USO INDISCRIMINADO DE MEDICAMENTOS NO TRATAMENTO DE DOENÇAS DO TRATO RESPIRATÓRIO

INDISCRIMINATE USE OF MEDICINES IN THE TREATMENT OF RESPIRATORY TRACT DISEASES

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11526440


Caroline Santos Pereira1
Maria Aparecida Barbosa Andrade1
Valdemir Moreira dos Santos Junior1
João Alfredo de Souza Silva1
Luane Silva Carvalho1
Alícya Maria Pereira Leal Guimarães1
Bruna Larissa Barbosa de Lira1
Sabrina Félix Silva1
David Souto Maior Vasconcelo1
Leticia Farias de Macedo1
Alice Henriques Lima1
Ana Carolina de Andrade Cavalcante1
Carlos Renato de Morais Nunes1
Maria do Socorro Ramos de Queiroz2


Resumo

As doenças do aparelho respiratório configuram-se como o segundo principal motivo de internações hospitalares no Brasil. O objetivo do presente estudo foi avaliar o uso indiscriminado dos medicamentos adquiridos em farmácias comunitárias para o tratamento das doenças respiratórias. Tratou-se de uma pesquisa de campo, de natureza aplicada, com abordagem quantitativa, sendo um estudo documental e descritivo realizado em Campina Grande-PB, no período de maio a outubro de 2022. Os dados obtidos foram organizados no Excel, utilizando a estatística descritiva, com apresentação de frequências simples ou absolutas e percentuais para as variáveis categóricas e a análise foi realizada com o auxílio do software estatístico R Studio. Foram incluídas 53 Farmácias Comunitárias sendo que, dos profissionais entrevistados, 34 (64,15%) eram farmacêuticos, a maioria do gênero masculino 31 (58,49%), com faixas etárias de 31-40 anos 25 (47,17%). A maioria dos estabelecimentos 30 (56,60%) ainda não implantou serviços de farmácia clínica, mas em 31 (58,49%) os usuários buscaram orientações do farmacêutico. Além disso, foi possível observar que as classes terapêuticas mais adquiridas em farmácias comunitárias foram corticoides (81,13%), broncodilatadores (64,15%) e anti-histamínicos (37,73%). Com relação à venda sem prescrição, 20 (37,74%) responderam que acontecia na maioria das vezes, 24 (45,28%) algumas vezes e 9 (16,98%) poucas vezes e 49 (92,45%) dos usuários buscavam orientações durante a aquisição. Desse modo, destaca-se a importância do farmacêutico nas farmácias comunitárias, no combate ao uso indiscriminado desses medicamentos, alertando, orientando e encaminhando ao médico quando necessário, evitando riscos à saúde dos pacientes.

Palavras-chave: Doenças Respiratórias. Uso indiscriminado de medicamentos. Automedicação. Assistência Farmacêutica.

1. INTRODUÇÃO

As doenças do aparelho respiratório configuram-se como o segundo principal motivo de internações hospitalares no Brasil, com um total de 5.928.712 hospitalizações entre 2013 e 2017. Quando analisados os óbitos, estas doenças foram a principal causa de morte durante as internações, ficando responsável por 19,5% dos casos (Gomes et al. 2017).

Agudas ou crônicas, estas doenças se apresentam em todas as faixas etárias e se manifestam de diversas formas. Destacam-se as infecções de vias aéreas superiores, como a pneumonia e a influenza, dentre as condições agudas e as doenças das vias aéreas inferiores dentre as crônicas, mais frequentemente, a bronquite, o enfisema e a asma (Santos et al. 2017).

Muitos medicamentos à base de corticosteróides são utilizados para aliviar e controlar as doenças respiratórias, sobretudo as crônicas. Eles são divididos em duas categorias, os mineralocorticoides e os glicocorticoides. O uso desses medicamentos pode causar reações quase de imediato em crises alérgicas, asma, rinite e agem melhor sob a forma inalatória, por permitir doses mais baixas e menos efeitos adversos do que por outras vias (Rianelli; Andrade, 2022). Devido a essas vantagens, os corticosteróides são frequentemente adquiridos em farmácias sem prescrição médica, caracterizando assim a prática da automedicação.

A automedicação é um método muito comum, onde o próprio paciente faz uso de um medicamento com intuito de melhorar no tratamento de alguma doença ou diminuição de algum sintoma. Contudo, é uma prática que gera impactos em sua saúde, muitas vezes desconhecidos, como efeitos colaterais e até mesmo mascaramento de outras doenças (Silva; Souza; Aoyama, 2020).

Frente a isso, o farmacêutico clínico deve ter papel fundamental para alertar sobre essa prática e promover o uso racional dos medicamentos. Essa prática foi regulamentada através da resolução nº 338, de 06 de maio de 2004, que dispõe no artigo 1, parágrafo III, que, a assistência farmacêutica trata-se de um conjunto de ações voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, seja de forma individual ou coletiva, tendo o medicamento como insumo essencial e visando o acesso e o seu uso racional (Brasil, 2004). Em adição, o Conselho Federal de Farmácia (CFF) através da Resolução nº 585, de 29 de agosto de 2013, regulamentou as atribuições clínicas do farmacêutico (CFF, 2013a).

Neste sentido, o presente estudo teve como principal objetivo avaliar o uso indiscriminado de medicamentos para tratar as diversas doenças que acometem o trato respiratório, em farmácias comunitárias da cidade de Campina Grande-PB.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Doenças Respiratórias

As doenças respiratórias são doenças das vias aéreas superiores e inferiores. Essas condições incluem as mais comuns: rinite alérgica, bronquite aguda, sinusite, asma e doença pulmonar obstrutiva crônica, que é um dos maiores problemas de saúde em todo o mundo. Correspondem ao grupo de patologias importantes que afetam o ser humano independentemente da idade (Ferraz et al. 2017).

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2012), mais de 60% da população morre de doenças não transmissíveis e 1,3 milhão de pessoas morrem de doenças respiratórias a cada ano. Portanto, a doença respiratória é um grave problema de saúde pública com altas taxas de internação no Sistema Único de Saúde (SUS) (Ramos et al. 2017).

Segundo o Ministério da Saúde, a epidemia de doenças respiratórias concentra-se principalmente entre idosos e crianças, afeta a qualidade de vida e causa incapacidade nos sujeitos afetados, com enormes impactos econômicos e sociais, além de constrangimentos físicos, emocionais e intelectuais (Brasil, 2010).

2.2 Tipos de Doenças Respiratórias

  • Gripe

A gripe é uma infecção respiratória viral aguda que causa morbimortalidade em todo o mundo, sendo causada por um vírus de RNA da família Orthomyxoviridae. Três tipos do vírus influenza causam doença em humanos, que são a influenza A, B e C. A influenza do tipo A é a responsável por causar pandemias, sendo altamente contagiosa, e que possui quadro clínico de tosse, calafrios ou suores, mal-estar, febre, dores musculares e dor de cabeça. A principal forma de prevenção para a doença é a vacinação contra o vírus da influenza, recomendado para toda a população com mais de 6 meses, desde que não tenham contraindicações (Gaitonde et al. 2019). Entretanto, de forma geral, a doença é autolimitada, podendo desenvolver complicações em idosos, crianças, gestantes e portadores de doenças crônicas (Dharmapalan, 2020).

Nos casos de gripe de baixo risco, é essencial fornecer tratamento sintomático e de suporte, não dispensando a hidratação, aliado com tratamento farmacológico de anti-inflamatórios não esteroides como ibuprofeno, paracetamol, dipirona, para reduzir os sintomas como febre, dor de cabeça e dores musculares, muito comuns durante os episódios de gripe (Javanian et al., 2021).

  • Asma

A asma é uma doença crônica não transmissível que afeta cerca de 330 milhões de pessoas em todo o mundo. A prevalência dos casos é maior nos países desenvolvidos, como Austrália, e menor nos países em desenvolvimento, como a China. Os sintomas da asma incluem sibilos, que são ruídos respiratórios, falta de ar, aperto no peito e tosse, que estão relacionados com a natureza do sintoma, tempo, e resposta ao tratamento, sendo necessário realizar uma anamnese para confirmar o caso de asma, ou de outro problema respiratório (Papi et al., 2017).

Como tratamento para sintomas agudos da asma, é iniciado o uso com beta 2-agonistas de curta duração e corticosteroides orais. Nos casos mais graves da doença, pode-se considerar terapia intravenosa e sulfato de magnésio ou hospitalização (Rehman; Amin; Sadeeqa, 2018).

Portanto, o tratamento farmacológico da asma visa avaliar eventos de crise ou exacerbação e terapia de manutenção, com o objetivo básico de fornecer suporte médico, educacional e emocional para garantir que as exacerbações não levem a consultas médicas, hospitalização ou mesmo morte do paciente. Nessa perspectiva, ressaltam que uma melhor compreensão dos fatores que contribuem para os desfechos ruins da asma é importante para o planejamento e o acesso individualizado aos indivíduos, reduzindo, assim, a morbimortalidade associada à doença (Amaral Pimenta; Sant’ana, 2018).

  • Rinite alérgica

A rinite alérgica é uma condição comum, causada por um processo inflamatório, cujos episódios agudos são causados por vírus, enquanto que os episódios crônicos são normalmente estimulados por exposição a alérgenos. Além disso, é importante assinalar que ela é uma doença que se correlaciona com a asma, onde 70 a 90% dos asmáticos apresentam rinite alérgica, e 40 a 50% das pessoas com rinite alérgica também apresentam asma (Rianelli; Andrade, 2022).

O tratamento da rinite alérgica consiste na prevenção de alérgenos, medicamentos para alívio sintomático, terapias anti-inflamatórias e Imunoterapia Alérgeno-Específica (AIT) (Hoyte; Nelson, 2018).

  • Sinusite

A sinusite é a inflamação das mucosas dos seios da face, ao redor do nariz, maçãs do rosto e olhos. Ela pode ser dividida em aguda e crônica, onde na fase aguda costuma ocorrer dor de cabeça na área do seio da face mais acometida, surgindo obstrução nasal com presença de secreção, que dificulta a respiração. Na sinusite crônica, os sintomas são os mesmos, variando de intensidade, onde a tosse é um sintoma predominante, ocorrendo geralmente de forma noturna (Adeloye et al. 2015).

  • Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC)

A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) é uma das causas mais relevantes de morte e incapacidade física na atualidade. A DPOC é definida como uma doença respiratória prevenível e tratável, caracterizada pela obstrução crônica do fluxo aéreo, geralmente progressiva e não totalmente reversível, manifestada por sinais e sintomas como dispneia, tosse e expectoração. O diagnóstico da DPOC é baseado em achados clínicos e confirmado pelo teste de função pulmonar. O principal fator de risco para o desenvolvimento da DPOC é o tabagismo, responsável por 80 a 90% dos casos (Adeloye et al., 2015).

A DPOC é reconhecida como um problema de saúde pública, caracterizada por distúrbio do fluxo aéreo, geralmente progressivo e apenas parcialmente reversível com o uso de broncodilatadores. Pode acarretar complicações no sistema cardiovascular, musculoesquelético e aspectos psicossociais, resultando em alto custo social devido à necessidade de tratamento com medicamentos e oxigenoterapia contínua em casa. Além disso, enfatiza-se a importância da prevenção e controle dos sintomas, bem como a redução da frequência de exacerbações, utilizando principalmente medicamentos por via inalatória como estratégia terapêutica. Assim, o uso correto e eficaz dos medicamentos pode prevenir efeitos adversos, evidenciando o papel dos serviços clínicos farmacêuticos na promoção do uso adequado e na garantia da eficácia e segurança da terapia medicamentosa, alcançando resultados terapêuticos definidos que impactam na melhoria da qualidade de vida dos pacientes. (Lottermann et al., 2017).

  • Bronquite

A bronquite é uma condição comum que pode levar à morte se não for tratada. É uma manifestação da DPOC. Os brônquios (inspirados e levados ao ar a cada respiração) são afetados por substâncias agressivas e sofrem um processo de inflamação crônica ao longo dos anos. Uma característica da bronquite crônica é quando os brônquios se tornam mais estreitos e produzem grandes quantidades de secreções. Os sintomas são falta de ar, corrimento, falta de ar ao esforço, tosse e expectoração (Brasil, 2014).

2.3 Tratamento farmacológico para as doenças respiratórias

  • Corticosteróides

Os corticosteróides de origem biológica foram revelados no século 20 por Edward Calvin Kendall e Philip Showalter Hench, porém, todos em uso são obtidos tanto sinteticamente quanto por oxidação microbiana de esteróides de linhagem natural e são amplamente utilizados por diversas especialidades médicas, como reumatologia, imunologia, alergia, dermatologia, entre outras (Panerari; Galende, 2015).

Dentro dessa prerrogativa, muitos medicamentos à base de corticosteroides são utilizados para aliviar e controlar doenças respiratórias crônicas. Historicamente, os corticosteróides foram descritos em duas categorias: glicocorticóides, que atuam regulando o metabolismo de carboidratos sendo a hidrocortisona considerado o principal da categoria e os mineralocorticóides, que atuam regulando o equilíbrio eletrolítico tendo a aldosterona como mais atuante.

As reações adversas aos corticosteróides são comuns, principalmente com altas doses e uso prolongado. Embora a terapia com este grupo farmacológico seja o tipo de terapia de maior sucesso para uma variedade de condições, o interesse em seu uso foi superado pela preocupação com os efeitos colaterais sistêmicos causados por esses medicamentos. É importante enfatizar que os efeitos adversos dos corticosteróides variam de indivíduo para indivíduo, porque pode haver diferenças na sua ligação específica aos receptores celulares ou farmacocinética, o que tem implicações para fatores genéticos, idade, gênero e doença (Rianelli; Andrade, 2022).

O uso desses medicamentos sem recomendação e prescrição médica adequada por um profissional da saúde pode gerar doenças e até síndromes, que irão se manifestar por meio de uma série de sinais e sintomas. Podemos destacar: Síndrome de Cushing, Diabetes mellitus (DM), Osteoporose, Efeitos gastrointestinais entre outros.

2.4 Manejo do Farmacêutico no controle dos corticosteróides

Os serviços desenvolvidos pelo farmacêutico são de extrema importância, e sua atuação pode ocorrer no cuidado direto com o pacientes, familiares e comunidades em múltiplas áreas e diferentes tipos de patologia, sempre visando a redução da morbimortalidade associada ao uso de medicamentos, promoção da saúde e prevenção de doenças e outros. Nesse cenário, torna-se crucial a intervenção de farmacêuticos e equipes multiprofissionais, fornecendo serviços de triagem para identificar possíveis agravos e problemas associados ao uso de medicamentos. Além de fornecer assistência direta ao paciente e suporte clínico, eles têm conhecimento especializado para avaliar aspectos relacionados aos medicamentos em pacientes com condições como rinite alérgica, asma e bronquite, desempenhando um papel significativo na prestação de cuidados de saúde (Rianelli; Andrade, 2022).

As resoluções nº 585/2013 e nº 586 de 29 de agosto de 2013, do CFF que regulamentam as atribuições clínicas do farmacêutico e a prescrição farmacêutica reforçam também a posição destes profissionais na prestação de cuidados em saúde. Através da Lei 13.021 de 8 de agosto de 2014, ficou ainda mais evidente que a farmácia é considerada um estabelecimento de saúde e que a assistência farmacêutica visa assegurar a prestação integral de cuidados terapêuticos e a promoção, a proteção e a recuperação da saúde nos estabelecimentos públicos e privados que desempenhem atividades farmacêuticas, tendo o medicamento como insumo essencial e visando ao seu acesso e ao seu uso racional (Brasil, 2014; CFF, 2013a; CFF, 2013b).

Segundo Storpirtis et al. (2016) o papel do profissional farmacêutico está passando por uma transformação significativa, destacada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma necessidade de inclusão na equipe de saúde. Adicionalmente, destaca-se o avanço no manejo farmacológico das doenças respiratórias ao longo das últimas décadas, atribuído ao novo perfil do profissional farmacêutico.

3        METODOLOGIA

Tratou-se de uma pesquisa de campo, de natureza aplicada, com abordagem quantitativa, sendo um estudo documental e descritivo realizado no período de maio a outubro de 2022, nas Farmácias Comunitárias de Campina Grande-PB. 

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba sob número 5.563.960 e a participação na pesquisa foi precedida pela assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos discentes seguindo os critérios da Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012 (CNS, 2012).

Foi utilizada uma ficha para a coleta de dados, a fim de obter informações como: medicamentos mais utilizados, se há procura do profissional farmacêutico, se existe na farmácia o serviço de farmácia clínica e se o medicamento é adquirido através de prescrições médicas ou através da prática da automedicação.

            Para análise e organização dos dados da pesquisa utilizou-se a estatística                                                                                                               descritiva, com apresentação de frequências simples ou absolutas e percentuais para variáveis categóricas. Todas as análises foram realizadas com o auxílio do software estatístico R (R CORE TEAM, 2017).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram incluídos no estudo 53 farmácias comunitárias e dos profissionais entrevistados 34 (64,15%) eram farmacêuticos e 19 (35,85%) balconistas, a maioria do gênero masculino 31 (58,49%) e com faixas etárias de 31-40 anos 25 (47,17%).

            Segundo Correr e Otuki (2013) o termo “Farmácia Comunitária” refere-se aos estabelecimentos farmacêuticos não hospitalares e não ambulatoriais que atendem à comunidade. No Brasil são, em sua maioria privadas, de propriedade particular, mas existem também farmácias públicas, sejam elas vinculadas à rede nacional de farmácias populares ou às esferas públicas municipais ou estaduais. Farmácia comunitária é uma terminologia utilizada mundialmente para designar farmácias que atendem o público oferecendo não só medicamentos e outros produtos, mas também serviços de saúde.

A farmácia comunitária exerce um papel muito importante para a sociedade, atendendo necessidades coletivas e individuais, através da intercambialidade de medicamentos, e orientações sobre o uso adequado de medicamentos, não se limitando apenas a dispensação, mas fornecendo monitorização terapêutica e uso racional de medicamentos (Rebelo; Delcorso, 2020).

A Lei 13.021 de 8 de agosto de 2014, pode ser considerada um marco no segmento farmacêutico na medida em que eleva a farmácia ao grau de estabelecimento de saúde e confere autonomia técnica ao profissional farmacêutico (Brasil, 2014). É importante ressaltar que essa lei projetou o farmacêutico como ator principal nas farmácias, com objetivo de: reduzir problemas de saúde decorrentes do uso irracional de medicamentos; fazer com que o paciente siga o tratamento; avaliar intoxicações, interações medicamentosas e reações adversas. Essa lei transformou as farmácias e drogarias em unidades de prestação de assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária individual e coletiva.

Fuller et al. (2017) obtiveram resultados positivamente relevantes ao avaliarem a implementação dos serviços farmacêuticos em farmácias comunitárias, havendo intervenções por meio de orientações, demonstrações, e ensinando sobre técnicas corretas do uso dos medicamentos, no auxílio do controle da asma e suas crises.

Entre tantos itens importantes da Lei 13.021/2014, destaca-se a exigência de que um farmacêutico esteja presente durante todo o horário de funcionamento da farmácia, assumindo a responsabilidade e a prestação de assistência técnica. Além disso, é crucial ressaltar que o proprietário da farmácia não tem autoridade para ignorar ou contrariar as orientações fornecidas pelo farmacêutico, o que fortalece o papel desta profissão.

Com essa lei o farmacêutico adquiriu mais segurança e respaldo perante a sociedade para implantar os serviços clínicos farmacêuticos implantados pela Resolução nº 585/2013 (CFF, 2013a). Com a promoção e a realização desses serviços, o farmacêutico voltou a ser considerado não mais “o profissional do medicamento”, mas sim “o profissional do cuidado”, assumindo um papel mais relevante na saúde da sociedade. O CFF também aprovou a Resolução 586/2013, que é fundamental na medida em que permite ao farmacêutico prescrever medicamentos que, mesmo sendo limitados, resolvem a problemática de vários pacientes (CFF, 2013b).

Os dados obtidos neste estudo revelam que, por meio das diferentes faixas etárias, os farmacêuticos estão cientes do novo perfil profissional que não se limita apenas à gestão dos medicamentos, mas também desempenha o papel de educador em saúde, visando o acompanhamento do usuário para garantir ou contribuir para um tratamento eficaz. No entanto, é frequente que, devido às condições locais, esses profissionais não consigam oferecer o acompanhamento necessário que os usuários precisam. Essa situação é respaldada pelos estudos de Costa et al. (2021), os quais indicam que os farmacêuticos enfrentam uma sobrecarga de tarefas burocráticas, o que acaba prejudicando o tempo dedicado ao atendimento aos pacientes. Isso afeta não apenas a oferta de orientações no balcão, mas também a prestação de serviços clínicos farmacêuticos de maneira abrangente.

Durante a pesquisa foi observado que a maioria dos estabelecimentos 30 (56,60%) não implantaram ainda serviços de farmácia clínica, mas em 31 (58,49%) delas os usuários atendidos durante a procura pelo medicamento buscaram orientações do farmacêutico.

Freitas et al. (2016)  realizaram um estudo das principais dificuldades enfrentadas por farmacêuticos para exercerem suas atribuições clínicas no Brasil e obtiveram os seguintes resultados: desinteresse do gestor, piso inadequado para o profissional, falta de estrutura física (espaço para atendimento privativo ou semiprivativo e disponibilidade de fontes de informação sobre medicamentos e equipamentos de informática com acesso à internet) e a formação profissional que está voltada a educação farmacêutica fornecida pelas instituições de ensino superior.

Ainda explicaram que quanto mais competências clínicas o farmacêutico desenvolver, mais capaz de resolver problemas e tomar decisões em saúde ele terá. Por conseguinte, este profissional será respeitado e valorizado tanto pela sociedade quanto pela equipe em que está inserido. Azeredo (2014), afirmou que a qualificação de recursos humanos para a execução de serviços farmacêuticos é um grande desafio para as Políticas de Medicamentos e o avanço da Assistência Farmacêutica no Brasil.

Foi possível observar que as classes terapêuticas dos medicamentos mais adquiridos em farmácias comunitárias foram corticoides (81,13%), broncodilatadores (64,15%) e anti-histamínicos (37,73%). Quando perguntado aos farmacêuticos e aos balconistas sobre a frequência de venda sem a prescrição de medicamentos utilizados para o tratamento das doenças respiratórias, 20 (37,74%) responderam que aconteceu a maioria das vezes, 24 (45,28%) algumas vezes e 9 (16,98%) poucas vezes. Quando investigado a respeito se o usuário no momento da aquisição do medicamento busca orientações, 49 (92,45%) responderam que sim (TABELA 1).

Tabela 1 – Principais classes terapêuticas dos medicamentos mais adquiridos em farmácias comunitárias.

A busca por orientações foi um dado bastante expressivo, tendo em vista que nos dias atuais mesmo sendo utilizada a prática da automedicação, muitas pessoas buscavam por informações adequadas para realizar o tratamento.

Um estudo realizado por Leal et al. (2022), também demonstrou que, entre crianças e adolescentes, os medicamentos mais utilizados no tratamento de doenças respiratórias crônicas estão os broncodilatadores com 19%, seguido pelos anti-histamínicos e corticosteróides, com 17,2% e 11,4% respectivamente. Embora esses medicamentos mostraram reduzir a taxa de internações, é necessário ainda ações de educação em saúde para disseminação do uso adequado. Dado que corroborou também com os achados deste estudo.

A procura crescente na venda de medicamentos da classe dos corticóides (81,13%), simboliza um alerta quanto à automedicação. Um estudo realizado por Ferreira et al. (2019), demonstraram que, em pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, com uso prolongado de corticoides, foi possível associar a distúrbios metabólicos como osteoporose e osteopenia e aumento no risco de fraturas ósseas, sendo um alerta para pacientes com propensão a desenvolver tais doenças. Cazeiro (2016) citou como exemplos de efeitos adversos locais do uso de corticoides inalatórios, a candidíase orofaríngea, disfonia, dor de garganta e tosse, que, em primeiro momento, não apresentam consequências de grande magnitude para a saúde do paciente, mas que podem levar à uma baixa tolerância à medicação, levando à diminuição na adesão ao tratamento.

 Ainda em relação aos efeitos provocados pelos corticoides, Conceição e Abreu (2021), revelaram que 57,7% dos entrevistados não tinham conhecimento sobre o desenvolvimento de diabetes associado ao uso dos corticoides, e mais de 60% não tinham sido orientado sobre interações dos corticoides com medicamentos para o tratamento da diabetes. Sendo assim, foi possível observar que o farmacêutico possui papel importante no uso indiscriminado desses medicamentos, orientando sobre os riscos e contraindicações.

Outro grupo de medicamentos que teve destaque no estudo, foram os broncodilatadores com 64,15%, utilizados no tratamento da asma. Cazzola et al. (2019) explicaram que, deve-se ter cuidado ao utilizá-los, pois eles podem impactar em comorbidades dos pacientes asmáticos, influenciando negativamente nos resultados. Assim, é de suma importância uma melhor análise na hora da prescrição, para que se possa minimizar o risco de potenciais efeitos adversos e interações medicamentosas.

Os anti-histamínicos, com 37,73% citações, foram bastante utilizados em crises alérgicas como sinusite e rinite.  Rodrigues (2018) orientou que essa classe possui subclasses, diferentes gerações, que possuem suas particularidades. Os Anti-H1 (anti-histamínicos que atuam nos receptores de histamina tipo 1) de segunda geração, por exemplo, com algumas exceções, são metabolizados pela via do citocromo P450, que por sua vez está envolvido no metabolismo de muitos fármacos, o que pode originar na ocorrência de interações medicamentosas e possíveis efeitos tóxicos, sobretudo em pacientes polimedicados. Assim, cada paciente possui uma variabilidade interindividual que deve ser analisada.

Os descongestionantes, antigripais, expectorantes e mucolíticos, ainda que pouco citados (16,98%, 5,66%, 7,55% e 11,32%, respectivamente), também foram de grande relevância para o estudo, pois são classificados como Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), o que torna sua venda de fácil acesso para os pacientes. Nesse caso, o farmacêutico pode prescrevê-los ou em outros casos, até mesmo encaminhar ao médico, quando persistirem os sintomas ou se agravarem.

Os antibióticos tiveram 11,32% de citações, número baixo em comparação com outras classes terapêuticas do estudo. Um dos motivos que pode ser explicado, se deve ao fato de que sua aquisição é mais difícil de acesso, pois é necessário prescrição médica com retenção de receita, o que impede sua livre compra pelos usuários. Entretanto, um estudo realizado nos Estados Unidos da América, em 2018 evidenciou que em 24,6% das consultas de emergência houve prescrição de antibióticos para problemas respiratórios de forma inapropriada. Alguns fatores estão envolvidos, como má comunicação entre médico e paciente, diagnóstico incerto e limitado tempo de atendimento (Tan et al., 2022).

Nesse âmbito, o farmacêutico tem seu papel na avaliação da prescrição de forma a analisar a ocorrência de erros e interações, informar o modo de uso dos antimicrobianos, alertando sobre os riscos de não seguir corretamente a farmacoterapia, o que pode levar à resistência bacteriana (Franco et al., 2015).

Como visto, o uso de forma incorreta desses medicamentos é grave e deve ser uma preocupação. De acordo com Leal et al. (2022), mesmo em condições respiratórias crônicas, onde o paciente utiliza o medicamento por muito tempo a ponto de não buscar um médico ou farmacêutico, é necessário realizar novas avaliações do tratamento, para observar sua eficácia.

Portanto, como observado por Castel-Branco e Figueiredo (2017), destaca-se a importância crucial do farmacêutico comunitário na prestação de serviços clínicos. Ao interagir diretamente com o paciente, o farmacêutico pode compreender sua fisiopatologia e encontrar a abordagem terapêutica mais adequada. Integrado à equipe de saúde, ele pode realizar um acompanhamento eficaz e atuar como intermediário entre o paciente e o médico, mitigando possíveis riscos e promovendo constantemente uma melhor qualidade de vida para o paciente.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo permitiu identificar as principais classes terapêuticas que foram adquiridas pelos pacientes, que buscam tratar alguma doença respiratória, seja aguda ou crônica, podendo destacar corticoides (81,13%), broncodilatadores (64,15%) e anti-histamínicos (37,73%).

Por conseguinte, também foi possível observar a frequência da automedicação e do uso indiscriminado desses medicamentos. Foi identificado que a aquisição de medicamentos utilizados para o tratamento das doenças respiratórias sem prescrição correspondeu a 20 (37,74%) dos casos, 24 (45,28%) relataram algumas vezes e 9 (16,98%) poucas vezes.        

Na prática da automedicação, foi possível verificar que o farmacêutico foi procurado para dispor de informações e orientações a respeito dos medicamentos, e problemas relacionados à eles e sua má administração.

A maioria das Farmácias Comunitárias de Campina Grande-PB, incluídas no estudo, ainda não implantaram os serviços clínicos farmacêuticos.

Além disso, é crucial ressaltar o papel fundamental do farmacêutico no estímulo ao uso racional de medicamentos por pacientes portadores de doenças respiratórias. Por meio da assistência farmacêutica, esse profissional de saúde pode oferecer um atendimento personalizado, voltado para as necessidades e desafios individuais de cada paciente. Isso inclui a identificação de possíveis problemas e a proposição de intervenções adequadas, contribuindo assim para a melhoria da qualidade de vida dos pacientes.

REFERÊNCIAS

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1 Discente do Curso de Farmácia Generalista. Universidade Estadual da Paraíba. Campus I. e-mail: caroline.pereira@aluno.uepb.edu.br

2 Maria do Socorro Ramos de Queiroz. Universidade Estadual da Paraíba. Campus I. Doutora em Biotecnologia em Saúde (RENORBIO/UFPB). e-mail: queirozsocorroramos@servidor.uepb.edu.br dor.com.br