USO ABUSIVO DE DERIVADOS ANFETAMÍNICOS POR ESTUDANTES DE MEDICINA E SUAS POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES A CURTO E A LONGO PRAZO

ABUSE OF AMPHETAMINE DERIVATIVES BY MEDICAL STUDENTS AND THEIR POSSIBLE SHORT- AND LONG-TERM IMPLICATIONS

REGISTRO DOI:10.69849/revistaft/cl10202410081217


Afonso Henrique de Queiroz Dias1
Marcel Sebastião Júnior2
Pedro Henrique Santana Mazzarin3
Joyce Mendes Gomes4


Resumo

O consumo de derivados anfetamínicos tem se intensificado entre universitários, especialmente entre estudantes de Medicina. Nesse contexto, torna-se imprescindível uma análise aprofundada sobre o possível uso abusivo dessas substâncias, bem como a investigação das motivações subjacentes e das implicações a curto e longo prazo. O presente estudo teve como objetivo principal avaliar a incidência e prevalência do uso abusivo de derivados anfetamínicos, como o metilfenidato e a lisdexanfetamina, por discentes de um curso de Medicina. Para tanto, foi conduzido um estudo observacional transversal, de natureza quantitativa, exploratória e descritiva. A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário online, disponibilizado pelo Google Forms, contendo perguntas fechadas e abertas, abrangendo aspectos relacionados ao perfil sociodemográfico, clínico e farmacoterapêutico dos respondentes. Os resultados indicaram que dos 134 alunos que responderam ao questionário, 56% utilizaram derivados anfetamínicos, com maior incidência em períodos de avaliações acadêmicas. Além disso, 40% dos estudantes relataram ter adquirido esses medicamentos sem prescrição médica ou diagnóstico que justificasse seu uso. As principais motivações para o consumo foram dificuldades de concentração, baixo rendimento acadêmico e fadiga excessiva. Entre os efeitos colaterais mais relatados, destacam-se perda de apetite, ansiedade, taquicardia, xerostomia, agitação, irritabilidade e insônia. Após a interrupção do uso, os efeitos desagradáveis mais citados foram: sonolência, redução de energia, letargia, humor deprimido e ansiedade, sintomas que fazem parte do quadro de abstinência. Ademais, embora nenhum participante tenha relatado reações mais graves, resultados da literatura indicam que o uso prolongado pode resultar em flutuações emocionais, com episódios de euforia seguidos de depressão ou irritabilidade. Pode também ocorrer o desenvolvimento de transtornos de humor, comportamentos impulsivos e reações desproporcionais a situações cotidianas; além de transtornos de ansiedade e psicoses. Verifica-se também perda de peso e desnutrição ao longo do tempo, bem como complicações graves, como úlceras gástricas e até coma, devido ao estresse físico e químico imposto ao corpo pela substância. Em casos extremos, o uso prolongado pode resultar em morte, seja por complicações diretas, como colapso cardiovascular, ou por comportamentos de risco associados ao uso. Diante do exposto, conclui-se que, embora o uso controlado de anfetamínicos possa oferecer benefícios, o consumo inadequado e sem orientação médica pode gerar dependência e sérios prejuízos à saúde. Os achados ressaltam a importância de pesquisas adicionais e o desenvolvimento de estratégias eficazes para combater esse problema crescente de saúde pública.

Palavras-chave: abuso de derivados anfetamínicos; lisdexanfetamina; metilfenidato; estudante de medicina

Abstract

The consumption of amphetamine derivatives has become increasingly prevalent among university students, particularly those studying medicine. In light of this, a thorough examination of the potential misuse of these substances, alongside an investigation into the underlying motivations and both the short- and long-term consequences, is imperative. The primary objective of this study was to evaluate the incidence and prevalence of the misuse of amphetamine derivatives, such as methylphenidate and lisdexamfetamine, among medical students. A cross-sectional observational study employing a quantitative, exploratory, and descriptive methodology was undertaken. Data collection was facilitated via an online questionnaire hosted on Google Forms, comprising both closed and open-ended questions designed to capture sociodemographic, clinical, and pharmacotherapeutic profiles of the respondents. The results revealed that 56% of the 134 students who participated in the survey had used amphetamine derivatives, with a higher prevalence during academic examination periods. Furthermore, 40% of students reported having obtained these medications without a valid medical prescription or diagnosis to justify their use. The primary reasons cited for consumption included difficulties with concentration, poor academic performance, and excessive fatigue. The most commonly reported side effects included loss of appetite, anxiety, tachycardia, xerostomia, agitation, irritability, and insomnia. Upon discontinuation of use, the most frequently mentioned withdrawal symptoms were drowsiness, reduced energy, lethargy, low mood, and anxiety. Although no participant reported severe adverse reactions, existing literature suggests that prolonged usage may lead to emotional instability, characterised by periods of euphoria followed by depression or irritability, mood disorders, impulsive behaviour, and disproportionate responses to everyday situations, in addition to anxiety disorders and psychoses. Progressive weight loss and malnutrition may also occur, along with severe complications such as gastric ulcers and, in extreme cases, coma, due to the physical and chemical strain imposed on the body. Prolonged use in the most severe instances may lead to death, either from direct complications such as cardiovascular collapse or through high-risk behaviours associated with the substance. In conclusion, while controlled usage of amphetamines may confer certain benefits, unsupervised consumption without proper medical guidance can lead to dependence and significant health risks. These findings underscore the necessity for further research and the development of effective strategies to address this escalating public health concern.

Keywords: abuse of amphetamine derivatives; lisdexamfetamine; methylphenidate; medical student

1 INTRODUÇÃO

As anfetaminas e seus derivados são estimulantes do sistema nervoso central. O termo ‘anfetaminas’ tornou-se genérico para designar um grupo de substâncias relacionadas, incluindo fenproporex, metilfenidato, mazindol, metanfetamina e dietilpropiona. No entanto, o termo mais adequado para substâncias que não possuem exatamente a estrutura química das anfetaminas é “derivado anfetamínico”. A maioria dessas substâncias é ou já foi comercializada sob a forma de medicamentos. Contudo, algumas, embora possuam efeito estimulante, não têm uso medicinal conhecido, como é o caso da metilenodioximetanfetamina (MDMA), popularmente conhecida como “êxtase” (Marcon et al., 2012).

Os derivados anfetamínicos provocam aumento da atenção e da energia, além de possuírem efeito anorexígeno. Podem ser prescritos para diversas condições médicas, como obesidade, narcolepsia e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) (Daher et al., 2020). Entretanto, é fundamental ressaltar que a prescrição desses medicamentos está sujeita ao controle especial de psicotrópicos, devido ao seu potencial risco de abuso e dependência.

A anfetamina foi sintetizada pela primeira vez em 1897 pelo químico alemão Lazar Edeleano, sendo inicialmente denominada fenil isopropilamina. No entanto, somente na década de 1920 tornou-se popular na comunidade médica, sendo usada para aumentar a pressão arterial, dilatar as vias nasais e estimular o sistema nervoso central (Fuchs; Wannmacher; Ferreira, 2004; Heal et al., 2013).

O abuso das anfetaminas começou em 1935, quando a empresa farmacêutica Smith, Kline and French lançou no mercado a anfetamina sob o nome de Benzedrina, com indicação para o tratamento de congestão nasal, narcolepsia, depressão leve e parkinsonismo pós-encefalite (Heal et al., 2013; Oga; Camargo; Batistuzzo, 2021; Schatzberg; Nemeroff, 2002). As propriedades de aprimoramento cognitivo da anfetamina foram rapidamente reconhecidas, com relatos de que a benzedrina produziu resultados significativos nos testes de inteligência, levando ao seu uso generalizado para reduzir o estresse, melhorar a concentração e o desempenho intelectual de acadêmicos, estudantes e profissionais médicos (Heal et al., 2013). 

A anfetamina existe em duas formas opticamente ativas, ou seja, o dextro- (ou d-) e o levo- (ou l-). A Smith, Kline and French sintetizou ambos os isômeros e, em 1937, iniciou a comercialização de d-anfetamina, que era o mais potente dos dois isômeros, sob o nome comercial de Dexedrine®. As vendas de Benzedrina e Dexedrina nas farmácias não foram restringidas até 1939, quando a aquisição destes medicamentos passou a ser permitida mediante prescrição médica ou assinando o Registro de Venenos (Heal et al., 2013).

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), as anfetaminas foram amplamente distribuídas aos soldados para combater a fadiga e melhorar o humor. Posteriormente, passaram a ser prescritas para a depressão (Schatzberg; Nemeroff, 2002). Ao final da guerra, em 1945, os derivados anfetamínicos, metanfetamina e fenmetrazina, foram incorporados à medicina com o propósito de reduzir a fadiga, o sono e o apetite, além de aumentar o desempenho laboral. Nos Estados Unidos, durante a década de 1950, comprimidos de dextroanfetamina (Dexedrine®) e metanfetamina (Desoxyn®) passaram a ser usados não medicalmente por estudantes universitários, motoristas de caminhão e atletas (Esposti, 2017). Vale ressaltar que assim como uso, o abuso desses compostos aumentou exponencialmente.

Nos anos 80, uma nova onda das anfetaminas surgiu, com destaque para o ecstasy, uma droga sintética com efeitos estimulantes e alucinógenos, que produz distorções na percepção de tempo e maior prazer nas experiências sensoriais (Marcon et al., 2012). É também capaz de produzir efeitos entactogênicos, que aumentam a capacidade de introspecção e de perceber a si mesmo com mais clareza, além de efeitos empatogênicos, que ampliam a capacidade de se colocar no lugar dos outros e compreender suas emoções (Nichols, 1986).

Nos anos de 1971 e 2007, respectivamente, o metilfenidato e a lisdexanfetamina foram aprovados pelo FDA (Food and Drug Administration) dos Estados Unidos para o tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Posteriormente, ambos também foram autorizados para o tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção (TDA) sem hiperatividade e para a narcolepsia. Contudo, somente se tornaram disponíveis no mercado brasileiro, em 1998 e 2010, respectivamente (Cerqueira; Almeida; Cruz Junior, 2021; Souza; Guedes, 2021). A lisdexanfetamina (LDX) é um pró-fármaco derivado de anfetamina que, após administração oral, é absorvido e submetido à hidrólise enzimática, resultando na liberação de dextroanfetamina, o seu metabólito ativo com efeito terapêutico (Coghill et al., 2017; Ermer; Pennick; Frick, 2016). Em virtude dos diversos efeitos adversos que podem provocar, além do potencial em causar dependência, a indicação médica dos derivados anfetamínicos, como a lisdexanfetamina e o metilfenidato, atualmente está restrita ao tratamento da narcolepsia, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e obesidade (Esposti, 2017; Marcon et al., 2012). 

Apesar dessas restrições, o uso abusivo permanece elevado, principalmente entre indivíduos que desejam perder peso, melhorar a concentração, aprimorar o desempenho cognitivo, combater a sonolência ou reduzir a necessidade de sono (Cerqueira; Almeida; Cruz Junior, 2021). Teixeira (2011) ressalta a presença significativa das anfetaminas e seus derivados como drogas de abuso em diversos segmentos da sociedade. Entre grupos que fazem uso dessas substâncias estão os moradores de rua, para fugirem da realidade; atletas, que visam melhorar o desempenho esportivo; caminhoneiros, para combater a fadiga durante longas jornadas de trabalho; e estudantes, entre os quais a prática tem se tornado cada vez mais comum em todo o mundo.

Devido ao histórico de uso abusivo desses fármacos no Brasil, as anfetaminas e seus derivados são classificados como substâncias sujeitas a controle especial. A venda é permitida somente mediante a apresentação de receita de controle especial (amarela), conforme as regras para fármacos listados na categoria A3, previstas pela portaria 344 (Brasil, 1998) e atualizada em por diversas resoluções da diretoria colegiada, como a RDC 877 (ANVISA, 2024). Entretanto, é fundamental salientar que muitas pessoas conseguem adquiri-los sem a devida prescrição. Ressalta-se que tanto a prescrição quanto o acompanhamento médico são essenciais para o uso correto de qualquer substância que atue sobre o sistema nervoso central, em especial aquelas com potencial em gerar dependência, a fim de reduzir os prejuízos à qualidade de vida dos usuários (Cordeiro; Pinto, 2017).

O abuso de substâncias psicoativas configura um dos graves problemas que afetam a sociedade contemporânea, pois está associado a danos à saúde, aumento da demanda sobre serviços de saúde, elevação das taxas de incapacidade social e laboral, além de contribuir para fenômenos criminais e disseminação de epidemias, como o HIV e a hepatite B, culminando na degradação de estruturas sociais fundamentais. Apesar das consequências mencionadas, o uso de drogas e os fenômenos de abuso e dependência tendem a se intensificar em todo o mundo (Corradi-Webster, 2014). O consumo de drogas psicoativas tem se expandido rapidamente, tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, afetando não apenas setores marginais da população, como também o âmbito profissional, incluindo os profissionais de saúde (Andrade; Pinto; Barreto, 2019).

Nesse contexto, estudos indicam que a incidência e prevalência do uso de drogas, lícitas e ilícitas, entre acadêmicos de medicina parecem ser significativamente elevadas, com o início desse comportamento ocorrendo, muitas vezes, antes mesmo do ingresso na universidade (Santana et al., 2020). Diante desse cenário, faz-se necessária uma análise aprofundada sobre o possível uso abusivo de derivados anfetamínicos por estudantes do curso de medicina, assim como a elucidação das motivações subjacentes e das possíveis implicações desse uso a curto e a longo prazo. Além da escassez de estudos que abordem o consumo abusivo de tais substâncias psicotrópicas por esse grupo acadêmico, pouco é discutido sobre as consequências decorrentes de seu uso inadequado (Pires et al., 2018). Essa discussão é extremamente necessária, inclusive para fundamentar campanhas de conscientização direcionadas a esses estudantes, assim como para que profissionais da saúde possam planejar intervenções visando minimizar os prejuízos causados pelo uso indiscriminado desses medicamentos. 

2 METODOLOGIA

Realizou-se um estudo observacional transversal com abordagem quantitativa, exploratória e descritiva. Cabe ressaltar que, por envolver seres humanos, o projeto de pesquisa foi submetido à apreciação e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Moriah, localizado em São Paulo/SP (CAAE 80238524.7.0000.8054).

Para a coleta de dados, foi elaborado um questionário online, acessível aos estudantes de Medicina do 1º ao 6º ano da Faculdades de Dracena – Unifadra, por meio de um link do Google Forms, enviado via WhatsApp nos grupos de estudo. O acesso ao questionário exigia o login com o e-mail institucional. Previamente à participação, todos os discentes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), destinado a adultos aptos a conceder consentimento formal. O TCLE é fundamental para garantir a proteção dos direitos e do bem-estar dos participantes, assegurando que estivessem plenamente informados e respeitados em sua decisão de aderir ou não à pesquisa. Além disso, foi garantido aos participantes o direito de retirar seu consentimento a qualquer momento ou interromper o preenchimento do questionário sem submetê-lo, caso optassem por desistir da participação.

O questionário aplicado aos discentes foi elaborado de forma clara e objetiva, composto por treze questões fechadas e duas abertas, abrangendo o perfil sociodemográfico, clínico e farmacoterapêutico dos participantes. As perguntas foram estruturadas para contemplar os aspectos essenciais ao tema em análise, visando a coleta de dados de maneira eficiente e precisa. Além disso, o questionário passou por um processo de validação, incluindo a realização de pré-testes, a fim de assegurar sua clareza, pertinência e adequação aos objetivos da pesquisa.

A pesquisa contou com a participação de 137 alunos do curso de Medicina da Faculdades de Dracena – UNIFADRA – FUNDEC, no ano letivo de 2024. Para garantir que cada participante respondesse ao questionário apenas uma vez, os e-mails dos respondentes foram registrados. As informações coletadas foram analisadas pelos pesquisadores, preservando o anonimato dos participantes, de modo que nenhum dado identificável foi divulgado, assegurando a confidencialidade e privacidade dos envolvidos. Ao término do período destinado às respostas, o questionário foi salvo e o arquivo eletrônico da plataforma foi excluído. O arquivo com as respostas ficará sob a custódia do pesquisador responsável por um período de cinco anos, após o qual será permanentemente deletado.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A amostra do estudo em questão foi composta por 137 estudantes do curso de medicina da Faculdades de Dracena – UNIFADRA, no ano letivo de 2024 que responderam ao questionário composto por treze questões fechadas e duas abertas, relacionadas ao perfil sociodemográfico, clínico e farmacoterapêutico dos discentes. Os dados qualitativos obtidos estão expressos em frequência e porcentagem. 

Tabela 1 – Caracterização da amostra em estudo.

Em resumo, a Tabela 1 demonstra que, entre as 134 pessoas que responderam ao questionário, 70% são do sexo feminino, 46% tem entre 20 e 25 anos e 35% estão na faixa etária de 26-39 anos. A maior parte dos respondentes, correspondente a 25%, está cursando o 3º ano. Além disso, 72% praticam atividade física, sendo que, entre elas, 59% realizam essa prática em média de 3-4 vezes na semana.

A Tabela 2 indica que 63% dos estudantes não possuem diagnóstico psiquiátrico, enquanto uma parcela considerável de 37%, apresenta. Considerando que cada pessoa pode ter mais de um diagnóstico, os transtornos mais frequentemente mencionados foram o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), com 45% dos casos, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), com 24% e a Depressão, com 13%. O estudo de Silveira et al. (2021) também destacou que o TAG e o TDAH são condições psiquiátricas que impactam significativamente a vida dos indivíduos, especialmente em contextos acadêmicos, como observado entre estudantes de medicina.

Tabela 2 – Diagnóstico(s) psiquiátrico(s).

Os sintomas do TAG incluem ansiedade, inquietação, fadiga, dificuldade de concentração e irritabilidade, os quais podem prejudicar significativamente o desempenho acadêmico e a autoestima dos estudantes. Por outro lado, indivíduos com TDAH enfrentam dificuldades em manter o foco e a organização, o que pode resultar em prejuízos em suas atividades acadêmicas, gerando insatisfação com o desempenho escolar. Ademais, estudantes com TDAH tendem a apresentar níveis mais baixos de autoestima, o que pode comprometer sua adaptação ao ambiente universitário (Katzman et al., 2017).

A Tabela 3 indica que, entre os discentes que responderam ao questionário, 47% não fazem uso de drogas lícitas ou ilícitas, enquanto 53% relataram o uso dessas substâncias. Considerando que cada participante poderia assinalar mais de um item, o uso de álcool foi o mais frequente, registrado em 49% dos casos, seguido pelo tabaco, com 7%, e pelas drogas ilícitas, com 1%, conforme evidenciado na Tabela 3. Esses dados são compatíveis com o estudo de De Araújo; Vieira; Mascarenhas (2018) que analisou o consumo de drogas lícitas e ilícitas entre estudantes universitários, e também identificou o álcool como a substância mais utilizada. O consumo de álcool, tabaco e outras drogas está relacionado a diversas implicações negativas, como a queda no desempenho acadêmico, além de problemas de saúde física e mental (De Araújo; Vieira; Mascarenhas, 2018).

Tabela 3 – Uso de drogas ilícitas e lícitas.

Ainda na Tabela 3, destaca-se o fato de que apenas 1% dos respondentes relataram fazer uso de drogas ilícitas, o que é notável considerando que, no ambiente universitário, esses índices costumam ser mais elevados, girando em torno de 30-50% (Medeiros et al., 2012; Silva et al., 2006). Devemos considerar, entretanto, que mesmo com a disponibilização de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), garantindo a confidencialidade das respostas, é possível que alguns estudantes tenham hesitado em admitir o uso de substâncias ilícitas. 

Em relação ao uso de psicotrópicos, excluindo os derivados anfetamínicos, o presente estudo indicou que 31% dos alunos relataram o uso desses medicamentos. Considerando que os participantes poderiam assinalar mais de uma opção, os mais citados foram: bupropiona (18%) e fluoxetina (14%), seguidos por escitalopram, desvenlafaxina, sertralina e trazodona, cada um com 8%, conforme apresentado na Tabela 4.

O estudo de Brito & Silva (2021) também demonstrou um uso considerável de medicamentos entre os estudantes, com destaque para os antidepressivos. Os mais mencionados foram bupropiona, fluoxetina e sertralina. Esses dados indicam uma tendência no aumento do uso de medicamentos psicotrópicos entre estudantes, possivelmente relacionada a fatores como estresse acadêmico e a busca por apoio para a saúde mental.

Tabela 4 – Uso de medicamentos psicotrópicos, exceto derivados anfetamínicos.

Conforme ilustrado na Tabela 5, entre os respondentes, 44% nunca fizeram uso de medicamentos derivados anfetamínicos. Dos 56% que relataram terem utilizado, 23% fizeram uso somente em períodos de avaliações acadêmicas, seguidos por 19% que relataram terem utilizado apenas uma única vez. Embora não tenha sido questionado qual derivado anfetamínico é o mais utilizado pelos discentes, estudos recentes apontam o metilfenidato e a lisdexanfetamina como os estimulantes dessa classe mais consumidos (Campos; Awelino; Romanichen, 2020; Rosa et al., 2021). A divulgação desses medicamentos aumentou nos últimos anos, conforme evidenciado por Acosta et al. (2019) e Fallah et al. (2018). A maior visibilidade e discussão sobre o uso de anfetaminas e seus derivados em contextos acadêmicos podem ter contribuído para a normalização de seu uso entre estudantes. De modo geral, a lisdexanfetamina é utilizada em menor escala em comparação ao metilfenidato, o que pode ser parcialmente atribuído à maior divulgação e familiaridade com o metilfenidato, tendo chegado ao mercado brasileiro 12 anos antes da lisdexanfetamina. Além disso, a lisdexanfetamina apresenta um custo mais elevado. Contudo, a recente expiração de sua patente e a subsequente entrada dos genéricos e similares no mercado podem provocar mudanças significativas nesse cenário.

Tabela 5 – Uso de medicamento derivado anfetamínico.

Assim como no Brasil, o uso de estimulantes do sistema nervoso central (SNC) é bastante prevalente entre universitários em outros países. Um exemplo disso é a pesquisa conduzida por Fallah et al. (2018) na Universidade de Medicina de Babol, no Irã, que revelou uma alta taxa de usuários de drogas estimulantes entre graduandos de medicina. Os dados desse estudo indicam que 11% dos universitários fazem uso de metilfenidato, evidenciando uma tendência global no uso desta substância no meio acadêmico.

No presente estudo, também foi perguntado como os estudantes obtiveram o medicamento derivado anfetamínico. Assim sendo, 62% relataram ter adquirido por meio de prescrição médica, enquanto o restante, 39%, o obtiveram por meio próprio, conforme ilustrado na Tabela 5. Cabe ressaltar que, embora o número de indivíduos que obtiveram o medicamento sem prescrição médica seja menor, representando 39%, este percentual corresponde a mais de um terço dos discentes que participaram do estudo. 

Os resultados expostos na Tabela 6 evidenciam que o principal motivo mencionado pelos discentes para o uso de derivados anfetamínicos foi a dificuldade de concentração, correspondendo a 41% das respostas. Considerando que os participantes puderam selecionar mais de uma alternativa, esses percentuais refletem a frequência com que os motivos foram assinalados. O segundo motivo mais frequente foi o baixo rendimento acadêmico, mencionado em 31% das respostas. Vale ressaltar que esses dois principais fatores corroboram achados de outros estudos (Cerqueira; Almeida; Cruz Junior, 2021; Ortega et al., 2010).

Pesquisas adicionais também confirmam essa tendência, evidenciando que esses medicamentos são frequentemente utilizados por estudantes que buscam melhorar o rendimento acadêmico (Campos; Awelino; Romanichen, 2020; Rosa et al.; 2021). Muitos universitários relatam que a pressão social para obter resultados elevados e a necessidade de gerenciar múltiplas tarefas com prazos curtos contribuem para a busca por substâncias que possam aprimorar suas capacidades cognitivas. Tal comportamento é frequentemente visto como uma resposta às exigências acadêmicas, apesar dos riscos de dependência e dos efeitos colaterais associados ao uso dessas substâncias (Ortega et al., 2010).

Os dados apresentados na tabela 6 também indicam que o terceiro principal motivo para o uso de derivados anfetamínicos é o cansaço excessivo (20%). Andrade et al. (2020) salientam que os estudantes universitários enfrentam altos níveis de estresse e sobrecarga de atividades acadêmicas. Ao ingressarem na universidade, esses indivíduos se deparam com novas responsabilidades, exigindo uma administração eficiente do tempo, sem comprometer a vida social. A pressão para se destacar academicamente, aliada à necessidade de socialização pode induzir alguns estudantes a buscar alternativas, como o uso de estimulantes do sistema nervoso central (SNC), na tentativa de manter-se ativos tanto nos estudos quanto em suas atividades sociais.

Barcellos (2017) observaram um aumento significativo no consumo de derivados anfetamínicos entre estudantes de medicina, enfatizando que o alto nível de comprometimento exigido por essa formação, aliado à necessidade de longas horas de estudo, pode levar esses alunos a recorrer ao uso de substâncias estimulantes. Esse fenômeno tem gerado crescente preocupação na literatura acadêmica, devido aos seus impactos negativos no bem-estar dos estudantes (Andrade et al., 2020; Antunes; Bortoli, 2017; Vieira, 2016). Os estudantes de medicina apresentam peculiaridades que os tornam particularmente suscetíveis ao consumo de derivados anfetamínicos e demais psicotrópicos sem acompanhamento médico, tais como as elevadas demandas acadêmicas, extensa carga horária de estudos e a pressão por resultados satisfatórios (Andrade et al., 2020). 

Tabela 6 – Principais motivos para uso de derivados anfetamínicos. Os participantes puderam selecionar mais de uma alternativa, de modo que, esses percentuais refletem a frequência com que os motivos foram assinalados.

É importante, ainda, destacar que os principais fatores de risco relacionados ao aumento do abuso dessas substâncias entre discentes de graduação incluem: facilidade de acesso, busca pelo alívio do estresse psicológico, inconsciência emocional, histórico familiar de alcoolismo e tabagismo (Nawaz et al., 2017) e alto percentual de diagnósticos, muitas vezes equivocados, de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Há, ainda, uma variedade de razões que impulsionam os estudantes ao uso de derivados anfetamínicos, entre as quais se destacam: a necessidade de mitigar o estresse produzido pelo ingresso na universidade; lidar com o aumento das pressões, não apenas acadêmicas, mas também financeiras e sociais; aprimorar a concentração e o desempenho acadêmico; manter-se em estado de vigília e diminuir horas de sono; promover a sensação de bem-estar e euforia; bem como a curiosidade acerca do efeitos dessas substâncias (Andrade et al., 2020; Machado; Moura; Almeida, 2015; Marcon et al., 2012).

Diversos estudos indicaram que, após a pandemia de COVID-19, estudantes começaram a utilizar lisdexanfetamina e metilfenidato, possivelmente devido à ansiedade relacionada ao retorno às aulas presenciais e à necessidade de melhorar o desempenho acadêmico. Esse comportamento pode ser explicado pela busca por aumentar a capacidade de concentração e a eficiência nos estudos. O acúmulo de disciplinas, decorrente dos atrasos nos cursos provocados pela pandemia, intensificou a pressão sobre os alunos para recuperar o tempo perdido e para manter bons resultados acadêmicos (Acosta et al., 2019; Fallah et al., 2018).

Para Marcon et al. (2012) e Andrade et al. (2020), o elevado consumo de anfetaminas e seus derivados entre estudantes é frequentemente atribuído à crença de que essas substâncias podem melhorar o desempenho cognitivo. Os autores defendem que muitos estudantes recorrem a essas substâncias na expectativa de melhorar sua capacidade de concentração, memória e eficiência nos estudos, especialmente em contextos acadêmicos de alta demanda, nos quais a pressão por desempenho é significativa.

Alguns estudantes também relatam um aumento acentuado na excitação emocional ao utilizar anfetaminas e seus derivados, o que pode levar ao uso continuado dessas substâncias, mesmo sem benefícios acadêmicos comprovados para não diagnosticados com TDAH, TDA ou narcolepsia (Smith; Farah, 2011). Esse aumento da excitação pode ser interpretado como uma sensação de euforia ou um estado de alerta elevado, com uma percepção de melhora no foco e na atenção. Tal efeito pode ser especialmente atrativo para os alunos que buscam melhorar seu desempenho em um ambiente acadêmico altamente competitivo (Plumber et al., 2021). Contudo, muitos desses acadêmicos tendem a superestimar o potencial dessas substâncias em aprimorar o desempenho cognitivo, o que se deve, em parte, a equívocos sobre seu mecanismo (Sayyah et al., 2018).

As anfetaminas e seus derivados são classificados como substâncias simpatomiméticas que atuam como estimulantes do sistema nervoso central (SNC), promovendo um incremento temporário nas capacidades físicas e psíquicas. Esses compostos agem aumentando a disponibilidade de neurotransmissores, como a dopamina e a norepinefrina, que estão associados ao prazer e à motivação, resultando em sensações de euforia e aumento de energia (Esposti, 2017). O principal mecanismo de ação das anfetaminas ocorre no SNC, onde estas substâncias aumentam as concentrações de dopamina, norepinefrina e serotonina (em menor grau) na fenda sináptica por meio de diversos mecanismos. 

A anfetamina penetra no terminal pré-sináptico do axônio através de difusão ou captação pelos transportadores de DAT, NET e SERT, respectivamente envolvidos na recaptação das monoaminas dopamina, noradrenalina e serotonina. Uma vez dentro do terminal, a anfetamina eleva as quantidades de neurotransmissores monoamina no citosol, inibindo o transportador vesicular de monoamina 2 (VMAT2) e interrompendo os gradientes eletroquímicos necessários para a função do transportador vesicular. Além disso, a anfetamina inibe o metabolismo dos neurotransmissores monoamina ao inibir a monoamina oxidase (MAO) (Martin; Le, 2024; Miller, 2011; Nickell et al., 2014).

A anfetamina parece também ativar receptores intracelulares TAAR1, o que provoca a internalização ou reversão do transportador DAT, e seus efeitos podem se estender ao NET e ao SERT. O resultado dessa atividade é um aumento do efluxo de dopamina para a fenda sináptica e a inibição da recaptação na fenda sináptica, através da internalização do DAT e da competição direta (Martin; Le, 2024; Miller, 2011; Nickell et al., 2014). Estudos demonstram que o mecanismo de ação das anfetaminas e seus derivados é complexo, envolvendo não apenas a inibição da recaptação e amplificação da exocitose, mas também influências sobre a síntese e o metabolismo de neurotransmissores (Marcon et al., 2012; Sulzer et al., 2005). Consequentemente, ocorre um aumento significativo dos níveis extracelulares de catecolaminas, neurotransmissores essenciais para diversas funções encefálicas, como a regulação do humor, a resposta ao estresse, a atenção, a motivação e o controle motor. A liberação aumentada de dopamina, por exemplo, está diretamente associada às sensações de prazer e recompensa, contribuindo para a euforia frequentemente relatada por usuários de anfetaminas. Paralelamente, o aumento da disponibilidade de noradrenalina pode intensificar o estado de alerta e a energia, tornando essas substâncias atraentes para indivíduos que buscam aprimorar o desempenho cognitivo ou físico (Marcon et al., 2012).

Vale ressaltar que alguns derivados anfetamínicos, como o metilfenidato, atuam principalmente como inibidores da recaptação de dopamina e norepinefrina. Esse composto bloqueia os transportadores DAT e NET, aumentando a concentração desses neurotransmissores na fenda sináptica. Em outras palavras, ao contrário das anfetaminas, o metilfenidato não induz a liberação de dopamina de forma significativa; sua ação é mais voltada para a inibição da recaptação (Capp; Pearl; Conlon, 2005).

Conforme apresentado na Tabela 7, o presente estudo também investigou a percepção dos alunos quanto à ocorrência de efeitos colaterais associados ao uso de derivados anfetamínicos. Os efeitos colaterais mais frequentemente mencionados foram: diminuição ou perda de apetite (10%), ansiedade (9%) e batimentos cardíacos acelerados (9%), o que corrobora os resultados obtidos por Melo (2021) e Daher et al. (2020). Ademais, outros efeitos citados com frequência incluíram xerostomia (7%), agitação (7%), irritabilidade (6%) e insônia (6%). Importa salientar que os respondentes podiam marcar mais de uma resposta.

A complexidade das ações farmacológicas das anfetaminas e seus derivados implica em uma ampla gama de efeitos colaterais, cuja gravidade está diretamente relacionada à dose administrada e às características individuais de cada usuário. Nesse sentido, além do potencial para desenvolvimento de dependência, podem acarretar sérios riscos de agravos à saúde, incluindo insônia, ansiedade, psicose, labilidade emocional, nervosismo, dependência, anorexia, aumento da pressão arterial e danos cardiovasculares (Verghese; Abdijadid, 2024).

Tabela 7 – Efeitos colaterais verificados durante o uso de derivados anfetamínicos.

As anfetaminas e seus derivados, por atuarem tanto no sistema nervoso central quanto periférico, exercem um impacto significativo sobre a pressão arterial e a frequência cardíaca. O aumento das pressões sistólica e diastólica é atribuído à ativação do sistema nervoso simpático, resultando em vasoconstrição e aumento da frequência cardíaca, efeitos que podem ser particularmente perigosos para indivíduos com histórico de hipertensão ou doenças cardíacas (Marcon et al., 2012). Em doses elevadas, esses efeitos podem se intensificar, levando a arritmias cardíacas, devido à estimulação excessiva dos receptores adrenérgicos, o que afeta a condução elétrica do coração (Teixeira, 2011). É importante ressaltar que a combinação de hipertensão e arritmias pode resultar em colapso cardiovascular e morte súbita.

As substâncias simpatomiméticas também podem provocar comportamentos estereotípicos, como ranger de dentes e movimentos involuntários, além de aumentar a agressividade. Esses efeitos decorrem da estimulação do sistema dopaminérgico, que está envolvido no controle motor e na resposta emocional (Verghese; Abdijadid, 2024). Em doses elevadas, podem surgir reações adversas mais graves, como a hipertermia, que pode acarretar complicações sérias, incluindo danos aos órgãos. Ademais, podem causar dilatação das pupilas (midríase), palidez, perda de apetite e insônia, dificultando o relaxamento e o sono. Destaca-se também o aumento da ansiedade, irritabilidade e, em casos extremos, convulsões e psicose. Todos esses efeitos podem aparecer em curto prazo, destacando os riscos associados ao uso de anfetaminas e seus derivados, especialmente em contextos recreativos ou não supervisionados, nos quais a falta de controle sobre a dose e a frequência de uso pode resultar em consequências graves para a saúde física e mental (de Oliveira; Guimarães Neto, 2024).

Os efeitos a longo prazo do uso de anfetaminas e seus derivados são igualmente preocupantes e podem impactar significativamente a saúde mental e física dos usuários. Esses efeitos incluem uma série de distúrbios que afetam tanto o corpo quanto o comportamento, como flutuações emocionais extremas, com episódios de euforia seguidos de depressão ou irritabilidade; o desenvolvimento de transtornos de humor, como depressão e transtorno bipolar; dificuldades em regular suas emoções, levando a comportamentos impulsivos e reações desproporcionais a situações cotidianas; além de transtornos de ansiedade, psicoses, convulsões e danos cardiovasculares (de Oliveira; Guimarães Neto, 2024; Lakhan; Kirchgessner, 2012). Pesquisas demonstram que o uso prolongado pode causar degeneração neuronal e a problemas cognitivos permanentes (Teixeira, 2011; Tucker, 2021). Verifica-se também perda de peso significativa e desnutrição ao longo do tempo, bem como complicações graves, como úlceras gástricas e até coma, devido ao estresse físico e químico imposto ao corpo pela substância. Em casos extremos, o uso prolongado pode resultar em morte, seja por complicações diretas, como colapso cardiovascular, ou por comportamentos de risco associados ao uso (Andrade et al., 2020, Antunes; Bortoli, 2017; Fallah et al., 2018; Lakhan; Kirchgessner, 2012; Vieira, 2016).

A Tabela 8 apresenta os resultados referentes à observação de sinais ou sintomas indesejáveis após a interrupção do uso de derivados anfetamínicos. Cabe ressaltar, novamente, que cada participante pôde selecionar mais de uma opção. Embora a maioria tenha relatado estar assintomática (28%), os principais sinais ou sintomas observados foram: redução de energia (17%), sonolência (14%), humor deprimido (12%), letargia (11%) e ansiedade (11%). Os resultados deste estudo corroboram os achados de Alarcon (2012), que demonstrou que o uso de derivados anfetamínicos pode, inicialmente, causar euforia e aumento de energia. No entanto, o mesmo estudo também evidenciou que, após a interrupção, os indivíduos frequentemente experimentam sintomas como sonolência, redução de energia, letargia e fadiga. Esses sintomas são parte do quadro de abstinência, que podem ser bastante intensos, refletindo a adaptação do corpo à substância.

Adicionalmente, estudos sugerem que o uso excessivo de estimulantes, como as anfetaminas e seus derivados, pode resultar em uma diminuição significativa da qualidade e quantidade do sono. A privação do sono é um efeito colateral comum, uma vez que essas substâncias aumentam a vigília e a energia. Embora os estudantes possam sentir que estão se beneficiando de um aumento na produtividade e na capacidade de concentração, a falta de sono reparador pode resultar em um aumento da fadiga, comprometendo a capacidade cognitiva e o desempenho acadêmico a longo prazo. Além disso, os usuários de estimulantes podem interpretar a fadiga resultante da privação do sono e do uso excessivo dessas substâncias como um sinal de que precisam de doses adicionais para manter seu nível de energia e produtividade (Sharif et al., 2021).

Diante do exposto, embora os derivados anfetamínicos possam oferecer certos benefícios quando usados com cautela e em doses controladas, a automedicação associada ao uso frequente e em doses elevadas, pode rapidamente se tornar prejudicial, além de causar dependência. Nesse contexto, torna-se essencial que os universitários recebam educação adequada sobre os riscos do uso indevido de derivados anfetamínicos, bem como sejam incentivados a buscarem alternativos saudáveis para o manejo do estresse e melhoria da produtividade (Plumber et al., 2021; Rosa et al., 2021; Siebra et al., 2021). 

Dessa forma, os resultados deste estudo enfatizam a necessidade de prosseguir com pesquisas a respeito do uso de derivados anfetamínicos entre estudantes, visando contribuir para o desenvolvimento de estratégias eficazes no combate a esse problema de saúde pública, cada vez mais prevalente. A busca por soluções apropriadas é crucial para enfrentar as questões relacionadas ao uso de substâncias psicoativas e suas repercussões na saúde mental e no desempenho acadêmico dos universitários.

Tabela 8 – Sinais ou sintomas desagradáveis experienciados após a interrupção do uso de derivados anfetamínicos. Cada participante pôde selecionar mais de uma opção.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sociedade contemporânea tem vivenciado transformações significativas, especialmente no que tange às tecnologias e ao progresso médico, os quais têm proporcionado melhorias na qualidade de vida, ao mesmo tempo que introduzem novos desafios e riscos. Nesse contexto, destaca-se a ampla gama de medicamentos disponíveis nas farmácias, assim como os avanços no desenvolvimento de novos compostos. Apesar do fácil acesso, muitas vezes a população carece do conhecimento necessário para utilizá-los de maneira segura e eficaz. Tal cenário pode culminar no uso inadequado e no abuso de substâncias, como das anfetaminas e seus derivados, frequentemente consumidas sem a devida supervisão médica, o que acarreta graves efeitos colaterais e riscos à saúde (Daher et al., 2020).

O presente estudo coletou dados sobre o uso de derivados anfetamínicos por meio de um questionário aplicado a estudantes de um curso de medicina da cidade de Dracena. Os resultados revelaram uma presença significativa dessas substâncias no cotidiano dos acadêmicos, com uma parcela expressiva, 40% dos que fazem ou já fizeram uso, adquirindo esses medicamentos sem a devida prescrição médica ou diagnóstico que justifique seu uso.

Os dados indicam que o uso dessas substâncias é amplamente impulsionado por motivos acadêmicos, principalmente deficiência de concentração, baixo rendimento e cansaço excessivo. Em muitos casos, a pressão para alcançar um alto desempenho acadêmico leva os estudantes a recorrerem ao uso de derivados anfetamínicos, muitas vezes sem plena consciência dos potenciais efeitos adversos decorrentes do uso indiscriminado dessas substâncias.

Os resultados deste estudo evidenciam a necessidade urgente de se investir em programas de formação e conscientização voltados aos estudantes de medicina, visando alertá-los sobre os potenciais efeitos adversos associados ao uso de derivados anfetamínicos sem prescrição e acompanhamento médico. Assim sendo, é fundamental que os discentes compreendam os riscos envolvidos e sejam orientados quanto às consequências a curto e longo prazo decorrentes do uso inadequado dessas substâncias.

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1Afonso Henrique de Queiroz Dias
Faculdades de Dracena – Fundação Dracenense de Educação e Cultura (UNIFADRA), Brasil
E-mail: afonso.dias@unifadra.fundec.edu.br
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-9013-3592

2Marcel Sebastião Júnior
Faculdades de Dracena – Fundação Dracenense de Educação e Cultura (UNIFADRA), Brasil
E-mail: marcel.junior@unifadra.fundec.edu.br
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-9518-2211

3Pedro Henrique Santana Mazzarin
Faculdades de Dracena – Fundação Dracenense de Educação e Cultura (UNIFADRA), Brasil
E-mail: pedro.mazzarin@unifadra.fundec.edu.br
Orcid: https://orcid.org/0009-0001-5664-2913

4Joyce Mendes-Gomes
Faculdades de Dracena – Fundação Dracenense de Educação e Cultura (UNIFADRA), Brasil
E-mail: joyce.gomes@docente.fundec.edu.br
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3342-0058