COVID-19 E O IMPACTO NA TERAPIA INTENSIVA: DESAFIOS VIVENCIADOS POR RESIDENTES MULTIPROFISSIONAIS DA SAÚDE

COVID-19 AND THE IMPACT ON INTENSIVE THERAPY: CHALLENGES EXPERIENCED BY MULTIPROFESSIONAL HEALTH RESIDENTS

COVID-19 Y EL IMPACTO EN LA TERAPIA INTENSIVA: DESAFÍOS EXPERIMENTADOS POR RESIDENTES MULTIPROFESIONALES DE SALUD

Autores:
Amanda Gabrielle Silva Queiroz
Samuel Amorim Dias
Sara Ferreira Sottocornola
Laurindo Pereira de Souza


RESUMO

Introdução: Muitos países implementaram uma série de intervenções para reduzir a transmissão da COVID-19 e frear a rápida evolução da pandemia. Na maioria das vezes o vírus se desenrola como uma doença aguda que evolui com sintomatologia leve, os pacientes que cursam com a apresentação clínica mais agressiva da doença necessitam de atendimento em Unidade de Terapia Intensiva. Objetivo: O estudo se trata de um relato de experiência e tem como objetivo relatar os desafios vivenciados por residentes do primeiro ano (R1), atuantes na linha de frente na UTI de um hospital público no interior sul de Rondônia. Diante da dimensão e repercussões observadas nas diversas regiões do Brasil, fez-se necessária a elaboração de um plano de enfrentamento para disponibilizar leitos de tratamento durante a pandemia da COVID-19 no HRC, sendo composto por 04 fases. A pandemia do COVID-19 apesar dos inúmeros desafios à assistência em saúde trouxe bastante conhecimento e em comparação às demais regiões do Brasil tivemos uma vantagem dos casos confirmados demoram a chegar em Rondônia, dando-nos uma vantagem para montar estratégias gerenciais para o enfrentamento da pandemia. Espera-se que o ano de 2020 seja um catalisador de mudanças duradouras que elevem o perfil dos profissionais de saúde.

Descritores: Residência, pandemia, coronavírus, Unidades de Terapia Intensiva.

ABSTRACT

Many countries have implemented a series of interventions to reduce the transmission of COVID-19 and halt the rapid evolution of the pandemic. Most of the times the virus unfolds as an acute disease that evolves with mild symptoms, patients who have a more aggressive clinical presentation of the disease need care in the Intensive Care Unit. The study is an experience report and aims to report the challenges experienced by first year residents (R1), working on the front line in the ICU of a public hospital in the southern interior of Rondônia. In view of the dimension and repercussions observed in the different regions of Brazil, it was necessary to develop a coping plan to provide treatment beds during the COVID-19 pandemic at the HRC, comprising four phases. The COVID-19 pandemic, despite the numerous health care challenges, brought a lot of knowledge and compared to other regions of Brazil, we had an advantage of the confirmed cases taking a long time to arrive in Rondônia, giving us an advantage to set up management strategies to face the pandemic. The year 2020 is expected to be a catalyst for lasting changes that raise the profile of health professionals.

Descriptors: Residence, pandemic, coronavirus, Intensive Care Units.

RESUMÉN

Muchos países han implementado una serie de intervenciones para reducir la transmisión de COVID-19 y detener la rápida evolución de la pandemia. La mayoría de las veces el virus se desarrolla como una enfermedad aguda que evoluciona con síntomas leves, los pacientes que tienen una presentación clínica más agresiva de la enfermedad necesitan atención en la Unidad de Cuidados Intensivos. El estudio es un informe de experiencia y tiene como objetivo informar sobre los desafíos experimentados por los residentes de primer año (R1), que trabajan en primera línea en la UCI de un hospital público en el interior sur de Rondônia. En vista de la dimensión y repercusiones observadas en las diferentes regiones de Brasil, fue necesario desarrollar un plan de afrontamiento para proporcionar camas de tratamiento durante la pandemia de COVID-19 en el HRC, que comprende cuatro fases. La pandemia de COVID-19, a pesar de los numerosos desafíos de la atención médica, trajo mucho conocimiento y en comparación con otras regiones de Brasil, tuvimos la ventaja de que los casos confirmados tardaron mucho en llegar a Rondônia, lo que nos dio una ventaja para configurar estrategias de manejo para enfrentar la pandemia. Se espera que el año 2020 sea un catalizador de cambios duraderos que eleven el perfil de los profesionales de la salud.

Descriptores: Residencia, pandemia, coronavirus, Unidades de Cuidados Intensivos.

INTRODUÇÃO

Em dezembro de 2019, a cidade de Wuhan, capital de Hubei, província na China, tornou-se o centro de um surto de pneumonia de causa desconhecida. Em fevereiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) nomeou, oficialmente, a doença comoCorona Virus Disease (COVID-19). Toda a epidemia teve um enorme impacto mundial na saúde, política e economia1 desolando o sistema de saúde de vários países2. O que levou a OMS a decretar uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional em janeiro de 2020, e, uma pandemia em março do mesmo ano 3.

Diante disso, muitos países implementaram uma série de intervenções para reduzir a transmissão do vírus e frear a rápida evolução da pandemia. Tais medidas incluem o isolamento de casos; o incentivo à higienização das mãos; ao uso de máscaras faciais caseiras; e medidas progressivas de distanciamento social, com o fechamento de escolas e universidades, a proibição de eventos de massa e de aglomerações, a restrição de viagens e transportes públicos, a conscientização da população para que permaneça em casa, até a completa proibição da circulação nas ruas, exceto para a compra de alimentos e medicamentos ou a busca de assistência à saúde. Essas medidas têm sido implementadas de modo gradual e distinto nos diferentes países, com maior ou menor intensidade, e seus resultados, provavelmente, dependem de aspectos socioeconômicos, culturais, de características dos sistemas políticos e de saúde, bem como dos procedimentos operacionais na sua implementação 4.

Na maioria das vezes a COVID-19 se desenrola como uma doença aguda que evolui com sintomatologia leve, contudo o curso da doença com a forma agravada pode resultar em óbito. Dados fornecidos pela OMS, evidenciam que a doença evolui de forma parecida a pneumonia viral, seguindo da forma leve a crítica, sendo que também pode ser observada em indivíduos sem sintomas (assintomáticos). Aproximadamente 80% dos pacientes diagnosticados com COVID-19 evoluem com sintomas leves, sem complicações, 15% necessitam de hospitalização e oxigenoterapia e 5% evoluem de forma mais grave 5, 6.

Os pacientes que cursam com a apresentação clínica mais agressiva da doença, evidenciam pneumonia viral com possível evolução para insuficiência respiratória aguda hipoxêmica e posterior Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) já na sua forma mais crítica 7.

Esses pacientes necessitam de atendimento em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). No Brasil já existem diretrizes e critérios para admissão em um leito de UTI. A nossa principal referência é a Resolução CFM nº 2156 de 17 novembro de 2016 8 que estabelece que o critério para admissão em UTI é a instabilidade crítica, definida como “necessidade de suporte para as disfunções orgânicas, e monitoração intensiva” e a Resolução nº 12, de 27 Maio de 2020 9 que “Aprova o Protocolo de Regulação para casos de COVID-19 para Unidades de Terapia Intensiva de Alta Complexidade\”.

O Ministério da Saúde, juntamente com as secretarias estaduais e municipais de saúde, buscam a adaptação para este cenário. Os serviços de saúde também se articulam para aumentar a capacidade de reação à pandemia e promover o equilíbrio nacional e, neste sentido, a gestão dos serviços de saúde, especialmente dos hospitais públicos brasileiros que são o enfoque desta discussão, primam por suplantar os desafios que surgem concomitantemente à propagação da COVID-19 10.

Recentemente foram impostos novos desafios ao Sistema Único de Saúde (SUS), especialmente no que se refere à restrição orçamentária em todos os níveis de atenção 11. Se tratando da atenção terciária, o Complexo Hospitalar Regional de Cacoal (COHREC) é uma referência em atendimento de média e alta complexidade no interior sul do estado de Rondônia, segunda Macrorregião de Saúde do estado, que abriga mais de 800 mil habitantes. Com a chegada do COVID-19 o Hospital Regional de Cacoal (HRC) se tornou centro de referência em tratamento de casos suspeitos e confirmados de COVID-19.Sendo que esse setor conta com uma equipe multiprofissional composta por enfermeiros, fisioterapeutas, médicos, farmacêuticos, técnicos de enfermagem, nutricionistas, psicólogos e assistentes sociais, fonoaudiólogos entre outras especialidades.

Dessa forma, o presente estudo trata-se de um relato de experiência e tem como objetivo relatar os desafios vivenciados por residentes do primeiro ano (R1), atuantes na linha de frente na UTI de um hospital público no interior sul de Rondônia.

A HISTÓRIA DO PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MULTIPROFISSIONAL EM INTENSIVISMO E O MÉTODO DO ESTUDO

O Programa de Residência Multiprofissional em Saúde (PRMS) é uma pós-graduação na modalidade residência lato sensu amparado pela Lei nº11.129 de 2005. Teve como precursora a área médica, antes conhecida como internato, a primeira foi implantada nos EUA em 1879, o surgimento no Brasil foi um pouco mais tarde, em 1945, disponibilizada pela Universidade de São Paulo (USP). Entretanto, essa modalidade foi regulamentada apenas no ano de 1977, por meio do decreto presidencial nº 80.281, onde foi criado a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM)12.

Os resultados alcançados no Brasil com a Residência Médica abriram portas, expandindo para outras áreas da saúde, tendo esse como modelo para implantação da Residência em Enfermagem no ano de 1961 pelo Hospital Infantil do Morumbi em São Paulo. Logo após, em 1973, teve início o curso de especialização de enfermeiros na área médico-cirúrgico pelo Hospital Escola da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia 13.

Os PRMS se destacam pelo redirecionamento dos conhecimentos e prática na atenção primária, disponibilizando para o mercado de trabalho jovens com qualificação e orientados pelos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), com conhecimento aprofundado da realidade e carências da comunidade. Essa modalidade tem por objetivo a formação de profissionais capazes de trabalhar em equipe, dessa forma colaborando para a integralidade da assistência prestada ao usuário, atendendo as demandas de todos os níveis da atenção. Fazem parte dos PRMS às seguintes profissões: Enfermagem, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Odontologia, Farmácia, Psicologia, Nutrição, Biomedicina, Fonoaudiologia, Ciências Biológicas, Serviço Social, Medicina Veterinária e Educação Física.

A Resolução Nº 2, de 13 de abril de 201214 define que os PRMS, são constituídos por uma Coordenação da Comissão de Residência Multiprofissional (COREMU), Coordenação do Programa, Núcleo Docente Assistencial Estruturante (NDAE), docentes, tutores, preceptores e profissionais da saúde residentes.

O PRMS do HRC atende a Resolução nº 5, de novembro de 201415, ofertando uma carga horária (CH) total de 5.760 horas, sendo 80% prática e 20% teórica necessárias para especialização na área de Cuidados Intensivos.

As atividades teóricas, práticas e teórico-práticas de um PRMS devem abranger três (03) eixos integradores, são eles: eixo integrador transversal, eixo integrador para área de concentração e eixo integrador específico. O primeiro, eixo integrador transversal é um eixo que engloba todas as profissões, nesse, são tratados temas teóricos e práticos comuns a todas as áreas de concentração, relacionados a ética e bioética, SUS, metodologia de pesquisa, epidemiologia clínica, entre outros. O segundo, eixo integrador para área de concentração é também voltado para todas as profissões, porém aborda determinada área de concentração, com conteúdo próprio da mesma, como saúde mental, neurologia, pediatria, etc. Por último, o eixo integrador específico, destinado às atividades e saberes de cada profissão em particular de forma a preservar a identidade profissional 14

Os eixos integradores são ministrados pelos tutores e preceptores divididos por módulos, rounds beira leito e discussão de casos 15. O PRMS do HRC tem como área de concentração o intensivismo e foi aprovado pelo Ministério de Educação em 2017 sob nº protocolo 2017-2464, em 2018 foi realizado a primeira seleção com um total de 11 vagas distribuídas entre as profissões: Enfermagem, Fisioterapia, Odontologia, Farmácia, Psicologia e Nutrição. Possui parceria com o Centro Universitário UniFacimed, a instituição executora, o Hospital Regional de Cacoal – HRC vinculados a Secretaria Estadual de Saúde – SESAU/RO.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Desafios na assistência direta às vítimas da COVID-19

Com os casos crescentes de COVID-19 em todo o mundo e chegando no Brasil houve a necessidade de criar um plano de enfrentamento e estratégias de enfrentamento a pandemia, abrindo hospitais de campanha, adaptando hospitais já existentes, públicos e particulares para recepcionar e tratar os pacientes com diagnóstico fechado de COVID-19. Em nossa realidade, um dos maiores desafios foi o treinamento dos funcionários antigos e readaptação dos novos, pois o elevado índice de contaminação dos servidores fragilizou e sobrecarregou o serviço, sendo necessário realizar contratação emergencial de novos profissionais, muitos deles sem experiência na área da terapia intensiva, o dimensionamento das clínicas do hospital para as UTIs foram a salvação de vários momentos durante o pico máximo da doença. As internações dos próprios funcionários que desenvolveram a forma grave também foi um fator que desestabilizou a equipe multiprofissional, alguns funcionários precisaram ser realocados para as clínicas por laudo psiquiátrico.

Diante da dimensão e repercussões observadas nas diversas regiões do Brasil, fez-se necessária a elaboração de um plano de enfrentamento 16 para disponibilizar leitos de tratamento durante a pandemia da COVID-19 no HRC, sendo composto por 04 fases (figura 1):

  • Fase 01: Liberação de 16 leitos intensivos adultos, 01 leito intensivo pediátrico, 07 leitos clínicos adulto e 08 leitos clínicos pediátricos. Implementar fase 02 quando atingir 50% de ocupação dos leitos disponibilizados.
  • Fase 02: Leitos disponíveis acumulados. Liberação de 22 leitos intensivos adultos, 01 leito intensivo pediátrico, 20 leitos clínicos adulto e 08 leitos clínicos pediátricos. Implementar fase 03 quando atingir 50% de ocupação dos leitos disponibilizados.
  • Fase 03: Leitos disponíveis acumulados. Liberação de 28 leitos intensivos adultos, 01 leito intensivo pediátrico, 31 leitos clínicos adulto e 02 leitos clínicos pediátricos (reduzido a quantidade de leitos pediátricos). Implementar fase 04 quando atingir 70% de ocupação dos leitos disponibilizados.
  • Fase 04: Nesta fase, a última do plano de contingência, seguirá com o bloqueio total de todo o complexo hospitalar regional de Cacoal em conjunto com convênios com hospitais particulares. Leitos disponíveis acumulados. Liberação de 45 leitos intensivos adultos, 02 leitos intensivos pediátricos, 88 leitos clínicos adultos e 15 leitos clínicos pediátricos.

Figura 1: Fases do plano de contingência do Hospital Regional de Cacoal

50% de Ocupação implementar Fase 0250% de Ocupação implementar Fase 03


























70% de Ocupação implementar Fase 04


























Bloqueio total do HRC Convênio com rede privada


























FASE 01
Leitos disponíveis HRC
FASE 02
Leitos disponíveis acumulados
FASE 03
Leitos disponíveis acumulados
FASE 04
Leitos disponíveis acumulados
UTI AD: 16* UTI AD: 22* UTI AD: 28* UTI AD: 45*
CLÍNICO AD: 07* CLÍNICO AD: 20* CLÍNICO AD: 31* CLÍNICO AD: 45*
UTI PED: 01** UTI PED: 01*** UTI PED: 01*** UTI PED: 02***
CLÍNICO PED: 08** CLÍNICO PED: 08*** CLÍNICO PED: 02*** CLÍNICO PED: 15***
* Admissão
** CI. Pediátrica
*Unidade I (12) +
Unidade III (10) = 22
** Unidade I (05) +
Unidade II (15) = 20
* Unidade I (10) +
Unidade III (10) +
Unidade IV (08) = 28
** Unidade I (05) +
Unidade II (26) = 31
*** Unidade II
* Unidade I (10) +
Unidade II (10) +
Unidade III (10) +
Unidade IV (08) +
Unidade V (07) = 35
** Unidade I (05) +
Unidade II (26) + Enf.
Ortopédica (40) + Enf.
Médica (32) = 92
*** Unidade Pediátrica
Fonte: Rondônia (2020)16

Em caso de 100% de ocupação dos leitos no HRC, se fará necessário estudar a disponibilidade de leitos não COVID de iniciativa privada ou na criação de um hospital de campanha que ficaria responsável pela triagem e assistência a pacientes clínicos (Figura 2). Além da abertura de um novo processo seletivo para a contratação de Recursos Humanos.

Figura 2: Designação para 100% dos leitos das Unidades COVID no HRC

Unidade COVID Atual Unidade COVID Antiga Leitos de UTILeitos Clínico
Unidade IAdmissão1005
Unidade II Clínica Cirúrgica1017
Unidade IIIUTI Adulto 1100
Unidade IV UTI Adulto 2080
Unidade VUTI Pediátrica070
Unidade VIClínica Pediátrica 0215
Unidade VIIClínica Ortopédica036
Unidade VIIIClínica Médica030
Total Adulto4588
Total Pediátrico0215
Total Geral47103
Fonte: Rondônia (2020)16

Com a implantação dessas fases, simultaneamente o núcleo de educação permanente (NEP) do HRC se prontificou a realizar capacitações aos profissionais da saúde, como: técnica correta de paramentação, montagem, testagem e manejo do ventilador, técnica para intubação orotraqueal com mínimo de dispersão de aerossóis, técnica de pronação, preparação do corpo em caso de óbito etc.

Frente às dificuldades de infraestrutura, equipamentos e Recursos Humanos a implantação das fases do plano de enfrentamento sofreu alterações. A implantação da fase I teve início no mês de março, logo no dia 26 de março de 2020 (quinta-feira) foram liberadas as vagas concernentes a esta fase, sendo inicialmente fechado a ala de oncologia pediátrica para então ser a unidade I do setor COVID-19, diferente do plano de enfrentamento inicial, nessa fase foram disponibilizados 12 leitos intensivos na então unidade I, e a clínica cirúrgica foi convertida na unidade II do setor COVID-19 com 20 leitos clínicos. Houve então a realocação de profissionais de outros departamentos para atuarem no setor COVID-19, posteriormente com o aumento das internações verificou-se a necessidade de recrutamento de novos profissionais através de processo seletivo emergencial, isto ainda não interferindo na assistência prestada pelos profissionais da residência multiprofissional.

Em um segundo momento quando as unidades I e II atingiram 50% da sua capacidade, iniciou-se a implantação da fase II, transformando a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) geral I (local de atuação de parte dos residentes) na então unidade III do setor COVID-19, liberando no dia 09 de junho de 2020 mais 10 leitos intensivos, sendo que destes, 02 são de isolamento de contato. Em seguida, diante do afastamento dos grupos de risco e afastamentos por contaminação pelo SARS Cov-2 dos profissionais, houve a necessidade dos residentes multiprofissionais assumirem mais responsabilidades junto aos pacientes com diagnóstico fechado de COVID-19. Nesse período, um dos maiores desafios da assistência foi lidar com a ideia de tratar uma doença com evolução pouco conhecida e prognóstico igualmente incerto, trazendo à tona a insegurança quanto à assertividade de condutas tomadas.

Com 22 dias de funcionamento da unidade III, no dia 01 julho de 2020 (quarta-feira), com 50% dos leitos totais (unidades I, II e III) ocupados foi implantada a fase III, nesta a UTI geral II foi adaptada e se tornou a unidade IV do setor COVID-19, agregando mais 08 leitos intensivos para o setor COVID-19. Para isso houve necessidade de realocação dos pacientes críticos não infectados pela COVID-19 para a UTI pediátrica do hospital, transformando em UTI geral adulto. Sendo assim, os pacientes pediátricos em tratamento nesse local foram remanejados para hospitais especializados do interior e capital do estado.

Na realidade, o HRC conta com três (03) unidades intensivas com 28 leitos no total e uma (01) unidade com leitos clínicos contando com 20 leitos, totalizando cinquenta (48) leitos destinados a atendimentos aos pacientes suspeitos e confirmados com COVID-19. Até o presente momento não houve a implantação da fase IV.

A rotina da assistência sofreu grandes alterações devido às práticas adotadas para contenção da disseminação do vírus, adaptações assistenciais foram necessárias para atender a demanda de pacientes infectados de forma a proteger a equipe multiprofissional, sendo permitida a entrada no setor apenas para profissionais que prestam assistência direta aos doentes. Frente a essa situação, onde a permanência no setor COVID-19 representava aumento significativo no risco de contaminação, foi necessário alteração na semana padrão dos residentes da equipe multiprofissional, que antes era composta por plantões de 10 horas diárias (60 horas semanais com 01 folga), para plantões de 12 horas diárias (60 horas semanais com 02 folgas), de forma a ter todos os plantões diurnos com pelo menos 01 residente multiprofissional acompanhado por um profissional plantonista de sua área de atuação. Nesse momento psicólogos e assistentes sociais tiveram que se reinventar, realizando seu atendimento de forma remota. Os boletins médicos também passaram a ser de forma remota juntamente com o serviço de psicologia.

Em um dado momento, em meio ao pico enfrentado no estado de Rondônia, o HRC sofreu com a falta de insumos e medicamentos, como luva de procedimento, luva estéril, sondas de aspiração, álcool em gel, sedativos, drogas vasoativas, bloqueadores neuromusculares, bombas de infusão e ventiladores mecânicos. Esse mesmo episódio se repetiu em determinados períodos, a justificativa para tal situação se dá devido o processo de licitações ser burocrático e consequentemente demorado, como a pandemia se instalou de forma rápida os insumos do hospital que deveriam durar de 06 meses a 01 ano em situação “normal” precisaram ser racionados para durar o máximo possível, até que os pedidos de novos insumos fossem atendidos. Houveram doações de iniciativas privadas em determinadas situações para equilibrar as demandas dos plantões.

O insumo hospitalar deste nosocômio advém da capital Porto Velho e é transportado através de um caminhão pela BR 364 com exatamente 379,6 km de distância. Com a pandemia necessitou de uma reorganização dos pedidos de materiais e um novo cálculo para os equipamentos de proteção individual e medicamentos conforme a necessidade de cada setor.

A técnica de paramentação e desparamentação adotada pelo hospital vai de encontro com as atuais recomendações. Segundo Guimarães et al., (2020)17, para a sequência de paramentação utiliza-se o mnemônico AMOGOL: Avental, Máscara, Gorro e Luva e o mnemônico LAGOM para desparamentação: Luvas, Avental, Gorro e Máscara.

Em relação aos insumos, estudos como o de Rodrigues et al., 2020 10, também destacam os desafios concernentes à aquisição do quantitativo de materiais e equipamentos necessários para atender a demanda decorrente da pandemia. Durante a pandemia, o uso de máscaras N95 que não possui uma boa vedação também foi relatado no estudo de Góes et al., 2020 18.

CONCLUSÃO

A pandemia do COVID-19 trouxe inúmeros desafios à assistência em saúde, algo novo, repentino e desconhecido. Tem sido desafiador porém um momento muito rico de conhecimento, onde foi possível vivenciar algo singular enquanto profissionais da saúde. Em comparação às demais regiões do Brasil tivemos uma vantagem dos casos confirmados demoram a chegar em Rondônia, dando-nos uma vantagem para montar estratégias gerenciais para o enfrentamento da pandemia, capacitando os profissionais que atuariam na linha de frente contra o COVID-19.

Espera-se que o ano de 2020 seja um catalisador de mudanças duradouras que elevem o perfil dos profissionais de saúde aos olhos de um público educado que compreende a sua importância e que tenham os recursos adequados e que sejam recompensados por excelentes contribuições que dão às sociedades em todo o mundo.

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