REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.11194457
Wanderson Fernando Rossales de Vasconcelos
Willian Caetano de Souza
RESUMO
A pandemia de COVID-19 intensificou a necessidade de repensar o papel da educação no contexto da necropolítica e do biopoder, especialmente no âmbito da Filosofia. O biopoder, conceito de Michel Foucault, expõe o controle exercido sobre a vida e os corpos, moldando comportamentos individuais e populacionais. Já a necropolítica, definida por Achille Mbembe, destaca as políticas de morte que marginalizam e eliminam grupos específicos da sociedade. No ensino de Filosofia, essa análise crítica se torna crucial para questionar como os discursos filosóficos abordam essas questões. A disciplina fornece ferramentas para refletir sobre biopoder e necropolítica, promovendo debates éticos e políticos essenciais para a compreensão e transformação da realidade. No entanto, a forma como esses temas são abordados pode reproduzir ou desafiar estruturas de poder e exclusão. Uma abordagem crítica e reflexiva na educação pós-pandemia é fundamental. Isso implica não apenas problematizar as relações de biopoder e necropolítica, mas também estimular o desenvolvimento do pensamento autônomo e da análise crítica nos alunos. Além do estudo de teorias filosóficas, é necessário analisar as práticas educacionais e sociais que perpetuam ou resistem a essas formas de poder. Dessa forma, o ensino de Filosofia pode contribuir para formar cidadãos conscientes e atuantes na promoção da justiça social e da dignidade humana. Ao questionar as estruturas de poder e as políticas de morte, a Filosofia pode contribuir para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, especialmente no contexto pós-pandemia.
Palavras chaves: Biopoder; Necropolítica; Filosofia; Pandemia.
ABSTRACT
The COVID-19 pandemic has intensified the need to rethink the role of education in the context of necropolitics and biopower, especially within the scope of Philosophy. Biopower, a concept by Michel Foucault, exposes the control exercised over life and bodies, shaping individual and population behaviors. Necropolitics, defined by Achille Mbembe, highlights death policies that marginalize and eliminate specific groups in society. In teaching Philosophy, this critical analysis becomes crucial to question how philosophical discourses address these issues. The discipline provides tools to reflect on biopower and necropolitics, promoting ethical and political debates essential for understanding and transforming reality. However, the way these themes are approached can reproduce or challenge structures of power and exclusion. A critical and reflective approach to post-pandemic education is fundamental. This implies not only problematizing the relations of biopower and necropolitics, but also stimulating the development of autonomous thinking and critical analysis in students. In addition to the study of philosophical theories, it is necessary to analyze the educational and social practices that perpetuate or resist these forms of power. In this way, the teaching of Philosophy can contribute to forming conscious and active citizens in promoting social justice and human dignity. By questioning power structures and death policies, Philosophy can contribute to the construction of a more just and inclusive society, especially in the post-pandemic context.
Keywords: Biopower; Necropolitics; Philosophy; Pandemic.
INTRODUÇÃO
A interseção entre a necropolítica e o biopoder se tornou um tema muito importante no campo da filosofia da educação após a pandemia. A pandemia de Covid-19 destacou de forma clara as práticas de controle e gestão da vida e da morte adotadas pelos governos e instituições, o que nos leva a refletir sobre as relações de poder que governam a sociedade atual. Nesse contexto, este estudo busca investigar os desafios e reflexões resultantes da interação entre a necropolítica e o biopoder. A necropolítica, conceito criado por Achille Mbembe, descreve as práticas de controle da vida e da morte impostas a certos corpos, enquanto o biopoder, conceito desenvolvido por Michel Foucault, trata das técnicas de regulação e controle dos corpos e populações.
O problema de pesquisa que guia este estudo é: de que forma a interseção entre a necropolítica e o biopoder influencia as práticas educacionais após a pandemia e quais são os desafios e reflexões que surgem desse contexto?
O objetivo geral desta pesquisa é analisar como as práticas de necropolítica e biopoder impactam a educação contemporânea, identificando os desafios e possibilidades que surgem dessa relação. Para alcançar esse objetivo, os objetivos específicos incluem:
– Analisar as práticas de controle e gestão da vida e da morte adotadas no contexto educacional pós-pandemia;
– Identificar as relações de poder presentes nas instituições de ensino e suas consequências nas práticas pedagógicas;
– Propor reflexões e alternativas para uma educação mais democrática e emancipatória.
A metodologia utilizada nesta pesquisa será qualitativa, por meio de revisão bibliográfica e análise de documentos oficiais, com o objetivo de aprofundar o debate sobre a interseção entre a necropolítica e o biopoder na educação pós-pandemia.
- O CONCEITO DE BIOPODER E DA NECROPOLÍTICA E SEUS IMPACTOS NA PANDEMIA.
O conceito de biopoder, criado pelo filósofo Michel Foucault[1], nos ajuda a entender como o poder influencia nossas vidas, regulando nossos corpos, comportamentos e saúde. É como se houvesse um controle sobre nós, visando garantir nossa sobrevivência e reprodução. Por exemplo, quando vemos políticas de saúde pública, controle de natalidade e intervenções médicas, tudo isso faz parte do biopoder. Já o conceito de necropolítica, desenvolvido por Achille Mbembe[2], trata-se das políticas e práticas de poder que decidem quem merece viver e quem merece morrer. É como se houvesse a determinação de quais grupos são expostos a situações que podem levar à morte prematura, como genocídios, guerras e violência estrutural.
Na pandemia de COVID-19, esses conceitos se tornam ainda mais relevantes ao analisarmos como diferentes governos e instituições têm lidado com a crise sanitária. Por um lado, vemos o biopoder em ação nas medidas de distanciamento social, uso de máscaras e campanhas de vacinação, que visam controlar a disseminação do vírus e proteger a vida das pessoas. Por outro lado, a necropolítica se manifesta em políticas que negligenciam certos grupos sociais, colocando-os em maior risco de contágio e morte.
Além disso, a pandemia expõe as desigualdades sociais e econômicas que existem em nossa sociedade, mostrando como o biopoder e a necropolítica afetam de forma desproporcional certas comunidades e grupos marginalizados. Isso significa que algumas pessoas são mais vulneráveis e têm menos acesso a recursos e cuidados de saúde. Diante disso, é importante questionar e combater as práticas e políticas que perpetuam a exclusão e a vulnerabilidade de certos segmentos da população. Devemos buscar uma abordagem mais igualitária e inclusiva no enfrentamento da pandemia, para construirmos uma sociedade mais justa e solidária para todos.
- COMO A NECROPOLÍTICA E O BIOPODER SE MANIFESTARAM DE FORMA EVIDENTE DURANTE A PANDEMIA.
A pandemia da COVID-19, foi um evento global de proporções épicas, expôs as profundas desigualdades e as falhas sistêmicas que permeiam as sociedades contemporâneas.
Nesse contexto, os conceitos de necropolítica e biopoder, cunhados por Achille Mbembe e Michel Foucault, respectivamente, assumem relevância crucial para compreender como a gestão da pandemia se entrelaçou com a produção de morte e a perpetuação de hierarquias sociais. Para Brito, a concepção de necropolítica corrobora ao entendimento das diferenças existentes nas ações do Estado em relação a determinados grupos e a distribuição diferencial de direito à vida.
A necropolítica, caracterizada pela capacidade do Estado de decidir quem vive e quem morre, se manifestou de forma evidente durante a pandemia. Governos em todo o mundo implementaram medidas restritivas, como lockdowns e toques de recolher, que, embora necessárias para conter a disseminação do vírus, impactaram desproporcionalmente as populações mais marginalizadas. Para Mbembe a necropolítica é o poder de definir quem vive e quem morre, um poder que se exerce sobre a ‘vida nua’ – a vida sem valor, sem direitos, sem proteção, a vida exposta à morte. (Mbembe, 2003).
Um exemplo emblemático é a situação das favelas no Brasil, onde a falta de infraestrutura básica, como saneamento e acesso à água potável, dificultou o cumprimento das medidas de distanciamento social. Além disso, a fragilidade do sistema de saúde pública e a falta de acesso a testes e tratamento intensificaram a letalidade do vírus nessas comunidades.
O biopoder, conceito foucaultiano que se refere ao conjunto de técnicas e mecanismos utilizados pelos Estados para controlar e regular a vida da população, também se manifestou com força durante a pandemia.
O conceito de poder foucaultiano se situa, entretanto, em algum lugar entre o direito e a verdade. Foucault quer estudar o modo pelo qual o poder se exerce, o “como do poder”, conforme ele mesmo explica em outras palavras, isso equivale a compreender os mecanismos do poder balizados entre os limites impostos de um lado pelo direito, com suas regras formais delimitadoras, e de outro pela verdade, cujos efeitos produzem, conduzem e reconduzem novamente ao poder. É nesse sentido que Foucault menciona a relação triangular que se estabelece entre esses três conceitos: poder, direito e verdade (Foucault 1999: 28).
Embora essas medidas tenham sido justificadas pela necessidade de proteger a saúde pública, elas também levantaram preocupações sobre a privacidade individual e o potencial para abusos de poder. A pandemia serviu como um catalisador para a expansão do biopoder, normalizando a vigilância estatal e a coleta de dados em larga escala.
A pandemia da COVID-19 revelou as nuances da necropolítica e do biopoder em ação. A capacidade do Estado de decidir quem vive e quem morre, bem como o controle e a regulação da vida da população, se manifestaram de forma evidente durante a crise sanitária.
Compreender esses conceitos é fundamental para analisar criticamente a gestão da pandemia e identificar as desigualdades e as falhas sistêmicas que foram exacerbadas por ela.
- COMO A INTERSEÇÃO ENTRE A NECROPOLÍTICA E O BIOPODER INFLUENCIAM AS PRÁTICAS E POLÍTICAS EDUCACIONAIS NO CONTEXTO PÓS – PANDEMIA, E QUAIS OS DESAFIOS E REFLEXÕES QUE SURGEM A PARTIR DESSE CENÁRIO.
A interseção entre a necropolítica e o biopoder tem se mostrado cada vez mais relevante e impactante em diversas esferas da sociedade, inclusive no contexto pós-pandemia. No âmbito educacional, as práticas e políticas estão profundamente influenciadas por essas formas de poder, o que suscita uma série de desafios e reflexões importantes.
Segundo Mbembe (2016). Ou seja, a soberania, ou o poder sobre um povo, se expressa a partir de normas gerais para o grupo. O presente autor refere-se ao poder de determinar quem vive e quem morre. Na pandemia de COVID-19, esse poder é evidente, com a vida de certos grupos sendo considerada dispensável em favor dos interesses econômicos e políticos dominantes. Essa lógica também afeta as escolhas educacionais.
Por outro lado, o biopoder, conceito de Michel Foucault, trata do controle e regulação da vida para garantir não apenas a sobrevivência, mas a produtividade e eficiência na sociedade. Após a pandemia, vemos a necessidade de medidas sanitárias nas instituições educacionais para proteger alunos e profissionais, porém, é crucial evitar excessos que restrinjam liberdades individuais.
Para Quintslr et. al. (2020) relacionam a pandemia ao controle elaborado por Foucault através do controle da peste: inspeção, informação e controle da população, o que têm um severo impacto, portanto, na democracia (chamamos aqui democracia de liberdade individual dos sujeitos e não a democracia como sistema político-econômico responsável pelas escolhas sobre os corpos).
Essa conjuntura gera desafios importantes. É necessário repensar o papel da educação em crises, buscando abordagens mais humanizadas e inclusivas. Além disso, questionar as estruturas de poder nas políticas educacionais é essencial para garantir equidade e justiça social no acesso à educação. Outro desafio é repensar práticas pedagógicas e currículos, incluindo temas como saúde pública e direitos humanos, que se tornaram urgentes. É vital debater a digitalização da educação, assegurando acesso sem reforçar desigualdades sociais. Assim, diante dessas interseções, a educação enfrenta desafios que exigem análise cuidadosa. É imprescindível repensar práticas e políticas, visando uma sociedade mais justa e igualitária.
- DE QUE FORMA ESSE CONTEXTO FILOSÓFICO INFLUÊNCIA AS PRÁTICAS EDUCATIVAS E AS RELAÇÕES DE PODER DENTRO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO.
A relação entre filosofia e práticas educativas é um tema recorrente ao longo da história da educação. Segundo Foucault (2010) “Todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e os poderes que eles trazem consigo.” A filosofia, como área de estudo dedicada às questões essenciais da existência humana e do conhecimento, exerce uma influência profunda sobre as práticas educativas e as dinâmicas de poder nas escolas. Neste texto, exploraremos como o contexto filosófico molda as práticas educativas e as relações de poder nas instituições de ensino.
A educação, entendida como o processo de compartilhamento de saberes e valores, reflete diferentes correntes filosóficas que orientam as abordagens pedagógicas. Entre essas correntes, destacam-se o idealismo[3], o realismo[4], o pragmatismo[5] e o pós-estruturalismo[6], cada qual com sua visão sobre a natureza do conhecimento e o propósito da educação na formação do indivíduo. O idealismo, por exemplo, concebe a educação como uma jornada em busca da verdade e da formação da razão. Dessa forma, as práticas educativas idealistas enfatizam a transmissão de conhecimentos universais e conferem autoridade ao professor como detentor do saber. Nas instituições idealistas, as relações de poder tendem a ser hierárquicas, com o professor exercendo controle sobre o aluno e impondo sua visão.
Por outro lado, o pragmatismo valoriza a experiência e a ação como ferramentas para a construção do conhecimento. Para os pragmatistas, a educação deve estar voltada para a solução de problemas práticos e o desenvolvimento de habilidades concretas. As práticas educativas pragmáticas enfatizam a participação ativa do aluno na construção do saber, e as relações de poder nessas escolas tendem a ser mais democráticas, valorizando a autonomia e a criatividade do aluno. O pós-estruturalismo, por sua vez, questiona as verdades absolutas e as hierarquias de poder. Para os adeptos dessa corrente, o conhecimento é uma construção social, e as práticas educativas devem estimular a crítica e a diversidade de perspectivas.
Nas instituições pós-estruturalistas, as relações de poder são caracterizadas pela descentralização e pela valorização da multiplicidade de vozes.
De acordo com Lima et al. (2020). E daí quer que eu faça o quê?” ou “O brasileiro mergulha no esgoto” demonstram descaso sobre a realidade social e estrutural do país, principalmente da população comum e carente da sociedade mostrando um “fazer morrer” da população pobre e periférica em relação às elites nacionais como uma estratégia política do atual governo. É importante ressaltar que as práticas educativas e as dinâmicas de poder nas escolas são influenciadas não apenas pelas correntes filosóficas, mas também por outros fatores, como políticas educacionais, cultura institucional e questões de classe, gênero e raça.
Cada linha de pensamento filosófico encara a educação de maneira única, impactando de forma direta as abordagens de ensino e as dinâmicas de poder dentro das escolas. Portanto, é fundamental que os educadores estejam atentos ao contexto filosófico em que atuam e reflitam criticamente sobre suas práticas, visando uma educação mais inclusiva, democrática e emancipadora.
- COMO PODEMOS REPENSAR O PAPEL DA EDUCAÇÃO DIANTE DAS QUESTÕES LEVANTADAS PELA NECROPOLÍTICA E PELO BIOPODER NO CONTEXTO PÓS- PANDEMIA.
A pandemia desencadeada pelo novo coronavírus trouxe à tona várias reflexões sobre o papel da educação na sociedade atual, especialmente diante das discussões sobre necropolítica e biopoder. Estes conceitos, criados pelo filósofo camaronês Achille Mbembe e pelo pensador francês Michel Foucault, respectivamente, questionam como as instituições, incluindo as escolas, lidam com questões de vida e morte na sociedade.
A necropolítica aborda a esfera política que decide quem deve viver e quem deve morrer, muitas vezes associada a políticas de extermínio e genocídio.
Por outro lado, o biopoder trata da gestão da vida dos indivíduos em várias áreas, como saúde, reprodução e segurança. Para Mbembe (2020a), mesmo antes da pandemia de COVID-19, “a humanidade já estava ameaçada de asfixia” (MBEMBE, 2020, p. 9). Dessa forma, a guerra não se dá especificamente contra um vírus, mas sim “[…] contra tudo o que condena a maior parte da humanidade à cessação prematura da respiração, tudo o que ataca sobretudo as vias respiratórias, tudo que, durante a longa duração do capitalismo, terá reservado a segmentos de populações ou raças inteiras, submetidas a uma respiração difícil e ofegante, uma vida penosa” (MBEMBE, 2020, p. 9).
Diante disso, é crucial reconsiderar o papel da educação e sua contribuição para uma sociedade mais justa e igualitária. No período pós-pandemia, a educação deve se basear em valores de solidariedade, empatia e cuidado com o próximo. As escolas devem ser espaços de acolhimento e promoção da vida, não apenas fisicamente, mas também emocional, social e intelectualmente.
Para Foucault (2010), ele diz: “ Pode parecer estranho que a prisão seja semelhante às fábricas, escolas, quartéis, hospitais; todos eles se parecem com prisões?” Assim, é necessário repensar práticas pedagógicas, currículos e interações dentro da comunidade escolar. Uma abordagem para repensar o papel da educação diante dessas questões é promover uma educação crítica e libertadora. Isso envolve refletir sobre as estruturas de poder que perpetuam desigualdades sociais, raciais, econômicas e de gênero, além de estimular o pensamento crítico e a ação transformadora dos alunos.
Além disso, a educação deve ser inclusiva e acessível a todos, garantindo o direito à educação de qualidade para cada pessoa, independentemente de sua condição social ou origem. É crucial combater o abandono escolar, evasão e reprovação, além de promover equidade e diversidade no ambiente escolar. Outro ponto importante é investir na formação dos profissionais da educação, valorizando sua atuação e oferecendo condições adequadas de trabalho.
Os educadores devem ser agentes de transformação social, capazes de incentivar o pensamento crítico e a consciência cidadã dos alunos. Além disso, é fundamental repensar currículos e métodos de ensino, tornando-os mais dinâmicos, interativos e relevantes para a realidade dos estudantes. A educação deve estar alinhada com as demandas do século XXI, preparando os jovens para os desafios do mundo globalizado e tecnológico em que vivemos.
Diante dos desafios levantados pela necropolítica e pelo biopoder, a educação precisa promover vida, dignidade e igualdade entre as pessoas. É necessário repensar o papel da escola como um espaço de formação integral, que valoriza a diversidade, inclusão e respeito às diferenças. Somente por meio de uma educação comprometida com a promoção da vida podemos construir uma sociedade mais justa, solidária e democrática.
- QUAL O PAPEL DOS EDUCADORES E DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO NA PROMOÇÃO DE UMA EDUCAÇÃO QUE RECONHEÇA E ENFRENTE AS QUESTÕES DE PODER E CONTROLE QUE PERMEIAM A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA.
A sociedade atual enfrenta uma série de desafios ligados ao poder e controle, que têm um impacto direto na maneira como as interações sociais se desenvolvem e no acesso à educação. Nesse cenário, educadores e instituições de ensino desempenham um papel crucial na promoção de uma educação que reconheça e enfrente esses problemas, visando uma formação crítica e reflexiva dos indivíduos Os educadores enfrentam o desafio de criar ambientes e oportunidades para que os alunos possam desenvolver habilidades analíticas e questionadoras em relação às estruturas de poder presentes na sociedade. Isso implica abordar criticamente questões como desigualdade social, discriminação e violência, que refletem relações de poder assimétricas na sociedade.
Concordando com Freire (1980), é preciso que a educação esteja – em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos – adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história. Através de uma educação que aborda e enfrenta esses desafios, os educadores podem contribuir para a formação de indivíduos mais conscientes e engajados na transformação da sociedade.
Ao estimular reflexões sobre sistemas de opressão e formas de resistência, os educadores podem inspirar os alunos a buscar uma sociedade mais justa e igualitária. Scocuglia (2005), quando esse destaca que o diálogo é um dos pilares para o processo permanente de construção e reconstrução curricular, assim como o são a consciência e o conhecimento. Além disso, os educadores têm a responsabilidade de criar um ambiente educacional seguro e acolhedor para todos os alunos, independentemente de sua origem, gênero, orientação sexual, raça ou qualquer outra característica que possa gerar discriminação.
É essencial que as instituições de ensino promovam a diversidade e a inclusão, combatendo práticas de exclusão e preconceito que perpetuam as desigualdades de poder na sociedade. As instituições de ensino também devem adotar políticas e práticas que estejam alinhadas com os princípios de uma educação emancipadora e transformadora. Isso inclui a implementação de currículos que abordem de forma abrangente temas relacionados ao poder e controle na sociedade, além de capacitar educadores para lidar com essas questões de maneira sensível e reflexiva.
Além disso, as instituições de ensino devem promover o diálogo e o debate democrático entre os diferentes membros da comunidade educacional, criando espaços de participação e escuta ativa. O professor passa a ser o agente mediador nesse processo, conforme apontam Costa et al. (2012), Cortella (2014) e Leite et al. (2009). Outro ponto importante requer que o próprio professor não seja um mero depositário de conhecimento, mas sim um provocador numa realidade onde o contexto atual da sociedade vem demandando por inúmeros sujeitos críticos, criativos e flexíveis, porém, de modo que o professor estimule e provoque os alunos a produzirem soluções para a sua vida pessoal e profissional. É fundamental garantir que os alunos tenham voz e possam expressar suas opiniões e ideias, contribuindo para uma cultura escolar mais plural e democrática.
Outro aspecto importante é a relação das instituições de ensino com as famílias e a comunidade local, buscando estabelecer parcerias e ações conjuntas que possam contribuir para uma educação mais crítica e comprometida com a transformação social. A escola não deve se isolar, mas sim abrir-se para o diálogo com outros atores sociais, ampliando seu impacto e alcance na promoção de uma educação mais inclusiva e igualitária.
Em resumo, o papel dos educadores e das instituições de ensino na promoção de uma educação que reconheça e enfrente os desafios de poder e controle na sociedade contemporânea é fundamental para construir uma sociedade mais justa e igualitária. Através de práticas e políticas educacionais que valorizem a diversidade, a inclusão e a participação democrática, é possível formar cidadãos críticos e engajados na transformação do mundo em que vivemos.
CONCLUSÃO
No mundo atual, marcado pela pandemia, temos visto o quanto as questões de poder e controle podem impactar nossas vidas. Imagine que essas questões são como um jogo de xadrez, onde alguns jogadores têm mais poder que outros e podem decidir quais peças sobrevivem e quais são sacrificadas. Isso é o que os pensadores Michel Foucault e Achille Mbembe chamam de biopoder e necropolítica, respectivamente. Durante a pandemia, esse “jogo de xadrez” ficou muito claro. As decisões tomadas pelos governos em relação à saúde e ao isolamento social mostraram que algumas pessoas são mais vulneráveis do que outras, ampliando as desigualdades existentes.
A falta de políticas públicas eficazes, a negação da ciência e a propagação de informações falsas contribuíram para a disseminação do vírus e para o aumento do número de mortes, expondo as falhas de nossos sistemas de saúde e de proteção social.
Nesse cenário, é importante refletir sobre como a educação pode ajudar a enfrentar esses desafios. As escolas, por exemplo, são como pequenos espelhos da sociedade, refletindo as relações de poder que existem fora delas. Portanto, precisamos pensar em como a educação pode ajudar a promover uma cultura de respeito e cuidado com o outro. Há muitos desafios a serem enfrentados, mas também há oportunidades de mudança. Precisamos repensar o que ensinamos em nossas escolas, incluindo temas como saúde coletiva, direitos humanos e justiça social.
Precisamos também mudar a forma como ensinamos, promovendo valores como empatia, solidariedade e respeito às diferenças. Os professores têm um papel crucial nesse processo, agindo como agentes de mudança e conscientização. Eles podem preparar os alunos para enfrentar os desafios atuais e futuros. Além disso, as escolas precisam se posicionar de forma mais ativa na promoção de uma educação crítica e emancipadora, que reconheça e enfrente as questões de poder e controle que permeiam a sociedade contemporânea. A democracia, a participação e a diversidade devem ser valores centrais na construção de uma educação mais justa e igualitária.
O diálogo e o debate de ideias devem ser incentivados, criando espaços para a construção coletiva do conhecimento e para a reflexão crítica sobre a realidade. Em resumo, a interação entre a necropolítica e o biopoder nos desafia a repensar o papel da educação diante das crises e desigualdades que a pandemia evidenciou.
Precisamos agir de forma ética e responsável, reconhecendo a complexidade das relações de poder e buscando transformar as práticas educativas em espaços de resistência e de construção de novas possibilidades. A educação, nesse sentido, não pode ser apenas um instrumento de reprodução do status quo, mas sim uma ferramenta de transformação social e de promoção da vida. É hora de agir.
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[2] Achille Mbembe: Filósofo, cientista político e intelectual, criador do conceito da necropolítica, Disponível em < https://colunastortas.com.br/autor/achille-mbembe/ > Acesso em 15 abr.2024.
[3] O termo idealismo, na verdade, surgiu apenas no século XVII para designar o platonismo, seus derivados medievais – doutrina dos universais – e alguns aspectos das filosofias de Descartes e John Locke. Disponível em < http://www.estudantedefilosofia.com.br/doutrinas/idealismo.php > Acesso em 04 maio.2024.
[4] O realismo também é uma doutrina filosófica que afirma a existência objetiva dos conceitos universais. Disponível em < https://conceito.de/realismo > Acesso em 04 maio.2024.
[5] O pragmatismo, por outro lado, é uma corrente filosófica que surgiu em finais do século XIX nos Estados Unidos. William James e Charles S. Peirce foram os principais precursores da doutrina, que se caracteriza pela procura das consequências práticas do pensamento Disponível em< https://conceito.de/pragmatismo > Acesso em 04 maio.2024.
[6] O pós-estruturalismo pode ser caracterizado como um modo de pensamento, um estilo de filosofar e uma forma de escrita, embora o termo não deva ser utilizado para dar qualquer ideia de homogeneidade, singularidade ou unicidade. Disponível em <https://periodicos.fclar.unesp.br/redd/article/download/11344/7950/35358#:~:text=O%20p%C3%B3s%2Destruturalismo%20pode%20ser,28). Acesso em 04 maio. 2024.