UMA ANÁLISE DO CYBERBULLYING: CRIME DE ALCANCE GLOBAL E IMPACTO REAL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202411150326


Rhage Rafael Moreira Pimenta1
Douglas Da Silva Vieira2
Andreia Alves de Almeida3


RESUMO: O fenômeno do cyberbullying destaca-se como uma forma moderna de violência, ampliada pela facilidade de disseminação permitida pela internet e redes sociais. Neste contexto, surgem questionamentos acerca da responsabilidade legal pelos crimes virtuais, incluindo punições aos agressores e o papel das plataformas digitais na moderação de conteúdo. Embora a proteção das liberdades individuais seja crucial, o Estado enfrenta o desafio de determinar até onde pode intervir para garantir a segurança online sem violar direitos civis. A problemática será analisar será possível aplicar de forma eficaz a lei vigente com as aplicações de regras e as políticas públicas para mitigar os impactos do cyberbullying sobre as vítimas? O objetivo geral é examinar o papel da legislação brasileira, especialmente a LGPD, na prevenção e combate ao cyberbullying, verificando se ela protege os usuários sem comprometer a liberdade de expressão. Como objetivos específicos, avalia-se a eficácia da LGPD contra o cyberbullying; a responsabilidade das plataformas digitais; a influência da Constituição, do CP e do CPC; e propõem-se estratégias de educação digital para um ambiente online mais seguro e ético. Metodologia foi utilizando o método dedutivo e descritivo, com base em fundamentos teóricos encontrados em pesquisas bibliográficas, como documentos públicos, livros, artigos científicos e dados da internet. Os resultados da pesquisa indicaram que as leis atuais não são suficientes para enfrentar e coibir o problema do Cyberbullying.

PALAVRAS-CHAVES: Cyberbullying. LGPD. Liberdade de expressão. Crimes virtuais. Proteção de dados.

ABSTRACT: The phenomenon of cyberbullying stands out as a modern form of violence, amplified by the ease of dissemination allowed by the internet and social networks. In this context, questions arise about legal responsibility for virtual crimes, including punishments for perpetrators and the role of digital platforms in content moderation. While protecting individual freedoms is crucial, the state faces the challenge of determining how far it can intervene to ensure online safety without violating civil rights. The problem will be to analyze whether it is possible to effectively apply the current law with the application of rules and public policies to mitigate the impacts of cyberbullying on victims? The general objective is to examine the role of Brazilian legislation, especially the LGPD, in preventing and combating cyberbullying, verifying whether it protects users without compromising freedom of expression. As specific objectives, the effectiveness of the LGPD against cyberbullying is evaluated; the responsibility of digital platforms; the influence of the Constitution, the CP and the CPC; and digital education strategies are proposed for a safer and more ethical online environment. The methodology used the deductive and descriptive method, based on theoretical foundations found in bibliographical research, such as public documents, books, scientific articles and internet data. The research results indicated that current laws are not sufficient to face and curb the problem of Cyberbullying.

KEYWORDS: Cyberbullying. LGPD. Freedom of expression. Virtual crimes. Data protection.

INTRODUÇÃO

No Brasil, o cenário legislativo para tratar o cyberbullying tem sido aprimorado, especialmente com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que busca garantir a privacidade dos usuários da internet, regulamentando o uso, armazenamento e compartilhamento de dados. Segundo Martins (2019), a LGPD, inspirada no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia, prevê punições para o uso indevido de informações pessoais, o que pode contribuir para a redução dos casos de cyberbullying ao dificultar o compartilhamento de dados que podem ser usados ​​para fins de intimidação ou assédio. Contudo, a eficácia da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) na abordagem do cyberbullying depende de uma série de fatores, incluindo a conscientização dos usuários sobre seus direitos e a capacidade das plataformas digitais de implementar medidas preventivas e responder de forma adequada a comportamentos abusivos.

O avanço das tecnologias digitais trouxe uma nova dimensão para as interações sociais, facilitando a comunicação, mas também gerando desafios éticos e legais, como o aumento de casos de cyberbullying e crimes virtuais. Isso afeta profundamente a saúde mental das vítimas, especialmente entre os jovens, que frequentemente são expostos a agressões online, chantagens e invasões de privacidade. Além disso, a legislação atual enfrenta dificuldades para controlar a rapidez das mudanças no ambiente digital, resultando em lacunas na proteção dos direitos dos usuários e na responsabilização dos agressores. 

Diante disso, a problemática será analisar será possível aplicar de forma eficaz a lei vigente com as aplicação de regras e as políticas públicas para mitigar os impactos do cyberbullying ? Esse problema evidencia a urgência de uma abordagem que integre aspectos legais, éticos e educacionais para promover um ambiente online mais seguro e inclusivo.

As hipóteses que orientam esta investigação são as seguintes: a LGPD pode ser uma ferramenta eficaz na redução dos casos de cyberbullying ao restringir o uso inadequado de dados pessoais. Em segundo lugar, considere que a responsabilidade compartilhada entre o Estado e as plataformas digitais é essencial para uma abordagem mais abrangente e eficaz no combate ao cyberbullying, especialmente por essas plataformas que permitem que agressores permaneçam de forma anônima. Por fim, a implementação de medidas educativas e de conscientização dos usuários sobre práticas seguras e éticas no ambiente digital pode complementar a legislação e reduzir a ocorrência de cyberbullying, promovendo um ambiente digital mais responsável e seguro.

O objetivo geral deste artigo é analisar o papel da legislação brasileira, com destaque para a LGPD, na prevenção e combate ao cyberbullying, verificando se ela é suficiente para proteger os usuários sem comprometer a liberdade de expressão. Os objetivos específicos são: investigar a eficácia da LGPD na proteção contra o cyberbullying; explorar a responsabilidade das plataformas digitais em prevenir e combater essas práticas; examinar a influência da Constituição Federal, do Código Penal e do Código de Processo Civil no contexto do cyberbullying; e propor estratégias de conscientização e educação digital para promover um ambiente online seguro e ético.

Este trabalho está estruturado em quatro capítulos. 

O primeiro capítulo aborda os conceitos fundamentais do cyberbullying, sua definição e as implicações para as vítimas e a sociedade. 

No segundo capítulo será analisado o cenário legislativo brasileiro, com foco na LGPD e sua relação com a proteção dos dados pessoais, discutindo também o Código Penal e o Código de Processo Civil. 

Já no terceiro capítulo discute a responsabilidade das plataformas digitais na prevenção e combate ao cyberbullying, considerando o contexto de regulamentações internacionais, como o GDPR. 

Finalmente, o quarto capítulo explora a importância da educação digital como uma estratégia complementar para enfrentar o cyberbullying e promover uma cultura de respeito no ambiente digital.

A metodologia utilizada neste estudo baseia-se em métodos dedutivos e descritivos, sustentando-se em fundamentos teóricos obtidos por meio de pesquisas bibliográficas que englobam documentos públicos, livros, artigos científicos e dados disponíveis na internet. A análise dos dados obtidos indicou que, apesar dos avanços legislativos, as leis atuais ainda se mostram insuficientes para enfrentar e coibir de maneira eficaz o problema do cyberbullying.

2. O PAPEL DA LGPD NA PROTEÇÃO CONTRA O CYBERBULLYING

Com a crescente expansão do uso das tecnologias digitais, o cyberbullying tornou-se um problema relevante, especialmente em ambientes como redes sociais, fóruns e outras plataformas online (Valença, 2022). Este fenômeno consiste em práticas de assédio, humilhação, ameaças e difamações dirigidas a indivíduos ou grupos, muitas vezes alimentado pelo anonimato que a internet oferece aos agressores. Como resposta a esse desafio, várias legislações foram implementadas para regular a privacidade e a proteção de dados dos usuários, incluindo a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil. Esta legislação, baseada no modelo europeu do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR), estabelece diretrizes para o tratamento de dados pessoais e pode ser uma ferramenta essencial no combate ao cyberbullying, ao proteger as informações que potencialmente facilitam a ação de agressores.

A LGPD, sancionada em 2018 e em vigor desde 2020, tem como objetivo garantir a privacidade e a segurança dos dados pessoais dos cidadãos brasileiros (CARRASCO, 2019). A lei regulamenta o modo como os dados podem ser coletados, armazenados e utilizados, e visa assegurar que os titulares dos dados tenham controle sobre suas informações. Isso inclui o direito ao consentimento explícito, o direito à transparência sobre o uso dos dados e o direito de retificação ou exclusão de informações que não desejam mais que sejam armazenadas. De acordo com Alencar (2023) o contexto do cyberbullying, a LGPD pode desempenhar um papel importante na proteção de indivíduos, especialmente ao limitar a disseminação de informações pessoais que possam ser usadas para assédio online. A lei exige que as empresas, como plataformas de redes sociais, implementem medidas rigorosas de segurança para proteger os dados dos usuários. Isso reduz a possibilidade de que esses dados sejam acessados ou utilizados de maneira abusiva, o que pode ser um primeiro passo para diminuir a incidência de cyberbullying.

Um dos desafios mais complexos no combate ao cyberbullying é o anonimato dos agressores. O anonimato pode ser um incentivador para aqueles que cometem cyberbullying, pois reduz a possibilidade de serem identificados e responsabilizados (Abranches, 2018). Embora a LGPD não elimine o anonimato diretamente, ela pode ajudar a monitorar e controlar o uso de dados pessoais, dificultando o acesso e a exposição das vítimas. Além disso, a LGPD estipula que as plataformas devem informar de forma transparente os dados que coletam e a finalidade de seu uso. Dessa forma, usuários que não desejam compartilhar informações sensíveis com terceiros podem negar o consentimento. Isso é particularmente importante, pois informações pessoais, como localização, número de telefone, e outros dados identificáveis, muitas vezes são expostos por meio de configurações padrão ou por coleta de dados automática.

A LGPD impõe às empresas, incluindo as plataformas de redes sociais, a responsabilidade de assegurar que o tratamento de dados seja feito de acordo com as diretrizes de privacidade (Cavalcanti, 2022). Elas devem implementar medidas de proteção, como encriptação de dados e políticas de segurança digital, e precisam garantir que qualquer violação de dados seja reportada rapidamente tanto à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) quanto aos titulares dos dados. Essa obrigação de notificação é crucial no contexto do cyberbullying, pois as plataformas podem ser informadas rapidamente sobre violações e tomar medidas para evitar danos maiores. Outro aspecto relevante é o conceito de privacy by design e privacy by default, que a LGPD exige que as empresas adotem. Isso implica que desde o momento de criação de um produto, sistema ou serviço, a proteção de dados deve ser uma prioridade, e as configurações de privacidade devem estar ativadas por padrão. Assim, ao acessar uma plataforma de rede social, o usuário deve ter suas informações protegidas automaticamente, reduzindo o risco de exposição a práticas abusivas, incluindo o cyberbullying.

Além da proteção de dados, a LGPD incentiva a conscientização sobre a importância da privacidade e segurança digital. A lei exige que as empresas eduquem seus usuários sobre seus direitos, o que pode incluir informações sobre como denunciar casos de cyberbullying e como se proteger contra a exposição indevida de dados pessoais. Os usuários estão mais preparados para lidar com possíveis abusos e podem adotar práticas que protejam sua privacidade (Melo, 2023). Além disso, muitas empresas têm implementado programas de educação digital, promovendo uma cultura de respeito à privacidade online e incentivando a empatia nas interações virtuais. Com a ajuda de tais programas, é possível abordar o cyberbullying de uma forma proativa, instruindo os usuários a reconhecerem práticas abusivas e a utilizarem as ferramentas de proteção à disposição.

A LGPD estabelece a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) como órgão responsável pela fiscalização e regulamentação da lei. A ANPD tem um papel vital em garantir que a LGPD seja aplicada corretamente e que as empresas que não respeitam os direitos dos usuários sejam penalizadas (Oliveira, 2021). Além disso, a ANPD pode colaborar com outros órgãos, como o Ministério Público e a Polícia Federal, para investigar casos de cyberbullying, especialmente aqueles que envolvem o uso de dados pessoais. A ANPD também pode trabalhar em conjunto com ONGs e outras entidades na promoção de campanhas de conscientização sobre o cyberbullying e a importância da privacidade digital (Santana, 2023). Campanhas que promovam o uso seguro e ético das plataformas online podem reduzir a ocorrência de cyberbullying, reforçando o impacto da LGPD na proteção dos indivíduos.

Apesar das contribuições significativas, a LGPD enfrenta alguns desafios no combate ao cyberbullying. Por exemplo, a lei é principalmente orientada à proteção de dados pessoais, o que não abrange diretamente todos os tipos de comportamento abusivo online. Outro desafio é a aplicação da LGPD em plataformas internacionais, que podem ter suas sedes em outros países e estar sujeitas a outras legislações. Isso pode limitar o alcance da ANPD e complicar o processo de responsabilização de plataformas que não respeitam as diretrizes de proteção de dados. Além disso, o cyberbullying frequentemente ocorre de maneira difusa e em tempo real, o que dificulta a ação rápida das autoridades. A responsabilidade compartilhada entre as plataformas e os usuários exige uma cooperação constante para a remoção de conteúdo ofensivo e a identificação de agressores (Martins, 2019). Como a LGPD não é focada exclusivamente no cyberbullying, sua efetividade depende do fortalecimento de outras medidas jurídicas e regulatórias complementares que possam agir de forma específica e direta contra esse tipo de abuso.

A LGPD representa um passo importante para a proteção dos usuários contra o uso indevido de seus dados pessoais, contribuindo indiretamente para o combate ao cyberbullying. A lei oferece uma estrutura para que as plataformas digitais adotem práticas de segurança, enquanto reforça o direito dos indivíduos à privacidade. No entanto, seu impacto no combate ao cyberbullying ainda é limitado e depende de um esforço coordenado entre as autoridades, as plataformas e os próprios usuários para criar um ambiente digital mais seguro. É essencial que outras regulamentações e políticas públicas complementem a LGPD, promovendo uma cultura de respeito e responsabilidade no ambiente online.

3. LIBERDADE DE EXPRESSÃO VS. PROTEÇÃO DOS DIREITOS INDIVIDUAIS

A liberdade de expressão é um dos direitos fundamentais mais importantes em uma sociedade democrática, pois permite a manifestação de ideias, opiniões e informações (Dias, 2021). No entanto, essa liberdade não é absoluta e pode colidir com outros direitos fundamentais, como a proteção da honra, da privacidade e da dignidade das pessoas. No ambiente digital, esse conflito torna-se ainda mais complexo, pois a internet amplifica a capacidade de disseminação de informações e de opiniões, expondo indivíduos a diversos tipos de abusos, incluindo o cyberbullying (Henrique, 2020). 

Nesse contexto, surge o desafio de equilibrar a liberdade de expressão com a necessidade de proteger os direitos individuais, garantindo que a liberdade de uma pessoa não cause danos a terceiros.

A Constituição Federal Brasileira de 1988 garante a liberdade de expressão em seu artigo 5º, inciso IX, estabelecendo que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. Além disso, o artigo 220 reforça essa liberdade, afirmando que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social. 

Contudo, a própria Constituição prevê limitações a esse direito, estabelecendo que o exercício da liberdade de expressão não pode violar direitos individuais, como a honra, a imagem, a intimidade e à privacidade, conforme o inciso X do mesmo artigo 5º. Isso evidencia a necessidade de uma aplicação equilibrada entre os direitos fundamentais, principalmente quando se trata de abusos cometidos no ambiente digital.

No Brasil, o Código Penal (CP) e o Código de Processo Civil (CPC) são instrumentos legais que ajudam a regular a liberdade de expressão e a proteção dos direitos individuais (Pereira, 2022). O Código Penal, por exemplo, prevê crimes como calúnia, difamação e injúria, que buscam proteger a honra e a dignidade das pessoas contra abusos verbais. Estes crimes são comuns no ambiente virtual, onde agressões e ataques pessoais são facilitados pela rapidez e pelo alcance das redes sociais. O CPC, por sua vez, regula as ações civis de indenização por danos morais e materiais, permitindo que as vítimas de abusos verbais ou de ataques online busquem reparação.

Na prática, o desafio de equilibrar liberdade de expressão e proteção dos direitos individuais é especialmente evidente no caso do cyberbullying. Esse fenômeno é caracterizado por ataques repetitivos, humilhações, ameaças e difamações realizadas no ambiente online. Os agressores muitas vezes se valem da liberdade de expressão para justificar suas ações, alegando que estão apenas exercendo o seu direito de manifestar opiniões. No entanto, o cyberbullying pode causar sérios danos psicológicos e emocionais às vítimas, além de prejudicar sua reputação e, em casos mais graves, levar ao suicídio. Portanto, é necessário limitar a liberdade de expressão quando ela ultrapassa o limiar do respeito aos direitos dos outros e se transforma em um meio de abuso.

O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) foi um avanço importante na regulamentação do uso da internet no Brasil. Ele estabelece diretrizes para o uso da rede e busca equilibrar a liberdade de expressão com a proteção dos direitos individuais. A lei define princípios como a neutralidade da rede, a privacidade e a proteção de dados pessoais, mas também prevê a responsabilização dos usuários e das plataformas por atos ilícitos cometidos na internet (Lima, 2022). De acordo com o Marco Civil, os provedores de conteúdo e as redes sociais só podem ser responsabilizados por conteúdos de terceiros se não atenderem a uma ordem judicial que determine a remoção de conteúdos ilícitos. Essa medida tem como objetivo evitar que as plataformas se tornem censoras, mas ao mesmo tempo garante uma forma de proteger as vítimas de abusos.

Um ponto importante de análise é o papel das redes sociais e das plataformas de comunicação no controle e na moderação de conteúdo. Essas plataformas, como Facebook, Twitter e Instagram, permitem que milhões de pessoas se expressem livremente, mas essa liberdade pode ser mal utilizada para promover discursos de ódio, calúnias, fake news e cyberbullying. Muitas dessas plataformas implementaram políticas de uso que proíbem conteúdo ofensivo e abusivo, e algumas adotaram mecanismos de denúncia e moderação para lidar com o conteúdo que viola seus termos. 

No entanto, essas políticas são limitadas, e muitas vezes os abusos passam despercebidos ou não são punidos adequadamente. A dificuldade em moderar conteúdos e a quantidade massiva de dados postados diariamente dificultam a ação efetiva contra abusos (Wanderley, 2021).

É fundamental também abordar a questão do discurso de ódio. Embora a liberdade de expressão permita a manifestação de opiniões impopulares e controversas, o discurso de ódio é considerado uma violação de direitos fundamentais. 

No Brasil, o discurso de ódio contra minorias étnicas, religiosas, sexuais e outras é crime, punível de acordo com o Código Penal e leis específicas, como a Lei do Racismo (Lei nº 7.716/1989) (Silva, 2019). O discurso de ódio online é frequentemente veiculado sob o pretexto da liberdade de expressão, mas esse argumento não é válido quando a intenção é ferir a dignidade e a segurança de grupos vulneráveis. Para proteger a sociedade contradiscursos abusivos, é necessário que o Estado atue de forma a balancear a aplicação de leis contra o discurso de ódio com a manutenção da liberdade de expressão.

A aplicação da liberdade de expressão no ambiente online também enfrenta desafios internacionais (Loureiro, 2018). 

As grandes plataformas de redes sociais, muitas vezes sediadas em outros países, estão sujeitas a legislações diversas. Isso pode dificultar a aplicação de leis brasileiras sobre liberdade de expressão e proteção de direitos individuais, uma vez que essas empresas podem operar conforme os regulamentos de seu país de origem. Esse cenário torna essencial a cooperação internacional na criação de normas que possam ser aplicadas globalmente para combater abusos online.

Por fim, é importante considerar o papel da educação digital na promoção de uma cultura de respeito e empatia nas interações online. A liberdade de expressão é um direito valioso, mas também vem acompanhada de responsabilidades. Educar os cidadãos, especialmente os jovens, sobre os limites da liberdade de expressão e sobre as consequências do discurso abusivo pode ser uma forma eficaz de prevenir o cyberbullying e outros abusos online. Iniciativas de conscientização e campanhas educativas promovidas por escolas, ONGs, governos e plataformas digitais podem contribuir para a criação de um ambiente digital mais seguro e inclusivo.

4. RESPONSABILIZAÇÃO E PUNIÇÃO DE CRIMES VIRTUAIS

Com o crescimento das tecnologias digitais, o ambiente online se tornou uma extensão significativa da vida social, profissional e pessoal (Fernandes, 2022). No entanto, essa expansão também trouxe consigo um aumento nos crimes virtuais, como o cyberbullying, a difamação, o vazamento de dados pessoais e o discurso de ódio. Esses crimes, que podem ser perpetrados de forma anônima e em grande escala, apresentam novos desafios para a responsabilização e punição dos infratores. 

No Brasil, a legislação tem avançado no sentido de estabelecer normas e regulamentos que permitam enfrentar essas práticas, mas o tema ainda envolve muitos desafios e lacunas. A responsabilização e a punição de crimes virtuais exigem uma abordagem abrangente, envolvendo o poder judiciário, as plataformas digitais, as políticas de segurança e a própria sociedade civil.

No Brasil, o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) é uma das principais legislações que regulamentam o uso da internet e estabelecem diretrizes para a responsabilização de crimes virtuais. A lei define princípios como a neutralidade da rede, a liberdade de expressão e a proteção da privacidade.

Em termos de responsabilização, o Marco Civil estabelece que os provedores de internet e as plataformas digitais são responsáveis por remover conteúdos ilícitos somente após o recebimento de uma ordem judicial (Vieira, 2018). Isso significa que, ao contrário de outras legislações mais rígidas, a lei brasileira visa proteger a liberdade de expressão, mas ao mesmo tempo exige que os provedores ajam prontamente quando notificados pela justiça. No entanto, a aplicação efetiva dessa responsabilidade tem se mostrado desafiadora, uma vez que o número de conteúdos ilícitos gerados diariamente é enorme e a capacidade das plataformas de monitorar, identificar e remover tal conteúdo é limitada.

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor desde 2020, também desempenha um papel relevante no combate aos crimes virtuais (Pimentel, 2021). Esta lei é focada na proteção dos dados pessoais dos usuários e impõe responsabilidades para as empresas que coletam, armazenam e processam essas informações. Em casos de vazamento de dados pessoais, a LGPD prevê penalidades significativas para as empresas que não tomam medidas adequadas de segurança, e elas podem ser responsabilizadas por qualquer dano causado a terceiros (Abreu, 2021). 

No contexto de crimes virtuais, a LGPD ajuda a proteger as vítimas contra o uso abusivo de seus dados pessoais e aumenta a responsabilidade das plataformas e das empresas de internet quanto à privacidade de seus usuários. Contudo, a punição de agressores individuais ainda exige uma abordagem mais direta, que inclua a investigação e identificação dos responsáveis pelos atos.

Outro aspecto importante é a questão do anonimato, que muitas vezes permite que os agressores atuem sem serem identificados. A internet facilita a prática de crimes virtuais devido à dificuldade de rastrear os autores das ações. 

Para lidar com isso, as autoridades judiciais têm utilizado ferramentas de rastreamento e colaboração com empresas de tecnologia para identificar os IPs e os dispositivos usados em crimes virtuais. No entanto, a identificação dos infratores nem sempre é fácil, e muitas vezes os dados obtidos não são suficientes para uma acusação formal. Além disso, em crimes que envolvem múltiplas jurisdições, ou seja, onde o agressor e a vítima estão em países diferentes, o processo de responsabilização se torna ainda mais complicado, exigindo cooperação internacional entre governos e agências de aplicação da lei.

Além das questões legais, as plataformas digitais desempenham um papel fundamental na prevenção e na punição de crimes virtuais. Redes sociais como Facebook, Twitter, Instagram e TikTok têm implementado políticas de uso que proíbem conteúdos abusivos e criminosos. Estas plataformas permitem que os usuários denunciem conteúdos que violem os termos de uso, e muitas vezes implementam mecanismos automatizados para identificar e remover publicações potencialmente prejudiciais. 

Entretanto, a eficácia desses mecanismos de moderação automática ainda é limitada, e muitos conteúdos ofensivos passam despercebidos. Quando as denúncias são feitas, há uma responsabilidade das plataformas em agir com celeridade para analisar e, se necessário, remover o conteúdo. Essa ação pode ser um passo importante na proteção dos usuários e na criação de um ambiente mais seguro, mas não substitui a ação jurídica necessária para punir os responsáveis.

No que se refere à punição de crimes virtuais, o Código Penal brasileiro prevê sanções para crimes como difamação, injúria e calúnia, que são frequentemente cometidos em ambientes online. Esses crimes podem resultar em penas de detenção, além de indenizações por danos morais. 

A difamação, por exemplo, é punível com até dois anos de prisão e multa, enquanto a injúria e a calúnia têm penas de até seis meses e dois anos, respectivamente (Xavier, 2023). No entanto, o cumprimento dessas penas muitas vezes é dificultado pela dificuldade em identificar e processar os infratores. 

Em muitos casos, os crimes virtuais são tratados como delitos menores, o que reduz o impacto das punições e dificulta a criação de um precedente legal dissuasivo. Isso gera um sentimento de impunidade, especialmente quando se trata de crimes de baixo impacto financeiro, mas com consequências significativas para as vítimas.

Além disso, a legislação brasileira prevê o crime de ameaça, que se aplica a situações de cyberbullying e outras formas de intimidação online. Em casos de ameaças graves, as vítimas podem solicitar medidas protetivas, como o afastamento do agressor, nos termos da Lei Maria da Penha, caso o agressor seja um parceiro íntimo. No entanto, para outros tipos de relacionamento, a proteção jurídica depende da comprovação do perigo e da gravidade das ameaças. Muitas vezes, as vítimas de crimes virtuais não denunciam, por desconhecimento dos mecanismos legais disponíveis ou por medo de represálias, o que reduz ainda mais o impacto das leis existentes.

A educação digital também é uma ferramenta crucial no combate aos crimes virtuais (Reis, 2022). 

Campanhas de conscientização sobre o uso responsável da internet e sobre as consequências legais dos crimes virtuais podem ajudar a prevenir esses delitos. Iniciativas educativas, muitas vezes promovidas por ONGs e por instituições de ensino, podem instruir a população sobre os riscos de práticas como o compartilhamento não autorizado de dados pessoais, a participação em discursos de ódio e o cyberbullying. 

Ao aumentar a conscientização sobre os crimes virtuais e suas consequências, a sociedade pode contribuir para a prevenção e para o fortalecimento de um ambiente digital mais seguro e responsável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O artigo foi dividido em cinco capítulos que abordam o cyberbullying e os crimes virtuais sob a perspectiva das legislações brasileiras, como a LGPD, o Marco Civil da Internet e a Constituição Federal. O primeiro capítulo introduz o tema e apresenta os principais conceitos. O segundo capítulo examinou o papel da LGPD na proteção de dados pessoais, o qual foi possível destacar a importância da lei  para mitigar a exposição indevida de informações, ainda que com limitações na prevenção direta do cyberbullying. No terceiro capítulo, analisou-se a liberdade de expressão e como as leis brasileiras buscam equilibrá-la com a necessidade de proteção contra abusos no ambiente digital. O quarto capítulo foi discutido a responsabilidade das plataformas digitais em criar políticas que combatam o cyberbullying e os desafios enfrentados na moderação de conteúdo. Finalmente, o quinto capítulo tratou da importância da educação digital para prevenir o cyberbullying e promover um ambiente online seguro e respeitoso.

Em resposta à pergunta-problema, concluiu-se que as legislações brasileiras, embora avançadas, ainda enfrentam desafios significativos para combater o cyberbullying de maneira eficaz. 

Os objetivos do estudo foram aprimorados, apontando para a necessidade de aprimoramento nas políticas e práticas que envolvem a proteção de direitos no ambiente digital. Sendo a educação digital também uma ferramenta crucial no combate aos crimes virtuais, assim como campanhas de conscientização sobre o uso responsável da internet e sobre as consequências legais dos crimes virtuais podem ajudar a prevenir esses delitos.

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1Acadêmico do curso de direito da Faculdade Unisapiens. E-mail: Rhage.pimenta@faculdadesapiens.edu.br 
2Acadêmico do curso de direito da Faculdade Unisapiens. E-mail: douglas.silva.vieira14@gmail.com
3Doutora em Ciência Jurídica DINTER entre UNIVALI e Faculdade Católica de Rondônia, Mestre em Direito Ambiental pela UNIVEM/SP. Especialista em Direito Penal UNITOLEDO/SP. Especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos pela UNIR/RO. Especialista em Direito Militar pela Verbo Jurídico/RJ. E-mail: andreia.almeida@gruposapiens.com.br.