AN INTEGRATIVE REVIEW OF RELIGIOUS/SPIRITUAL COPING AND COGNITION
REGISTRO DOI:
Amanda Fonseca Menezes1
Geovanna Felix Oliveira1
Paloma Emanoela Fava Felix2
RESUMO
O Coping Religioso/Espiritual (CRE) deriva do conceito cognitivo-comportamental de enfrentamento, compreendido como um conjunto de estratégias cognitivas e/ou comportamentais de manejar situações estressantes, podendo trazer impactos significativos no funcionamento humano. Ocorre que, o coping e a religião estão interligados como um método utilizado pelos seres humanos como uma estratégia de enfrentamento durante situações estressantes. Assim, o uso da crença torna-se um facilitador para resolução de problemas, como também, pode ser um meio de prevenção e alívio das consequências emocionais em ocasiões estressantes. Sendo assim, surge o CRE, referenciando estratégias que auxiliam no manejo do estresse, tendo como base a religiosidade ou a espiritualidade. O objetivo do presente estudo foi compreender a associação entre o CRE e a cognição humana focado em discutir a sua importância na prática psicológica. Uma revisão integrativa foi elaborada, o processo de busca e seleção dos estudos esteve norteado pela pergunta: “O coping religioso/espiritual afeta a cognição humana?”. As buscas ocorreram no banco de dados PubMed, utilizando os descritores: religious spiritual coping AND cognition NOT disease. De 73 artigos, 13 foram lidos na íntegra e 3 foram incluídos na amostra final. Os estudos possibilitaram uma compreensão neurológica e comportamental, demonstrando áreas cerebrais ativadas pelas crenças religiosas, assim como pelas não religiosas, direcionadas ao desempenho cognitivo e ao comportamento de raciocínio social. Os profissionais da saúde precisam de conhecimento sobre a importância da abertura para dialogarem e analisarem as vivências espirituais e religiosas de seus pacientes, o contato com essas informações contribui para melhor acessar e organizar estratégias de saúde eficazes e motivacionais ao paciente.
Palavras-chave: coping religioso/espiritual; cognição; psicologia.
1. INTRODUÇÃO
O Coping Religioso/Espiritual (CRE) advém do conceito cognitivo-comportamental de coping, que surge a partir de estudos nessa área da psicologia acerca do estresse. O coping é caracterizado portanto como um conjunto de estratégias cognitivas e/ou comportamentais cujo papel é o de manejar situações estressantes, podendo trazer impactos significativos no funcionamento humano (Panzini; Bandeira, 2007).
Ao analisar pesquisas atuais ligadas ao coping ocorre o aparecimento e envolvimento da religião como um método utilizado pelos seres humanos como uma estratégia de enfrentamento durante situações estressantes. Panzini e Bandeira (2007 apud Koenig et al.;1998), definem que o uso da crença torna-se um facilitador para resolução de problemas, como também, pode ser um meio de prevenção e alívio das consequências emocionais em ocasiões estressantes.
Desenvolvendo-se em áreas de estudo como a psicologia da religião, psicologia positiva, cognitiva-comportamental e da saúde, o conceito de CRE se caracteriza também como um conjunto de estratégias que auxiliam no manejo do estresse, tendo como base a religiosidade ou espiritualidade do indivíduo. O CRE também não se delimita ao manejo de situações negativas, mas alcança a visão de mundo do indivíduo, afetando também como ele enxerga situações positivas e significativas (Galvão; Gomes; Bezerra, 2023; Panzini; Bandeira, 2007).
Quando o ambiente onde um indivíduo está inserido apresenta sinais estressores e o organismo tem a capacidade de absorver e enviar para o cérebro que processará e responderá a situação por meio de aspectos cognitivos, comportamentais e fisiológicos. Margis et al. (2003), comenta que ao nível cognitivo a resposta fornecida pelo indivíduo a determinada situação varia dependendo do processamento e avaliação da informação, sendo possível ocorrer a ativação de respostas de defesa específicas para o alvo, gerais ou se não houver uma resposta terá que decidir em arriscar uma nova resposta ou suportar passivamente a situação.
Portanto, a temática religiosidade e espiritualidade ainda parece ser um tabu em discussões científicas, mas sendo fundamental, visto que a fé e as crenças religiosas são utilizadas como estratégias para lidar com vivências estressantes (Wiedenhoft; Machado, 2020). Em relação à saúde mental das pessoas, existem apontamentos para que a religiosidade e a espiritualidade sejam consideradas um recurso de enfrentamento (Monteiro et., 2020).
2. OBJETIVO
O objetivo geral do estudo foi compreender a associação entre o coping religioso/espiritual e a cognição humana.
Os objetivos específicos são:
- Realizar uma revisão sobre o CRE e a cognição;
- Discutir a relevância do CRE para a prática da psicologia;
- Identificar se existe o conhecimento e a abertura referente ao CRE na atuação prática psicoterapêutica.
3. METODOLOGIA
3.1 Estratégia de pesquisa e critérios de elegibilidade
Para a elaboração da revisão integrativa, o processo de busca e seleção dos artigos utilizou o banco de dados PubMed (busca de livre acesso ao Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica (MedLine)), empregando os descritores: religious spiritual coping AND cognition NOT disease; utilizando o filtro para seleção dos últimos 5 anos (2019-2024).
Todo o processo de busca e seleção dos estudos foi norteado pela pergunta: “O coping religioso/espiritual afeta a cognição humana?”.
Os critérios de inclusão: (i) estudos experimentais e não-experimentais; (ii) associação entre CRE e cognição e (iii) população saudável a partir de 18 anos.
E os critérios de exclusão: (i) estudos duplicados; (ii) estudos que não discutem a associação entre CRE e cognição; (iii) estudos com indivíduos não saudáveis, como, doenças crônicas e distúrbios psicológicos e (iv) estudos com população inferior a 18 anos.
3.2 Seleção e análises dos estudos incluídos
O processo de seleção dos artigos ocorreu de forma independente por duas autoras (Menezes; Felix-Oliveira), sendo que, os conflitos de elegibilidade foram discutidos e analisados detalhadamente na presença da terceira autora (Fava-Felix). Portanto, foram lidos os títulos e resumos de todos os estudos, sendo primeiramente excluídos os duplicados e, posteriormente, os selecionados foram lidos na íntegra para definição da amostra final.
Durante todo o processo os estudos foram organizados em tabelas excel e a descrição dos estudos estão apresentados nos resultados.
4. RESULTADOS
4.1 Processo de busca e seleção dos estudos
A varredura no banco de dados PubMed ocorreu de maio a julho de 2024. Foram encontrados no total 73 estudos, sendo 12 duplicados, assim lidos títulos e resumos de 61 estudos, dos quais 48 foram excluídos e 13 inseridos para leitura na íntegra. Foram selecionados para a amostra final 3 estudos.
Dos 3 estudos incluídos, apenas 1 discute sobre a atuação do coping religioso/espiritual na cognição. Entretanto, outros 2 estudos foram elegíveis, devido apresentarem informações de como a crença religiosa atua na cognição humana.
As representações do processo de busca e seleção estão apresentadas nos gráficos 1 e 2 de diagramas.

Gráfico 1. Diagrama do processo de busca e seleção dos estudos.

Gráfico 2. Diagrama da divisão dos estudos incluídos.
4.2 Descrição dos estudos incluídos
Os estudos incluídos na amostra final, são dos últimos cinco anos e dois discutem sobre a atuação da crença religiosa na cognição (Gaw, 2019; Bakhtiari et al., 2019) e apenas um sobre a atuação do coping religioso/espiritual (Vitorino; Granero-Lucchetti; Lucchetti; 2022).
A revisão de Gaw (2019), buscou investigar através de exame de ressonância magnética os correlatos neurais dos temas: acreditar; crença, descrença e incerteza; religiosidade; crença religiosa e não religiosa; e processamento autorreferencial entre crentes e não crentes, sugerindo que não existir um “ponto de Deus” e que o papel da crença religiosa é um importante aliado ao atendimento clínico dos pacientes.
O estudo transversal (Bakhtiari et al., 2019), objetivou investigar a relação entre orientação religiosa e promoção de comportamento de saúde entre idosos iranianos, encontrando uma relação significativa entre comportamento de saúde e alguns perfis dos participantes, portando, as características demográficas e a saúde física e mental não devem ser negligenciadas ao investigar a correlação entre religiosidade e saúde.
Já a revisão longitudinal de Vitorino; Granero-Lucchetti; Lucchetti (2022), avaliou se ter crenças religiosas, frequentar serviços religiosos e usar estratégias de enfrentamento espiritual-religioso (tanto de forma positiva quanto negativa) estão associados a um declínio cognitivo em idosos residentes na comunidade brasileira.
As características dos estudos também estão apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1. Características dos estudos incluídos


5. DISCUSSÃO
Esta revisão integrativa buscou compreender a associação entre o coping religioso/espiritual e a cognição humana, tendo encontrado dois estudos que discutem a atuação da crença religiosa na cognição e um estudo da atuação do coping religioso/espiritual.
Os resultados do estudo de Gaw (2019) encontraram indicações da ativação do córtex pré-frontal ventromedial tanto para crenças religiosas e não religiosas, havendo maior envolvimento do córtex pré-frontal ventromedial para não religiosos, e maior do córtex pré-frontal dorsomedial para os cristãos.
Em consonância com Gaw (2019), a revisão de Newberg (2014) direciona para a ocorrência de um crescente na busca acadêmica sobre as associações de práticas religiosas à cognição, com destaques para estudos com foco em averiguar os impactos no cérebro através de exames como por exemplo a neuroimagem, ressonância magnética funcional, computadorizada por emissão de fóton único e tomografia por emissão de pósitrons. Esses exames têm apresentado consideráveis contribuições para as pesquisas que buscam o impacto da religião na cognição, como o fMRI que mede as mudanças no fluxo sanguíneo cerebral em estruturas cerebrais durante uma tarefa específica.
Nesta revisão, o estudo de Bakhtiari (2019) indicou que descobrir o potencial religioso dos indivíduos pode ser valioso para os comportamentos de saúde dos idosos, reconhecendo a importância da função religiosa em contexto de saúde humana e apontando que correlações significativas a respeito do comportamento de saúde e perfis dos participantes do estudo foram identificadas. Assim, indicações de abordagens mais específicas para a temática são fundamentais para melhor entendimento da saúde e sua diversidade de aspectos.
Um recente estudo (Britt et al., 2024), apresentou indicações de que as crenças e os valores religiosos podem agir como influenciadores de saúde física e cognitiva, pois estão associados a senso de propósito, recursos de enfrentamento, saúde psicológica e menor risco de saúde entre adultos e idosos, além de a prática religiosa atuar também como estímulo para a vivência social e comunitária, o que influencia os níveis de estresse.
Ainda considerando que a crença religiosa pode atuar como fator protetivo, um outro estudo incluído nesta revisão (Vitorino; Granero-Lucchetti; Lucchetti, 2022), sugere que o estabelecimento de uma relação funcionalmente positiva com a mesma, pode estar vinculado a uma menor taxa de declínio cognitivo em idosos, sendo importante considerar que a cognição é afetada também por fatores pessoais e culturais. Este estudo também ressalta a necessidade de profissionais de saúde considerarem os aspectos religiosos de seus pacientes em suas atuações.
Interessantemente, o estudo de Murakami e Campos (2012), apresentou a religiosidade/espiritualidade como mobilizador de energia positiva através da fé, ratificando que através da crença no poder sobrenatural cria-se uma intervenção favorável nas circunstâncias de vida, além do apoio que pode ser encontrado dentro desse contexto, fortalecendo os indivíduos através da participação em grupos religiosos que oferecem um suporte e um lugar de fala.
Para finalizar, é importante considerar que apesar do número reduzido de estudos incluídos nesta revisão, todos os estudos direcionaram a compreensão de que os aspectos ‘espiritual e religioso’ pode ser considerado fator protetivo aos indivíduos, especificamente os adultos e idosos, pois além de ativar regiões que envolvem regulação emocional e tomada de decisão, estão envolvidos no combate ao declínio cognitivo.
6. LIMITAÇÕES
É importante considerar que dados sociodemográficos são valiosos para futuras correlações, como a idade dos participantes de cada estudo incluído. Nesta revisão foi difícil de incluir estudos com população abaixo dos 40 anos, sendo em sua maioria idosos. Ao investigar e compreender o coping religioso/espiritual dados como a idade e a escolaridade, podem mediar diferentes resultados futuros.
Outro fator limitante, envolve a numerosa quantidade de estudos vinculando a religiosidade/espiritualidade a enfrentamentos de doenças em relação a baixa taxa de estudos que não vinculam doenças.
As proxies de reserva cognitiva poderão contribuir para futuras pesquisas na temática CRE, colaborando para correlações entre perfil e cognição dos participantes. Estudos futuros também devem investigar outros bancos de dados que anexam estudos da área da saúde.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os estudos incluídos nesta revisão integrativa, indicam a importância de profissionais da área da saúde obterem conhecimento e demonstrar abertura para dialogarem e analisarem as vivências espirituais e religiosas de seus pacientes. O acesso a essas informações contribui para compreender, acolher e orientar estratégias de saúde.
As crenças religiosas, assim como as não religiosas, parecem ativar regiões específicas do cérebro envolvidas no desempenho cognitivo e comportamento de raciocínio social, do controle de impulsos, da regulação emocional e da tomada de decisões.
A associação entre o CRE e a cognição humana também envolve fatores pessoais e culturais dos indivíduos, não devendo ser analisada em contexto isolado.
REFERÊNCIAS
BAKHTIARI, Afsaneh et al. Does Religion Predict Health-Promoting Behaviors in Community-Dwelling Elderly People? Journal of Religion and Health, v. 58, n. 2, p. 452–464, 5 out. 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s10943-018-0710-3. Acesso em 06 mai. 2024.
BRITT, Katherine Carroll et al. The association between religious beliefs and values with inflammation among Middle-age and older adults. Aging and mental health/Aging & mental health, p. 1–8, 29 mar. 2024. Disponível em: https://doi.org/10.1080/13607863.2024.2335390. Acesso em 07 mai. 2024.
GALVÃO, Paulo Cesar da Costa; GOMES, Eduardo Tavares; BEZERRA, Simone Maria Muniz da Silva. Coping religioso-espiritual de pacientes no período préoperatório de cirurgia cardíaca. Revista Baiana de Enfermagem, v. 37, 1 jan. 2023. DOI 10.18471/rbe.v37.48540. Disponível em: https://periodicos.ufba.br/index.php/enfermagem/article/view/48540. Acesso em: 04 abr. 2024.
GAW, Albert C. Religious Belief at the Level of the Brain: Neural Correlates and Influence of Culture. The Journal of nervous and mental disease, v. 207, n. 7, p. 604–610, jul. 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1097/NMD.0000000000001016. Acesso em: 10 abr. 2024.
MARGIS, Regina et al. Relação entre estressores, estresse e ansiedade. R. Psiquiatr., v. 25, s. 1, p. 65-74, abril 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rprs/a/Jfqm4RbzpJhbxskLSCzmgjb/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 09 abr. 2024.
MONTEIRO, Daiane Daitx et al. Espiritualidade / religiosidade e saúde mental no brasil: uma revisão. Bol. – Acad. Paul. Psicol., São Paulo, v. 40, n. 98, p. 129-139, 1 jun. 2020. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415711X2020000100014&lng=pt&nrm=iso. Acesso em 04 abr. 2024.
MURAKAMI, Rose; CAMPOS, Claudinei José Gomes. Religião e saúde mental: desafio de integrar a religiosidade ao cuidado com o paciente. Revista Brasileira de Enfermagem, v. 65, n. 2, p. 361–367, 1 abr. 2012. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0034-71672012000200024. Acesso em 20 jun. 2024.
NEWBERG, Andrew. B. The neuroscientific study of spiritual practices. Front Psychol., v. 5, 18 mar. 2014. Disponível em: https://doi.org/10.3389/fpsyg.2014.00215. Acesso em 04 jun. 2024.
PANZINI, Raquel Gehrke; BANDEIRA, Denise Ruschel. Coping (enfrentamento) religioso/espiritual. Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), v. 34, p. 126–135, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0101-60832007000700016. Acesso em: 04 abr. 2024.
VITORINO, Luciano Magalhães; GRANERO-LUCCHETTI, Alessandra Lamas; LUCCHETTI, Giancarlo. The role of spirituality and religiosity on the cognitive decline of community-dwelling older adults: a 4-year longitudinal study. Aging & mental health, v. 27, n. 8, p. 1526–1533, 1 nov 2022. Disponível em: https://doi.org/10.1080/13607863.2022.2141195. Acesso em 02 jul. 2024.
WIEDENHOFT, Jessica Pastoriza; MACHADO, Laura Morais. Coping religioso como estratégia de enfrentamento em situações estressoras. Pastoriza Wiedenhoft, v. 1, n. 1, 2020. Disponível em: https://www.ulbracds.com.br/index.php/interfaces/article/view/2956/330. Acesso em 10 de jul. 2024.
1Formadas em Psicologia pela Faculdade de Dracena (Unifadra) e-mail: geovanna.felix022@gmail.com amanda.menezes.0910@gmail.com;
2Docente do Curso Superior de Psicologia da Faculdade de Dracena (Unifadra) e-mail: paloma.felix@docente.fundec.edu.br