TRIBUTAÇÃO DE DIVIDENDOS NO BRASIL: ANÁLISE DA CONSTITUCIONALIDADE E O PRINCÍPIO DO NON BIS IN IDEM

TAXATION OF DIVIDENDS IN BRAZIL: ANALYSIS OF CONSTITUTIONALITY AND THE PRINCIPLE ON NON BIS IN IDEM

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202504102217


Beatriz Mayumi Paula Yamashita1
Ademir Gasques Sanches2


RESUMO

A tributação de dividendos no Brasil é um tema que suscita debates acalorados, principalmente quando analisado à luz da constitucionalidade e do princípio do non bis in idem, que proíbe a dupla tributação de um mesmo fato gerador. A Constituição brasileira estabelece normas gerais sobre a tributação e os direitos fundamentais do contribuinte, o que gera questionamentos sobre a possibilidade de se tributar dividendos, uma vez que os lucros já são previamente tributados no âmbito das empresas. Sob a perspectiva do non bis in idem, a tributação de dividendos poderia ser vista como uma violação desse princípio, ao representar uma dupla incidência fiscal sobre o mesmo capital. No entanto, há interpretações que defendem que o imposto sobre os dividendos e o tributo sobre o lucro da empresa incidem sobre bases tributárias distintas, justificando a legalidade da cobrança. O objetivo deste estudo é analisar a constitucionalidade da tributação de dividendos à luz do princípio do non bis in idem e identificar os possíveis impactos dessa tributação na economia e no ambiente de negócios do país. A metodologia utilizada é a revisão bibliográfica, que envolve a análise de doutrinas, legislações e jurisprudências sobre o tema. Como conclusão, pode-se considerar que a aplicação desse tributo precisa ser amplamente debatida para evitar interpretações conflitantes e garantir que os princípios constitucionais sejam respeitados.

Palavras-chave: Lucro distribuído. Non Bis in Idem. Conformidade com a Constituição. Direito Tributário.

ABSTRACT

The taxation of dividends in Brazil is a topic that raises heated debates, especially when analyzed in light of constitutionality and the principle of non bis in idem, which prohibits double taxation of the same taxable event. The Brazilian Constitution establishes general rules on taxation and the taxpayer’s fundamental rights, which raises questions about the possibility of taxing dividends, since profits are already previously taxed within companies. From the perspective of non bis in idem, the taxation of dividends could be seen as a violation of this principle, as it represents a double tax incidence on the same capital. However, there are interpretations that argue that the tax on dividends and the tax on the company’s profit fall on different tax bases, justifying the legality of the charge. The objective of this study is to analyze the constitutionality of dividend taxation in light of the principle of non bis in idem and identify the possible impacts of this taxation on the country’s economy and business environment. The methodology used is bibliographic review, which involves the analysis of doctrines, legislation and jurisprudence on the topic. In conclusion, it can be considered that the application of this tax needs to be widely debated to avoid conflicting interpretations and ensure that constitutional principles are respected.

Keywords: Distributed profit. Non Bis in Idem. Compliance with the Constitution. Tax Law.

INTRODUÇÃO

A tributação de dividendos no Brasil é um tema complexo e controverso, especialmente quando analisado à luz da Constituição Federal e dos princípios que regem o sistema tributário nacional. O Brasil é um dos poucos países que, durante anos, adotou uma política de isenção sobre a distribuição de lucros e dividendos aos acionistas, com o intuito de atrair investimentos e estimular o crescimento econômico.

No entanto, nos últimos anos, tem havido um crescente debate sobre a necessidade de tributar dividendos, principalmente em razão da busca por maior justiça fiscal e equilíbrio nas contas públicas. A discussão envolve não apenas aspectos econômicos, mas também jurídicos, uma vez que a Constituição de 1988 impõe limites e diretrizes para a criação e implementação de tributos, além de garantir direitos fundamentais aos contribuintes.

A análise da constitucionalidade da tributação de dividendos passa por uma avaliação cuidadosa dos princípios constitucionais que regem o sistema tributário brasileiro. Entre eles, destaca-se o princípio da legalidade, que determina que nenhum tributo pode ser instituído ou aumentado sem previsão legal.

Assim, qualquer tentativa de tributar dividendos deve estar em conformidade com as normas constitucionais e ser respaldada por uma legislação específica. Além disso, a Constituição prevê o respeito à capacidade contributiva, o que implica que os tributos devem incidir de forma proporcional à capacidade econômica dos indivíduos, evitando sobrecargas fiscais desproporcionais sobre determinadas classes de contribuintes. A tributação de dividendos, nesse sentido, deve ser cuidadosamente desenhada para não gerar distorções que possam ferir esse princípio fundamental.

Outro ponto central da discussão sobre a tributação de dividendos é o princípio do non bis in idem, que proíbe a dupla tributação de um mesmo fato gerador. A distribuição de dividendos, na prática, já decorre de lucros que foram previamente tributados no âmbito da pessoa jurídica, o que levanta questionamentos sobre a legitimidade de uma nova tributação sobre esses mesmos recursos no momento da distribuição aos acionistas.

Sob essa ótica, alguns juristas argumentam que a tributação de dividendos representaria uma violação ao non bis in idem, pois o capital já teria sido objeto de tributação na empresa. No entanto, há quem defenda que os dividendos, ao serem repassados aos acionistas, constituem um novo fato gerador, justificando a incidência de tributos sobre eles.

A questão da dupla tributação é um ponto sensível e merece uma análise detalhada no contexto da economia e do direito brasileiro.

Por um lado, a tributação de dividendos pode ser vista como uma forma de promover a justiça social, uma vez que busca taxar rendas que, em muitos casos, são percebidas por uma parcela mais rica da população.

Por outro lado, há o argumento de que a incidência de tributos sobre dividendos pode desencorajar o investimento, pois reduziria o retorno sobre o capital investido, além de poder afetar negativamente o ambiente de negócios no país. Assim, a constitucionalidade dessa tributação envolve um delicado balanço entre a necessidade de arrecadação do Estado, a promoção da equidade fiscal e a manutenção de um ambiente econômico atrativo e competitivo.

Além do princípio do non bis in idem, a análise da constitucionalidade da tributação de dividendos também deve levar em consideração o princípio da segurança jurídica. Esse princípio exige que as normas tributárias sejam claras, precisas e previsíveis, de modo a garantir ao contribuinte a certeza sobre as suas obrigações fiscais. Qualquer mudança na tributação de dividendos precisa ser feita de forma transparente e com o devido tempo de adaptação para os investidores e empresas.

O risco de insegurança jurídica é especialmente alto em um contexto de frequentes mudanças legislativas, o que pode gerar incertezas sobre a correta interpretação e aplicação das novas regras tributárias.

Destaca-se que a análise da constitucionalidade da tributação de dividendos no Brasil deve considerar o impacto global e as práticas adotadas por outros países, que frequentemente utilizam mecanismos como créditos tributários, deduções ou alíquotas diferenciadas para mitigar a dupla tributação. O Brasil precisa alinhar sua política tributária com essas melhores práticas internacionais, evitando um sistema que penalize excessivamente os investidores e prejudique sua competitividade. Medidas compensatórias e alíquotas moderadas poderiam ser soluções para equilibrar a arrecadação com a proteção ao ambiente de negócios

O estudo se justifica pela crescente relevância do debate sobre a tributação de dividendos no Brasil, especialmente diante da necessidade de promover um sistema tributário mais justo e eficiente. A isenção de impostos sobre dividendos, vigente no país por muitos anos, tem sido alvo de críticas por especialistas que apontam a concentração de riqueza e a falta de equidade no sistema fiscal.

Além disso, a discussão sobre a constitucionalidade dessa tributação, à luz do princípio do non bis in idem, tem gerado controvérsias entre juristas e economistas, dado que o capital distribuído aos acionistas já foi anteriormente tributado nas empresas. Nesse contexto, o estudo busca oferecer uma análise profunda e crítica sobre os aspectos jurídicos e econômicos relacionados à tributação de dividendos, contribuindo para o entendimento das implicações constitucionais e práticas dessa medida para o cenário fiscal brasileiro.

O objetivo do estudo é analisar a constitucionalidade da tributação de dividendos no Brasil, com especial foco no princípio do non bis in idem, que proíbe a dupla tributação. O estudo visa identificar se a cobrança de tributos sobre dividendos viola esse princípio, considerando que os lucros das empresas já são tributados. O trabalho busca compreender os impactos econômicos dessa tributação sobre o ambiente de negócios, especialmente no que se refere à atração de investimentos e à competitividade do Brasil no cenário internacional. O estudo também objetiva propor alternativas que equilibrem a necessidade de justiça fiscal com a promoção de um ambiente econômico favorável, alinhando a política tributária brasileira com as melhores práticas internacionais.

A metodologia do estudo foi baseada em uma abordagem qualitativa, utilizando a técnica de revisão bibliográfica como principal método de pesquisa. Foram selecionados artigos, livros e publicações acadêmicas relevantes ao tema, com foco em material publicado entre os anos de 2015 e 2024. As fontes foram obtidas por meio de pesquisas no Google Acadêmico e na plataforma SciELO, utilizando palavras-chave como “tributação de dividendos”, “non bis in idem”, “constitucionalidade” e “direito tributário”.

O estudo privilegiou artigos que abordam a tributação de dividendos no contexto brasileiro e internacional, com atenção especial às análises jurídicas sobre o princípio do non bis in idem e suas implicações no direito tributário. A partir desta revisão foi possível construir uma base sólida para a discussão sobre a constitucionalidade da tributação de dividendos e seus impactos práticos no sistema fiscal e econômico do Brasil.

1. O SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO: ESTRUTURA E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

O sistema tributário brasileiro é amplamente considerado um dos mais complexos do mundo, com uma estrutura robusta que envolve a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, cada um com competência para instituir e cobrar tributos específicos.

Em matéria de impostos a Constituição Federal estabeleceu de forma expressa, exemplificativa para a União e taxativa para os Estados, Distrito Federal e Municípios os seguintes impostos: 

a) Impostos da União (Art. 153 da CF/1988)

Art. 153. A União poderá instituir os seguintes impostos:

I – Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza;
II – Imposto sobre Produtos Industrializados;
III – Imposto sobre a Importação de Produtos Estrangeiros;
IV – Imposto sobre a Exportação de Produtos;
V – Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural;
VI – Imposto sobre a Produção e Circulação de Mercadorias e Serviços (nos casos previstos pela Constituição);
VII – Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários.

b) Impostos dos Estados (Art. 155 da CF/1988)

Art. 155. Compete aos Estados instituir os seguintes impostos:

I – Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS);
II – Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA);
III – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).

c) Impostos de Competência Municipal (Art. 156 da CF/1988)

Art. 156. Compete aos Municípios instituir os seguintes impostos:

I – Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU);
II – Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
III – Imposto sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN ou ISS).

A descentralização do sistema tributário brasileiro tem vantagens e desvantagens. Por um lado, ela permite que os estados e municípios tenham autonomia para instituir tributos de acordo com suas necessidades regionais, o que pode promover uma melhor alocação de recursos e uma administração mais eficiente.

Por outro lado, essa descentralização pode gerar conflitos de competência e falta de uniformidade nas regras tributárias, criando um ambiente de negócios incerto e oneroso. As empresas, por exemplo, enfrentam dificuldades em cumprir com as obrigações tributárias em diferentes estados e municípios, devido às variações nas alíquotas e nos critérios de cobrança do ICMS e do ISS (Felício; Martinez, 2019).

Além disso, o sistema tributário brasileiro é amplamente criticado por sua elevada carga tributária, especialmente sobre o consumo, o que acaba penalizando as classes mais baixas. Impostos como o ICMS, o IPI e o ISS são repassados ao consumidor final, o que significa que todos os cidadãos, independentemente de sua renda, pagam tributos embutidos nos preços dos produtos e serviços que consomem.

Isso gera um efeito regressivo, onde os mais pobres, proporcionalmente, pagam uma parcela maior de sua renda em tributos do que os mais ricos. Essa característica do sistema tributário brasileiro contraria o princípio da capacidade contributiva e gera debates sobre a necessidade de reformas que aumentem a tributação sobre a renda e o patrimônio, reduzindo a carga sobre o consumo (Felício; Martinez, 2019).

As tentativas de reforma tributária no Brasil, embora historicamente enfrentando obstáculos políticos e econômicos, finalmente se concretizaram com a Emenda Constitucional nº 132/2023, que institui um novo sistema tributário. 

Embora a transição ainda esteja em andamento, com a plena implementação prevista para 2033, a reforma já está em vigor, e alguns pontos estão sendo regulamentados, como os Impostos sobre Valor Agregado (IVAs). A Lei Complementar nº 214/2025 foi responsável pela implantação dos IVAs federal e estadual. Na seara federal haverá a fusão do IPI com as contribuições PIS e CONFINS, dando origem a contribuição de bens e serviços (CBS). 

No âmbito estadual foi criado outro IVA, dessa feita com a junção do ICMS, imposto estadual e com o ISS imposto municipal, nascendo daí o Imposto sobre Bens e Serviço (IBS).

Em resumo, o sistema tributário brasileiro é caracterizado por uma estrutura descentralizada, uma ampla gama de tributos e uma elevada carga sobre o consumo. Embora os princípios constitucionais que regem o sistema busquem garantir justiça fiscal e equilíbrio na arrecadação, a prática revela uma série de desafios que comprometem a eficiência e a equidade do sistema.

A complexidade das regras tributárias, a carga regressiva sobre o consumo e a fragmentação das competências entre os entes federativos são alguns dos principais problemas apontados por especialistas. Diante desse cenário, a discussão sobre a reforma tributária ganha cada vez mais relevância, com o objetivo de simplificar o sistema, torná-lo mais progressivo e promover um ambiente de negócios mais competitivo e justo.

2. PRINCÍPIO DO NON BIS IN IDEM E SUA APLICAÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO

O princípio do non bis in idem é um conceito fundamental no direito, especialmente relevante no contexto do direito tributário. Em sua essência, o princípio visa impedir que um mesmo fato gerador seja objeto de múltiplas tributações, evitando a sobrecarga fiscal sobre o contribuinte.

Este princípio está diretamente relacionado à ideia de justiça tributária, uma vez que assegura que o contribuinte não seja punido de forma excessiva ou injusta pela repetição de tributos sobre o mesmo fato gerador. No âmbito do direito tributário, a aplicação do non bis in idem busca manter um equilíbrio entre a arrecadação necessária ao Estado e a proteção aos direitos fundamentais do contribuinte, garantindo que a tributação seja feita de maneira proporcional e justa.

A aplicação do princípio do non bis in idem no direito tributário brasileiro é essencial para evitar que o contribuinte seja onerado de forma indevida. Isso significa que, uma vez tributado um determinado fato gerador, como o lucro de uma empresa, não é possível que outro tributo incida sobre o mesmo fato de forma equivalente, sob o risco de configurar dupla tributação.

A Constituição Federal brasileira e o Código Tributário Nacional, por sua vez, estabelecem diretrizes claras que buscam impedir a repetição de tributos sobre o mesmo fato econômico, protegendo o cidadão e as empresas de uma carga fiscal que poderia ser excessiva e, em muitos casos, inviável economicamente (Masagão; Oliveira, 2019).

No direito tributário, a aplicação do non bis in idem é frequentemente debatida em casos de tributação sobre dividendos. No Brasil, o lucro das empresas é tributado por meio do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), e, tradicionalmente, os dividendos distribuídos aos acionistas eram isentos de tributação, evitando a dupla incidência fiscal.

A lógica subjacente à isenção de dividendos está justamente no respeito ao princípio do non bis in idem, já que o capital que está sendo distribuído aos acionistas já foi objeto de tributação na esfera da pessoa jurídica. Contudo, a recente discussão sobre a reintrodução da tributação sobre dividendos levanta preocupações sobre uma possível violação desse princípio, uma vez que o mesmo lucro poderia ser tributado em duas esferas, empresarial e pessoal (Masagão; Oliveira, 2019).

Outro aspecto relevante na aplicação do non bis in idem é a tributação internacional. Em um mundo globalizado, é comum que empresas e indivíduos tenham renda e ativos em diversos países, o que pode gerar situações de dupla tributação internacional. Nesse contexto, o Brasil, assim como muitos outros países, adota acordos internacionais para evitar a dupla tributação, de modo a garantir que o mesmo fato gerador de renda não seja tributado tanto no país de origem quanto no país de destino dos investimentos. Esses acordos, conhecidos como tratados de bitributação, são mecanismos importantes para assegurar que o princípio do non bis in idem seja respeitado em âmbito internacional, promovendo a justiça tributária e incentivando o comércio e os investimentos globais (Veloso, 2021).

A aplicação do non bis in idem no direito tributário também está intimamente ligada ao princípio da segurança jurídica, que exige que as normas tributárias sejam claras e previsíveis, permitindo ao contribuinte conhecer com antecedência suas obrigações fiscais.

A dupla tributação, quando não controlada, cria incertezas para o contribuinte, que pode ser surpreendido por uma cobrança excessiva de tributos, comprometendo sua atividade econômica. Portanto, garantir a aplicação rigorosa do non bis in idem é uma forma de preservar a segurança jurídica e de evitar abusos na tributação. Ao estabelecer limites claros à incidência de múltiplos tributos sobre o mesmo fato gerador, o princípio contribui para um sistema tributário mais justo e eficiente (Ribeiro; Barbosa, 2022).

No entanto, apesar da importância do princípio do non bis in idem, sua aplicação não é sempre linear, e há situações em que o legislador e o Poder Judiciário precisam equilibrar o respeito ao princípio com outras demandas do sistema tributário. Em alguns casos, o Estado pode argumentar que a cobrança de tributos distintos sobre o mesmo fato gerador é justificável por razões de ordem pública ou econômica.

Nesses casos, cabe ao Judiciário avaliar se a imposição de múltiplos tributos sobre um mesmo fato caracteriza uma violação do princípio ou se existem justificativas legítimas que permitam essa cobrança. Esse é um desafio recorrente no direito tributário, que envolve a interpretação de princípios constitucionais e a busca por um equilíbrio entre arrecadação e justiça fiscal (Ribeiro; Barbosa, 2022).

O princípio do non bis in idem também tem implicações importantes no controle da carga tributária total sobre os contribuintes. Uma das principais críticas ao sistema tributário brasileiro é justamente a alta carga tributária, que recai sobre diferentes bases de cálculo e pode, em muitos casos, gerar situações de dupla ou tripla tributação sobre o mesmo fato.

Essa situação não apenas desrespeita o princípio do non bis in idem, mas também pode desincentivar investimentos e afetar negativamente a economia. Portanto, a aplicação rigorosa desse princípio é vista como uma forma de controlar a escalada da carga tributária e garantir que o sistema fiscal funcione de maneira equilibrada e justa, sem excessos que prejudiquem o desenvolvimento econômico (De Lima, 2024).

Destaca-se que o princípio do non bis in idem desempenha um papel fundamental na estrutura do direito tributário brasileiro, assegurando que a tributação seja justa e proporcional. Sua aplicação busca evitar a sobrecarga fiscal sobre o contribuinte, impedindo a incidência de múltiplos tributos sobre o mesmo fato gerador. No entanto, o princípio também enfrenta desafios, especialmente em um sistema tributário tão complexo como o brasileiro, onde diferentes tributos podem incidir de forma concomitante sobre fatos econômicos similares.

O respeito ao non bis in idem é essencial para garantir a segurança jurídica e a equidade no sistema tributário, além de contribuir para um ambiente econômico mais justo e atrativo para os investidores. Ao mesmo tempo, o princípio precisa ser aplicado de maneira flexível, permitindo que o sistema tributário se adapte às necessidades de arrecadação do Estado, sem comprometer os direitos fundamentais dos contribuintes.

A Apelação Criminal nº 96.04.00855-2/RS refere-se a um caso envolvendo crimes contra a ordem tributária, conforme disposto na Lei nº 8.137/90. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao analisar a questão, abordou a aplicação do tipo misto alternativo presente no artigo 1º da referida lei, esclarecendo que as condutas descritas em seus incisos não devem ser cumuladas, resultando em uma pena única. A decisão enfatiza a importância da proporcionalidade das penas, respeitando os princípios da individualização e da razoabilidade.

Ademais, o Tribunal rejeitou a aplicação da responsabilidade objetiva, ressaltando a necessidade de comprovação da autoria e do dolo do réu. A decisão foi fundamentada em provas documentais e testemunhais que atestaram a atuação do réu na gerência financeira da empresa, configurando sua imputabilidade. A jurisprudência também tratou do “bis in idem”, constatando que houve erro ao considerar a continuidade delitiva tanto como agravante quanto como causa de aumento de pena. Por fim, o Tribunal deu provimento à apelação e concedeu habeas corpus de ofício.

Este aspecto reforça a relevância da análise criteriosa das provas no processo penal, garantindo que a responsabilização penal seja baseada em elementos concretos e não meramente em presunções ou interpretações administrativas. A discussão sobre o princípio do non bis in idem também foi central, com o Tribunal reconhecendo a inadequação de utilizar a mesma circunstância para justificar tanto a culpabilidade quanto a continuidade delitiva, prevenindo assim a aplicação indevida de sanções múltiplas pelo mesmo ato.

Por fim, a decisão aborda de maneira significativa a aplicação das penas restritivas de direitos em substituição à pena privativa de liberdade, conforme os requisitos estabelecidos no art. 44 do Código Penal. Este ponto reflete uma tendência jurisprudencial de flexibilização das penas, promovendo alternativas que visam à reintegração social do condenado sem a necessidade de encarceramento.

Além disso, a consideração da prescrição retroativa para os delitos cometidos sob a égide da Lei nº 4.729/65 demonstra a aplicação correta das normas legais vigentes à época dos fatos, garantindo a segurança jurídica e o respeito aos direitos adquiridos. Em suma, a jurisprudência analisada exemplifica uma interpretação equilibrada e fundamentada das normas penais, contribuindo para a consistência e a justiça nas decisões judiciais relacionadas aos crimes contra a ordem tributária. 

3. TRIBUTAÇÃO DE DIVIDENDOS NO BRASIL: HISTÓRICO E PERSPECTIVAS

A tributação de dividendos no Brasil possui um histórico marcado por mudanças significativas ao longo dos anos, refletindo as diversas estratégias econômicas e fiscais adotadas pelo país. Até 1995, os dividendos pagos pelas empresas a seus acionistas estavam sujeitos à tributação no âmbito da pessoa física.

Contudo, com a promulgação da Lei nº 9.249/1995 (BRASIL, 1995), houve a isenção de tributação sobre os dividendos para as pessoas físicas, como parte de uma política que visava estimular investimentos e promover o crescimento econômico. Essa medida foi justificada com base na ideia de evitar a dupla tributação, já que os lucros das empresas já haviam sido tributados pelo Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ).

A partir de então, o Brasil seguiu uma tendência internacional, presente em diversos países, de isentar a tributação sobre a distribuição de dividendos para atrair capital.

Essa isenção, entretanto, sempre foi alvo de debates, especialmente em relação à equidade do sistema tributário. A crítica mais recorrente é que a isenção de dividendos beneficia, em sua maior parte, as camadas mais ricas da população, que detém a maior parte do capital investido nas empresas.

Em contrapartida, as camadas mais pobres continuam a ser impactadas pela alta carga tributária sobre o consumo. Além disso, a isenção de dividendos tem sido apontada como uma das razões para o desequilíbrio na distribuição de renda no Brasil, já que os maiores beneficiários desse tipo de política são os grandes investidores.

Nos últimos anos, essa crítica tem se intensificado, especialmente em um cenário de crescente desigualdade social e aumento da pressão fiscal sobre as classes trabalhadoras. E dessa forma a citação a seguir aborda a crescente discussão sobre a reintrodução da tributação de dividendos no Brasil, destacando como essa proposta tem ganhado força nos últimos anos. (De Godoi, 2017).

A perspectiva de reintrodução da tributação de dividendos começou a ganhar força a partir da segunda década do século XXI, especialmente com o avanço de propostas de reforma tributária no Brasil. O governo e diversos setores da sociedade passaram a argumentar que a tributação sobre dividendos é uma medida necessária para tornar o sistema tributário mais justo e progressivo, uma vez que permitiria tributar os ganhos de capital de forma mais direta. A ideia é que os lucros distribuídos aos acionistas constituem uma forma de renda, e, portanto, devem ser tratados de maneira semelhante aos salários e outras formas de remuneração, que já estão sujeitos à tributação. Assim, a tributação de dividendos se tornaria um mecanismo de redistribuição de renda, contribuindo para a redução das desigualdades (De Godoi et al., 2017, p. 99-100).

Além das questões de justiça fiscal, a tributação de dividendos é vista como uma forma de ampliar a arrecadação do governo sem aumentar os impostos sobre o consumo, que afetam de forma desproporcional as classes mais pobres. Essa arrecadação adicional poderia ser utilizada para financiar políticas públicas e programas sociais, ajudando a mitigar os efeitos da pobreza e promover o desenvolvimento econômico.

No entanto, há preocupações sobre o impacto que essa medida poderia ter sobre o ambiente de negócios no Brasil. Críticos argumentam que a tributação de dividendos pode desincentivar investimentos no país, especialmente se não for acompanhada de uma reforma mais ampla que reduza outros tributos, como o Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ), que já é elevado (Gobetti, 2018).

A experiência internacional oferece lições importantes para o debate sobre a tributação de dividendos no Brasil. Em muitos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Reino Unido e França, os dividendos são tributados, mas as alíquotas aplicadas são geralmente menores do que as alíquotas incidentes sobre a renda do trabalho, e há mecanismos para evitar a dupla tributação, como o uso de créditos tributários ou a aplicação de deduções específicas.

Esses países adotam a visão de que, embora os dividendos devam ser tributados, é importante garantir que a tributação não seja excessivamente onerosa a ponto de desincentivar o investimento. No Brasil, uma das propostas é justamente adotar uma alíquota moderada sobre os dividendos, acompanhada da redução da carga tributária sobre o lucro das empresas, criando assim um sistema mais equilibrado e atraente para os investidores (De Sousa; Penedo; Pereira, 2018).

Um dos principais desafios para a implementação da tributação de dividendos no Brasil é garantir que a medida seja aplicada de maneira eficaz e justa. Isso requer uma legislação clara e objetiva, que estabeleça alíquotas adequadas e que evite a criação de brechas que possam ser utilizadas para a evasão fiscal.

Além disso, é fundamental que a tributação de dividendos seja inserida em um contexto mais amplo de reforma tributária, que contemple também a simplificação do sistema e a redução da carga sobre o consumo e sobre as pequenas e médias empresas. Somente assim será possível evitar que a tributação de dividendos tenha efeitos adversos sobre a economia, como a fuga de capitais ou a retração dos investimentos (De Sousa; Penedo; Pereira, 2018).

Outro aspecto importante a ser considerado é o impacto da tributação de dividendos sobre o mercado financeiro. O Brasil tem um mercado acionário relativamente pequeno em comparação com o tamanho da sua economia, e a tributação de dividendos pode afetar o comportamento dos investidores, especialmente os estrangeiros. Caso a tributação seja vista como excessiva, há o risco de que os investidores passem a preferir mercados com carga tributária menor, reduzindo o fluxo de capital para o Brasil.

Por outro lado, se a medida for bem calibrada, pode contribuir para um mercado financeiro mais equilibrado, onde a tributação incida de maneira mais justa sobre todos os tipos de renda, sem prejudicar o desenvolvimento do setor (Ávila; Conceição, 2018).

A tributação de dividendos também tem implicações importantes para o setor empresarial. Muitas empresas optam por reinvestir seus lucros em vez de distribuí-los como dividendos, justamente para evitar a dupla tributação. Com a reintrodução da tributação de dividendos, pode haver uma mudança nas estratégias de distribuição de lucros e reinvestimento, o que pode impactar a estrutura de capital das empresas e o comportamento dos acionistas. 

Empresas que costumam pagar dividendos elevados, como bancos e grandes corporações, podem ser particularmente afetadas por essa mudança, já que a tributação pode reduzir o valor distribuído aos acionistas e, consequentemente, a atratividade das ações dessas empresas (Cunha, 2021).

Em perspectiva futura, o debate sobre a tributação de dividendos no Brasil deve continuar a evoluir, especialmente à medida que o país busca reformar seu sistema tributário para torná-lo mais eficiente e menos desigual.

A questão central será encontrar um equilíbrio entre a necessidade de justiça fiscal e a promoção de um ambiente de negócios competitivo e atrativo para investidores. Se bem implementada, a tributação de dividendos pode se tornar um instrumento importante para reduzir a desigualdade no Brasil, ao mesmo tempo em que contribui para o aumento da arrecadação e para o financiamento de políticas públicas essenciais. Contudo, isso exigirá um planejamento cuidadoso e uma abordagem integrada que leve em conta todos os aspectos econômicos, fiscais e sociais envolvidos (Cunha, 2021).

Em suma, a tributação de dividendos no Brasil, apesar de seu histórico de isenção nas últimas décadas, está novamente no centro do debate sobre como tornar o sistema tributário mais justo e eficiente. As perspectivas futuras indicam que, com uma política bem desenhada e calibrada, é possível reintroduzir a tributação de dividendos sem comprometer o crescimento econômico e o ambiente de negócios. O desafio será garantir que a medida seja aplicada de forma justa, sem sobrecarregar os investidores e sem prejudicar a competitividade do Brasil no cenário global.

Há de se ressaltar que no âmbito da reforma tributária busca-se a cobrança de imposto de renda sobre dividendos. Tramita no Congresso Nacional o projeto de lei nº 307/2021, que trata da tributação sobre dividendos distribuídos por empresas, propondo a cobrança de 10% sobre lucros e dividendos, alterando a Lei nº 9.249/1995. 

O projeto visa a tributação de resultados apurados a partir de 2022, exceto para empresas optantes pelo Simples Nacional. Essas modificações refletem um esforço contínuo para modernizar o sistema tributário, buscando maior eficiência e justiça fiscal no Brasil.

A ideia é reduzir a complexidade do sistema, harmonizar as regras de cobrança em todo o país e diminuir os custos de conformidade para as empresas. No entanto, há resistências por parte de estados e municípios, que temem perder arrecadação e autonomia tributária. Além disso, a transição para um novo modelo tributário requer um período de adaptação que pode gerar incertezas no curto prazo (Rezende, 2022).

4. IMPACTOS ECONÔMICOS E JURÍDICOS DA TRIBUTAÇÃO DE DIVIDENDOS NO AMBIENTE DE NEGÓCIOS

A tributação de dividendos é um tema de grande relevância tanto para o ambiente de negócios quanto para o contexto jurídico no Brasil. Os impactos econômicos e jurídicos dessa medida refletem diretamente sobre a competitividade das empresas, o comportamento dos investidores e a capacidade de atração de capitais, especialmente em um cenário global cada vez mais integrado.

No Brasil, durante muitos anos, os dividendos distribuídos aos acionistas foram isentos de tributação, como parte de uma política que visava incentivar investimentos e fomentar o crescimento econômico. No entanto, a recente discussão sobre a reintrodução dessa tributação tem gerado preocupações sobre possíveis efeitos adversos para o ambiente de negócios, tanto do ponto de vista econômico quanto jurídico, uma vez que a medida envolve questões relacionadas à justiça fiscal e ao princípio da não cumulatividade (Vicentini; Manita, 2021).

Do ponto de vista econômico, a tributação de dividendos pode impactar diretamente o retorno sobre o capital investido, reduzindo o interesse de investidores, especialmente estrangeiros, em aplicar recursos no Brasil.

Em um mercado global competitivo, os investidores buscam maximizar seus retornos, e a tributação sobre dividendos representa uma redução nesse retorno, o que pode fazer com que optem por mercados onde a carga tributária seja menor. Isso pode, por consequência, reduzir o fluxo de capitais para o país, afetando negativamente o financiamento de empresas brasileiras e limitando sua capacidade de crescimento e expansão. Portanto, o impacto econômico da tributação de dividendos não se limita à arrecadação fiscal imediata, mas se estende à capacidade de o país continuar atraindo investimentos em longo prazo (Vicentini; Manita, 2021).

Para as empresas, a tributação de dividendos representa um aumento do custo de capital. Com a redução da parcela de lucros que é distribuída aos acionistas após a tributação, as empresas podem enfrentar maiores dificuldades em captar recursos via mercado acionário. Isso é especialmente relevante para empresas que dependem de dividendos como forma de atrair investidores e que têm como parte de sua estratégia a distribuição regular de lucros.

Assim, a introdução dessa tributação pode forçar as empresas a buscar outras formas de financiamento, como empréstimos bancários, que tendem a ser mais onerosos e podem afetar negativamente a estrutura financeira das companhias. Além disso, as pequenas e médias empresas, que geralmente têm menos acesso a linhas de crédito vantajosas, podem ser particularmente afetadas, pois muitas vezes dependem do reinvestimento dos lucros para crescer (Araújo Neto, 2022).

A tributação de dividendos também tem um impacto direto no comportamento dos acionistas. Com a redução dos lucros distribuídos, muitos investidores podem optar por retirar seus investimentos de empresas que tradicionalmente pagam altos dividendos, como bancos e grandes corporações, e buscar alternativas que ofereçam melhores retornos líquidos. Isso pode gerar uma maior volatilidade no mercado de capitais, à medida que as empresas precisam ajustar suas políticas de dividendos para se manterem competitivas. Em contrapartida, as empresas podem ser incentivadas a reinvestir seus lucros em vez de distribuí-los, o que pode ter efeitos positivos no longo prazo, ao fomentar o crescimento interno e a inovação. Contudo, esse cenário de reinvestimento depende de uma série de fatores econômicos, incluindo o ambiente macroeconômico, as taxas de juros e as perspectivas de crescimento da economia (Araújo Neto, 2022, p. 41).

Do ponto de vista jurídico, a tributação de dividendos levanta questões sobre o princípio da segurança jurídica e o respeito às normas constitucionais. No Brasil, o sistema tributário deve respeitar uma série de princípios, como o da legalidade, o da capacidade contributiva e o da não cumulatividade, que buscam garantir que a tributação seja aplicada de forma justa e previsível.

A reintrodução da tributação sobre dividendos deve, portanto, ser cuidadosamente desenhada para evitar interpretações conflitantes e lacunas legais que possam gerar insegurança jurídica. O princípio do non bis in idem, por exemplo, é frequentemente citado em debates sobre a tributação de dividendos, uma vez que o capital distribuído aos acionistas já foi tributado na esfera da pessoa jurídica. Assim, qualquer mudança no regime de tributação de dividendos precisa ser feita de forma clara e objetiva para evitar conflitos com esses princípios constitucionais (Silva, 2023).

Outro aspecto jurídico relevante é a necessidade de garantir que a tributação de dividendos não resulte em uma carga fiscal excessiva. O direito tributário brasileiro impõe limites à capacidade do Estado de tributar, assegurando que a arrecadação de impostos não tenha caráter confiscatório. Dessa forma, a aplicação de uma alíquota elevada sobre dividendos, sem ajustes compensatórios em outras áreas, pode ser vista como uma forma de confisco, o que violaria os direitos dos contribuintes.

Para evitar esse cenário, é comum que países que adotam a tributação de dividendos implementem mecanismos que permitam deduções ou créditos fiscais, garantindo que a carga tributária seja equilibrada e não desestimule o investimento. No Brasil, o debate sobre a introdução de mecanismos compensatórios será central para garantir que a tributação de dividendos seja juridicamente sustentável (Silva, 2023).

A introdução da tributação de dividendos também pode gerar um aumento da litigiosidade no sistema tributário brasileiro. Mudanças na legislação fiscal, especialmente em áreas sensíveis como a tributação de lucros e rendas, tendem a gerar disputas judiciais entre o fisco e os contribuintes, à medida que as empresas e investidores buscam formas de minimizar sua carga tributária.

O risco de judicialização pode aumentar se a legislação for ambígua ou se as mudanças forem feitas de forma abrupta, sem um período adequado de adaptação. Além disso, a complexidade do sistema tributário brasileiro, que já é amplamente criticado pela sua fragmentação e dificuldade de cumprimento, pode exacerbar os problemas, tornando mais difícil a aplicação de novas regras sobre a tributação de dividendos (Lessa, 2023).

No campo econômico, além da questão da atração de capitais e do custo de capital, a tributação de dividendos pode ter impactos sobre a distribuição de renda. Como os dividendos são uma fonte significativa de renda para investidores de alta renda, sua tributação pode ser vista como uma forma de promover maior justiça fiscal, redistribuindo parte da riqueza concentrada nas mãos dos mais ricos.

No entanto, essa medida precisa ser equilibrada com a necessidade de manter um ambiente de negócios competitivo, de modo que o país não perca atratividade para investimentos estrangeiros e não prejudique o crescimento das empresas. Portanto, a tributação de dividendos pode contribuir para a redução das desigualdades, desde que implementada de maneira a minimizar seus impactos negativos sobre a economia (Soares, 2023).

Em termos de competitividade global, a tributação de dividendos pode colocar o Brasil em desvantagem em relação a outros países que oferecem regimes tributários mais favoráveis aos investidores. Em um cenário globalizado, o fluxo de capitais pode migrar facilmente para países com menor carga tributária, e a tributação de dividendos no Brasil, caso seja implementada sem as devidas compensações, pode afetar a competitividade das empresas brasileiras no mercado internacional.

Além disso, empresas multinacionais podem buscar alternativas para transferir suas operações ou recursos para jurisdições com regimes fiscais mais atrativos, o que resultaria em perda de arrecadação para o país e em uma diminuição da atividade econômica local. Portanto, qualquer mudança no regime de tributação de dividendos deve levar em consideração o cenário internacional e as práticas fiscais de outros países (Soares, 2023).

Em suma, a tributação de dividendos no Brasil possui implicações econômicas e jurídicas amplas que afetam diretamente o ambiente de negócios. Do ponto de vista econômico, a medida pode impactar negativamente a atração de investimentos, aumentar o custo de capital para as empresas e alterar o comportamento dos investidores.

Por outro lado, do ponto de vista jurídico, a tributação de dividendos precisa ser cuidadosamente desenhada para respeitar os princípios constitucionais, como a segurança jurídica, o non bis in idem e a não confiscatoriedade.

A adoção de mecanismos compensatórios, como créditos fiscais ou reduções em outros tributos, pode ser uma solução para mitigar os efeitos negativos da medida e garantir que a tributação de dividendos contribua para a justiça fiscal sem comprometer a competitividade do país.

5. CONCLUSÃO

Em conclusão, a análise da tributação de dividendos no Brasil envolve desafios jurídicos e econômicos, principalmente quando considerada à luz do princípio constitucional do non bis in idem, que visa evitar a dupla tributação sobre o mesmo fato gerador. A proposta de reintrodução da tributação de dividendos gera um debate sobre justiça fiscal e competitividade econômica. De um lado, a medida pode promover maior equidade, tributando mais a renda de capital, que, frequentemente, está concentrada nas mãos de uma parcela pequena da população. No entanto, surgem preocupações sobre a possível violação do princípio do non bis in idem, pois os lucros das empresas já são tributados pelo Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), e a tributação sobre os dividendos representaria uma nova tributação sobre o mesmo montante.

Ainda que a tributação de dividendos tenha como objetivo corrigir distorções, ela precisa ser implementada com cuidado, respeitando o princípio da capacidade contributiva e assegurando que aqueles com maior capacidade econômica contribuam proporcionalmente mais para o sistema tributário. Além disso, os impactos econômicos dessa tributação devem ser avaliados, especialmente no que diz respeito à atração de investimentos e à competitividade das empresas no cenário internacional. A introdução de uma alíquota sobre dividendos pode desincentivar o investimento interno e estrangeiro, além de aumentar o custo de capital para as empresas, o que pode ter repercussões negativas no crescimento econômico.

Do ponto de vista jurídico, a tributação de dividendos deve estar alinhada com os princípios constitucionais, como legalidade e segurança jurídica, para garantir clareza e previsibilidade para os contribuintes. A implementação de qualquer reforma tributária deve, portanto, respeitar esses princípios e equilibrar a carga tributária sobre empresas e investidores, sem comprometer a competitividade econômica e sem prejudicar o ambiente de negócios. Dessa forma, o desafio está em encontrar um equilíbrio entre aumentar a arrecadação e promover a justiça fiscal, sem prejudicar a economia e os direitos dos contribuintes.

Por fim, a tributação de dividendos no Brasil é uma questão complexa que envolve tanto aspectos jurídicos quanto econômicos. A análise da constitucionalidade dessa medida, à luz do princípio do non bis in idem, demonstra que, embora a tributação possa ser uma ferramenta útil para promover justiça fiscal, ela precisa ser cuidadosamente desenhada para evitar violações constitucionais e impactos negativos sobre o ambiente de negócios. O desafio está em encontrar um equilíbrio que permita aumentar a arrecadação e promover a equidade, sem comprometer a competitividade econômica e o respeito aos direitos dos contribuintes.

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1Graduanda em Direito, Centro Universitário de Santa Fé do Sul/SP – UNIFUNEC, bmayumi99@outlook.com

2Docente em Direito, Centro Universitário de Santa Fé do Sul/SP – UNIFUNEC, ademirgssjr@hotmail.com