DISCRIMINAÇÃO DO GÊNERO FEMININO NO AMBIENTE DE TRABALHO E A PROTEÇÃO LEGAL

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11406497


Quétilen da Silva Oliveira
Orientador: Jacson da Silva Sousa


RESUMO

A discriminação de gênero no ambiente de trabalho é um problema recorrente que se revigora em abundantes vertentes, afetando significativamente a confiança, oportunidade e, primordialmente, à efetiva igualdade estabelecida como direito constitucional a ser seguido pela sociedade. Ao longo da história da civilização humana, a mulher, em suma, ocupava posições relacionadas ao cuidado doméstico e dos filhos. Aos poucos, no Brasil e no mundo, elas colocaram-se em posição adversa ao rumo outrora predestinado, que era voltado à procriação e submissão ao lar e foram em busca de relevância e posicionamento laboral perante um cenário precipuamente masculino. Com a chegada das fábricas têxteis, elas desbravaram o inexplorado mercado de trabalho em busca de liberdade individual, vislumbrando reconhecimento profissional, sobretudo, sua dignidade como ser humano diante das vigorosas arestas do machismo que cercavam o universo trabalhista. Todavia, mesmo após recorrentes vitórias no alcance de seus objetivos, nos dias atuais ainda há um tratamento distinto que desprestigia a igualdade na ambiência laborativa, refletindo em uma atmosfera de desconforto e desrespeito que impactam em situações de higidez física, mental e social. No ordenamento jurídico, diversos instrumentos normativos consagram princípios e normas que visam coibir práticas discriminatórias que visam promover um ambiente labol isento de desigualdades de gênero. 

Palavras chaves: discriminação; gênero; mulher; trabalhista.

ABSTRACT

Gender discrimination in the workplace is a recurring problem that manifests in numerous ways, significantly affecting confidence, opportunity, and primarily the effective equality established as a constitutional right to be upheld by society. Throughout the history of human civilization, women have predominantly occupied roles related to domestic care and child-rearing. Gradually, in Brazil and around the world, they have positioned themselves against the previously predetermined path focused on procreation and household submission, seeking relevance and labor positioning in a predominantly male scenario. With the advent of textile factories, women ventured into the unexplored job market in search of individual freedom, envisioning professional recognition, and above all, their dignity as human beings amidst the vigorous edges of machismo that surrounded the work universe. However, even after repeated victories in achieving their goals, there is still a distinct treatment today that undermines equality in the workplace, reflecting an atmosphere of discomfort and disrespect that impacts physical, mental, and social well-being. In the legal framework, various normative instruments enshrine principles and norms aimed at curbing discriminatory practices to promote a labor environment free from gender inequalities. 

Keywords: discrimination; gender; women; labor.

2. INTRODUÇÃO

O ambiente de trabalho é diverso e na medida em que a atividade laboral proporciona dignidade e possibilidade de conquistas ao ser humano, também pode se revelar um ambiente discriminatório, especialmente no tocante ao gênero surgindo dessa forma como um fenômeno social, problemático e retrógrado se levado em consideração o século em que vivemos.

Nesse contexto, a análise jurídica se apresenta como ferramenta essencial para compreender a amplitude e a complexidade dessa questão, a aplicação efetiva das normas vigentes bem como o aprimoramento delas, reflete diretamente na promoção da equidade de gênero, tornando imperativa a investigação das lacunas e obstáculos que comprometem sua efetividade, justificando a relevância pragmática desta pesquisa. 

De acordo com Mendes e Bastos (2023), a temática de igualdade de gênero no ambiente de trabalho, vem surgindo como uma grande preocupação, pois sem as devidas observâncias podem ser acarretados diversos problemas, principalmente voltados à saúde e ao psicológico. Os referidos autores também pronunciam que: “tais desmerecimentos podem se dar pela diferenciação injustificada de salário, ausência de promoção à mulher ou em discursos verborrágicos que não se coadunam com as conquistas femininas das últimas décadas, não apenas no âmbito laborativo assim como em diversas outras frentes sociais, consolidando o não atendimento da igualdade inderrogável entre homem e mulher impreterivelmente anotada no arquétipo constitucional brasileiro”

Além disso, a legislação infraconstitucional, notadamente a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) e leis específicas correlatas, preconizam diretrizes específicas que proíbem a discriminação de gênero no âmbito das relações laborais. 

3. MATERIAL E MÉTODOS

Utilizou-se a pesquisa explicativa para identificar os fatores que determinam ou contribuem para a ocorrência de determinado fenômeno social, buscando justificar e dar profundidade  ao tema abordado, além da pesquisa bibliográfica que permite ao pesquisador que se aproprie do conhecimento acumulado e das abordagens teóricas desenvolvidas por outros estudiosos, tarefa esta realizada por meio de leitura de obras literárias e consulta ao site do Ministério do Trabalho e Emprego, site Scielo.br e site Locomotiva.com.

Também foi adotada abordagem qualitativa, pois foram expostos alguns dados estatísticos dos casos de discriminação entre homens e mulheres.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Toda discriminação é leviana e repugnante. Trata-se de um comportamento desprezível e que, por mais dissimulado que seja, pode causar danos à dignidade bem como à saúde mental e física da pessoa atingida.

As mulheres atravessam a história da humanidade passando por obstáculos impostos pela descrença em sua força e capacidade intelectual, seja sobre as mais simples atividades diárias quanto à projeção, criação e execução de projetos elaborados que determinem ideias ou descobertas originais, a exemplo de Marie Curie, que precisou registrar  duas vezes na biografia que escreveu sobre o seu marido, que partiu dela o estudo e descoberta dos elementos químicos: polônio e rádio, a fim de garantir que não houvesse dúvidas acerca da brilhante descoberta científica, visto que, naquele momento, seria difícil que o núcleo de cientistas composto sumariamente por homens acreditassem que uma mulher pudesse ser capaz de tal descoberta. 

No Brasil, a discriminação de gênero no contexto laboral emerge como uma preocupação premente no sistema jurídico. Por vezes inicia-se em um simples processo de entrevista de emprego, onde os agentes de Recursos Humanos dispensam a mão de obra feminina somente pelo fato delas terem filhos ou dependentes, ainda que possuam grau de instrução que as qualifique para a função. 

Uma pesquisa do Instituto Locomotiva revela que cerca de 55,6 milhões de brasileiros já sofreram com assédio, discriminação ou preconceito enquanto trabalhavam. A mesma pesquisa apontou que 75% dos brasileiros concordam que o mercado de trabalho é mais receptivo para os homens do que para as mulheres.

Para o público feminino, essa realidade é ainda mais evidente, pois 78% notam menos oportunidades para mulheres do que homens no mercado de trabalho de forma geral.

Quando as mulheres têm filhos 88% das mães relataram que enfrentam mais desafios no mercado de trabalho e ao se tratar de gestantes o número de rejeição beira o absoluto grau de rejeição ao serem submetidas à uma entrevista de emprego, levantando assim o questionamento de que uma mulher gestante pode ser vista como uma despesa desnecessária, haja em vista que ela terá que ausentar-se num curto período de tempo para desfrutar da licença maternidade. 

A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) estabelece que a mãe ou o pai  de criança que tenha até seis anos de idade pode se ausentar somente uma vez por ano para acompanharem seus filhos ao médico sem que isso resulte em desconto salarial, ou seja, em relação ao filho é esperado que este não adoeça para que os pais não sejam advertidos ou até mesmo demitidos sujeitando às partes que confrontem um dilema que foge ao seu controle.

Em se tratando de cuidado, proteção e apoio são de notório saber que em nossa sociedade as mulheres detêm essa finalidade em maior constância recaindo sobre si, soberana responsabilidade sobre seus filhos e consequentemente, mais desafios a serem enfrentados para conciliar o paralelo entre sua realização pessoal e profissional.

Outro fator recorrente é a disparidade em relação ao salário. Conforme  o 1º Relatório Nacional de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios divulgados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em 25/03/2024, as mulheres recebem 19,4% a menos do que os homens, muito embora exista a Lei  nº 14.611, que dispõe sobre a  Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens. 

O referido  relatório evidencia que apesar da evolução histórica de espaço e direitos, as mulheres, ainda nos dias atuais são submetidas a desvalorização laboral.

Os avanços legislativos e sociais demonstram a persistente pretensão em reduzir essas diferenças, conforme pesquisa citada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), também foram apresentados dados que indicam se as empresas têm, efetivamente, políticas de incentivo à contratação, permanência e ascensão profissional das mulheres. O Relatório aponta que:

  • Apenas 32,6% das empresas têm políticas de incentivo à contratação de mulheres; o valor é ainda menor quando se consideram grupos específicos de mulheres: negras (26,4%); mulheres com deficiência (23,3%); LBTQIAP+ (20,6%); mulheres chefes de família (22,4%); mulheres vítimas de violência (5,4%);
  • 38,3% declararam que adotam políticas para promoção de mulheres a cargos de direção e gerência;

Outros dados indicam que poucas empresas ainda adotam políticas como de flexibilização de regime de trabalho para apoio à parentalidade (39,7%), de licença maternidade/paternidade estendida (17,7%) e de auxílio-creche (21,4%). 

A Constituição Brasileira (CF) preconiza que:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; 

Dessa forma, a problemática discriminação de gênero no ambiente laboral não apenas vulnera direitos individuais, mas também perpetua desigualdades sociais e econômicas, bem como propicia marginalização das mulheres no mercado de trabalho comprometendo não apenas o seu desenvolvimento profissional, mas também impacta negativamente a economia nacional ao subutilizar talentos e competências. 

5. CONCLUSÃO

Com base no exposto, é possível verificar e reconhecer a importância que as mulheres possuem na luta por igualdade e diretos, haja vista que a discriminação de gênero no ambiente de trabalho é um fenômeno social recorrente e grave que não merece prosperar e que a busca incessante por seu lugar de direito na sociedade tem sido uma chama perene que transpõe o tempo suprimindo as sucessivas gerações de um cenário laboral composto por homens.

Seja de forma sutil e flagrante, esse disparate ocorre em nosso horizonte e atrai os olhares para  que medidas rígidas e seguras sejam estabelecidas para sanar a disseminação de  condutas ou de regras que ardilosamente submetam as mulheres a trabalharem numa conjuntura desigual e compelida.

Para viabilizar essa conduta, propõe-se maior participação do Poder Legislativo na elaboração de projetos de lei que estimulem o exercício pleno de atividade laboral da mulher no tocante a paridade salarial, respeitando – a como mãe e provedora do lar, reduzindo a possibilidade de  medidas punitivas nos casos de ausência para acompanhar seus filhos ao médico e que garantam sua fluência laboral e pleno exercício de suas inúmeras atribuições sem prejuízo a nenhuma delas, pois hipoteticamente, a persistência de estereótipos de gênero nas organizações poderia contribuir para a reprodução de práticas discriminatórias, relegando as mulheres a posições subalternas e perpetuando desigualdades e prejudicando o seu desenvolvimento pessoal e profissional.

A eventual inexistência de mecanismos claros para a denúncia de casos de discriminação de gênero no trabalho poderia criar um cenário propício para que as vítimas hesitem em relatar tais práticas, temendo represálias ou retaliações, o que poderia contribuir para a subnotificação e subestimação do problema. 

Falta de conscientização por parte das empresas em relação à igualdade de gênero poderia resultar na implementação inadequada de políticas internas e práticas de gestão, perpetuando assim estigmas e prejudicando a construção de um ambiente igualitário. 

Em cenários hipotéticos nos quais as mulheres são sub- representadas em cargos de liderança, poderia ocorrer a perpetuação de estigmas e preconceitos, criando um ciclo no qual a ausência de referências femininas em posições de destaque reforça a ideia de que estas posições não são adequadas para mulheres o que é um atraso do comportamento social diante da imensa capacidade que as mulheres desenvolvem, por vezes acumuladamente com outras atribuições. 

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

As práticas discriminatórias que se manifestam de diversas formas confronta diretamente os princípios fundamentais estabelecidos pela CF (1988), esta carta magna consagra, de forma inequívoca, a igualdade entre homens e mulheres como um dos pilares da sociedade brasileira.

Contudo, a discriminação de gênero persiste no ambiente de trabalho, revelando a necessidade de uma análise mais aprofundada da legislação infraconstitucional que busca combater essa prática.                                          A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), enquanto a principal norma reguladora das relações trabalhistas no Brasil contém dispositivos que visam assegurar a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres. No entanto, sua aplicação e efetividade requerem análise cuidadosa, considerando as nuances das relações laborais e as formas sutis de discriminação que muitas vezes escapam à abordagem normativa. 

A evolução humana também depende da capacidade de se reinventar e criar novos processos para seu crescimento enquanto sociedade, bem como, se faz necessário buscar desenvolver consciência mental para o desenvolvimento de sua psique, índole, comportamentos e princípios que regeram sua vida levando o ser humano ao encontro de uma conduta idônea, incorruptível e ajustada perante as diferenças entre os mesmos de sua espécie possibilitando assim, um universo, diverso, igualitário e justo.

O gênero feminino não pode ser desprestigiado como sendo algo inferior ou incapaz, limitando o alcance de salários iguais por função, tampouco, como atributo de merecimento ou não de oportunidades de emprego. 

A igualdade de oportunidade vai além de um ato previsto na legislação, é atributo ético-social que edifica a capacidade de crescimento pessoal e profissional do ser humano.

7. REFERÊNCIAS 

BASTOS, Alder Thiago; MENDES, Paula Kauane Monteiro. Os impactos da discriminação de gênero no meio ambiente do trabalho: uma reflexão sobre os documentos existentes. Unisanta Law and Social Science, v. 12, n. 1, p. 175-190, 2023.

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