas, realizando sua atividade de forma precária, isto é, sem os equipamentos necessários para agregar maior valor ao seu produto coletado e, ao mesmo tempo, sem condições adequadas que lhes proporcione qualidade vida; com renda insuficiente diante das mudanças econômicas e estruturais do país e sendo eternos dependentes, de um lado, do capital das empresas compradoras, estas detentoras dos meios de produção; e, de outro, das políticas assistenciais para sobreviver.

Houve maior incentivo por parte do poder público (nas esferas federal, estadual e municipal), entre os períodos de 2002 a 2016, decaindo os investimentos voltadas aos catadores até 2020, por conta do congelamento dos gastos com as políticas sociais, instituído pelo governo federal.

Num contexto mais recente, em meio à crise institucional que se instalou no Brasil, e às políticas restritivas de direitos sociais e trabalhistas vindas a partir das reformas neoliberais, desde 2016, o país foi acometido pela pandemia de COVID-19, em 2020, assim como os demais países do mundo, passando a enfrentar uma crise sanitária nunca vista por gerações.

Foi reduzida a capacidade de compra desses atores sociais, em meio a pandemia, devido ao aumento da inflação, diminuição do valor de venda dos materiais recicláveis e do crescimento do número de catadores eventuais (concorrentes) no mercado local no primeiro ano de pandemia.

Quanto às especificidades dos(as) catadores(as) pesquisados(as), observamos a pouca ou nenhuma experiência com o trabalho cooperado de fato, isto é, em associações cooperativistas que exercessem uma atividade realmente organizada e de interesse coletivo. Isto fez com que estes profissionais não tivessem parâmetros para identificar os benefícios do trabalho cooperado, o que parece ter influenciado na escolha de continuar a exercer sua atividade individualmente. Outra característica própria desses(as) catadores(as) foi quanto à existência de residências fixas de coleta de recicláveis já pré-estabelecidas, que os auxiliam a manter um mínimo de produto vendável, garantindo assim uma renda mínima ao mês a cada catador(a). A existência de um contingente de catadores idosos ainda exercendo a profissão de catador também chama a atenção.

Das dificuldades enfrentadas pelos(as) catadores(as) fixos, foi relatada: competição entre catadores fixos e eventuais; pouco espaço para armazenagem dos produtos, haja vista que alocam em suas residências e em áreas descobertas, algumas vezes nas calçadas; renda insuficiente para aquisição de determinados itens da cesta básica e demais produtos essenciais, incluindo medicações; falta de consciência da população ao não separar o lixo; preconceito; cansaço e saúde debilitada; meio de transportar os materiais precário; e, por fim, ausência de políticas públicas.

Com este estudo percebemos que parte significativa da sociedade descalvadense e do poder público municipal desconhece a identidade e realidade cotidiana do trabalho dos(as) catadores(as) fixos individuais pesquisados(as). Basta dizer que a lista de catadores fornecida não condiz com a realidade dos catadores ativos, estes que se surpreenderam ao serem ouvidos durante esta pesquisa. Só não são invisíveis dentro de suas próprias comunidades (bairros), locais em que contam com a colaboração dos moradores ao separarem os materiais e lhes entregarem em mãos, por conhecerem de pertos os desafios que enfrentam para sobreviver.

Ao longo da execução da pesquisa, e neste texto final, buscamos, de um lado, contribuir para chamar a atenção dos gestores públicos e privados para o trabalho dos(das) catadores(as) no município, evidenciando sua importância para a cadeia da reciclagem e a invisibilidade por eles vivenciada. E, de outro, colaboramos para que os profissionais ativos da catação pensassem a respeito do seu trabalho, sua importância para o município e suas dificuldades, mostramos também a existência de mais de uma empresa compradora local (que muitos não tinham conhecimento), a variação de preços por produto pago e a ausência de políticas públicas voltadas a atender suas necessidades e a questão ambiental.

Desse modo, este trabalho espera ter fornecido conhecimentos que possam auxiliar a melhorar as relações existentes entre todos os atores sociais da reciclagem, reconhecendo os catadores como protagonistas nessa relação de modo a se tornarem cada vez mais conscientes de sua importância social e ambiental.


[1] É possível verificar situações de violência contra catadoras também em municípios da região a exemplo de Araraquara. Disponível em: ttps://www.acidadeon.com/araraquara/cotidiano/cidades/NOT,0,0,1667819,trabalhadoras-da-acacia-protestam-contra-furtos-em-araraquara.aspx. Acesso em: 20 out. 2021.

[2] Commodities são produtos de origem agropecuária ou de extração mineral, em estado bruto ou pequeno grau de industrialização, produzidos em larga escala e destinados ao comércio externo (PACHECO, 2013)

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1Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente pela Universidade de Araraquara.
2Doutora e mestre em Sociologia pela UNESP/Araraquara e especialista em Governança Pública e Novos Arranjos de Gestão. Docente da Faculdade de Ciências e Letras da UNESP/Araraquara.