EXTRAORDINARY USUCAPION AND THE RIGHT TO PROPERTY: A HISTORICAL ANALYSIS
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10004687
Raul Cavalcante Batista filho1
Lucas Lucena Oliveira2
RESUMO: No presente artigo iremos tratar dos aspectos da usucapião como forma originária de aquisição de propriedade com ênfase na modalidade usucapião extraordinária, prevista, mais específicamente no artigo 1.238 do Código Civil. A propriedade é um direito constitucional elevado pelos constituintes a direito fundamental comparado com os mais nobres direitos da vida em sociedade. Desse modo, a CRFB/88 atribui dentre os direitos e garantias individuais, o direito a propriedade, desde que ela cumpra a sua função social, nos termos do artigo 5º, XXII e XXIII. Trata-se de uma pesquisa sobre a usucapião extraordinária e o direito a propriedade como uma análise histórica, no qual busca compreender a aplicação da usucapião extraordinária no que diz respeito a sua distribuição, regularização de propriedades e seus efeitos históricos. O objetivo geral dessa pesquisa busca verificar as mudanças históricas no que tange o Direito a Propriedade demonstrando a efetividade da usucapião extraordinária sobre a distribuição de terras e a legalização das propriedades. A primeira etapa do trabalho foi realizar a leitura de resumos para verificar se a publicação se tratava do tema da pesquisa, analisando as leis vigentes e a influência delas perante o tema exposto e a leitura de todo o trabalho com seleção e descrição dos principais resultados.
Palavras Chave: Usucapião. Extrajudicial. Propriedade.
ABSTRACT: In this article we will deal with the aspects of usucapião as an original form of property acquisition with emphasis on the extraordinary usucapião modality, provided for, more specifically, in article 1.238 of the Civil Code. Property is a constitutional right elevated by the constituents to a fundamental right compared to the nobler rights of life in society. Thus, the CRFB/88 assigns among the individual rights and guarantees, the right to property, provided that it fulfils its social function in accordance with Articles 5, XXII and XXIII. This is a research on extraordinary usucapion and the right to propertyas a historical analysis, in which it seeks to understand the application of extraordinary usucapião with regard to its distribution, regularization of properties and its historical effects. The general objective of this research seeks to verify the historical changes regarding the Right to Property demonstrating the effectiveness of extraordinary usucapião on the distribution of land and the legalization of properties. The first stage of the work was to read abstracts to verify if the publication was the theme of the research, analyzing the current laws and their influence on the theme exposed and the reading of the entire work with selection and description of the main results.
KEYWORD: Usucapião. Extrajudicial. Property
1. INTRODUÇÃO
A usucapião extraordinária é uma figura importante no direito brasileiro que permite a aquisição da propriedade de um imóvel por alguém que o possui de forma contínua, pacífica e ininterrupta por um longo período de tempo, geralmente estipulado em 15 anos, de acordo com o Código Civil brasileiro. No presente artigo iremos tratar dos aspectos da usucapião como forma originária de aquisição de propriedade com ênfase na modalidade usucapião extraordinária, prevista, mais especificamente no artigo 1.238 do Código Civil.
A propriedade é um direito constitucional elevado pelos constituintes a direito fundamental comparado com os mais nobres direitos da vida em sociedade. Desse modo, a CRFB/88 atribui dentre os direitos e garantias individuais, o direito a propriedade, desde que ela cumpra a sua função social, nos termos do artigo 5º, XXII e XXIII. Esse caráter social ligado ao dispositivo pré citado determina as peculiaridades relacionadas a utilização da propriedade expondo os poderes e ou faculdades inerentes a propriedade.
A usucapião é a eventualidade no que diz respeito reconhecer a posse e obtenção da propriedade. Desde o início das legislações as intensificações do individualismo inseriu na propriedade características de inviolabilidade e absolutismo. Contudo, nos dias atuais já pode-se averiguar a propriedade privada como um complexo de limitações formais, formadas por restrições e e deduções que compõem o conteúdo da função social da propriedade.
Destaca-se que a aplicação da usucapião extraordinária no Brasil está sujeita a diversos requisitos e procedimentos legais específicos. Além disso, a legislação pode variar dependendo do tipo de propriedade, seja ela rural, urbana, etc. e da situação individual.
O presente artigo trata-se de uma pesquisa sobre a usucapião extraordinária e o direito a propriedade como uma análise histórica, no qual busca compreender a aplicação da usucapião extraordinária no que diz respeito a sua distribuição, regularização de propriedades e seus efeitos históricos. Quanto a problematização da presente pesquisa esta decorre dos questionamentos sobre o Usucapião Extraordinário frente ao direito de propriedade como uma garantia constitucional.
O objetivo geral dessa pesquisa busca verificar as mudanças históricas no que tange o Direito a Propriedade demonstrando a efetividade da usucapião extraordinária sobre a distribuição de terras e a legalização das propriedades. Quanto aos objetivos específicos buscam descrever os aspectos gerais sobre o direito de propriedade; Apresentar as origens e transformações históricas da usucapião; Analisar a usucapião extraordinária a luz do ordenamento jurídico brasileiro atual.
O presente estudo trata-se de uma revisão da literatura utilizando-se dados, informações bibliográficas ou eletrônicas na busca de outros estudos e autores. Nesse sentido, foi utilizada uma metodologia com base na revisão bibliográfica específica e atual com intuito de levantar informações literárias de acordo com o tema proposto.
A primeira etapa do trabalho foi realizar a leitura de resumos para verificar se a publicação se tratava do tema da pesquisa, analisando as leis vigentes e a influência delas perante o tema exposto e a leitura de todo o trabalho com seleção e descrição dos principais resultados.
Desse modo, após a delimitação do tema, convergiu o conteúdo bibliográfico necessário para a construção da fundamentação teórica em busca da familiarização com a temática, que consiste no levantamento de embasamentos teóricos, com o intuito de agregar informações literárias como base da exploração de artigos e materiais.
Com base na revisão de literatura este artigo está estruturado em quatro seções a serem expostas.
2. CONCEITO DE USUCAPIÃO E UMA BREVE ANÁLISE HISTÓRICA
Partindo para a etimologia da palavra, “usucapião” vem do latim usucapio, que significa uso (usu), e tomar em relação ao seu uso (capio).
A origem desse instituto remonta ao período colonial brasileiro, quando o país estava sob domínio português. As terras eram frequentemente concedidas a colonos e sesmeiros, mas nem sempre esses proprietários efetivamente ocupavam e cultivavam todas as terras que lhes eram atribuídas. Muitas vezes, as terras eram abandonadas ou não utilizadas de forma produtiva. Para evitar o acúmulo de terras improdutivas e promover o desenvolvimento econômico, as leis coloniais e, posteriormente, as leis imperiais brasileiras, incluíram disposições que permitiam que pessoas que ocupassem e melhorassem terras por um determinado período de tempo pudessem adquirir a propriedade dessas terras, desde que cumprissem certos requisitos.
Segundo Venosa (2010), o objetivo da usucapião é distribuir o bem de forma justa a quem dele se beneficia, seja por meio de residência ou exploração econômica.
Além disso, o governo deve intervir rotineiramente na propriedade privada se os recursos não estiverem sendo usados adequadamente ou não forem atendidos, redistribuindo-os para aqueles que têm interesse em fazê-lo e os meios para fazê-lo.
Há discussão na doutrina sobre a classificação da forma pela qual a usucapião é utilizada na aquisição da propriedade: se foi derivada ou originária. A primeira classificação ocorre quando não há transmissão de uma pessoa a outra, ou quando o sujeito adquire algo o tornando próprio sem que tenha pertencido anteriormente a outra pessoa ou porque nunca pertenceu a outra pessoa. A aquisição que resulta de uma negociação jurídica entre o proprietário e o adquirente resulta na transferência do domínio em decorrência do desejo manifestado mutuamente pelas partes (GONÇALVES, 2014).
A grande maioria da doutrina sustenta que a usucapião é a forma originária de aquisição de bens, pois, apesar de o bem usucapido poder ter pertencido a outrem, o usucapiente dele não recebe aquela coisa. Neste caso, o seu direito de aquisição é derivado não diretamente do proprietário anterior, mas sim de uma decisão legal que lhe concede o direito de adquirir a propriedade (VENOSA, 2010).
A discordância sobre se a usucapião é um modo original de aquisição de propriedade é baseada em como os autores definem um modo original. Segundo eles, algo só é original quando o proprietário se torna proprietário de algo que nunca esteve sob o controle de outrem, ou quando a propriedade da coisa surge ali pela primeira vez, sendo a ocupação o único modo originário (GONÇALVES, 2014).
No Brasil, o direito pré-codificado exigia uma prescrição longissimi temporis que, por sua vez, expirou após 30 anos para bens pessoais tangíveis, e após 40 anos para bens públicos intangíveis e itens contestados, incluindo bens roubados. Somente nos Códigos Civis de 1916 e 2002 se separaram a prescrição e a usurpação, estando a primeira prevista na Seção Geral do Código e a segunda no Livro de Direito das Coisas (FARIAS; ROSENVELD, 2015).
Conforme ao exposto, pode-se notar que ao longo do tempo, as regras de usucapião foram sendo aprimoradas e atualizadas por meio de diversas reformas legislativas e, mais recentemente, pelo Código Civil de 2002. De modo que a usucapião extraordinária no Brasil seja uma expressão do princípio da função social da propriedade, que visa evitar que terras ou imóveis permaneçam improdutivos ou subutilizados. Ela permite que aqueles que estão na posse direta e ininterrupta de um imóvel por um longo período de tempo adquiram a propriedade legal, desde que atendam aos requisitos legais estabelecidos.
2.1 Usucapião Extraordinária
O Usucapião extraordinária é um modo autônomo de uma aquisição da propriedade móvel e imóvel que é mediante a posse qualificada da coisa pelo prazo legal. Desde a mais alta antiguidade de reconhecimento da necessidade social desse instituto (BRASIL, 2002). Tal modalidade é forma mais popular e conhecida de usucapião. A falta do justo-título e da boa-fé, é um fator significativo; ou seja, esses requisitos não são necessários para a modalidade de julgamento e servem apenas como suporte para o julgamento, caso existam (GONÇALVES, 2014).
Contudo, desde a época da mais alta antiguidade se reconheceu a necessidade social desse instituto, o Direito Romano o disciplinou como um modelo de aquisição. A igreja lhe fez restrições, por razões morais e como um suporte no Direito Natural, pelo fato de admitir a usucapião uma expropriação sem indenização.
Outro aspecto digno de nota dessa é a valorização do proprietário que exerce função social na propriedade, seja pela residência efetiva na mesma, seja pela prestação de bens e serviços de cunho produtivo. Essa redução do valor agregado no tempo de venda de uma casa, de cinco para dois anos, demonstra mais uma vez a importância da busca pela justiça ambiental e social por meio do princípio da função social.
O direito de requerer o reconhecimento judicial da usucapião está delineado no artigo 1.241 do Código Civil, que diz o seguinte: ” Poderá o possuidor requerer ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, a propriedade imóvel” (BRASIL, 2002). No entanto, a regulamentação do processo judicial de usucapião encontra-se no Código de Processo Civil (CPC), que foi alterado em 2015 para incorporar o processo comum ao invés de torná-lo um procedimento especial como em 1973 (artigos 941 a 945).
Conforme a isso, a usucapião extraordinária é uma modalidade de usucapião, um instituto do direito civil que permite a aquisição da propriedade de um bem imóvel por uma pessoa que o possui de forma contínua, pacífica e ininterrupta por um longo período de tempo, desde que atenda a certos requisitos legais específicos. No caso da usucapião extraordinária, esses requisitos costumam ser mais rigorosos do que em outras modalidades de usucapião.
Maria Helena Diniz (2011, p. 161) explana sobre a necessidade de pacificidade e a imprescindibilidade da ausência de interrupção, que assim dispõe:
A posse deve ser mansa e pacífica, isto é, exercida sem contestação de quem tenha legitimo interesse, ou melhor, do proprietário contra quem se pretende usucapir. Se a posse for perturbada pelo proprietário, que se mantém solerte na defesa de seu domínio, falta um requisito para a usucapião. Para que se configure a usucapião é mister a atividade singular do possuidor e a passividade geral do proprietário e de terceiros, ante aquela situação individual. Precisa ser ela contínua, ou seja, exercida sem intermitência ou intervalos.
Na atual legislção o artigo 1.238 do Código Civil define mais precisamente a usucapião na modalidade extraordinária, dispondo que:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boafé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Portando, além do requisito do tempo de posse, a usucapião extraordinária também exige que o possuidor do imóvel tenha agido de boa-fé, ou seja, que ele tenha acreditado, de forma legítima, que era o verdadeiro dono do imóvel. A boa-fé é um elemento importante nesse tipo de usucapião.
Vale ressaltar que a usucapião extraordinária não depende de pagamento pelo possuidor ao proprietário original, diferentemente de outras modalidades de usucapião. No entanto, o processo judicial para reconhecimento da usucapião é necessário para regularizar a situação legal do imóvel.
Ao Tratar-se da oposição para interromper o prazo de aquisição esta deve ser aquela perpetrada ou que se manifesta no seu decurso de modo que apenas esta rompe o prosseguimento do lapso prescricional aquisitivo. Portanto, transcorrido o período, qualquer impugnação será ineficaz, pois a partir de então a posse já será consumada.
Em face da posse, o indivíduo precisa ser consciente de que o ato de uma mera permissão para o uso da propriedade não irá lhe caracterizar como verdadeiro possuidor, dessa forma, o artigo 1.208, do Código Civil, apresenta que:
Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.
Nessa diapasão, a posse violenta decorre do emprego de força, que de forma lógica se contraria a posse pacífica e mansa. Clandestina é a posse que se caracteriza por vias ilícitas ou discretas que não oportuniza o verdadeiro possuidor de preservar os seus direitos ligados a propriedade. Já a posse precária se deriva do abuso de confiança daquele que tendo recebido a coisa com o encargo de devolvê-la, se recusa em momento de fazê-la.
3. PROPRIEDADE
A propriedade é um conceito fundamental no direito e na teoria jurídica, abrangendo uma série de direitos e prerrogativas relacionadas ao controle e ao uso de bens materiais e imateriais. Ela desempenha um papel central em diversos ramos do direito, incluindo o direito civil, o direito imobiliário, o direito empresarial e outros. Ressalta-se que a propriedade é um direito real, desse modo, Nader (2015) leciona que determinado direito se caracteriza pelo grande e abrangente domínio que o titular possui sobre o bem.
A propriedade confere ao proprietário uma série de direitos, incluindo o direito de usar o bem, receber os benefícios dele, vendê-lo, alugá-lo ou doá-lo, bem como o direito de proteger o bem contra interferências de terceiros. Esses direitos são frequentemente resumidos na expressão “usar, gozar, dispor e excluir” podendo ser transferida de uma pessoa para outra por meio de diversos instrumentos legais, como contratos de compra e venda, doações, testamentos ou herança. Cada um desses métodos tem seus próprios requisitos legais e formalidades.
Vale mencionar que o direito à propriedade é amplamente protegido pelo sistema legal. Se alguém violar os direitos de propriedade de outra pessoa, o proprietário pode recorrer aos tribunais para buscar reparação por danos ou proteção legal.
Melo (2014, p. 53-54) conceitua propriedade como:
O direito de propriedade (domínio) é o mais completo dos direitos subjetivos, representado pelo exercício do titular (pessoa física ou jurídica, singular ou coletiva) sobre uma determinada coisa (corpórea ou incorpórea), em regra perpetuamente, de modo absoluto e exclusivo, impondo-se a todos respeitar, podendo o seu titular usar, gozar e dispor da coisa, podendo ainda reavê-la de quem quer que a injustamente possua ou detenha […].
Portanto, a propriedade é o direito legal de uma pessoa ou entidade ter controle sobre um bem e de usá-lo, gozá-lo, dispor dele e excluí-lo de terceiros, de acordo com a lei buscando desempenhar um papel essencial ao funcionamento da economia e da sociedade, proporcionando incentivos para a criação, inovação e uso eficiente de recursos e regulada por uma série de leis e princípios legais, e a interpretação dessas leis pode variar de acordo com a jurisdição e o contexto legal específico.
3.1 aspectos gerais do direito de propriedade e sua função social
O direito de propriedade tem um lugar especial no ordenamento jurídico que é quase universalmente elogiado por advogados especializados no estudo dos direitos civis. Segundo Gonçalves (2014), este é o rol mais abrangente dos direitos subjetivos, a intersecção dos direitos reais e o cerne do direito às coisas. O autor ainda afirma que o direito de propriedade é o mais significativo e firme de todos os direitos do sujeito, o verdadeiro direito acima de todos os outros, e o centro em torno do qual se centram todos os outros direitos.
A magnitude da importância para o estudo jurídico da propriedade justifica-se pela sua origem. A necessidade de um indivíduo satisfazer suas necessidades básicas por meio da apropriação de bens pode ser vista desde os primórdios da humanidade, quando o homem deixou a terra e a terra passou a ser sua propriedade (FARIAS; ROSENVELD, 2015). Este processo é inicialmente examinado pela procura de bens de consumo imediato. A partir daí o homem passa a controlar os objetos móveis, aperfeiçoando a noção de propriedade como algo complexo e plural.
Três critérios podem ser utilizados para resumir o conceito de direito de propriedade: o sintético, que é a ideia de que algo está sujeito a alguém em todas as suas relações; a analítica, que é a ideia de que alguém tem o direito de usar, desfrutar e dispor de algo; e a descritiva, que é a ideia de que algo possui um direito complexo, absoluto, perpétuo e exclusivo, além de levar em consideração as restrições legais (GOMES, 2012).
A forma como a propriedade é organizada legalmente varia de país para país e mudou desde a Antiguidade até o presente. Os sistemas políticos dos locais onde é concebido terão, inelutavelmente, um impacto direto e significativo no instituto da propriedade (GONÇALVES, 2014). Devido a todas essas variações, o conceito de propriedade passou a ser flexível e tende a acompanhar os desenvolvimentos econômicos, políticos, sociais e religiosos da localidade.
O direito de propriedade tornou-se um direito fundamental subjetivo no ordenamento jurídico brasileiro, resguardado e protegido pela Constituição Federal, positivado no artigo 5º, XXII, e confirmado também no artigo 1.228 do Código Civil, este último direcionado à atuação do proprietário, a quem é garantido ” o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha ” (BRASIL, 2002). Essa garantia constitucional busca impor um dever de abstinência ao mesmo tempo em que impõe um nível de autonomia privada imune à interferência do poder público e de terceiros (LEAL, 2012).
O artigo 1.231 do Código Civil afirma que “a propriedade se presume plena e exclusiva, salvo prova em contrário” (BRASIL, 2002). Neste caso, o direito do proprietário é absoluto ou irrestrito no sentido de poder usar, fruir e dispor do imóvel da forma que lhe aprouver, podendo exigir todos os usos que o imóvel seja capaz de proporcionar, salvo apenas algumas restrições impostas à luz do interesse público (GONÇALVES, 2014).
Outra qualidade ou atributo que deve ganhar destaque é a exclusividade. O termo “ser exclusiva” é usada no sentido de o proprietário ter o direito de impedir alguém de usar qualquer coisa sem o seu consentimento (GONÇALVES, 2014). O domínio é alvo da exclusividade, pois não pode haver mais de um domínio centrado no mesmo bem. Com isso, apenas uma pessoa pode usar, colher e descartar o item, tornando o domínio único e indivisível (FARIAS; ROSENVELD, 2015). Tais atributos da propriedade geram uma percepção equivocada de que a propriedade é ilimitada em seu sentido absoluto, isto é, intocável. Contudo, ao longo dos anos tais características têm recebido mais restrições e limitações, diminuindo os direitos dos proprietários (CARVALHO, 2016).
O princípio fundamental da função social acarreta a principal restrição ao direito de propriedade na atualidade, juntamente com outras restrições impostas pelas leis de mineração, silvicultura e proteção ambiental, além das restrições impostas pelo direito de vizinhança. Com isso, essas restrições acabaram por traçar a atual situação do direito de propriedade no ordenamento jurídico brasileiro, que antes era caracterizado por um direito absoluto e ilimitado, mas agora é um direito com finalidade social (GONÇALVES, 2014).
À medida que a propriedade passa a ser tratada como instituição, o conceito de sua função social começa a tomar forma. Nessa dialética, entende-se que os benefícios são dados ao indivíduo para potencializar sua “função social”, ao invés de serem explorados ao máximo e em detrimento de outros. Para garantir o cumprimento de determinadas obrigações e o desempenho desse papel, defende-se que o direito de propriedade deve ser limitado (PEREIRA, 2012).
3.1.2 A usucapião extraordinária como forma de regularização e distribuição de propriedades
Em regra, o bem imóvel é obtido de maneira consensual, gratuita ou onerosa, consistente no registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente. O Registro no Cartório de Imóveis garante direitos e permite a oposição às exceções contra todos, além de assegurar validade e regularidade aos atos e negócios jurídicos.
Entretanto, pode-se observar que os efeitos da usucapião, que funcionam como verdadeiro remédio nas aquisições de imóveis irregulares, são pouco discutidos na atual sociedade.
Apesar de gerar grandes discussões nos Tribunais de todo o país, têm-se admitido a regularização de lotes urbanos ou rurais irregulares, imóveis que não obedeceram a alguma forma legal para sua formalização e estas situações por vezes, inviabilizam negócios ou até mesmo expõem o comprador a riscos. Portanto, é exatamente diante dessas situações que a usucapião surge buscando modos de sanar determinados problemas.
No que tange a distribuição de propriedades, a usucapião extraordinária, ao permitir que uma pessoa adquira a propriedade de um bem imóvel por meio da posse prolongada e ininterrupta, contribui para a distribuição de propriedades e o acesso à terra. Isso é especialmente relevante em um país com desigualdades fundiárias, como o Brasil, onde a concentração de terras é historicamente um problema social.
A Regularização Fundiária frente a usucapião extraordinária é uma ferramenta legal que pode ser usada para regularizar propriedades que, de outra forma, estariam em situação irregular. Muitas áreas urbanas e rurais no Brasil têm ocupações informais e irregulares, e a usucapião pode ser usada para legalizar a posse dessas áreas, trazendo segurança jurídica para os ocupantes.
A Regularização Fundiária tem como aspecto social e principal a garantia do direito à moradia, com o objetivo de que a propriedade cumpra a sua função social, isto é, garantir os benefícios e desenvolver da melhor forma a finaliadade da propriedade, seja por meio economico, pessoal ou coletivo
Desse modo, vejamos:
USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. Loteamento irregular. Imóvelusucapiendo situado em área de proteção de mananciais. Insurgência do Ministério Público. 1. Preliminar de conversão do julgamento em diligência afastada. 2. Inexistência de óbice legal para o reconhecimento da prescrição aquisitiva por estar o imóvel situado em loteamento irregular ou em área de proteção de mananciais. Mera irregularidade administrativa. Limitações administrativas ambientais que não impedem o reconhecimento do direito de propriedade sobre o imóvel. Preenchimento dos requisitos do art. 1.238 do Código Civil. 3. Recurso desprovido. (TJ-SP – AC: 10075324620148260348 SP 1007532-46.2014.8.26.0348, Relator: Mary Grün, Data de Julgamento: 27/03/2018, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/03/2018).
O papel da regularização fundiária se baseia em três aspectos, o jurídico, o social e o urbanístico. Do ponto de vista jurídico, consiste num modo de aquisição originária de propriedade, sem o requisito tempo e natureza da posse, o que poderia ser considerado pela legislação uma desconformidade com a norma. Cumpre mencionar que com as mudanças feitas pela Lei 13.465/2017, o entendimento segundo, Rodrigo Paniz Vitório, é de que:
“[…] para alguns juristas contém contornos inconstitucionais, dada uma possível violação ao direito de propriedade. Ou seja, o Município pode conferir o título de propriedade a ocupantes do imóvel, sem contrapartida ou indenização ao proprietário anterior, e também em caso de ocupação de terras públicas, o que fere previsão constitucional no sentido oposto.” (VITÓRIO, 2018, p. 25).
É importante notar que, embora a usucapião extraordinária tenha impactos positivos na distribuição e regularização de propriedades, seu uso deve ser feito de acordo com a lei e com a devida análise de cada caso. Isso significa que os requisitos legais, como o prazo de posse, a boa-fé e outros, devem ser cumpridos para que a usucapião seja reconhecida pelo sistema jurídico.
CONCLUSÃO
O instituto da usucapião extraordinária é uma ferramenta jurídica relevante no contexto do direito à propriedade, especialmente no Brasil, onde desigualdades fundiárias e ocupações irregulares de terras são questões significativas. A usucapião extraordinária permite que uma pessoa adquira a propriedade de um bem imóvel por meio da posse prolongada e ininterrupta, desde que cumpra os requisitos legais estabelecidos.
Essa modalidade de usucapião desempenha um papel fundamental na distribuição de propriedades, na regularização fundiária e na proteção dos direitos de posse de comunidades tradicionais. Ela também contribui para a segurança jurídica, ao legalizar propriedades que, de outra forma, estariam em situação irregular.
No entanto, é importante destacar que a usucapião extraordinária é uma ferramenta legal que deve ser utilizada de acordo com a lei e os procedimentos adequados. Os requisitos, como o prazo de posse, a boa-fé e a ausência de contestação, devem ser rigorosamente cumpridos. Além disso, as políticas de aplicação da usucapião podem variar de acordo com as jurisdições e as leis locais.
Em razão das novas disposições da usucapião no Novo Código Civil, descobriu se que o legislador se preocupou com a função social da propriedade no que se refere à norma superior da Constituição Federal, que estabelece por meio de seus preceitos que o instituto da usucapião é de extrema importância para a sociedade.
Como resultado de tudo o que foi revelado, podemos constatar que o Instituto Usucapião passou por inúmeras transformações ao longo do tempo, que remontam à Roma Antiga, mas manteve sua importância para nossos direitos, visto que a propriedade será cada vez mais utilizada para o bem social, perdendo seu status privado quando não é apropriado para sua função social pretendida.
Portanto, a usucapião extraordinária é um importante instrumento para a regularização fundiária e a distribuição de propriedades, desde que seja aplicada com responsabilidade e de acordo com as normas legais vigente.
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1Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito da Unisulma/IESMA. Artigo Científico apresentado ao curso de Bacharelado em Direito na Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão – IESMA/UNISULMA, como Trabalho de Conclusão de Curso, Imperatriz – MA, 2023
2Advogado especializado em Direito Público. Doutorando em Direito pela Universidade de Marília. Mestre em Educação pela Universidade Federal do Maranhão. Especialista em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário Internacional. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão