UMA REFLEXÃO BÍBLICO-TEOLÓGICA DA “MULTIPLICAÇÃO” DOS PÃES E PEIXES SEGUNDO MT 14,13-21

A BIBLICAL-THEOLOGICAL REFLECTION THE “MULTIPLICATION” OF LOAVES AND FISHES ACCORDING TO MT 14,13-21

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11532906


Renata Soares da Silva1


Resumo 

O presente artigo tem como objetivo a reflexão bíblico-teológica sobre a perícope de Mt 14, 13-21, da “multiplicação” dos pães e peixes. Esta narrativa sugere um vislumbre do “projeto de fraternidade de Jesus”. Quando os discípulos sugerem que Jesus mande a multidão faminta embora para que possam comprar alimento (cf. v 15), Jesus recusa a proposta, respondendo: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (v. 16). Este imperativo sublinha a importância da compaixão (v. 14) e da partilha dos recursos (v. 17) como soluções para a fome. A lógica dos discípulos, às vezes, é oposta à do Mestre. Mas Jesus chama os discípulos a conversão, pois acredita que a resposta para os problemas da humanidade está nas “mãos” da comunidade, quando comprometida com a construção do Reinado de Deus – um dom divino que também requer esforço humano. Os significados bíblico-teológicos desta passagem são profundos, apontando para uma prática de fé que implica em ações concretas de compaixão e partilha.

Palavras-chave: Multiplicação de pães e peixes. Mateus 14, 13-21. Teologia bíblica. Compaixão. Partilha.

Abstract 

The aim of this article is a biblical-theological reflection on the pericope of Mt 14:13-21, the “multiplication” of the loaves and fishes. This narrative suggests a glimpse of Jesus’ “project of fraternity”. When the disciples suggest that Jesus send the crowd away so that they can buy food (cf. v. 15), Jesus refuses the proposal, replying: “Give them something to eat yourselves” (v. 16). This imperative underlines the importance of compassion (v. 14) and the sharing of resources (v. 17) as solutions to hunger. The disciples’ logic sometimes runs counter to that of the Master. But Jesus calls the disciples to conversion, because he believes that the answer to humanity’s problems lies in the “hands” of the community, when it is committed to building the Reign of God – a divine gift that also requires human effort. The biblical-theological meanings of this passage are profound, pointing to a practice of faith that implies concrete actions of compassion and sharing.

Keyword: Multiplication of loaves and fishes. Matthew 14:13-21. Biblical theology. Compassion.

Introdução 

 O presente trabalho tem como objetivo fazer uma reflexão bíblico-teológica da narrativa da “multiplicação” dos pães e peixes em Mt 14,13-21, embora a narrativa encontre paralelo nos outros três Evangelhos: Mc 6,31-44; Lc 9,10-17; Jo 6,1-13.  

 Através de uma leitura atenta da perícope de Mt 14, 13-21, podemos perceber que o projeto de fraternidade de Jesus – “dai-lhes vós mesmos de comer” (v. 16) – fundamenta-se na compaixão (cf. v.14) e na partilha dos recursos (cf. v. 17), a começar pelos mais marginalizados e sofredores.   

Essa solidariedade de Jesus com os oprimidos e empobrecidos tem em sua base a solidariedade de Deus com seu povo (cf. Ex 3, 7-11). É interessante lembrar que Deus em Jesus Cristo caminha conosco, ao fazermo-nos solidários aos nossos irmãos, mesmo quando enfrentamos desafios.     

 A “boa notícia” do texto de Mt 14, 13-21 é que a solução para a problemática da fome está na partilha e na solidariedade. Pois, “o grande milagre não é multiplicar os pães e os peixes, mas repartir o pãozinho e o peixinho que cada um tem entre todos os outros”2. Nesse sentido, indaga-se: qual é o sentido da narrativa, e quais critérios são apontados para ação cristã?  

Essa reflexão bíblica-teológica pretende mostrar como a prática de Jesus de Nazaré ilumina esta questão. Para tanto, o trabalho será dividido em seis partes na primeira, identificar-se-á o contexto literário de Mt 14, 13-21; na segunda, apresentar-se-á o contexto histórico da comunidade mateana implicado na perícope; na terceira, segmentar-se-á o texto; na quarta, evidenciar-se-á a estrutura literária e o gênero literário; na quinta, indicar-se-á o sentido bíblico e teológico da perícope; na sexta e última parte, sublinhar-se-á sua relevância pastoral no atual contexto.  

1. Contexto literário 

 Conforme Radermarkers3, o evangelho segundo Mateus pode ser dividido em doze etapas.

Lohr4 oferece a seguinte divisão:

VV.AA.5, divide a obra em duas etapas: primeira (3-16) e segunda (17-28), que compõem cinco “livretos”. Vejamos:

Observa-se que a narrativa Mt 14, 13-21, conhecida como “multiplicação dos pães”, situa-se segundo Radermarkers e Lohr, no bloco compreendido entre os capítulos 14 e 17, ou ainda, de acordo com VV.AA., entre os capítulos 13 e 16.  

No capítulo 13, através do discurso em parábolas, Jesus revela aos discípulos a dinâmica do “Reino dos Céus”. Nesta etapa, a comunidade eclesial, primícias do Reino, vai se formando, aprofundando a fé no “Cristo, Filho do Deus vivo” (16, 16), começando a compreender Jesus e sua proposta (cf. 15,10; 16,12; 17,13).

2. Contexto histórico da comunidade mateana implicado na perícope 

 O Evangelho segundo Mateus foi redigido num ambiente marcado pelo judaísmo. No final do século primeiro do tempo de Jesus, pelos anos 70 d.C., quando o império romano invadiu a Palestina, tomou Jerusalém, e destruiu o Templo, começou um movimento de reorganização do judaísmo, conhecido como “judaísmo formativo”6

O evangelho segundo Mateus foi redigido para fortalecer a fé da comunidade, composta na maioria de cristãos de oriundos do judaísmo. A comunidade mateana enfrenta certa tensão com o judaísmo formativo que é fortemente influenciado pelos fariseus que, por sua vez, são apresentados pelo evangelista como os grandes “opositores” de Jesus.  

Para Mateus a sua comunidade é o “verdadeiro Israel” (e não a “nova sinagoga”!). Aqui é importante ressaltar que o Jesus de Mateus é um “novo Moisés”, que vem do Egito (cf. 2,15), que pronuncia cinco discursos baseando-se na estrutura da Torá (cf. primeiro discurso: 5-7; segundo: 10; terceiro: 13; quarto: 18; quinto e último: 24-25)7.  Para o evangelista ainda, Jesus é o Messias esperado por Israel, investido pelo Pai (cf. 3,17), cujo messianismo se dá por palavras e obras (cf. 4, 23-25), desenvolvidas ao longo do evangelho.    

3. Texto de Mt 14, 13-21 segmentado 

13
a) Jesus,  
b) ouvindo isso,  
c) partiu dali, de barco, para lugar deserto, afastado.  

14
a) Assim que as multidões o souberam  
b) vieram das cidades,  
c) seguindo-o a pé:  

15
a) Assim que desembarcou,
b) viu uma grande multidão e,  
c) tomado de compaixão,  
d) curou seus doentes.  
e) Chegada a tarde aproximaram-se dele seus discípulos,  
f) dizendo:  
g) “O lugar é deserto  
h) e a hora já está avançada.  
i) Despede as multidões  
j) para que vão aos povoados comprar alimento para si”.  

16
a) Mas Jesus lhes disse:  
b) “Não é preciso que vão embora.  
c) Dá-lhes vós mesmos de comer”.  

17
a) Ao que os discípulos responderam:  
b) “Só temos aqui cinco pães e dois peixes”.  
c) Disse Jesus:  

18
a) “Trazei-os aqui”.  

19
a) Tendo mandado que as multidões se acomodassem na grama,  
b) tomou os cinco pães e os dois peixes,  
c) elevou os olhos ao céu e 
d) pronunciou a bênção.  
e) Em seguida, partindo os pães, 
f) Deu-os aos discípulos,  
g) e os discípulos às multidões.  

20
a) Todos comeram  
b) e ficaram saciados,  
c) e ainda recolheram doze cestos cheios dos pedaços que sobraram. 

21
a) Ora, os que comeram eram cerca de cinco mil homens,  
b) sem contar mulheres e crianças.

4. Estrutura e gênero literário  

A perícope (Mt 14, 13-21) possui as características do gênero literário chamado “narrativa de milagre”9. Observemos que a narrativa (vv. 13-15c. 16a. 17a.c.1921) contém um diálogo entre Jesus e seus discípulos (vv. 15d-g. 16b-d. 17b. 18).

A forma literária de Mt 14, 13-21 está estruturada em 3 partes:

A narrativa da “multiplicação” dos pães e peixes mostra “a compaixão divina para com a dor humana e a chegada do tempo de salvação”10.

5. Reflexão bíblico-teológica de Mt 14, 13-21  

Logo no início do texto, o evangelista afirma que Jesus “viu uma grande multidão e, tomado de compaixão, curou seus doentes” (v.14). O verbo grego σπλαγχνίζομαι (splangnizomai) traduzido como “mover-se ou ser movido de compaixão”11 , deriva do substantivo σπλάγχνον (splangnon) que significa literalmente “vísceras”, e metaforicamente “compaixão”, “misericórdia”12.

Misericórdia e compaixão estão intimamente entrelaçadas nas Escrituras. Algumas vezes, o termo “compaixão” pode ser traduzido como έλεος (éleos), nome grego que quer dizer “misericórdia”13.  

Nota-se que a palavra misericórdia em hebraico רחמים (rahamim) tem a mesma raiz da palavra רחם (rehem) que significa “entranhas”, “ventre materno”13.

Isto explica que somente quem é capaz de gerar vida, de alguma forma, é também capaz de agir com compaixão-misericórdia.     

 A misericórdia é um atributo divino. Como podemos constatar no Êxodo, Deus se posiciona em favor de toda humanidade, ao mesmo tempo em que manifesta seu amor preferencial pelos pobres, oprimidos e excluídos por causa do seu contexto histórico: “Eu vi, eu vi a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi seu grito … eu conheço as suas angústias. Por isso desci a fim de libertá-lo” (Ex 3, 7-8).  

 Assim como o seu Pai, Jesus não é distante ao sofrimento da humanidade. Ele observa o sofrimento do povo, sofre com o sofrimento do povo, e manifesta a todos nós seus irmãos, a começar pelos mais sofridos e empobrecidos, a misericórdia do seu (e nosso) Pai. 

 No dizer do papa Francisco,   

Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai. O mistério da fé cristã parece encontrar nestas palavras a sua síntese. Tal misericórdia tornou-se viva, visível e atingiu o seu clímax em Jesus de Nazaré. O Pai, « rico em misericórdia » (Ef 2, 4), depois de ter revelado o seu nome a Moisés como « Deus misericordioso e clemente, vagaroso na ira, cheio de bondade e fidelidade » (Ex 34, 6), não cessou de dar a conhecer, de vários modos e em muitos momentos da história, a sua natureza divina. Na « plenitude do tempo » (Gl 4, 4), quando tudo estava pronto segundo o seu plano de salvação, mandou o seu Filho, nascido da Virgem Maria, para nos revelar, de modo definitivo, o seu amor. Quem O vê, vê o Pai (cf. Jo 14, 9). Com a sua palavra, os seus gestos e toda a sua pessoa, Jesus de Nazaré revela a misericórdia de Deus.Jesus é o rosto misericordioso do Pai.14  

Em Mt 14, 14, movido de compaixão, Jesus sentiu a dor da multidão sofrida, e curou seus doentes. (“Amar é ‘(lou)cura’”, não é mesmo?!) A cura é interpretada como um dos sinais messiânicos”. Recordemos que ao responder à pergunta de João Batista se ele era mesmo o Messias, o “Enviado de Deus” (cf. Mt 11, 3), Jesus disse aos discípulos do Batista: “Ide contar a João o que ouvis e vedes: os cegos recuperam a vista, os coxos andam, os leprosos são purificados e os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados” (Mt 11, 4-5). 

Além das doenças, na perícope aparece também a problemática da fome da multidão. O contexto veterotestamentário15 da “multiplicação” dos pães e peixes em Mt 14, 13-21 é o da “multiplicação” do azeite e do pão em 2 Rs 4, 42-44. E mais: na medida em que o evangelista apresenta Jesus alimentando a multidão num “lugar deserto” (v.13), parece evocar também a figura de Moisés e alimentação do povo no deserto (cf. Ex 16; Nm 11).   

Os discípulos percebem que já está ficando tarde, então eles sugerem a Jesus mandar a multidão embora a fim de “comprar alimento para si” (v. 15). Jesus discorda da proposta deles e ordena: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (v. 16). Observemos que no texto grego do neotestamento o ὑμεῖς (“vós mesmos”) encontra-se no nominativo, na segunda pessoa do plural, como sujeito do verbo “dar” que, por sua vez, está no imperativo. Então aqui o “vós mesmos” é enfático…   

A lógica dos discípulos, às vezes, é oposta à do Mestre. Quando Jesus manda alimentar a multidão, os discípulos reagem: “Só temos aqui cinco pães e dois peixes” (v.17). Parece que eles veem a realidade a partir do individualismo, do calculismo. No v.15, percebe-se que a possibilidade de se alimentar está associada ao dinheiro. (E quem não tem dinheiro???) Jesus acredita que o disponível (v.18: “os cinco pães e os dois peixes”) é o suficiente quando partido e compartilhado. Note-se que em hebraico o número sete (cinco pães e dois peixes) é um número simbólico que significa plenitude, totalidade, abundância.   

Para atender as necessidades da multidão, Jesus agiu assim: primeiro, ele acomodou (organizou) as pessoas famintas na grama (v.18). (Este versículo evoca a imagem do Bom Pastor do Sl 23: “O Senhor é meu pastor… Em verdes pastagens me faz repousar” (vv.1-2)); segundo, ele tomou os pães e os peixes; terceiro, ele pronunciou uma bênção antes da refeição, assim como seu povo judeu fazia (e faz); quarto, ele partiu os pães e, quinto e por fim, ele distribuiu (os alimentos) aos seus discípulos que distribuíram às multidões (v.19). (Nota-se que os discípulos têm uma missão clara … São “servidores” da humanidade sofrida….) 

Aqui é importante enfatizar que a comunidade colocou em comum aquilo que tinha: “pão” e “peixe”. O pão, feito de cevada ou trigo, era (e é) um alimento cotidiano fundamental para o povo de Jesus, o povo judeu. Também o peixe era (e, ainda é) algo muito comum naquela região em torno do lago da Galileia. Alguns dos discípulos de Jesus eram pescadores, e o próprio Jesus chamou os seus seguidores de “pescadores de homens” (Mt 4, 9)16. A solução da fome, dentre outros problemas da humanidade, está nas mãos da comunidade que tem “cinco pães e dois peixes” (14,17).     

Outro ponto significante é que Mateus diz que Jesus “abençoou” os alimentos. A linguagem e os gestos deste versículo remetem à cena da última ceia, na qual Jesus “tomou [o pão]”, “abençoou”, “partiu” e “distribuiu” e disse: “Tomai e comei, isto é o meu corpo” (cf. Mt 26,26). Isso faz pensar: quais ensinamentos há em comum entre a alimentação da multidão faminta e a mesa da Eucaristia?      

O banquete do Reino de Deus em Jesus Cristo é assim: favorece a todos, é (mais) para todos! Por isso, é de fato, “boa nova”! Todos – crianças, mulheres e homens (cf. v. 21) – “comeram e ficaram saciados, e ainda recolheram doze cestos cheios dos pedaços que sobraram” (v. 20).  

6. Conclusão: “Pão [e peixe!] em todas as mesas”   

 Ao recolher a mensagem da narrativa da “multiplicação” dos pães e peixes segundo Mateus 14,13-21 percebe-se que ela tem muito a dizer para nosso atual contexto. Entre os vários elementos ressalta-se:  

1) Jesus não é indiferente ao sofrimento da humanidade. A misericórdia e     compaixão se apoderaram de Jesus ao observar o sofrimento da multidão. Cada um também chamados a abrir o coração com compaixão e misericórdia enquanto sai ao encontro dos mais necessitados a fim de dar expressão ao Reino de Deus que já está entre nós. No dizer da Gaudium et Spes: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco no seu coração”.   

2) A proposta de Jesus é de reunir a humanidade numa fraternidade real (cf. Mt 23, 8). Porém ele percebe as contradições econômicas, sociais, políticas, religiosas de sua época e de todas as épocas. Cada um também é chamado a ser crítico diante da nossa realidade, percebendo e denunciando a pobreza que massacra o povo, a distribuição iníqua da renda e das riquezas, o econômico que estrangula o social, os impostos, a falta de uma reforma política agrária, a violência, o desemprego, as mazelas de uma cultura da competição. 

3) A ordem de Jesus aos discípulos (“dai-lhes vós mesmos de comer”) pode ser compreendida como uma crítica à fé desvinculada da prática (?). Hoje também a mesma crítica é feita diante da situação de miséria e degradação do povo. Realidade que confronta a consciência cristã e ressalta a falta de testemunho evangélico e falta daquilo que é a essência da fé (cf. Mt 25), apegando-se em elementos periféricos (luta pelo poder, vestes, microfones etc).  

4) Deus em Jesus Cristo sempre chama à conversão. Cada um também é chamado a uma conversão individual e comunitária para superar a mentalidade “neoliberal” e assumir a “globalização da solidariedade”. Consciente desta sua missão, de ajudar a solucionar os grandes problemas da humanidade, a Igreja Católica, em 2022, lançou pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil a Campanha da Fraternidade que tem como tema “Fraternidade e fome”, e cujo lema é o encontrado na nossa perícope de estudo: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16).  

5) O texto evangélico termina dizendo que as sobras foram recolhidas.   “Recolher” as sobras é sempre necessário a fim de evitar desperdícios de alimentos. Cada um é chamado a cuidar uns dos outros e do meio ambiente pois tudo está interligado (cf. Encíclica Laudato Si e Exortação Apostólica Querida Amazônia).

6) Justamente como Jesus fez quando repartiu os pães e os peixes, oxalá, cada ser humano possa experimentar sempre mais esse Deus de Jesus Cristo e, “movido de compaixão”, “sair” ao encontro dos mais necessitados de misericórdia e compaixão a fim de manifestar, nesse contexto desafiador, o Reino de Deus que já está, mas não plenamente, entre a humanidade toda.  

Conclui-se o artigo com as palavras do canto das Comunidades Eclesiais de Base; hoje, sobretudo, o refrão dele: “Pão [e peixe!] em todas as mesas…” tem sabor de utopia – mas é uma esperança:  

“A mesa tão grande e vazia de amor e de paz! De paz! 
Aonde há o luxo de alguns, alegria não há, jamais! 
A mesa da Eucaristia nos quer ensinar, a – a, 
Que a ordem de Deus, nosso Pai, é o pão partilhar! 

Pão [e peixe!] em todas as mesas, da Páscoa nova certeza. 
A festa haverá e o povo a cantar, Aleluia. 

As forças da morte: a injustiça e a ganância de ter – de ter, 
Agindo naqueles que impedem ao pobre viver – viver, 
Sem terra, trabalho e comida, a vida não há, – não há 
Quem deixa e não age, a festa não vai celebrar. 

Irmãos, companheiros na luta, nos demos as mãos – as mãos, 
Na grande corrente do amor, na feliz comunhão! – irmãos! 
Unindo a peleja e a certeza, vamos construir aqui, 
Na terra o projeto de Deus: Todo povo a sorrir! 

Que em todas as mesas dos pobres haja festa de pão – de pão! 
E as mesas dos ricos não mais concentrando o pão – o pão! 
Busquemos aqui, nesta mesa do pão redentor – do céu, 
A força e a esperança que faz todo povo ser Deus!” 


2STORNIOLO, Ivo. Como ler o evangelho de Mateus: o caminho da justiça. São Paulo: Paulus, 2005, p. 99-100.
3Cf. RADERMAKERS, Jean. Au fil de l’évangile selon saint Matthieu, I. Texte II. Lecture continue, 1972. In Revue théologique de Louvain, 4e année, fasc. 2, 1973, p.217-225.
4Cf. VIVIANO, Benedict. O Evangelho segundo Mateus”. In BROWN, Raymond; FITZMYER, Joseph; MURPHY, Roland. Novo comentário bíblico São Jerônimo: Novo Testamento e artigos sistemáticos. São Paulo: Academia Cristã/Paulus, 2011, p. 136.
5Cf. VV. AA. Leitura do evangelho segundo Mateus. São Paulo: Paulinas, 1982, p. 24. 26-27.
6Cf.VITÓRIO, Jaldemir. Mateus. São Paulo: Loyola, 1996, p. 7.
7Cf VITÓRIO, Jaldemir. Mateus. São Paulo: Loyola, 1996, p.8 
8O texto utilizado foi extraído da BÍBLIA DE JERUSALÉM: nova edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2013.
9Cf. LIMA, Maria de Lourdes Corrêa. Exegese Bíblica: Teoria e Prática. São Paulo: Paulinas 2014, p.194-195.
10LIMA, Maria de Lourdes Corrêa. Exegese Bíblica: Teoria e Prática. São Paulo: Paulinas 2014, p. 194.
11RUSCONI, Carlo. Dicionário do grego do Novo Testamento, São Paulo: Paulus, 2003, p.423. Cf. Ildo PERONDI, “Presenças do verbo mover-se de compaixão (σπλαγχνίζομαι) nos evangelhos sinóticos”, Atualidade Teológica, Rio de janeiro, v. 46, p.162-173. Jan./abr. 2014 (download in pdf).
12Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do grego do Novo Testamento, São Paulo: Paulus, 2003, p.424.
13RUSCONI, Carlo. Dicionário do grego do Novo Testamento, São Paulo: Paulus, 2003, p. 162. 13 Cf. Francis BROWN, Samuel Rolles DRIVER, Charles Augustus BRIGGS. Hebrew and English Lexicon Old Testament with an appendix containing the Biblical Aramaic, Oxford: Claredon, 1975, p. 933-934. 
14BULA MISERICORDIA E VULTUS – O Rosto da Misericórdia. São Paulo: Paulinas: 2015. Leia sobre “A comunicação da Palavra de Deus: Dei Verbum” em SESBOUÉ, Bernard; THEOBALD, Cristian. A Palavra da Salvação. São Paulo: Loyola, 2006, p.419-456.
15Cf. BEALE, G. K; CARSON, D.A. Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: exegese e interpretação. São Paulo: Vida Nova, 2014. p.62. Cf. BÍBLIA DE JERUSALÉM: nova edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2013, Nota “c”, p. 1730.
16No final do século primeiro da nossa era o peixe passou a ser usado entre os cristãos como símbolo de identificação frente a perseguição do Império Romano. A palavra grega para peixe, ICHTHYS, foi usada como um acróstico pela igreja primitiva: Iesous(I), Christos (CH), Theo (T), HYiós (H), Soter (S) (Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador). 

Referências Bibliográficas 

BEALE, G. K; CARSON, D.A. Manual do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento: exegese e interpretação. São Paulo: Vida Nova, 2014. 

BÍBLIA DE JERUSALÉM: nova edição revista e ampliada. São Paulo: Paulus, 2013. 

BROWN, Francis; DRIVER, Samuel Rolles; BRIGGS, Charles Augustus. Hebrew and English Lexicon Old Testament with an appendix containing the Biblical Aramaic, Oxford: Claredon, 1975. 

BULA MISERICORDIAE VULTUS – O Rosto da Misericórdia. São Paulo: Paulinas: 2015. 

CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES. Documentos do Concílio Ecumênico Vaticano II. São Paulo: Paulus, 1997. 

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RADERMAKERS, Jean. Au fil de l’évangile selon saint Matthieu, I. Texte II. Lecture continue, 1972. In Revue théologique de Louvain, 4e année, fasc. 2, 1973, p.217-225.  

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SESBOUÉ, Bernard;THEOBALD, Cristian. A Palavra da Salvação. São Paulo: Loyola, 2006. 

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VV. AA. Leitura do evangelho segundo Mateus. São Paulo: Paulinas, 1982.  



1Pós graduanda em Bíblia e Teologia PUC-SP