OBSTETRIC VIOLENCE IN BRAZIL: GUARANTEE OF WOMEN’S INTEGRAL RIGHT TO HEALTH
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7953636
Veronika Aparecida Peixoto Bastos Dias1
Esp. Pedro Henrique Oliveira2
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo tratar sobre a violência obstétrica, uma nova forma de violência de gênero, que ainda carece de regulamentação e tem ocorrido de forma ampla, tanto na gestação como no parto e pós-parto. Neste sentido, foram abordadas as características e as modalidades desta violência, trazendo visibilidade sobre como ela pode ocorrer e ser identificada no cotidiano das práticas hospitalares. A partir disso, busca-se evidenciar a falta de amparo legal e a ausência de previsão específica que tipifique este crime, regulando seus aspectos conceituais, sua abrangência e punições devidas. Para construir a pesquisa foi feita uma revisão bibliográfica elaborada com embasamento em doutrinas, artigos científicos, monografias, periódicos, teses, livros, textos jurídicos e legislações pertinentes. No mais, entendese que a definição legal e a aplicação da pena são essenciais para prevenir e coibir este tipo de violência contra a mulher, além de disseminar informações e tornar evidente as muitas formas com que essa violência pode se manifestar.
Palavras-chave: Violência Obstétrica. Maternidade Segura. Direitos Femininos.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos a sociedade modificou a sua percepção sobre gêneros, principalmente a partir das revoluções feministas e da busca incessante pela igualdade e respeito entre homens e mulheres. Ainda assim, apesar dos avanços em direitos femininos e melhores perspectivas de evoluções para o futuro, as mulheres ainda são uma minoria social frequentemente prejudicada pelo sistema patriarcal.
A violência obstétrica é entendida como uma violência de gênero que pode ocorrer através de várias formas, podendo ser antes, durante ou até mesmo após o parto. Assim, este tipo de violência é uma agressão não só aos direitos da mãe, mas também do nascituro. Entende-se por violência obstétrica qualquer ato que seja praticado tanto no corpo da mulher como no bebe, sem o consentimento da parturiente (MARIANI; NASCIMENTO NETO, 2016).
O debate sobre violência obstétrica é muito importante, atualmente não existe legislação especifica que regulamente seus aspectos conceituais, sua abrangência e punições devidas. É fundamental que essa problemática seja discutida pelo Estado e sociedade, com a disseminação de informação sobre este crime e sobre os direitos da parturiente e do nascituro, visando o aumento de denúncias e o crescimento de demandas judiciais que discutam o tema. Portanto, este estudo se faz relevante para demonstrar como vem ocorrendo este novo tipo de violência e conscientizar as mulheres de seus direitos, bem como buscar a efetivação destes.
Partindo da perspectiva da falta de legislação específica que trate sobre este tipo de violência, busca-se informar sobre os direitos da parturiente e as possibilidades de responsabilização penal e civil do agressor. Entendendo como a falta de legislação específica e classificação/uniformização do conceito de violência obstétrica afetam a dignidade feminina e os direitos da parturiente. Analisando os direitos fundamentais e direitos femininos frente a violência obstétrica e a falta de legislação especifica sobre o tema.
Assim, buscou-se compreender o conceito e as formas mais comuns de violência obstétrica, analisar os direitos fundamentais constitucionais e direitos femininos diante dos casos de violência obstétrica no Brasil e verificar as possibilidades de responsabilização civil e penal frente a ausência de lei especifica. Para compreender toda a temática foi feita uma revisão bibliográfica a respeito dos principais conceitos e aspectos da violência obstétrica, utilizando como fundamentos doutrinas, artigos científicos, monografias, periódicos, teses, livros, textos jurídicos, legislações pertinentes e as jurisprudências atualizadas dos tribunais brasileiros.
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS CONSTITUCIONAIS, DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FEMININOS: MATERNIDADE SEGURA
Tratar sobre a violência obstétrica sob uma perspectiva dos direitos humanos e direitos fundamentais é muito importante, tendo em vista que este tema envolve saúde, autodeterminação e integridade pessoal. E ao mesmo tempo, também envolve as mulheres, classificadas como uma minoria social e grupo vulnerável que carecem de atenção especial e de proteção por parte do Estado (ALBUQUERQUE, 2019).
O reconhecimento do direito sobre o próprio corpo é o início para o desenvolvimento de uma sociedade democrática que atribua a todos os indivíduos o mesmo valor e direitos. Para isso a promoção da igualdade de gênero é fundamental para a concretização da autonomia sexual e existencial da mulher, assim como a criação de políticas assistenciais capazes de atender as demandas e direitos femininos. A humanização do parto e a maternidade segura e voluntária são questões recorrentes nas discussões acerca dos direitos da parturiente. Essa humanização pode ser compreendida como respeitar e entender a mulher como a protagonista no momento do parto, retirando o médico ou qualquer outro individuo dessa posição (LEITE, 2016).
A maternidade segura deve ser observada justamente com os outros direitos fundamentais, com foco no direito à saúde, vida e integridade física. Portanto, este conceito de maternidade deve abranger desde a concepção, gestação, nascimento e primeiros anos de vida pois compreendem não só direitos da mãe, mas também do nascituro, seja na esfera pública ou privada (MARIANI; NASCIMENTO NETO, 2016).
O direito à vida é assegurado pela Constituição Federal em seu artigo 5º, e também através artigo 4º do Pacto de São José da Costa Rica. Assim, este direito é amplo e envolve não só o direito de não ser morto ou privado da vida, mas também o de continuar vivo e ter uma existência digna, compreendendo um dos direitos de mais importância. Se trata de direito inviolável e intrínseco a todo ser humano, e é também direito indisponível, prevalece em detrimento a outros, e, sendo indisponível, não pode ser cedido ou abandonado, é direito ligado a existência e não se pode abrir mão (LENZA, 2019).
No mesmo sentido, o direito a saúde está previsto no artigo 196 da Constituição Federal de 1988, que estabelece o dever do Estado em atuar através de medidas sociais e econômicas a fim de assegurar este direito. O direito a saúde se destaca por sua fundamental importância para a efetividade e exercício de outros direitos ligados a vida de todo ser humano (LENZA, 2019).
Os Direitos Humanos dos Pacientes são definidos como um ramo do Direito Internacional dos Direitos Humanos e que compreendem um conjunto de convenções, pactos, declarações e jurisprudência internacionais formadas pelos órgãos de monitoramento dos direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), o Sistema Europeu de Proteção dos Direitos Humanos, o Sistema Interamericano de
Direitos Humanos e o Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos saúde. Assim, dos direitos infringidos pelo cometimento da violência obstétrica destaca-se: o direito à vida; a não ser submetido a tortura e tratamento cruel ou degradante; direito ao respeito pela vida privada; à informação; a não ser discriminado e, por fim, direito a saúde (OLIVEIRA, 2017).
Resta claro dever do Estado em adotar as medidas necessárias para o pleno exercício destes direitos, dado que os índices altos e crescentes de morbimortalidade materna estão diretamente ligados a omissão do Estado no que se refere a saúde da mulher no período de gestação e as condições precárias e desumanas dispensadas a estas mulheres durante pré e o pós parto, o que inclui não somente a falta de estrutura da rede pública, mas também o tratamento fornecido pelos profissionais da saúde as pacientes (OLIVEIRA, 2017).
3 CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
Um dos primeiros registros acerca da violência obstétrica foi em 1958, com a publicação da matéria Crueldade nas Maternidades, pela revista norte-americana Ladies Home Journal. No texto haviam relatos tanto de mães como enfermeiras que informavam sobre os tratamentos a que as parturientes eram submetidas durante o parto. Entre outros depoimentos, foram relatadas inúmeras crueldades, casos em que se realizaram episiotomias, uma incisão/corte que é feita na região do períneo da mulher para supostamente ampliar o canal do parto e sem anestesia. Parturientes com pernas amarradas para impedir o nascimento enquanto o médico saia para refeições, e ainda eram intimidadas sobre seus gritos de dor causarem danos ao cérebro do bebê (MARQUES, 2021).
Em 1958 houveram movimentações no Reino Unido com a publicação de uma carta ao jornal The Guardian para convocar a implementação da Sociedade para Prevenção da Crueldade contra Grávidas, que trazia denúncias a respeito da solidão e falta de empatia, redução de horários de visita, desrespeito, ignorância, privação de sono, entre outras violências sofridas pelas mães durante o parto. No Brasil em 1981 foi publicado o Espelho de Vênus, feito pelo Grupo Ceres o texto descrevia as inúmeras práticas violentas cometidas e conceituava a violência obstétrica. Trazendoa como um novo tipo, dentre tantos, de violência contra a mulher, relacionando com o desconhecimento acerca da fisiologia feminina e a aflição das parturientes em verem seus corpos sendo manipulados com tanta agressividade e falta de dignidade (MARQUES, 2021).
Em 2014 a OMS publicou uma nova declaração acerca da necessidade de prevenir e eliminar as violências cometidas contra as parturientes. Citando os abusos, maus-tratos e desrespeito a dignidade humana praticadas pelas unidades hospitalares e profissionais da saúde, demonstrando ainda a importância da manutenção do direito e acesso ao parto seguro e digno. No Brasil foi somente em 2019, por recomendação do Ministério Público Federal em São Paulo, que o Ministério da Saúde (MS) reconheceu a legitimidade do termo violência obstétrica, que antes era inadequado segundo o MS. Assim, ele autorizou mulheres a utilizarem da expressão para relatar todas as agressões e experiências sofridas durante o parto, que configurariam maus tratos e abusos a parturiente e ao recém-nascido (OLIVEIRA, et. al., 2021).
A violência obstétrica pode acontecer em três momentos distintos no atendimento a gestante. Assim, podendo ser no pré-parto, durante o parto propriamente dito e no pós-parto. Isso demonstra a necessidade e importância de a mulher participar ativamente no processo de decisões, visto que este tipo de violência afeta não somente a mãe, mas também o nascituro que é sujeito de direitos (MARIANI; NASCIMENTO NETO, 2016).
Portanto, o conceito de violência obstétrica se trata de intervenção médica/hospitalar indevida, feita sem autorização ou até mesmo não informada, sobre o corpo ou processo reprodutivo da mulher. Consistindo assim em violação a autonomia, informação, liberdade e participação em decisões acerca de seu próprio corpo: “a violência obstétrica é uma série de violências físicas, sexuais e psicológicas pelas quais a mulher é submetida em um momento que deveria ser marcado tão somente pela felicidade de dar à luz” (MARIANI; NASCIMENTO NETO, 2016, p. 51).
A violência obstétrica equivale a apropriação do corpo, assim como dos processos reprodutivos da mulher por qualquer profissional da saúde. Essa violência é externada através de um tratamento violento e que afeta a autonomia da parturiente, bem como sua capacidade de decidir acerca dos procedimentos que são executados em seu próprio corpo. A mulher acaba sendo submetida a dores desnecessárias e excessivas, a procedimentos invasivos que não são recomendados e tudo isso associado a humilhações e perda da própria dignidade (OLIVEIRA, 2017).
Logo, é qualquer conduta omissiva ou comissiva, feita por profissionais da saúde em hospitais públicos ou privados e que, seja diretamente ou não culmina na apropriação indevida do processo reprodutivo da mulher. É a submissão a tratamento desumano, com abuso de medicação e procedimentos opressores fundamentado em uma patologização desnecessária dos processos da gravidez e do parto (BRITO et. al. 2020).
Assim, a expressão violência obstétrica, embora ainda não tipificado como crime no ordenamento jurídico brasileiro, vem sendo utilizada para caracterizar as práticas que acontecem dentro das unidades de saúde e atendimento a gestante, seja no pré-natal, na execução do parto ou no puerpério. Agressões que podem ser cometidas não só por médicos, mas por todos profissionais que estão envolvidos no tratamento dispensado a mulher e a criança no ciclo gravídico-puerperal (MARQUES, 2020).
3.1. FORMAS MAIS COMUNS DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
A violência física ela pode ser definida como todos fatos que atingem e interferem no corpo feminino, causando dor e abuso físico, seja de grau leve ou não, sem a necessidade ou fundamento científico. Cita-se entre os principais e mais populares procedimentos a episiotomia, aqui já abordada e a manobra de Kristeler, procedimento em que a barriga da parturiente é empurrada pelo profissional (OLIVEIRA, 2017).
Ainda, enquadram-se como violência obstétrica o enema que se trata de lavagem intestinal e o uso da ocitocina sintética um hormônio utilizado para acelerar as contrações. O fórceps, submeter a gestante a jejum de comida e de água, bem como o exame de toque frequente e exagerado usado para sentir a dilatação e descida do bebê e o rompimento artificial da bolsa (MARIANI; NASCIMENTO NETO, 2016).
Este tipo de violência geralmente envolve procedimentos médicos forçados ou não consentidos, que não são esclarecidos para a paciente antes de serem realizados. Destaca-se também a submissão da gestante a posições desconfortáveis que geram dor, imobilização física ou restrição de movimentos, suturas e intervenções sem anestesia. A cesariana também é outro grande problema, este procedimento é indicado apenas em partos difíceis em que não há possibilidade do parto natural com segurança, usado para prevenir a morbidade materna e fetal (OLIVEIRA, 2017).
A cesárea é intervenção cirúrgica que, como qualquer outra, possui riscos a paciente e ao recém-nascido. Ela pode acarretar desde complicações leves como febre e perda sanguínea ou até eventos maiores como infecções e lacerações acidentais internas. A cesárea eletiva é realizada sem necessidade clínica, muitas vezes por conveniência médica que acaba por submeter, em grande parte, mulheres a essa cirurgia de grande porte e risco sem necessidade (SCHOPF, 2021).
Há que se falar ainda da violência psicológica, ela acontece de forma silenciosa e cruel e é uma das mais recorrentes. Se classifica como qualquer conduta, verbal ou de comportamento, que seja desrespeitosa, humilhante e que diminua a mulher, subestimando sua dor e causando desestabilidade emocional, insegurança, fragilidade, negligenciando reclamações, pedidos de ajuda e que estimulam o descaso e a falta de dignidade (SCHOPF, 2021).
Dentre alguns exemplos de violência obstétrica de cunho psicológico, pode se mencionar a privação de informações a gestante sobre procedimentos que serão executados nela ou na criança. Comentários ofensivos, humilhantes ou até mesmo discriminatórios, tratamentos agressivos, grosseiros e sem empatia ou expor a mulher a situação de medo e abandono. Também, a censura a comportamentos da parturiente que expressam dor ou emoções e a demora em promover contato da mãe com o recém-nascido (SCHOPF, 2021).
Ainda, para mulheres mais vulneráveis economicamente, pode haver recusa do hospital em administrar medicamentos ou até mesmo a retenção da mãe e do recém-nascido na instituição até quitação de débitos. Essas negligências que são cometidas durante o processo do parto causam complicações que poderiam ser evitadas, podendo causar até riscos a vida da mãe ou do bebê (OLIVEIRA, 2017).
4 VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA SOB A PERSPECTIVA JURÍDICA
Apesar de ser um crime muito comum dentro dos ambientes hospitalares a prática da violência obstétrica ainda carece de uma previsão expressa em lei específica. A definição legal bem como a cominação da pena é de suma importância para prevenir e coibir este tipo de violência contra a mulher, além de também disseminar informações e tornar evidente as formas com que essa violência pode se manifestar (LEITE et. al., 2022).
Os textos, documentos oficiais e também as políticas públicas no Brasil ainda não estão fazendo o uso do termo violência obstétrica. Essa omissão do Estado em parte pode ser justificada pela falta de estatísticas confiáveis e transparente sobre o cometimento e prevalência dessa violência, assim como de estudos e evidencias cientificas sobre os prejuízos a saúde da mulher e da criança que são submetidas a essas agressões (LEITE et. al., 2022).
Desta forma, a falta de posicionamento do Estado diante desta violência contra mulheres, seja pela necessidade de previsão legal bem como de adequação e implementação de políticas públicas tem auxiliado na continuidade e propagação desta prática criminosa. Assim como também afeta a mensuração de dados e estatísticas sobre a violência obstétrica, pois a maioria dos casos não são noticiados e as gestantes, por falta de conhecimento e suporte, não buscam fazer um boletim de ocorrência (LEITE et. al., 2022).
Existem outros fatores que contribuem para que a violência obstétrica continue a acontecer como a falta de disseminação de informações acerca de seus direitos para as parturientes, a péssima estrutura dos hospitais públicos, a má formação humanitária os profissionais da área da saúde, a discriminação de gênero, o machismo e a cultura de superioridade dos médicos. Entretanto, a ausência de lei específica associada a falta de conhecimento dos magistrados sobre o tema são fatores importantes que cooperam para a perpetuação do desamparo aos direitos das gestantes/mães (BRITO et. al. 2020).
Nesse sentido, a implementação de um termo e lei especifica que endosse a prática é medida fundamental para compreender melhor o problema, compreender as experiencias negativas e subjetivas da vítima. De modo que é também essencial para delimitar as práticas criminosas para que também não haja uma marginalização de qualquer conduta dos profissionais da saúde na assistência e atendimento à gestante ou puérpera (COSTA, et. al., 2021).
5 POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL E PENAL
A ausência de lei específica sobre violência obstétrica não impede a parturiente de receber amparo sob a perspectiva da responsabilidade civil. Isso nos casos em que se constata quaisquer atos violentos, consequências e privações de direitos, sendo possível a mulher ajuizar ação indenizatória, e o Poder Judiciário sob análise do caso concreto poderá decidir pela possibilidade de reparação. O Direito está direcionado aos atos ilícitos, tendo em vista a necessidade de reprimir e sanar as lesões e consequências destas condutas nocivas. Sendo assim, o ordenamento pátrio cria um conjunto de direitos e de deveres, cuja violação compreende um ato ilícito, e cometimento desta ação na grande maioria dos casos acaba causando nos para terceiros, situação essa que cria um novo dever jurídico dessa vez consistindo na reparação do dano (COSTA, et. al., 2021).
Neste contexto surge a noção de responsabilidade enquanto uma espécie de contraprestação, em que se busca reparar os danos e prejuízos provenientes do ato ilícito e da violação de dever jurídico. Logo, é possível concluir que qualquer conduta do ser humano que em alguma hipótese viole o dever jurídico originário e direitos de terceiros, causando danos a outrem é passivo de gerar responsabilidade. O ato ilícito pode acontecer tanto na esfera civil como na esfera penal. O Direito Penal é ferramenta máxima de controle social na sociedade, de modo que ele é aplicado somente em casos de maior gravidade social, em contrapartida os casos menos graves são passíveis de serem solucionados apenas no âmbito civil, através da reparação do dano (COSTA, et. al., 2021).
Assim, a responsabilidade penal decorre de alguma conduta/fato cometido que seja tipificado criminalmente, independente se foi conduta comissiva ou omissiva, é aplicada uma pena no criminoso proporcional ao delito. Já a responsabilidade civil constitui dano que é capaz de causar lesões a bens juridicamente tutelados, o que consequentemente cria uma obrigação de reparar através de uma indenização ou compensação (COSTA, et. al., 2021).
A responsabilidade do médico e de outros profissionais é subjetiva, ou seja, é preciso que se comprove a culpa, bem como nexo causal entre o dano e a conduta praticada. Essa responsabilidade se fundamenta no artigo 951 do CC/02 prevendo indenização para os casos em que se comprove a atuação do profissional com negligencia, imperícia ou imprudência. O dever de indenizar nestes casos pode ser por dano moral ou material (SCHOPF, 2021).
Já quando se trata de matéria penal a violência obstétrica é ignorada, uma vez que não é tipificada. Todavia, para procedimentos mais invasivos realizados na gestante que podem causar algum dano é possível verificar o enquadramento enquanto uma lesão corporal tipificada no artigo 129 do CP/40, em que há perigo e ofensa a integridade corporal ou saúde de outra pessoa. A pena prevista é de detenção de três meses a um ano para lesão simples e de reclusão de dois a oito anos para lesões graves (SCHOPF, 2021).
Obviamente que o enquadramento deste crime como uma lesão corporal ou até mesmo com um ressarcimento indenizatório feito na esfera civil não atende as expectativas da vítima. Isto porque a conduta não é reconhecida propriamente como violência obstétrica e o autor não responde e não é reconhecido pela extensão dos danos causados a mulher, ao bebe e a família. De certo modo, isso acaba por reforçar a exclusão e falta de assistência aos direitos femininos (SCHOPF, 2021).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A violência, assim como a violência de gênero, se faz presente em toda a estrutura da sociedade. O Direito nasceu em razão da necessidade de regular as relações sociais e promover a justiça, e é também uma ferramenta importante no auxílio de mudanças sociais, pois ele evolui sempre conforme as necessidades da sociedade. A partir disso, nos últimos anos foram alcançadas grandes conquistas nos direitos femininos, e as lutas para combater a violência de gênero ajudam a trazer visibilidade para essas questões.
A violência obstétrica é espécie de violência de gênero e que está tão perpetrada socialmente que por vezes as gestantes não tem consciência de que foram agredidas e violadas em seus corpos e direitos. Assim, a violência obstétrica retira a
autonomia e o protagonismo da mulher no parto, ocorre uma apropriação de seu próprio corpo e de seus processos reprodutivos pelos profissionais de saúde, que conduzem o parto conforme acreditam, por vezes com procedimentos violentos, invasivos e desnecessários.
É neste contexto que se demonstra a necessidade da criação de uma previsão especifica quanto a este tipo de crime, que delimite sua abrangência, formas de configuração e principalmente a punição devida para a violência obstétrica. Isto tendo em vista que apesar de atualmente existirem algumas políticas públicas e outros direitos previstos para a maternidade, a lacuna sobre o crime de violência obstétrica permanece, o que acaba permitindo que as práticas ilegais e o desrespeito as pacientes continuem a acontecer.
Por fim, é certo que já existem Projetos de Lei e movimentações no Poder Judiciário com foco em tratar sobre a violência obstétrica e reconhecer a existência dessa modalidade de crime. Assim, o foco desta pesquisa não foi exaurir as soluções para a problemática, mas ajudar a dar visibilidade e relevância para a questão e para a negligência aos direitos femininos, que continuam a ocorrer mesmo com o passar das décadas.
ABSTRACT
This work aims to deal with obstetric violence, a new form of gender violence, which still lacks regulation and has occurred widely, both during pregnancy, childbirth and postpartum. In this sense, the characteristics and modalities of this violence were addressed, bringing visibility to how it can occur and be identified in the daily routine of hospital practices. From this, it seeks to highlight the lack of legal support and the absence of specific prediction that typifies this crime, regulating its conceptual aspects, its scope and due punishments. To build the research, a bibliographic review was carried out based on doctrines, scientific articles, monographs, journals, theses, books, legal texts and relevant legislation. Moreover, it is understood that the legal definition and application of the penalty are essential to prevent and curb this type of violence against women, in addition to disseminating information and making evident the many ways in which this violence can manifest itself.
Keywords: Obstetric Violence. Safe Motherhood. Women’s Rights
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1Graduanda. Curso de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – UniEVANGÉLICA – E-mail: veronikadias04@gmail.com
2Professor Esp. Curso de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – UniEVANGÉLICA – Email:pedro7ho@gmail.com