CIBERCRIMES: ESTELIONATO VIRTUAL NO DIREITO BRASILEIRO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa1020211112042


Samya Gama do Vale1


RESUMO

A pesquisa aborda o tema dos cibercrimes, com foco no estelionato virtual no contexto do direito brasileiro. O objetivo principal é analisar os elementos que compõem a prática do estelionato virtual, investigando sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro e a evolução das normas que regem esse delito. Além disso, a pesquisa discute o surgimento do estelionato virtual, suas características distintivas e as punições previstas na legislação atual. O estudo também busca compreender os crimes virtuais no Brasil e avaliar as medidas preventivas voltadas às vítimas, visando à redução e inibição da prática desse crime, que tem crescido com a digitalização das transações cotidianas. O fortalecimento de políticas de educação digital e a criação de mecanismos de proteção para os usuários, especialmente os mais vulneráveis, são estratégias que devem ser adotadas em conjunto com a aplicação das normas penais. A conclusão destaca a necessidade de políticas educativas e jurídicas mais efetivas para mitigar os danos causados por esse tipo de fraude no ambiente cibernético.

Palavras-chave: Cibercrimes. Estelionato Virtual. Direito Brasileiro.  

ABSTRACT

The research addresses the topic of cybercrimes, focusing on virtual fraud in the context of Brazilian law. The main objective is to analyze the elements that make up the practice of virtual fraud, investigating its insertion in the Brazilian legal system and the evolution of the rules that govern this crime. In addition, the research discusses the emergence of virtual fraud, its distinctive characteristics and the punishments provided for in current legislation. The study also seeks to understand virtual crimes in Brazil and evaluate preventive measures aimed at victims, aiming to reduce and inhibit the practice of this crime, which has grown with the digitalization of everyday transactions. Strengthening digital education policies and creating protection mechanisms for users, especially the most vulnerable, are strategies that should be adopted in conjunction with the application of criminal laws. The conclusion highlights the need for more effective educational and legal policies to mitigate the damage caused by this type of fraud in the cyber environment.

Keywords: Cybercrimes. Virtual Fraud. Brazilian Law.

1 INTRODUÇÃO

A pesquisa aborda o tema dos cibercrimes, com foco no estelionato virtual no contexto do direito brasileiro. Seus objetivos incluem a análise dos fatores associados à prática do estelionato virtual, a investigação dos crimes cibernéticos no Brasil e o entendimento do crime de estelionato conforme previsto no ordenamento jurídico do país. Além disso, a pesquisa explora o surgimento do estelionato virtual e as formas de punição aplicáveis no direito brasileiro.

O problema de pesquisa é: Quais são as medidas preventivas direcionadas às vítimas de estelionato virtual que podem contribuir para a redução e inibição desse tipo de crime?

Com o avanço das tecnologias digitais e a crescente dependência da internet nas transações cotidianas, surgem novos desafios para o Direito, especialmente no que se refere à criminalidade cibernética. Entre os diversos tipos de crimes digitais, o estelionato virtual tem ganhado destaque por seu impacto econômico e social, afetando milhares de vítimas que, frequentemente, têm suas informações pessoais e financeiras exploradas por meio de fraudes eletrônicas. O estelionato, tradicionalmente tipificado no artigo 171 do Código Penal Brasileiro, sofreu adaptações legislativas com a Lei nº 14.155/2021, que aumentou a pena para crimes cometidos com o uso de meios digitais.

A expansão do ambiente virtual e a facilidade com que criminosos podem agir de forma anônima e sem barreiras territoriais tornam o estelionato virtual um crime de difícil controle. Neste contexto, o Direito brasileiro tem buscado se adequar às novas modalidades de cibercrime, criando normas que punam adequadamente os infratores e protejam os usuários. Entretanto, a rápida evolução das tecnologias e o caráter transnacional desses crimes impõem a necessidade de uma constante revisão das legislações e da cooperação internacional para garantir a eficácia das punições e a prevenção de novos delitos.

Dessa forma, este estudo pretende analisar a evolução legislativa no combate ao estelionato virtual no Brasil, avaliando a adequação das normas vigentes às características desse crime e os desafios enfrentados pelo sistema judiciário brasileiro para sua efetiva aplicação. A metodologia da pesquisa é do tipo bibliográfica, utilizando estudos científicos, doutrina e leis acerca do tema.

2 CRIMES CIBERNÉTICOS

Com o avanço da tecnologia, a internet se tornou uma importante ferramenta no mundo globalizado, pois tem se mostrado como um importante instrumento na relação entre as pessoas e comércio assim como na transmissão de informações. Contudo, a internet, juntamente com os benefícios, traz em mesma proporção uma quantidade infinita de ilícitos, que vêm aumentando assustadoramente (Santos et. al., 2017, p. 73). Desse modo, apesar da internet ser uma ferramenta de integração global, proporcionando o relacionamento de pessoas independente da distância, acaba por dar margem ao cometimento de vários delitos.

Nesse contexto, destaca-se que as pessoas perderam parcialmente sua privacidade, ficando sujeita a riscos decorrentes da exposição excessiva, ou até mesmo de danos a sua moral, embora seja inegável os pontos benéficos, como a integração cibernética, o armazenamento e coordenação de dados e a facilitação de atividades e processos. Assim, tem se demonstrado também como um meio para o cometimento de delitos informáticos, visto que serve de instrumento para a prática delitiva (Spinieli, 2018, p. 24).

Faz-se necessário assim, esclarecer a definição de crimes cibernéticos, a qual se configura como ampla, pois, abrange uma variedade de condutas delitivas praticadas por meio da utilização de tecnologias da informação e comunicação. Os crimes cibernéticos são condutas delitivas que ocorrem por meio do uso de tecnologias de informação e comunicação, onde o meio digital é utilizado como instrumento para a prática de infrações penais. Esses delitos são cometidos de maneira virtual, envolvendo a utilização de dispositivos eletrônicos e a internet para a realização de atividades ilegais. Com o avanço tecnológico e a ampla adoção da internet em diversas esferas da sociedade, os crimes cibernéticos se tornaram uma preocupação global. (Almeida, 2018, p. 97).

Conforme aponta Kshetri (2017, p. 144), “os crimes cibernéticos não estão restritos a uma jurisdição específica, e os criminosos podem operar virtualmente de qualquer lugar, dificultando a cooperação internacional e a aplicação da lei”.

Destaca-se ainda como característica dos crimes cibernéticos é a utilização de técnicas e ferramentas específicas, pois, que comete tais crimes, utilizam métodos sofisticados para obter acesso indevido a sistemas, roubar informações confidenciais, disseminar malware, realizar fraudes e outras atividades ilícitas.

De acordo com Maues et. al (2018, p. 45) a internet trouxe inúmeros resultados positivos para o mundo globalizado, seja na perspectiva política, econômica, social ou cultural. Porém, aspectos negativos também podem ser mencionados, como por exemplo, a proliferação dos chamados crimes cibernéticos, tais como, a pornografia infantil, práticas de racismo, fraudes em contratos eletrônicos, crimes contra a honra, furtos, dentre outros crimes virtuais. A internet, portanto, tem sido o instrumento utilizado para a prática e proliferação dos chamados crimes cibernéticos, ou cybercrimes, que vão desde crimes contra a honra, a crimes de maior dimensão social, como a pornografia infantil.

Menciona-se ainda que, as provas devem ser admitidas desde que respeitado todos os meios legais, a fim de que sejam provados os fatos verdadeiramente. Sendo de extrema importância, identificar a origem, conceito, finalidade, destinatário e o objeto utilizados para se conseguir a prova utilizada (Souza, 2012).

A investigação dos crimes virtuais é feita através de uma análise técnica, que permite verificar a autoria e materialidade dos crimes praticados por meio de uma rede que interliga os computadores (Wendt, 2017).

Com o avanço da tecnologia e assim a utilização da internet pela população, o cometimento de crimes virtuais tem crescido nos últimos anos, ocasionando assim, a criação de delegacias especializadas a investigar determinados crimes, porém, se no local em que ocorreu o crime virtual não tiver uma Delegacia Especializada, poderá ser registrado um boletim na delegacia mais próxima da residência da vítima.

Isso porque as provas devem ser colhidas por profissionais especializados, assim como um perito capacitado, pois demanda tempo, pela complexidade dos procedimentos.

De acordo com Regis (2011, p. 13):

Além da coleta de provas é necessário também se chegar até ao autor do delito, e para se chegar até ele existe um caminho onde há uma burocracia enorme que dificulta muito o andamento da investigação, essa dificuldade decorre, devido ao endereço IP da máquina do autor, ser uma informação protegida pelo sigilo de dados (Art.5 da CF), assim, para poder se comprovar os dados referentes ao cadastro do IP, faz-se necessária autorização judicial para as autoridades acessarem as informações da pessoa que proferiu a injúria, calúnia ou difamação.

Portanto, ao se conectar à internet, o servidor de acesso à rede, atribui um endereço ao computador, que funcionará como sua identidade. Nesse processo, o IP desenvolve um papel relevante, no prazo em torno de 30 dias, pois, identificará quem são os indivíduos que se conectaram na internet naquele momento e lugar, ajudando na identificação dos autores.

Durante esse processo, há duas posições no ordenamento jurídico brasileiro, pois, há os que defendem que a quebra desse sigilo do IP fere o que o artigo 5⁰, inciso XII, da Constituição o qual declara que: “É inviolável o sigilo das correspondências e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. Por outro lado, há os que defendem o posicionamento de que o artigo 5⁰, inciso IV, da CF/88, determina que: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (Brasil, 1988).

2.1 A lei dos crimes cibernéticos (lei nº 12.737/2012) – O caso Carolina Dieckman

A Lei nº 12.737, sancionada em 30 de novembro de 2012, é um marco na legislação brasileira que trata dos crimes cibernéticos. Conhecida popularmente como a “Lei Carolina Dieckmann”, a norma foi criada em resposta ao aumento de delitos cometidos no ambiente virtual, visando proteger os usuários da internet contra ações nocivas e garantir a integridade de dados pessoais. O nome da lei se deve ao famoso caso da atriz Carolina Dieckmann, que em 2012 teve fotos íntimas vazadas na internet, o que chamou a atenção da sociedade e gerou um clamor por medidas mais eficazes de proteção à privacidade.

A lei tipifica diversos crimes relacionados à invasão de dispositivos eletrônicos, à violação de dados e à disseminação de conteúdos não autorizados. Um dos pontos centrais da legislação é o artigo 154-A, que estabelece a penalidade para quem invadir um dispositivo informático alheio, seja com a intenção de obter, adulterar ou destruir dados. As penas podem variar de três meses a um ano de detenção, além de multa, dependendo da gravidade do ato. Este dispositivo legal surgiu como uma resposta direta a casos como o de Carolina Dieckmann, que evidencia as vulnerabilidades enfrentadas por indivíduos em um mundo cada vez mais digital (Costa, 2020).

O caso de Carolina Dieckmann destacou a necessidade de um marco legal que protegesse não apenas as figuras públicas, mas todos os cidadãos de ações criminosas que possam ocorrer na internet. A repercussão do episódio mobilizou a opinião pública e evidenciou a fragilidade das legislações existentes em relação à proteção da privacidade e à segurança de dados pessoais. Conforme relata Ribeiro (2019), o episódio não apenas expôs a atriz a constrangimentos, mas também gerou uma reflexão profunda sobre os limites da privacidade na era digital e a responsabilidade dos provedores de serviços online.

A promulgação da Lei nº 12.737/2012 foi um passo importante, mas a implementação e a efetividade das punições ainda são questões que desafiam as autoridades. Apesar de a lei prever penalidades, a dificuldade de investigação e a identificação dos autores de crimes cibernéticos muitas vezes limitam a aplicação das sanções. Além disso, a evolução constante da tecnologia traz novos desafios que exigem uma atualização contínua da legislação. Segundo Almeida (2021), a luta contra os crimes cibernéticos é um processo dinâmico, e é fundamental que as leis acompanhem o avanço tecnológico para garantir a proteção dos cidadãos.

Além da lei, o caso Carolina Dieckmann também trouxe à tona a importância da educação digital e da conscientização sobre os riscos envolvidos na utilização da internet. A prevenção, por meio da informação e do conhecimento, é uma ferramenta essencial para que os usuários estejam mais preparados para evitar situações de vulnerabilidade. De acordo com Souza (2022), iniciativas de conscientização são cruciais para formar cidadãos mais críticos e atentos aos seus direitos e deveres no ambiente digital.

Em conclusão, a Lei nº 12.737/2012 representa um avanço significativo na proteção dos direitos dos cidadãos no espaço virtual, especialmente em um contexto onde crimes cibernéticos se tornaram uma preocupação crescente. O caso de Carolina Dieckmann catalisou a discussão sobre a necessidade de legislação específica e a importância da proteção da privacidade. No entanto, é necessário que a lei seja efetivamente aplicada e que haja um esforço contínuo para educar a população sobre os riscos da internet e a importância de proteger seus dados pessoais.

2.2 O Marco Civil da Internet (lei nº 12.965/2014) e a proteção de dados dos usuários

Em 2014, foi sancionada a Lei nº 12.965, também conhecida como a Lei do Marco Civil da Internet, que trouxe princípios, direitos, garantias e deveres dos usuários da internet. O crime de estelionato tipificado no artigo 171 do Código Penal brasileiro, obter para si ou para outra vantagem ilícita mediante ardil, artificio, meio fraudulento em prejuízo de outrem. A principal característica do estelionato é manter a vítima em erro e deixá-la no prejuízo. No que tange o estelionato virtual, a única diferença havida entre o estelionato virtual e o real, é o modus operandi, pois o virtual necessita do uso de um equipamento de informática. Para este não há qualquer tipificação no ordenamento jurídico, a qual não pode haver qualquer condenação.

Maia (2017, p. 76), afirma que o Marco Civil se assenta em três pilares: “a garantia da neutralidade da rede; proteção à privacidade do usuário da Internet; e a garantia da liberdade de expressão”.

O Marco Civil da Internet, estabelecido pela Lei nº 12.965/2014, representa um avanço significativo na regulamentação do uso da internet no Brasil. Essa legislação foi criada com o intuito de garantir os direitos dos usuários na rede, promovendo a liberdade de expressão, a privacidade, e a proteção de dados pessoais. A lei surgiu em um contexto em que a expansão da internet e a crescente digitalização das relações sociais e comerciais levantaram preocupações sobre a segurança e a privacidade dos dados dos usuários (Mendes, 2020).

Um dos principais objetivos do Marco Civil da Internet é assegurar a proteção da privacidade e dos dados pessoais dos internautas. De acordo com o artigo 7º, a lei estabelece que é assegurado ao usuário o direito à proteção de seus dados pessoais, sendo obrigatória a obtenção de consentimento para a coleta, uso e tratamento dessas informações. Essa abordagem reforça a ideia de que os dados dos usuários são uma extensão de sua identidade e, portanto, devem ser tratados com respeito e cuidado. Segundo Silva (2021), essa proteção é crucial em um cenário onde dados pessoais são frequentemente utilizados para fins comerciais sem o consentimento adequado dos titulares.

Além disso, a lei também define a responsabilidade dos provedores de serviço em relação à segurança dos dados que armazenam. O artigo 14 estabelece que esses provedores são responsáveis por danos causados por conteúdo gerado por terceiros, salvo se comprovada a ausência de culpa. Essa disposição busca garantir que os provedores adotem medidas eficazes de segurança e que os usuários sejam informados sobre as políticas de privacidade e de proteção de dados aplicáveis a suas informações pessoais (Costa, 2022).

O Marco Civil da Internet também criou um ambiente propício para a discussão e a formulação de políticas públicas relacionadas à proteção de dados. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que entrou em vigor em 2020, é um desdobramento do Marco Civil, complementando as disposições sobre a proteção de dados pessoais. A LGPD estabelece princípios e diretrizes mais abrangentes, garantindo um maior controle dos usuários sobre suas informações e impondo obrigações rigorosas às empresas que lidam com dados pessoais. A relação entre o Marco Civil e a LGPD reforça a necessidade de um marco regulatório robusto e coeso para a proteção da privacidade e dos dados na era digital (Almeida, 2021).

A efetividade do Marco Civil da Internet na proteção de dados dos usuários também depende da conscientização e da educação digital. Muitos usuários ainda não estão plenamente cientes de seus direitos ou das implicações do compartilhamento de seus dados pessoais na internet. Portanto, campanhas de conscientização são fundamentais para empoderar os cidadãos e permitir que façam escolhas informadas sobre a privacidade e a segurança de suas informações. Como observado por Oliveira (2022), a educação digital deve ser parte integrante da discussão sobre proteção de dados, capacitando os usuários a compreenderem melhor os riscos envolvidos na navegação online.

Em síntese, o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) representa um marco significativo na proteção dos direitos dos usuários na internet, com ênfase na proteção de dados pessoais e na privacidade. A inter-relação com a LGPD e a necessidade de conscientização digital reforçam a importância de uma abordagem integrada para garantir a segurança e a privacidade dos internautas. Embora a legislação tenha avançado, a implementação efetiva das normas e a educação dos usuários são essenciais para assegurar que os direitos digitais sejam respeitados e protegidos.

3 CRIME DE ESTELIONATO

O estelionato é um crime tipificado no artigo 171, do Código Penal. No âmbito virtual, o estelionato é praticado pela conduta do agente de “induzir ou manter a vítima em erro, e com isso, obter vantagem ilícita, para si ou para outrem”. Portanto, o objetivo do agente é iludir a vítima, induzi-la ao erro, para que voluntariamente, ela entregue o bem, valores ou informe seus dados pessoais, os quais possibilitará ao agente encontrar formas de obter vantagens nome da vítima.

3.1 Crime de Estelionato virtual no ordenamento jurídico brasileiro

Esse crime se configura majoritariamente através da possibilidade em que o autor delituoso encontra para obter proveito de modo ilícito, para si, ou para outrem, se utilizando de meios fraudulentos para realizar tal ato. Diante do ordenamento jurídico brasileiro, o sujeito passivo do estelionato será a vítima que sofreu o prejuízo, devendo ser pessoa certa e determinada, embora muitas vezes exista mais de um indivíduo envolvido na relação e o ativo é o indivíduo que o comete de forma dolosa, com livre e consciente vontade, podendo de modo diverso para alcançar seus fins.

Vale ressaltar que o estelionato virtual ainda é recente dentro dos tribunais brasileiros, apesar de seu cometimento ter sido bastante visto nos últimos anos, em que se deve a evolução da tecnologia que são identificados por meios mais eficazes para a realização.

O estelionato virtual pode ser realizado como meio de: venda de produtos falsificados ou inexistentes em plataformas de comércio eletrônico, o oferecimento de oportunidades de investimento falsas em criptomoedas ou outros esquemas de pirâmide, e a aplicação de golpes em redes sociais, onde os criminosos se passam por pessoas conhecidas das vítimas para solicitar dinheiro ou informações pessoais.

Destaca-se o modo de realizar tal crime por meio da utilização de sites falsos com a mesma aparência e registro semelhante dos originais, para a captação de dados do usuário. Essa prática é conhecida como Typosquatting, em que os agentes estruturam uma página web na internet e registram o domínio idêntico ao de alguma grande empresa conhecida, resultando, por exemplo em: site original – www.walmart.com; site falso – www.wallmart.com (Barreto, 2021, p. 83).

Segundo Ataide (2017, p. 172) ocorre crime de estelionato virtual quando os infratores criam links, e-mails, etc., falsos, com o objetivo de não ser identificado e consequentemente prometem fazer algo que sabem não ser possível fazer, mas fazem a promessa em troca de alguma vantagem que em grande parte das vezes é pecuniária. Em síntese, o estelionato virtual se consuma com o induzimento da vítima, utilizando-se de meios digitais, aproveitando-se das brechas que esses lhe permitem para conseguir obter vantagens.

A invasão do correio eletrônico da vítima também é uma forma de cometer esse crime, especialmente aquelas que tem o costume de consultar saldos e extratos bancários pelo computador. Nesse caso em específico, o estelionatário encontra uma maneira de clonar a página da internet banking e fazer com que a vítima tente fazer o acesso a conta, sem saber que os danos inseridos na dita página serão interceptados por um terceiro de má-fé. Outro tipo bem comum é praticado por pessoas de menor saber informático, os quais se utilizam de crenças populares ou correntes de sorte, para que ao final a vítima deposite determinada importância em dinheiro para que obtenha aquilo que foi veiculado, sendo garantido a esta que ao adquirir o almejado a importância lhe será devolvida, fato que não ocorre (Feitoza, 2012, p. 92).

Contudo, o cometimento do referido crime é perfeitamente realizado através da rede mundial de computadores. Aliás, tem sido bem comum que pessoas sejam vítimas de golpes de estelionatários na internet (Freitas, 2009, p. 23). Percebe-se, pois, que cada vez é mais frequente a prática de estelionato virtual, o que se deve principalmente como já analisado, ao avanço da tecnologia e popularização da internet.

De acordo com Cruz e Rodrigues (2018, p. 26) quando falam que o estelionato na internet tem se tornado cada vez mais frequente, um exemplo são os indivíduos que maliciosamente produzem sites de vendas com informações falsas de modo a induzir as vítimas a pagarem por produtos que sequer existem. Como informam os autores tem sido comum, a prática de estelionato no meio digital, e os autores, se utilizam de informações falsas para manipular a vítima e fazê-la acreditar em uma suposta vantagem.

Destaca-se que o estelionato virtual tende a ser praticado por pessoas com mais conhecimentos em informática. A única diferença entre o estelionato virtual e o estelionato comum, é o modo pelo qual o agente irá operar, pois o estelionato virtual é realizado em ambiente virtual e o estelionato comum em ambiente físico.

A respeito de sua previsão, o Código Penal não faz menção ao crime de estelionato virtual em seu texto, a conduta descrita no art. 171 do diploma diz respeito tão somente ao delito praticado diretamente pelo infrator, isto é, obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, não importando aqui se isto foi realizado por intermédio do computador ou da internet (Feitoza, 2012, p. 21).

Desse modo, o impasse que surge quando da tipificação do crime de estelionato virtual, é a ausência de norma penal específica. A própria Constituição Federal no art. 5º, inc. XXXIX, firma o princípio da legalidade, pelo qual não a crime sem lei anterior que venha para defini-lo, nem pena sem prévia previsão legal. A natureza jurídica desse dispositivo acaba por limitar a pretensão punitiva do estado, por inexistir tipificação expressa para o crime de estelionato virtual, em alguns casos seus adeptos são absolvidos devido a esta brecha deixada pelo Código Penal que datado de 1940 é antiquado para os dias atuais (Feitoza, 2012, p. 32).

Contudo, torna-se necessário o aprimoramento da legislação para enfrentar o estelionato virtual, considerando a dinamicidade e a evolução constante dos crimes cibernéticos. A criação de leis específicas que tipifiquem e punam de forma adequada as práticas criminosas no ambiente virtual é um passo importante para a efetividade do combate a esse tipo de crime.

4 PROJETOS DE LEI SOBRE O TEMA   

O avanço tecnológico e a crescente digitalização das interações sociais e comerciais trouxeram consigo um aumento significativo no número de crimes cometidos no ambiente virtual. Entre os crimes cibernéticos, o estelionato virtual tem ganhado destaque, especialmente pela sua natureza fraudulenta e pelo impacto financeiro e emocional que causa às vítimas. O estelionato, tipificado no artigo 171 do Código Penal Brasileiro, consiste em obter vantagem ilícita, induzindo alguém em erro, por meio de artifícios ou meios fraudulentos. Com a digitalização, esse tipo de crime migrou para o ambiente virtual, exigindo que o legislador adaptasse as normas para coibir essa nova modalidade de fraude.

No Brasil, a Lei nº 14.155, sancionada em 2021, introduziu importantes alterações no Código Penal, estabelecendo agravantes para o crime de estelionato praticado por meio eletrônico ou digital, aumentando a pena em caso de utilização de informações fornecidas por dispositivos eletrônicos. A mudança legislativa visa adequar o ordenamento jurídico à realidade dos crimes digitais, uma vez que os crimes cometidos no ambiente cibernético muitas vezes envolvem esquemas de difícil rastreamento, atingindo muitas vítimas em pouco tempo (Brasil, 2021).

Além dessa lei, diversos projetos de lei tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de tornar ainda mais rigorosa a punição para os cibercrimes, em especial o estelionato virtual. Um dos exemplos é o Projeto de Lei nº 4554/2020, que propõe medidas mais efetivas para a responsabilização criminal e civil de infratores no ambiente digital, além de prever a criação de mecanismos de proteção e conscientização da população quanto aos riscos de golpes eletrônicos (Câmara dos Deputados, 2020). O projeto busca, entre outras coisas, equiparar as punições aplicadas a crimes cibernéticos àquelas já estabelecidas para crimes cometidos no ambiente físico, ampliando a abrangência das investigações e das penalidades.

Essas iniciativas legislativas refletem a preocupação do legislador brasileiro com o aumento dos crimes digitais e a necessidade de proteger os cidadãos no ambiente virtual. O estelionato virtual, que envolve práticas como fraudes bancárias, vendas falsas em plataformas digitais e golpes de phishing, tem prejudicado uma parcela significativa da população, sobretudo os mais vulneráveis, como idosos e pessoas com menor acesso à educação digital. Assim, a adaptação das leis e a criação de novos projetos são passos essenciais para garantir a segurança jurídica e combater de forma eficaz esses crimes (Santos, 2020).

Outro ponto relevante abordado nos projetos de lei sobre cibercrimes é a necessidade de cooperação internacional para combater o estelionato virtual. Devido à natureza transnacional da internet, muitos crimes são cometidos por indivíduos ou grupos localizados fora do território brasileiro, o que dificulta a investigação e a responsabilização. Nesse sentido, iniciativas como o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) e acordos de cooperação internacional são fundamentais para enfrentar esses desafios, estabelecendo diretrizes para o compartilhamento de informações entre nações e a agilização de processos investigativos (Vasconcellos, 2020).

Portanto, os projetos de lei sobre cibercrimes, com especial atenção ao estelionato virtual, mostram-se imprescindíveis para o enfrentamento das novas modalidades de criminalidade. A legislação brasileira tem avançado no sentido de fortalecer o arcabouço jurídico, mas ainda há muito a ser feito para que a sociedade digital seja devidamente protegida. A educação digital e a conscientização pública são fundamentais para prevenir crimes virtuais, enquanto o aprimoramento das normas jurídicas e a cooperação internacional são essenciais para garantir a punição dos infratores e a segurança do ambiente virtual.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa evidenciou que o estelionato virtual, como uma das principais formas de cibercrime, tem desafiado o sistema jurídico brasileiro a adaptar suas normas para enfrentar as particularidades e a complexidade dos crimes cometidos no ambiente digital. A evolução tecnológica proporcionou novas oportunidades para a prática de fraudes, exigindo uma resposta legislativa adequada e eficaz. Nesse contexto, a Lei nº 14.155/2021, que agrava as penas para crimes de estelionato cometidos por meio eletrônico, representa um avanço importante no combate a esses delitos, embora ainda seja necessário o aprimoramento contínuo das ferramentas legais para lidar com o cenário dinâmico da criminalidade virtual.

Além das medidas legislativas, a pesquisa também ressalta a importância de uma maior conscientização da sociedade sobre os riscos associados ao ambiente digital, uma vez que a prevenção desempenha um papel crucial na redução da incidência desses crimes. O fortalecimento de políticas de educação digital e a criação de mecanismos de proteção para os usuários, especialmente os mais vulneráveis, são estratégias que devem ser adotadas em conjunto com a aplicação das normas penais.

Por fim, conclui-se que o combate ao estelionato virtual requer uma abordagem multidisciplinar, que inclua, além da legislação e da educação digital, uma cooperação internacional efetiva para garantir que criminosos que atuam além das fronteiras nacionais possam ser responsabilizados. Dessa forma, o Brasil estará mais preparado para enfrentar os desafios impostos pelos crimes cibernéticos, assegurando a proteção de seus cidadãos no ambiente digital e reforçando o direito à segurança no uso de tecnologias da informação.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Gabriela Pinheiro. Crimes Cibernéticos: uma análise da legislação brasileira e perspectivas de prevenção. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade de Brasília, 2018.

ALMEIDA, J. F. Crimes Cibernéticos e a Lei Carolina Dieckmann. São Paulo: Editora Atlas, 2021.

ALMEIDA, J. F. Proteção de Dados e Marco Civil da Internet: Uma Análise Crítica. São Paulo: Editora Atlas, 2021.

ATAÍDE, Amanda Albuquerque de. Crimes Virtuais: uma análise da impunidade e dos danos causados às vítimas. Maceió, 2017. Disponível em: http://www.faaiesa.edu.br/aluno/arquivos/tcc/tcc_amanda_ataide.pdf. Acesso em: 27 Maio 2024.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

BRASIL. Lei nº 14.155, de 27 de maio de 2021. Altera o Código Penal e o Código de Processo Penal, para agravar a pena de crimes cometidos por meio eletrônico, digital ou simulado. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 maio 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2021/Lei/L14155.htm. Acesso em: 22 out. 2024.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei nº 4554/2020. Modifica dispositivos do Código Penal, criando novas penas e medidas para crimes cometidos em ambiente digital. Câmara dos Deputados, Brasília, DF, 2020. Disponível em: https://www.camara.leg.br. Acesso em: 22 out. 2024.

COSTA, R. M. A Eficácia da Lei dos Crimes Cibernéticos no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2020.

COSTA, R. M. Marco Civil da Internet: Direitos e Deveres dos Usuários. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2022.

CRUZ, Diego; RODRIGUES, Juliana. Crimes Cibernéticos e a Falsa Sensação de Impunidade. 2018. Disponível em: http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/ arquivos_destaque/iegWxiOtVJB1t5C_2019-2-28-16-36-0.pdf. Acesso em: 27 Maio 2024.

FEITOZA, luis Guilherme de Matos. Crimes Cibernéticos: o Estelionato Virtual. Brasília, 2012. Disponível em: https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/crimes _ciberneticos_o_estelionato_virtual.pdf. Acesso em: 27 Maio 2024.

FREITAS, Riany Alves de. Segurança Estelionato Digital. 2009. Disponível em: https://aplicacao.mpmg.mp.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/502/Estelionato%2 0digital.pdf?sequence=3. Acesso em: 27 Maio 2024.

KSHETRI, N. International Perspectives on Cybercrime. Routledge, 2017.

LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. DE A. Metodologia do trabalho científico. São Paulo: Atlas, 2014.

MAIA, T. S. F. Análise dos mecanismos de combate aos crimes cibernéticos no sistema penal brasileiro. Universidade Federal do Ceará. Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2017.

MARCO CIVIL DA INTERNET. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm. Acesso em: 27 Maio 2024.

MAUES, Gustavo Brandão Koury et. al. Crimes Virtuais: uma análise sobre a adequação da legislação penal brasileira. 2018. Disponível em: https://www.unirios.edu.br/revistarios/media/revistas/2018/18/crimes_virtuais.pdf. Acesso em: 27 Maio 2024.

MENDES, A. L. O Marco Civil da Internet e Seus Impactos na Proteção de Dados. Brasília: Editora da Câmara dos Deputados, 2020.

OLIVEIRA, P. R. Educação Digital e Proteção de Dados na Era da Informação. Porto Alegre: Editora PUC, 2022.

REGIS, André Tavares. Crimes Contra a Honra na Internet: Dificuldade na Apuração dos Fatos. João Pessoa, 2011.

RIBEIRO, L. A. Privacidade e Segurança na Era Digital: O Caso Carolina Dieckmann. Brasília: Editora da Câmara dos Deputados, 2019.

SANTOS, C. L. Cibercrimes e a proteção penal no Brasil: desafios da era digital. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2020.

SANTOS, Liara Ruff dos et. al. Os crimes cibernéticos e o direito a segurança jurídica: uma análise da legislação vigente no cenário brasileiro contemporâneo. Santa Maria, 2017. Disponível em: http://coral.ufsm.br/congressodireito/anais/2017 /7-7.pdf. Acesso em: 27 Maio 2024.

SILVA, T. R. Privacidade e Segurança na Era Digital: Desafios do Marco Civil. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2021.

SOUZA, Júlio Cesar. Investigação Criminal Pela Polícia Militar e Sua Inconstitucionalidade. 2012.

SOUZA, P. R. Educação Digital e Conscientização em Segurança da Informação. Porto Alegre: Editora PUC, 2022.

SPINIELI, André Luiz Pereira. Crimes informáticos: comentários ao projeto de Lei n° 5.555/2013. Brasilia, 2018. Disponível em: http://www.mpf.mp.br/atuacaotematica/ccr2/publicacoes/coletaneas-de-artigos/coletanea_de_artigos_crimes_ ciberneticos. Acesso em: 27 Maio 2024.

SPINIELI, André Luiz Pereira. Crimes informáticos: comentários ao projeto de Lei n° 5.555/2013. Brasilia, 2018. Disponível em: http://www.mpf.mp.br/atuacaotematica/ccr2/publicacoes/coletaneas-de-artigos/coletanea_de_artigos_crimes_ ciberneticos. Acesso em: 27 Maio 2024.

VASCONCELLOS, M. R. O marco civil da internet e a cooperação internacional no combate aos crimes cibernéticos. Belo Horizonte: Fórum, 2020.

WENDT, Emerson e NOGUEIRA JORGE, Higor Vinicius Nogueira. Editora Braspot. Crimes Cibernéticos: Ameaças e Procedimentos de Investigação – 2º Edição. 2017.


1Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Féretro.
E-mail: gamadovalesamya@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0009-0006-5213-4782.