O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) E A INCLUSÃO ESCOLAR À LUZ DO DSM-5

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ch10202412100508


Jacilene de Jesus Moraes Rodrigues1;
Mílvio da Silva Ribeiro2


RESUMO

O artigo aborda a inclusão escolar de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) à luz do DSM-5, destacando a necessidade de uma abordagem multifacetada. Inicialmente, descreve as características diagnósticas do TEA segundo o DSM-5, enfatizando os déficits na comunicação social e os comportamentos restritos e repetitivos. Em seguida, analisa os desafios da inclusão escolar, como barreiras atitudinais, adequação do currículo e capacitação de professores. Propõe estratégias de inclusão, como o Planejamento Educacional Individualizado (PEI), uso de tecnologias assistivas e criação de um ambiente escolar inclusivo. Ressalta a importância do apoio interdisciplinar e familiar, destacando a colaboração entre escola e família e o envolvimento de profissionais de saúde. Conclui que a inclusão eficaz exige compromisso contínuo, capacitação e apoio, garantindo que todos os alunos alcancem seu potencial educacional e social.

Palavras-chave: TEA; inclusão escolar; DSM-5; adaptação curricular; apoio interdisciplinar.

1 INTRODUÇÃO

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição neurológica complexa que afeta a comunicação, o comportamento e a interação social dos indivíduos, sendo um tema de grande relevância no contexto educacional atual. A crescente prevalência do TEA, somada à diversidade de manifestações desse transtorno, demanda um olhar atento e inclusivo nas práticas pedagógicas. Este artigo tem como foco a inclusão escolar de crianças com TEA à luz do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª Edição (DSM-5), documento que define critérios diagnósticos e orienta o entendimento dos transtornos mentais.

A relevância deste estudo se dá pela necessidade urgente de proporcionar um ambiente educacional inclusivo e adequado para crianças com TEA, garantindo-lhes o direito à educação de qualidade e ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades. O DSM-5, publicado pela Associação Americana de Psiquiatria em 2013, trouxe mudanças significativas na forma como os transtornos do espectro autista são diagnosticados, consolidando diversas condições anteriormente separadas em um único espectro, o que influencia diretamente nas estratégias de inclusão escolar.

A pesquisa aqui apresentada tem como objetivo analisar as diretrizes do DSM-5 relacionadas ao TEA e discutir como essas orientações podem ser aplicadas no contexto escolar para promover a inclusão efetiva. Especificamente, busca-se identificar os desafios enfrentados pelos educadores e pelas escolas, bem como propor estratégias que possam facilitar a integração de alunos com TEA no ambiente escolar. Para isso, adotamos uma abordagem qualitativa, baseada em revisão bibliográfica, a fim de proporcionar uma visão abrangente e aplicável.

O problema central deste estudo reside na dificuldade de adaptação das práticas pedagógicas tradicionais às necessidades específicas dos alunos com TEA, muitas vezes resultando em exclusão e estigmatização. Questiona-se: Como as orientações do DSM-5 podem ser efetivamente traduzidas em práticas pedagógicas inclusivas? Quais são as principais barreiras enfrentadas pelas escolas na inclusão de alunos com TEA e como superá-las? Estas perguntas guiam a reflexão e a análise ao longo do artigo.

Em síntese, este trabalho oferece uma visão panorâmica sobre o TEA e a inclusão escolar, destacando a importância do DSM-5 como ferramenta diagnóstica e orientadora. A justificativa para esta investigação está enraizada na busca por equidade educacional e no respeito aos direitos das crianças com TEA. A metodologia adotada, fundamentada na análise qualitativa e na revisão de literatura, permite explorar de forma aprofundada as nuances e complexidades do tema. Espera-se que as reflexões e propostas apresentadas contribuam para a construção de um ambiente escolar mais inclusivo e acolhedor para todos.

2 DESENVOLVIMENTO

A compreensão profunda do Transtorno do Espectro Autista (TEA) é essencial para a implementação de práticas pedagógicas inclusivas e eficazes. No desenvolvimento deste artigo, serão abordados quatro subtópicos fundamentais que visam proporcionar um entendimento abrangente sobre o TEA e suas implicações no contexto educacional. Inicialmente, será discutido o diagnóstico do TEA segundo o DSM-5, destacando as principais características e critérios diagnósticos que definem o transtorno. Em seguida, serão explorados os desafios enfrentados na inclusão escolar de crianças com TEA, analisando barreiras atitudinais, curriculares e estruturais que dificultam a integração desses alunos no ambiente escolar.

O terceiro subtópico irá focar em estratégias de inclusão escolar para alunos com TEA, propondo abordagens pedagógicas e adaptações necessárias para promover um ambiente educacional acessível e acolhedor. Serão apresentadas práticas inovadoras e recursos tecnológicos que podem facilitar o aprendizado e a interação social dos alunos com TEA. Por fim, será discutida a importância do apoio interdisciplinar e familiar no processo de inclusão escolar, ressaltando a colaboração entre educadores, profissionais de saúde e famílias para garantir um suporte adequado e contínuo.

Ao longo do desenvolvimento, serão levantadas questões e reflexões sobre como as diretrizes do DSM-5 podem ser aplicadas na prática educativa, buscando respostas para os desafios encontrados e propondo soluções viáveis. Este enfoque permitirá uma análise crítica e construtiva das práticas atuais, incentivando a adoção de medidas que promovam a inclusão efetiva e o desenvolvimento integral das crianças com TEA.

2.1 Características diagnósticas do TEA segundo o DSM-5

O DSM-5, ou Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª Edição, define o Transtorno do Espectro Autista (TEA) com base em dois critérios principais: déficits na comunicação social e interação, e comportamentos restritos e repetitivos. Estes critérios ajudam a identificar e compreender a ampla gama de manifestações do TEA, fornecendo uma base para diagnósticos precisos e intervenções adequadas.

O primeiro critério, déficits na comunicação social e interação, refere-se às dificuldades significativas que indivíduos com TEA enfrentam ao interagir com outras pessoas. Esses déficits podem incluir uma falta de reciprocidade social, onde o indivíduo pode não responder adequadamente a interações sociais, dificuldades na conversação que se manifestam como uma inabilidade em iniciar ou manter diálogos, e uma compreensão limitada das normas sociais que guiam as interações humanas.

Exemplos práticos desses déficits incluem não responder ao nome, evitar o contato visual, e não entender gestos ou expressões faciais. Por esta razão, um dos objetivos dos tratamentos direcionados a pessoas com autismo, segundo Souza et al. (2019, p. 4), “é maximizar as habilidades sociais e comunicativas da criança por meio da redução dos sintomas do autismo e do suporte ao desenvolvimento e aprendizado”.

O segundo critério, comportamentos restritos e repetitivos, envolve a presença de padrões de comportamento que são rígidos e repetitivos. Esses comportamentos podem incluir movimentos motores repetitivos, como balançar ou bater as mãos, uma adesão inflexível a rotinas, interesses altamente restritos e específicos, e uma resposta atípica a estímulos sensoriais, como uma hipersensibilidade a sons ou texturas.

Essas características podem impactar significativamente o funcionamento diário e a adaptação escolar dos alunos com TEA, tornando essencial o desenvolvimento de estratégias educacionais que considerem e acomodem essas necessidades específicas. De acordo com Da Cruz Nascimento (2023, p.25), “ao trabalhar os comportamentos restritos e repetitivos, busca-se expandir as possibilidades da criança, tornando suas interações e comportamentos mais flexíveis e diversificados”.

2.2 Desafios da inclusão escolar de crianças com TEA

A inclusão escolar de crianças com TEA enfrenta diversos desafios, sendo um dos mais significativos as barreiras atitudinais e o preconceito. Muitos profissionais da educação e alunos ainda possuem um entendimento limitado sobre o TEA, o que pode resultar em atitudes excludentes e até mesmo em bullying. Conforme De Almeida (2021, p. 2), o preconceito e falta de conhecimento dificultam a integração dos alunos com TEA, que frequentemente enfrentam isolamento social e uma falta de apoio adequado no ambiente escolar. Promover a conscientização e a empatia é crucial para transformar essas atitudes e criar um ambiente mais inclusivo e acolhedor.

Outro desafio crucial é a adequação do currículo e das metodologias de ensino. As abordagens educacionais tradicionais muitas vezes não atendem às necessidades dos alunos com TEA, que podem necessitar de um ensino mais estruturado e individualizado. Adaptações curriculares são essenciais para permitir que esses alunos alcancem seu pleno potencial. Métodos diferenciados, como o uso de tecnologias assistivas e estratégias visuais, podem ser altamente eficazes. A flexibilidade na abordagem pedagógica é fundamental para responder às diversas formas de aprendizado e interação dos alunos com o TEA.

A capacitação de professores é um componente vital para a inclusão efetiva de alunos com TEA. Educadores precisam de formação contínua para entender as características do TEA e para desenvolver estratégias de ensino que promovam a inclusão. Programas de capacitação devem focar em técnicas de manejo comportamental, estratégias de comunicação e o uso de recursos adaptativos. Além disso, é importante que os professores aprendam a criar ambientes de aprendizagem que sejam sensíveis às necessidades sensoriais e sociais dos alunos com TEA. A preparação adequada dos professores pode fazer uma diferença significativa na vida escolar desses alunos, promovendo uma educação mais inclusiva e equitativa.

2.3 Estratégias de inclusão escolar para alunos com TEA

A implementação de um Planejamento Educacional Individualizado (PEI) é essencial para a inclusão eficaz de alunos com TEA. O PEI deve ser desenvolvido por uma equipe multidisciplinar que inclua pais, professores, e profissionais de saúde. Este documento se trata de um planejamento detalhado que visa adaptar o currículo e o ambiente escolar para atender às necessidades específicas de cada aluno. Segundo Tannús-Valadão, et al. ( 2018, p. 6), este documento quebra uma certa barreira existente no modelo educativo atual e faz isso “auxiliando o currículo oficial, especificando e estruturando o tipo de atividade e apontando qual apoio profissional é conveniente para um estudante PAEE3, de modo que […] haja estímulo no processo de ensino-aprendizagem.” 

O uso de tecnologias assistivas pode transformar significativamente a experiência educacional dos alunos com TEA. Aplicativos educacionais, softwares de comunicação aumentativa e alternativa, e dispositivos sensoriais são exemplos de tecnologias que podem facilitar o aprendizado e a comunicação. Essas ferramentas ajudam os alunos a superar barreiras de comunicação, permitindo que eles participem mais ativamente das atividades escolares e interajam com seus colegas e professores. Além disso, tecnologias assistivas promovem a autonomia dos alunos com TEA, capacitando-os a explorar e aprender de maneira mais independente e personalizada.

Criar um ambiente escolar inclusivo vai além de adaptações físicas; envolve também mudanças sociais e culturais dentro da escola. Reduzir estímulos sensoriais excessivos, como ruídos altos e luzes brilhantes, pode ajudar os alunos com TEA a se sentirem mais confortáveis e focados. Promover atividades que incentivem a interação entre todos os alunos, independentemente de suas habilidades, é fundamental para construir um senso de comunidade e inclusão. Programas de sensibilização e conscientização para alunos, professores e funcionários da escola são igualmente importantes, pois fomentam uma cultura de respeito e compreensão, combatendo o preconceito e as barreiras atitudinais que dificultam a verdadeira inclusão.

2.4 A importância do apoio interdisciplinar e familiar

Segundo Ambrosim, et al. (2024) A parceria entre a escola e a família é crucial para a eficácia da inclusão do aluno autista. Os pais podem oferecer informações importantes sobre as necessidades do aluno, contribuindo para a criação de estratégias que podem ser implementadas tanto no ambiente escolar quanto no doméstico. Essa parceria garante que as estratégias pedagógicas sejam adaptadas de acordo com as especificidades de cada aluno, promovendo um ambiente de aprendizado mais acolhedor e eficiente.

O envolvimento de profissionais de saúde, como psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais, é crucial no apoio a alunos com TEA. Esses especialistas oferecem intervenções terapêuticas que complementam o ensino, abordando questões como habilidades sociais, comunicação e regulação sensorial. A colaboração entre educadores e profissionais de saúde assegura que o aluno receba um suporte abrangente, integrando cuidados educativos e terapêuticos.

Redes de apoio, incluindo ONGs, grupos de apoio a pais e iniciativas governamentais, são fundamentais para a inclusão escolar de crianças com TEA. Essas redes oferecem recursos, informações e suporte emocional, auxiliando tanto as famílias quanto as escolas. Ao promover a capacitação e a sensibilização sobre o TEA, essas organizações contribuem para a construção de um ambiente escolar mais inclusivo e acolhedor.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inclusão escolar de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA), à luz do DSM-5, exige uma abordagem multifacetada e integrada. Compreender as características do TEA, como os déficits na comunicação social e os comportamentos restritos e repetitivos, é fundamental para desenvolver estratégias educacionais eficazes. A adaptação curricular, incluindo o Planejamento Educacional Individualizado (PEI) e o uso de tecnologias assistivas, é essencial para atender às necessidades específicas desses alunos e promover um ambiente de aprendizado inclusivo.

A capacitação de profissionais da educação é um aspecto crucial para a inclusão efetiva. Educadores precisam estar bem informados sobre o TEA e equipados com técnicas e estratégias para apoiar o desenvolvimento acadêmico e social dos alunos. Programas de formação contínua e a colaboração com profissionais de saúde são fundamentais para garantir que os educadores possam responder adequadamente às diversas necessidades dos alunos com TEA, proporcionando um ensino mais personalizado e eficaz.

O forte apoio interdisciplinar e familiar também é vital para o sucesso da inclusão escolar. A parceria entre escola e família, juntamente com o envolvimento de profissionais de saúde, cria uma rede de suporte abrangente que pode atender às variadas necessidades dos alunos com TEA. Redes de apoio, como ONGs e grupos de apoio a pais, oferecem recursos adicionais e suporte emocional, contribuindo para um ambiente escolar mais inclusivo e acolhedor.

Ao comparar os dados discutidos ao longo do estudo com o objetivo inicial de promover a inclusão e a igualdade de oportunidades, fica evidente que um compromisso contínuo e colaborativo é necessário. A reflexão final destaca que, ao adotar essas abordagens multifacetadas, podemos garantir que todos os alunos, independentemente de suas necessidades específicas, possam alcançar seu pleno potencial educacional e social. Portanto, as considerações finais reiteram a importância de uma abordagem inclusiva e integrada, sublinhando a relevância e a urgência do estudo realizado.


3Público-alvo da Educação Especial (PAEE); Segundo a legislação brasileira, o atual PAEE é composto por pessoas com deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação (Brasil, 2011).


REFERÊNCIAS

______. Decreto n. 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre o atendimento educacional especializado. Brasília: Presidência da República/Casa Civil/Subchefia para Assuntos Jurídicos, 2011.

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1Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da Educação, Instituição: Faculdade Interamericana de Ciências Sociais (FICS), Endereço: Igarapé-Miri – Pará, Brasil, E-mail: jacilenedejesusm@gmail.com
2Doutor em Geografia, Instituição: Universidade Federal do Pará (UFPA), Endereço: Belém – Pará, Brasil ,E-mail: milvio.geo@gmail.com, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1118-7152