TRABALHO ESCRAVO: Uma Análise Acerca da Relação da Terceirização com o Trabalho Escravo

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10395791


SANTOS, Edmundo Ferreira dos1
FERREIRA FILHO, José2


RESUMO

O trabalho escravo é um tema de grande relevância no cenário jurídico em razão do art. 149 do Código Penal Brasileiro, que descreve os elementos que caracterizam a redução a condição análoga à de escravo. O trabalho escravo tem suas raízes fundamentadas nos aspectos culturais, legais e sociais que descrevem a realidade das famílias brasileiras e suas vulnerabilidades na área de emprego e renda. A partir deste contexto, presente estudo traz algumas informações relevantes sobre o Trabalho Terceirizado e a sua relação com o Trabalho Escravo, bem como suas nuances sobre o Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. A discussão acerca do tema vem ganhando destaque em virtude de alguns dados divulgados trabalhadores em condições análogas às de escravo. Desta forma, a problemática de pesquisa é apresentar Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, tendo como questionamento: de que Forma a Terceirização Impulsiona o Trabalho Escravo no Brasil?, apresentando uma análise dos impactos, bem como solucionar este problema. Diante dessa problemática, esse trabalho procura com objetivo geral analisar a relação da terceirização com o trabalho escravo e por meio dos objetivos específicos: contextualizar a relação do trabalho terceirizado e o trabalho análogo a escravidão, compreender as consequências sofridas pelos responsáveis que expõe situações análogas a escravidão e apresentar os Princípios Constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana, pautadas nas ações do judiciário. A metodologia utilizada deu-se por meio de uma pesquisa bibliográfica, onde será abordado um estudo com base em materiais já publicados e de domínio público, tais como livros, artigos científicos, que servirá de base de sustentação para a construção desse estudo. Diante da relevância desse estudo, espera-se que os resultados venham fornecer subsídios relevantes para os formandos do Curso de Direito, bem como, contribuir para fortalecer a temática proposta.

Palavra Chave: Terceirização. Trabalho. Escravidão. Princípios Constitucionais

1 INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos a sociedade vem testemunhando através da mídia várias descobertas de trabalhadores ludibriados com falsas promessas e são obrigados a prestar labor em condições insalubres, tendo suprimido seus direitos fundamentais de cidadão. Com isso, a modalidade de trabalho terceirizado pode impulsionar o trabalho escravo no Brasil, visto que, os trabalhadores terceirizados são submetidos a jornadas exaustivas, condições degradantes de emprego, servidão para quitação de dívidas contraídas durante o labor.

A discussão acerca da problemática vem ganhando destaque em virtude dos dados divulgados recentemente que apontam que entre 1995 a 2022, segundo o MT – Ministério do Trabalho – foram realizados mais de 50 mil resgates de trabalhadores em condições análogas às de escravo.

          Desta forma, a problemática de pesquisa é apresentar Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, tendo como questionamento: De que Forma a Terceirização Impulsiona o Trabalho Escravo no Brasil? apresentando uma análise dos impactos, bem como solucionar este problema.

Frente a essa problemática, o presente estudo tem por objetivo geral apresentar uma visão ampla da relação da terceirização com o trabalho escravo, conceituando e abordando os seus impactos. E por meio dos objetivos específicos discutir sobre a relação do trabalho terceirizado e o trabalho análogo a escravidão; apontar as consequências sofridas pelos responsáveis que expões situações análogas a escravidão e identificar os Princípios Constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana, pautadas nas Leis e ações do judiciário.

A partir desses objetivos, compreende-se a relevância dos Princípios Constitucionais da Dignidade da Pessoa Humana, visando respaldo no art. 149 do Código penal, uma vez que esses indivíduos fazem parte da sociedade e são dignos de direitos. Sendo assim, justificamos a escolha dessa temática, tendo em vista que a exploração do trabalho escravo faz parte dos estudos pautados nos direitos constitucionais da sociedade.

O trabalho acadêmico foi desenvolvido em três etapas, com a finalidade didática de dar maior clareza ao desenvolvimento à pesquisa. Na primeira parte do estudo se procurou fazer uma rápida evolução histórica a respeito do trabalho escravo no mundo e no Brasil, além de abordar sobre a terceirização e as características do trabalho escravo, visando alguns fatos e números apontados.

A segunda etapa do estudo foi apresentado o trabalho escravo pautado sob os princípios da dignidade humana, por conta que nesse princípio se encontra as principais ideias acerca do sistema jurídico nacional. No terceiro e último capítulo da presente monografia foi feita uma análise sobre a aplicação da lei em cima do trabalho análogo ao escravo, apontando as consequências do crime e as penas aplicadas. Por fim, espera-se que este estudo ofereça subsidios importantes para os graduandos na área de direito, visando melhoria na aplicação da lei no ordenamento jurídico.

2 METODOLOGIA

O estudo é de caráter descritivo, que segundo Marconi e Lakatos (2010, p. 32) “permite a pesquisa bibliográfica compreender a realidade do objeto pesquisado, tanto a partir de reflexões teóricas e de experiências práticas cientificamente comprovados sobre o tema”.

Foi elaborado utilizando-se uma abordagem qualitativa. Que segundo Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.

No presente trabalho foi utilizado pesquisa bibliográfica, onde será realizado um estudo com base em materiais já publicados e de domínio público, tais como livros, artigos científicos, reportagens jornalísticas em seus mais diversos formatos, tais como reportagens de sites e revistas, que servirá de base de sustentação para a construção de um raciocínio lógico e repleto de informações, para que o tema em voga, alcance os seus reais objetivos. Trabalhou-se a partir de uma amostra não probabilística de forma não aleatória, atrelada a vários sites de pesquisas. Amostra não-probabilística “é aquela em que a seleção dos elementos da população para compor a amostra depende ao menos em parte do julgamento do pesquisador ou do entrevistador no campo”. (MATTAR, F. p. 132).

Para desenvolver o presente trabalho científico de conclusão de curso acadêmico, será feito um levantamento a partir de dados bibliográficos em sua amplitude, bem como a coleta de informações complementares por meio de casos específicos de grande repercussão ocorridos nos últimos anos, para alcançar o objetivo final da proposta, uma vez que se faz necessário organizar e selecionar todo o corpo teórico como referência, além de avaliação crítica, para finalizar a escrita.

As técnicas utilizadas foram levantamentos documental e estatísticas. Esse tipo de técnica é realizado com a ausência dos participantes, e sim com a informação de dados encontrados em tabelas, gráficos, planilhas, etc.

3 TRABALHO ESCRAVO: Uma Análise Acerca da Relação da Terceirização com o Trabalho Escravo

O presente capítulo tem por objetivo tratar da evolução histórica do trabalho escravo desde seu surgimento, delineando seu contexto mundial e a chegada desse da terceirização com o trabalho escravo ao Brasil, além de apontar conceitos e características sobre as variedades de trabalhos escravos existentes.

3.1 CONTEXTO HISTÓRICO MUNDIAL

O processo que descreve o contexto histórico da terceirização com o trabalho escravo no mundo, está associada aos meados de 1859, na abertura dos portos japoneses para a entrada de maquinários utilizados na indústria têxtil. O início mais expressivo da terceirização surgiu nos Estados Unidos, com o nome de outsourcing, em 1940, no começo da Segunda Guerra Mundial.

A terceirização originou-se nos Estados Unidos, logo após a eclosão da Segunda Guerra Mundial. As indústrias bélicas tinham como desafio concentrar-se no desenvolvimento da produção de armamentos a serem usados contra as forças do Eixo, e passaram a delegar algumas atividades de suporte a empresas prestadoras de serviços mediante contratação”. (GIOSA, 1997, p.12):

As empresas recebiam contratação de outras empresas e precisavam concentrar na produção intensiva. Os empresários da época buscavam de todas as formas dar conta dos serviços solicitados, e com isso contratavam um serviço de mão-de-obra barata, de modo a reduzir os custos. Com o aumento da terceirização, as empresas abriu as portas para os trabalhadores, homens, mulheres, idosos e até mesmo crianças eram usadas para a produção têxtil, tornado-se escravos do trabalho.

Para ilustrar alguns tipos de escravidão vivenciados hoje no mundo, o autor cita cinco países em que tais formas de exploração ocorrem, embora os mesmos sejam signatários de Tratados das Nações Unidas contra a escravidão e o trabalho forçado (BALES, 2004, p.33). Porém, é necessário que se entenda que estes países não possuem o monopólio deste tipo de escravidão, ocorrendo este em vários países e um destes Estados citados não possui apenas um tipo de abuso. Ele apenas os inúmera para exemplificar os tipos de escravidão discriminados.

Em relação ao trabalho escravo presente no contexto histórico mundial tema sua origem associada as conquistas territoriais, onde os povos perdiam as batalhas, tinham como consequência ser submetidos ao trabalho forçado por parte dos vencedores. Publicações históricas dão conta que a escravidão iniciou no Oriente Médio, mas os povos nas Américas como, por exemplo os Maias se serviam de cativos.

A escravidão não é recente na história da humanidade. Já na antiguidade verificamos sua ocorrência. Na mesopotâmia e no Egito quando da execução das obras públicas como barragens ou templos, grande número de trabalhadores era recrutado. Tornava-se propriedade dos governantes que lhes impunham sua autoridade e determinavam as tarefas. Não eram, contudo, vendidos e sua atividade podiam cessar quando do fim da construção, retornando os trabalhadores as suas tarefas anteriores. As relações que estabeleciam com seus proprietários eram eventuais, diferentes daquelas que ocorriam na Grécia- principalmente Atena – e Roma onde a escravidão era a forma mais característica de extração de trabalho. Escravos eram comprados ou obtidos, após saques e batalhas e nunca perdiam- à exceção de casos isolados- sua condição. (PINKY, 1993. p. 13)

O labor forçado, ou seja, o trabalho escravos fez parte de todas as civilizações da antiguidade, como os assírios, hebreus, babilônios, egípcios, gregos e romanos, variando as suas características dependendo do contexto local. Muitos países mantinha os trabalhadores numa posição de escravidão, e essa prática colocava esses homens e mulheres a uma situação de exploração e venda da dignidade humana.

Em Roma, com a expansão de seu domínio, havia comerciantes que acompanhavam as tropas do exército em busca de prisioneiros que eram vendidos como cativos na península itálica. Ainda aqui os escravos eram considerados mercadorias e, como tal, não possuíam direitos. O mais interessante é que, assim como ocorreu na Grécia, Roma conseguiu criar uma estrutura tanto ética quanto legal de forma que a escravidão fosse aceita. A própria lei permitia que o homem se tornasse um escravo. Havia três classes de escravos: aqueles que tendo mais de vinte anos venderam sua liberdade, aqueles vendidos ainda crianças por seus familiares e aqueles que foram condenados pela justiça. Perante a lei, estas pessoas não eram tidas como juridicamente perfeitas, não possuindo, desta forma, qualquer direito civil (NINA, 2010, p. 49).

Com os avanços da terceirização, aumentou-se o trabalho escravo em todos os lugares do mundo. Muitas transformações na estrutura ocupacional entre diversos países fizeram com que os trabalhadores aceitassem a escravidão, tendo em vista que esses indivíduos buscavam uma renda da qual pudessem sobreviver.

Constata-se, portanto, que a escravidão passou por inúmeras mudanças durante a evolução da história, abolida formalmente pela maioria dos países, no século XIX. Não obstante sua extinção no plano formal, versões análogas de exploração tornaram-se comuns com a ascensão do capitalismo, a partir do século XX, podendo-se citar como exemplos a servidão por dívida e o trabalho em condições degradantes. Esse problema, infelizmente, ocorre praticamente em todo o mundo, tendo se tornado uma pauta bastante debatida tanto no cenário internacional, quanto nacional. (FILGUEIRAS; ALVES, 2013).

A terceirização ao trabalho escravo no Brasil, surgiu entre os séculos XV e XIX com a chegada dos africanos. Os portugueses não puderam mais escravizar os povos indígenas, com isso foram para a África e se apossaram dos negros, onde foram transportados como escravos para servir ao homem branco e aos seus familiares.

O tráfico negreiro trouxe para o Brasil milhões de africanos, na condição de escravos. Eles rasgaram as matas, lavraram o solo e fizeram a colheita de produtos tropicais exportáveis; trabalharam nas minas, nos engenhos, nos portos e nas casas. (NINA, 2010, p. 63).

Os negros possuíam habilidades superior à dos índios e sem contar que o valor mercantil era bem mais em conta, o que facilitava a compra para os portugueses. A estratégia utilizada pelos colonizadores era transformar os negros e mercadorias, o que ajudaria no processo de compra e venda entre o comércio transatlântico.

A entrada da mão de obra escrava africana não eliminou a mão de obra escrava indígena. Porém, vários fatores explicam o aumento do número de escravos africanos em relação ao índio: fraca densidade demográfica da população indígena […] devido às tribos estarem cada vez mais arredias, […] dizimação dos indígenas através da superexploração de sua força de trabalho; proteção jesuítica, etc. Existia ainda outro interesse envolvido na entrada de mão de obra africana: com a mão de obra indígena era possível sonegar impostos, porque era “um negócio interno da colônia […] até o quinto devido à coroa era sonegado” enquanto o “comércio ultramarino trazia excelentes dividendos tanto aos governos quanto aos comerciante”. (PINSKY, 1993. p.19).

Com o valor da exportação em alta, a África forneceu milhões de negros para serem cativos no Brasil, eles eram trocados por armamentos, tecidos, aguardente, entre outros. Eram mandados para fora do país em navios negreiros e sofriam todos os tipos de maus tratos.

[…] Na grande lavoura, horários, tarefas, ritmo e turnos de trabalho eram todos determinados pelo proprietário e sua equipe”. O engenho, lugar de produção, era uma empresa que exigia devido sua complexidade vários trabalhadores “nunca menos de 50”. Existiam, as exceções, os pequenos engenhos que produziam “rapadura” ou “cachaça” para consumo interno da colônia e que funcionavam com número reduzido de escravos ou somente com mão de obras dos proprietários e de seus familiares. No século XVIII, “Por ocasião da corrida às minas de ouro e diamante descobertos na colônia portuguesa, deu-se a escassez de mão de obra escrava no agro manufatura açucareira. (NINA, 2010. p.65).

Quando o navio negreiro ancorava no Brasil, começavam novas negociações e os senhores de engenho realizava as trocas, buscando sempre pelos escravos mais fortes, mais robustos e apresentavam aparência de mais forte. Após serem trocados, os escravos eram entregues aos seus senhores que iniciava uma luta para impedir que os africanos fugissem. Com o passar dos anos e com a criação da Lei Áurea, o Brasil se tornou um país abolicionista, e a partir da abolição dos escravos iniciou a criação de várias outras leis em defesa dos trabalhadores.

Segundo a Organização internacional do Trabalho (OIT), “O Brasil é o melhor exemplo contra o trabalho forçado na América Latina”. A ação de fiscalização do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (PNTE) tem oferecido dados numéricos anualmente de pessoas liberadas do trabalho escravo. “Com isso, o Brasil atingiu 32.000 pessoas liberadas do trabalho forçado, desde o começo das atividades dos grupos de inspeção criados em 1995”. Vale lembrar que não estão incluídos nesse montante os trabalhadores estrangeiros em condições ilegais no país, a exemplo os bolivianos na cidade de são Paulo. (NINA, 2010. p. 138).

Através dos dispositivos constitucionais os trabalhadores começaram uma nova história, dessa vez buscando romper com outros tipos de escravidão, visando a luta pelos direitos fundamentais e o direito a dignidade humana.

Machado elucida que Habermas, em trabalho recente, considera que direitos humanos e dignidade da pessoa humana se alimentam mutuamente. Para ele, a dignidade é o elemento moral que alimenta os direitos humanos na sua fundamentação; e os direitos humanos, em sua aplicação no caso concreto, alimentam a dignidade, ao reafirmarem-na como critério geral, em confirmação à sua pretensão de universalidade. (MACHADO, 2011, p. 193).

Apesar do trabalho escravo se tornar ilegal em todo mundo, a escravidão continua se escondendo na atualidade, dessa vez usando algumas falhas e inconsistências da lei para garantir aos poderosos um negócio altamente rentável, que pode se fazer presente atualmente no tráfico de drogas, prostituição, exploração de crianças e adolescentes, acordos políticos, entre outros trabalhos simbolizados escravos.

Contudo, compreende-se que a história da terceirização ao trabalho escravo se encontra enraizado em toda a sociedade, uma vez que essas questões foram e continuam sendo discutidas na atualidade, tendo em vista que atualmente existem ações jurídicas que atuam em defesas das pessoas escravizadas em seus setores de trabalho.

3.2 A TERCEIRIZAÇÃO E AS CARACTERÍSTICAS DO TRABALHO ESCRAVO A palavra “terceirização” é um neologismo da palavra “terceiro” e, não está consignado na maioria dos dicionários. Para Giosa (2001),

A terceirização investe de uma ação mais caracterizada como sendo uma técnica moderna de administração e que se baseia num processo de gestão, que leva a mudanças estruturais da organização, a mudanças de cultura, procedimentos, sistemas e controles, capilarizando toda a malha organizacional, com um objetivo único quando adotada: atingir melhores resultados, concentrando todos os esforços e energia da organização para a sua atividade principal. Para tanto, o sucesso de sua aplicação está na visão estratégica que os dirigentes deverão ter quando de sua implantação nas organizações, de modo que ela se consolide como metodologia e prática.” (GIOSA, 1997, p.15).

No terciário da economia; outros, optaram pelo termo parcelarização para evitar que se trate o terceiro como um estranho, um desconhecido. O termo se popularizou, e hoje é conhecido nacionalmente como terceirização e no mundo internacional é denominado de “Outsourcing”.

OUTSOURCING (em inglês, “Out” significa “fora” e “source” ou “sourcing” significa fonte ou,  temos, fornecimento externo) é uma expressão inglesa que significa transferir para outras empresas a responsabilidade pela coordenação e execução de tarefas que não sejam o foco principal da atenção da organização, por não fazem parte do seu negócio principal. Ou seja, é a transferência das atividades conhecidas como atividades meio, e nunca as atividades fins (produto final), para uma empresa terceirizada. (MACHADO, 2011, p.11).

Com isso, a terceirização apoia o crescimento das empresas, visando sempre a produção ao seu favor, permitindo nova expansão e um bom desenvolvimento do capital, avançando seu reconhecimento em toda área mundial, sem limites.

A aplicação da terceirização como um instrumento de gestão inovadora tem contribuído para diversas mudanças estruturais, sistêmicas e comportamentais nos países do primeiro mundo, resultando em uma considerável eficácia administrativa. Com uma economia estável, o acompanhamento dos efeitos desta nova sistemática de gestão sobre os resultados torna-se mais preciso. No mercado brasileiro, mesmo com o cenário de turbulência em que as empresas estão inseridas, também é possível determinar as vantagens competitivas oriundas deste processo (GIOSA, 1997).

A terceirização traz em seu conceito uma ligação com o trabalho, onde as empresas desenvolvem parcerias e trocas de serviços visando resultados lucrativos para ambos os investidores. Como visto em tópicos anteriores, essa terceirização leva as empresas a contração de diversos trabalhadores, contratados com salários defasados e submetidos a humilhações, violência física, subordinação, entre outras formas de escravidão. Nesse sentido, referido autor define o trabalho escravo contemporâneo como sendo:

[…] aquele em que o empregador sujeita o empregado a condições de trabalho degradantes, inclusive quanto ao meio ambiente em que irá realizar sua atividade laboral, submetendo-o, em geral, a constrangimento físico e moral que vai desde a deformação do seu consentimento ao celebrar o vínculo emprega- tício, passando pela proibição imposta ao obreiro de resilir o vínculo quando bem entender, tudo motivado pelo interesse mesquinho de ampliar os lucros às custas da exploração do trabalhador. (SENTO-SÉ, 2001, p.21).

Diante desse conceito, podemos perceber que não há menor sinal de desaparecimento do trabalho escravo, mas sim a existência assevera em relação ao direito do trabalho. O que vimos, na verdade, é ausência de compromisso dos empresários em relação aos funcionários, onde os interesses particulares e a primazia do mercado, colocam em detrimento a pessoa humana e, o capital em detrimento do trabalho. O autor afirma que:

[…] equiparar conceitualmente trabalho escravo e trabalho análogo ao escravo é um profundo equívoco, pois abstrai a natureza específica do fenômeno contemporâneo, qual seja, a operação da coação do mercado – o moinho satânico de Polanyi (2000) – sobre o trabalho como agente de imposição de condições de uso da força de trabalho iguais àquelas vigentes em outros modos de produção. Em muitos casos, ocorrem condições piores do que as dos escravos, pois o exército industrial de reserva permite a reposição sem custos do trabalhador (na escravidão típica a reposição dependia da compra de escravo, desestimulando a destruição do ativo).(FILGUEIRAS, 2013, p. 12).

É possível compreender que crescimento da produção de uma empresa depende da necessidade de cada trabalhador, quanto mais desempenho, mas referências às necessidades físicas, cultural, social e política. Por mais que a falta de desemprego seja uma humilhação para muitos indivíduos que precisam se submeter a certas humilhações, é possível articular dignidade humana e lucratividade econômica. O primeiro passo é consciência educativa de seus direitos e buscar por esses princípios constituídos em leis.

Na verdade, o que temos em mente é que o trabalho surgiu para dá significado a humanidade e permitir que os indivíduos saibam valorizar os seus esforços e manter o equilíbrio de sobrevivência. Sociologicamente foi, efetivamente assim, sabendo-se que o trabalho era “coisa” de escravos, os quais, no fundo, pagavam seu sustento com o “suor de seus rostos”. Escravos e servos, historicamente sucedidos, eram os que podiam dedicar-se ao trabalho que, nas origens, eram sempre pesados. A produção de bens, por mais simples e, por vezes, ainda o são, é atividade do homem chamada trabalho que se evoluiu da escravidão ao contrato de trabalho (FERRARI, 1998).

A partir dessa citação, entende-se que o trabalho apresenta grande relevância para a vida do homem, uma atividade de responsabilidade que dignifica o homem e concede a oportunidade de melhorar sua vida social, deixando-o privado de condições materiais e a acesso às políticas de educação, saúde, habitação, trabalho, entre outros.

Espécie humana, de geração a geração, mantêm-se viva pelo trabalho, sob a forma de cooperação ou trabalho coletivo, determinando entre os indivíduos participantes relações sociais de ordem econômica, pela produção, distribuição e troca de produtos; de ordem ética, por normas religiosas, morais e jurídicas e regulam a vida de cada um em meio à corporação, classe ou sociedade. (FERRARI, 1998, p. 21-23).

Compreende-se, a partir do exposto, que a identidade do trabalhador na atual sociedade é excessivamente desvalorizada no que se refere as leis do trabalho, quando, na verdade, precisa se expor a vários tipos de trabalho escravos. Existe uma variedade de trabalho escravo atuante no Brasil, dentre eles podemos observar no quadro abaixo:

Quadro 1 – Fatos e Números Globais de Trabalho Forçado no Brasil

Em 2021, 49,6 milhões de pessoas viviam em situação de escravidão moderna (Isso significa que 1 em cada 150 pessoas vivendo no mundo). Desse total, 28 milhões de pessoas realizavam trabalhos forçados e 22 milhões estavam presas em casamentos forçados.
Em 2021, 10 milhões de pessoas a mais estavam em situação de escravidão moderna em comparação com as estimativas globais de 2016.
27,6 milhões de pessoas em trabalho forçado, 17,3 milhões são exploradas no setor privado; 6,3 milhões eram vítimas da exploração sexual comercial forçado e 3,9 milhões do trabalho forçado imposto pelo Estado.
Quase quatro em cada cinco vítimas de exploração sexual comercial forçado são mulheres ou meninas, com isso, mulheres e meninas representavam 4,9 milhões das pessoas vítimas da exploração sexual comercial forçada, e 6 milhões das pessoas em situação de trabalho forçado em outros setores econômicos, em 2021. 
Um total de 3,31 milhões de crianças são vítimas de trabalho forçado, o que representa 12% de todas as pessoas em situação de trabalho forçado. Mais da metade dessas crianças são vítimas da exploração sexual comercial.
O trabalho forçado atinge praticamente todas as áreas da economia privada. Os cinco setores responsáveis pela maior parcela do trabalho forçado são: serviços (excluindo trabalho doméstico), manufatura, construção, agricultura (excluindo pesca) e trabalho doméstico.

Fonte: GLOBO DA OIT, 2022.

A existência da diversidade de argumentos contidos nas normas brasileiras contribuído para impedir o aumento do trabalho escravo em todos os setores da sociedade. No Recurso Extraordinário n. 398.041, o Plenário do STF firmou a competência da Justiça Federal para processar e julgar o crime de redução análoga à condição de escravo.

Entendeu-se que quaisquer condutas que violem não só o sistema de órgãos e instituições que preservam, coletivamente, os direitos e deveres dos trabalhadores, atingindo-os nas esferas em que a Constituição lhes confere proteção máxima, enquadram-se na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto das relações de trabalho. Concluiu-se que, nesse contexto, o qual sofre influxo do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, informador de todo o sistema jurídico-constitucional, a prática do crime em questão caracteriza-se como crime contra a organização do trabalho, de competência da justiça federal (CF, art.109, VI). (STF. Plenário. RE 459510/MT, 2015 (Info 809).

Portanto, em direção oposta ao trabalho análogo à escravidão, ainda se tem muito a conquistar por meio das ações jurídicas, uma vez que o objetivo da Legislação Brasileira é defender os sujeitos e reconhecê-los em sociedade por meio do Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. Deve-se levar em consideração a existências de várias leis e normatizações que defendem esses sujeitos de serem expostos ao trabalho escravo, o que dá maior concretude aos termos da lei e traz mais segurança jurídica para todos os envolvidos.

4 TRABALHO ESCRAVO E O PRINCIPIO DA DIGNIDADE HUMANA

Conforme inicialmente abordado, o trabalho escravo sempre fez parte da história da humanidade. Surgiu como um fenômeno social moldado pelas suas caracterizações envolvendo homens e mulheres pobres, ignorantes, sensíveis socialmente e ligadas à família pelas vulnerabilidades inaceitáveis de uma sociedade injusta e democrática. O trabalho escravo continua presente em vários países que lutam contra esse mal, que ofende a dignidade humana e viola uma série de direitos humanos.

SENTO-SÉ (2001), define escravo com: Aquele que vive em sujeição ao empregador no que diz respeito a condições de trabalho degradantes, inclusive quanto ao meio ambiente em que irá realizar a sua atividade laboral, submetendo-se, em geral, a constrangimento físico e moral, que vai desde a deformação do seu consentimento ao celebrar o vínculo empregatício, passando pela proibição imposta ao obreiro de resilir o vínculo quando bem entender, tudo motivado pelo interesse de ampliar os lucros às custas da exploração do trabalhador.

A partir da promulgação da Constituição de 1988, deu-se o surgimento de algumas garantias aos direitos sociais, associadas a direitos trabalhistas e princípios jurídicos na defesa do homem, tornando essencialmente importante o estudo dos princípios para uma melhor compreensão dos ramos do Direito, tendo em vista, constituir as principais ideias de um sistema jurídico, conferindo-lhe sentido lógico e harmônico.

Com isso, compreende-se a necessidade de discutir os princípios dentro dos processos jurídicos em defesa dos alicerces para o direito das pessoas que são submetidas ao trabalho escravo. Sobre a definição de princípios é relevante mencionar o dizer de Tostes e Carvalho (1998, p. 13) expressando os princípios:

 […] se definem dogmas juspolíticos e filosóficos que irradiam por todo um sistema ou instituto, servindo de norte e diretriz para interpretação. Portanto, os princípios jurídicos são a base para fazer às leis, a jurisprudência, a doutrina e os tratados e convenções internacionais, uma vez que eles traduzem valores essenciais da Ciência Jurídica. (TOSTES e CARVALHO, 1988, p.13).

Conforme dito acima, os princípios visam orientar sistema ou instituto, e contribuir para melhorar o ordenamento jurídico, pautados em regras e normas que conduzem os estudiosos na área de direito a obter elementos importantes para o fechamento de suas ações e processo. Esses princípios devem ser dotados de autonomia visando a dignidade da pessoa humana.

Em meio a esses princípios gerais da Constituição de 1988 se encontra o princípio da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, uma vez que a personalidade humana deve ser respeitada como um direito fundamental. O princípio explica a “[…] primazia da pessoa humana sobre o Estado. A consagração do princípio importa no reconhecimento de que a pessoa é o fim, e o Estado não mais do que um meio para a garantia e promoção dos seus direitos fundamentais.” (SARMENTO, 2004, p. 111).

Através desse princípio os indivíduos podem reivindicar seus benefícios e liberdade, visando sempre à justiça, democracia e igualdade, além de aprimorar a base moral e política do ser humano. Esses direitos devem abranger o mundo, uma vez que cada cultura traz com ela as marcas da justiça e das lutas históricas. Cada povo tem uma maneira de lutar, de exigir e de defender aquilo que acredita, buscando viver livremente em sociedade com dignidade.

Sarlet (2009) afirma que se deve entender o princípio da dignidade da pessoa humana como o princípio que está na base do estatuto jurídico dos indivíduos, havendo de ser interpretado como individual e universal e a cada homem como se autônomo fosse, estando, ainda, na base de todos os direitos constitucionalmente consagrados: direitos e liberdades tradicionais, de participação política, direitos dos trabalhadores e de participação social. Mas, essencialmente, alguns direitos assumem, segundo o autor, valoração de primeiro grau da ideia de dignidade: o direito à vida, à liberdade física ou de consciência, a generalidade dos direitos pessoais e que se constituem em atributos jurídicos essenciais da dignidade dos homens concretos, assim possuindo o objetivo de proteger a dignidade essencial da pessoa humana. 

Neste sentido, o princípio da dignidade humana defende os indivíduos que estão submetidos ao trabalho escravo, tendo em vista que esse princípio se torna primordial para a ordem jurídica e respeito aos seres humanos. Os princípios aqui se tornam essenciais, a fim de garantir o Direito do trabalhador.

Como visto, os direitos são respaldados por leis e devem ser seguidos como competência constitucional e assim, garantir a proteção jurídica aos seres humanos. No Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – A soberania;

II – A Cidadania;

III – A dignidade da pessoa humana;

IV – Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – O pluralismo político (CF/88) (Grifos Nossos).

Esses direitos defendem os direitos humanos e sua integridade física e moral, assegurando-lhes respeito e existência, bem como, dispondo dos direitos de liberdade de ir e vir em suas ações e práticas de trabalho. Deve-se levar em consideração que para a concretização da dignidade humana, é importante que o trabalho seja valorizado, tendo em vista que é por meio das normas trabalhistas que o indivíduo é reconhecido e a aplicação dessa norma possibilita garantir seus direitos conforme as leis.

Assim, o “trabalho não violará o homem enquanto fim em si, desde que prestado em condições dignas. O valor da dignidade deve ser o sustentáculo de qualquer trabalho humano”. E também assevera que onde “o direito ao trabalho não for minimamente assegurado, não haverá dignidade humana que sobreviva” e que a proteção conferida pela Constituição da República de 1988 refere-se ao trabalho digno. (DELGADO, 2006).

O Princípio da Dignidade Humana traz em seu ordenamento jurídico a base da liberdade, da justiça e da paz, visando o valor central da sociedade e defendendo a ordem juspolítica e social em torno do ser humano. Ela prioriza os valores sociais como o trabalho e o bem-estar dos indivíduos. Complementando a ideia disposta no artigo 4º, cita-se o artigo 23, segundo o qual,

Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.

Toda a pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. toda pessoa tem direito de organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses. (ONU, 1948, Art. 23).

  1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
  2. Toda a pessoa, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Toda pessoa que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. toda pessoa tem direito de organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses. (ONU, 1948, Art. 23).

Conforme o artigo citado, o Princípio da Dignidade Humana busca validar e reconhecer a dignidade do homem, além de viabilizar condições necessárias para que os indivíduos não sejam excluídos e nem humilhados em sociedade. No que se refere ao trabalho, esse princípio conduz o homem ao valor social e concede a ele o direito de não ser escravizado. Nesse aspecto, aponta Rafael da Silva MARQUES que:

[…] a valorização do trabalho humano não apenas importa em criar medidas de proteção ao trabalhador, como ocorreu no caso do Estado de Bem-Estar Social, mas sim admitir o trabalho e o trabalhador como principal agente de transformação da economia e meio de inserção social. Com isso o capital deixa de ser o centro dos debates econômicos, devendo-se voltar para o aspecto, quem sabe subjetivo, da força produtiva humana. […] A livre iniciativa, bem compreendida, além de reunir os alicerces e fundamentos da ordem econômica, também deita raízes nos direitos fundamentais. É daí que surge a observação de que as leis restritivas da livre iniciativa, vale dizer, aquelas que asseguram o acesso de todos ao livre exercício de profissão ou ofício, devem observar o conteúdo essencial dos direitos fundamentais, funcionando como uma espécie de limite negativo ao legislador, fazendo valer o princípio da dignidade da pessoa humana, art. 1º, III, da Carta de 1988 […]. (MARQUES, 2004, p.47).

Conclui-se, a partir dessa citação, que o princípio da dignidade humana valoriza o trabalho como direito social-fundamental no ordenamento jurídico brasileiro, exigindo, portanto, proteção e garantia dos direitos dos indivíduos escravizados pelo trabalho. Ressalta-se que a Constituição elencou por meio de rol exemplificativo a busca a defesa de direitos ao trabalho escravo, todavia a existência de vários artigos fora incluída, além de diversos dispositivos legais com o intuito de defender o trabalho análogo ao escravo.

5 APLICAÇÃO DA LEI EM NOTRABALHO ANÁLOGO AO ESCRAVO

A Constituição de 1988 é uma das grandes mudanças que surgiu para consolidar a democracia, e que garante o trabalho como um direito. Em seu artigo 6º, designa o trabalho como um direito social fundamental, a par de estatuir, como fundamento da República Federativa do Brasil, “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (art. 1º, IV). Dispõe, ainda, ser o trabalho o fundamento da ordem econômica (art. 170, caput) e a busca do pleno emprego um de seus princípios reitores (art. 170, VI). Ademais, o art. 5º, § 1º, assegura a aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, inclusive dos direitos sociais. (SARLET, 2006).

O trabalho contribui para a formação do homem e concedem aos mesmos direitos de liberdade, independência e formação histórica na vida Social. A produção através do trabalho garante ao ser humano uma relação social com outros indivíduos e no meio em que vive, garantindo crescimento específico, compreensão, mas com a própria natureza da existência humana.

Neste sentido a CF também defende os direitos dos trabalhadores análogos ao escravo, assegurando a eles o respeito à integridade física e moral, além de que a Lei 10.803/2003, traz em seu Art. 149 o Código Penal que estabelece penas aos indivíduos que cometer o crime que configura condição análoga à de escravo.

“Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer o submetendo a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer  o sujeitando a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:
Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. § 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem”.

Ainda sobre o Código Penal em defesa do trabalho escravo, o Art.149 A, prever o crime de tráfico de pessoas, nos seguintes termos:

Art. 149-A.  Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:

I – Remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo; II – Submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; III – submetê-la a qualquer tipo de servidão; IV – Adoção ilegal; ou V – Exploração sexual. Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. § 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se: I – O crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las; II – O crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência; III – o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou IV – A vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional. § 2º A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.

Esse entendimento, traz aportes jurídicos em defesa do indivíduo escravizado no trabalho, além de descrever a pena para o sujeito que cometeu o ato de violação de direitos dos trabalhadores. Outro meio que a Lei utiliza para proteger o trabalhador, se encontra no Art. 203 do Código Penal:

A Praticar, reiteradamente, contra o trabalhador ato hostil capaz de ofender a sua dignidade e causar-lhe dano físico ou psicológico, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de um a dois anos. (BRASIL, 1940, Art. 203).

A finalidade da lei é preservar a integridade psicológica, física, social e econômica do trabalhador, contra toda e qualquer forma de trabalho escravo. Ao proteger os trabalhadores em relação ao aliciamento, de um local para outro do território nacional é definido pelo artigo 207 do Código Penal, e consiste em aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional, sob pena de detenção de um a três anos, e multa. No parágrafo 1º prescreve que incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. No parágrafo 2º a pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física, ou mental. (BRASIL, 2003).

Assim, nota-se que por meio da Lei 10.803/2003, houve uma preocupação do legislador em delinear os paragráfos acima citados. No tocante do paragráfo 2º que dispõe que o poder público deve exigir o aumento da pena quando o trabalhador for menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou com deficiência.

 A lei menciona e garante ao homem o direito ao trabalho com o propósito de alcançar recursos necessários para sua sobrevivência e desfrutar assim de uma vida digna, com o direito de ir e vir. Para além da discussão sobre o juízo competente, o Supremo Tribunal Federal também já se posicionou de maneira contundente, reconhecendo que a restrição de liberdade de ir e vir não é elemento necessário para a caracterização do trabalho escravo contemporâneo.

EMENTA PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA A DE ESCRAVO. ESCRAVIDÃO MODERNA. DESNECESSIDADE DE COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR. DENÚNCIA RECEBIDA. Para configuração do crime do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se prove a coação física da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima “a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva” ou “a condições degradantes de trabalho”, condutas alternativas previstas no tipo penal. A “escravidão moderna” é mais sutil do que a do século XIX e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos. Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisa e não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mas também pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno impacta a capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação. Isso também significa “reduzir alguém a condição análoga à de escravo”. Não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo. Se a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se os trabalhadores são submetidos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes de trabalho, é possível, em tese, o enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal, pois os trabalhadores estão recebendo o tratamento análogo ao de escravos, sendo privados de sua liberdade e de sua dignidade. Denúncia recebida pela presença dos requisitos legais. (BRASIL, 2012).

A partir dos Arts. citados acima, o trabalhador é assegurado por meio da legislação e descreve a pena de detenção e multa para quem comete a ofensa. Caso os empresários venham ser condenados mediante o Código Penal e nos Art. 149, 203 e 207, serão obrigados a ressarcir monetariamente os trabalhadores submetidos ao trabalho forçado e escravo. Desta forma, o Código Civil, por sua vez, no seu artigo 932, inciso III, revela que o empregador também tem a responsabilidade de reparação civil por seus empregados.

As sanções de natureza civil decorrem da Constituição Federal (art. 5º, V e X), do Código Civil (art. 927), da Lei nº 7.347/1985 (LACP) e da Lei nº 8.078/1990 (CDC), traduzindo-se no dever de reparar os danos morais individuais e coletivos. As sanções de natureza administrativa estão previstas na CLT, na Lei nº 5.889/1973, que estatui normas reguladoras do trabalho rural, no Decreto nº 73.626/1974, que regulamentou a referida lei, e na Portaria nº 86/2005, do MTE, que aprovou a Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho na Agricultura, Pecuária, Silvicultura, Exploração Florestal e Aquicultura (NR 31), as quais estipulam multas administrativas para o descumprimento da legislação trabalhista e de segurança e saúde no trabalho rural, aplicáveis pelas autoridades administrativas do MTE (SILVA 2010; P- 208).

Conforme dito acima, a sanção têm como função orientar sistema ou instituto, servem ainda como verdadeiros alicerces para o direito. As leis são as bases para concretizar os direitos e traduzir os valores essenciais do poder jurídico.

Vale ressaltar que tramita no Congresso Nacional, desde 2003, Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 438/2001 que prevê que os donos percam suas terras onde for identificado trabalho escravo e que as mesmas sejam distribuídas entre aos agricultores da propriedade. “Esta PEC, já aprovada pelo Senado Federal, aguarda votação em segundo turno pelo plenário da Câmara dos Deputados”. Como bem define a Constituição Federal “no seu artigo 184, que compete a União desapropriar por interesse social, para fins da reforma agrária, o imóvel rural que não cumpra sua função social, (…) que somente é cumprida quando atendam e regulam as relações de trabalho e bem-estar do trabalhador”. Se o problema da escravidão persiste, se existe a lei, porque será que demora tanto para ser aprovada? (NINA, 2010. p.143).

De acordo a PEC, os donos das terras devem perder suas propriedades assim que for identificado a presença de trabalho escravo, e que os mesmos devem responder por suas ações violentas. O que observa é que mesmo com a existência de tantas leis, ainda existe uma demora imensa na resolução dos crimes de trabalho escravo.

Apesar de todos os esforços contra o trabalho escravos, o fato é que na atualidade o trabalho escravo se apresenta de forma camuflada, mantendo inúmeras trabalhadores aprisionados em razão de trabalho forçado. Por exemplo, no Brasil, como foi a última nação do mundo ocidental a abolir o trabalho escravo oficialmente, ocorrendo só final dos meados do século XIX, o trabalho escravo de forma camuflada é a inda mais intensa (BRASIL, 2013). Segundo dados do índice da escravidão global, elaborado pela Organização não Governamentais (ONGs) ligados à Organização Internacional do Trabalho (OIT), mais de 200 mil trabalhadores no país vivem em regime de escravidão.

Mediante o exposto acima, o papel do Ministério Público, é notável para uma atenção maior sobre esses crimes, tendo em vista que o trabalho é um meio de sobrevivência do homem, e se não existir uma dignidade neste contexto, os indivíduos vão continuar sofrendo ou até morrer através da escravidão no trabalho. O trabalho escravo trata-se de crime de várias condutas, não importado se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo, descritas no tipo penal, o mesmo deverá responder por seus delitos. E isso requer soluções e aparato jurídico o mais urgente possível.

Diante disso, a Justiça do Trabalho tem o dever institucional de processar e julgar as ações em que são partes os trabalhadores, as pessoas jurídicas os seus representantes legais ou prepostos, nos crimes previstos no código penal associados à exploração da mão de obra, com a possibilidade de tramitação de ações trabalhistas mistas com matéria penal, administrativa e trabalhista, trazendo economia processual e reduzindo a impunidade na aplicação conjunta das sanções de pena restritiva de direito e liberdade, pagamento de multa relacionada à fiscalização tutelar do trabalho e a condenação no pagamento dos consectários trabalhistas decorrentes de fraude ou abuso de poder de direção do empregador, inclusive, nos casos de dano moral ou existencial (SOUZA e LEBRE, 2017, apud Lebre, 2016).

A partir dessas afirmações é possível compreender que o direito ao trabalho vai muito além da formação de personalidade, construção da sociedade e princípio da igualdade. O Trabalho é, na verdade um direito essencial a vida humana e contribuição para sua formação social do homem, visando sua vida, suas necessidades e sua concepção de ser humano.

Sendo assim, percebe-se que a criação de direitos como forma de instrumento de luta é imprescindível, no sentido de reforçar a forma democrática do direito do trabalho no Brasil. Dessa forma, pressupõe-se que o entendimento aumente reforçando a ideia de adaptar os direitos humanos ao direito do trabalho, para consolidar ações em prol dos direitos sociais do trabalho. Na verdade, todos os direitos humanos compõem um complexo integral e indivisível, onde os diferentes direitos são interdependentes entre si e estão in-ter-relacionados (PIOVESAN, 2022).

Por fim, o referido estudo, menciona que o trabalho escravo existe e precisa que as autoridades tomem providências e medidas cabíveis, assegurando aos trabalhadores a concretização de seus direitos respaldados no Código Penal.

6 CONCLUSÃO

Após a realização do presente trabalho e a análise acerca da relação da terceirização com o trabalho escravo, foi possível notar que o Trabalho Escravo ainda existe no Brasil e no Mundo, apresentado de forma diferente, sobre tudo desafiando os direitos trabalhistas dos indivíduos.

O trabalho, tão somente visto como uma ação de produção que leva o homem a desenvolver suas atividades com fins profissionais, buscando pelo aprimoramento e o reconhecimento dentro da sociedade. No Brasil, principalmente a partir do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o Código Penal tipifica diversos crimes, incluindo o trabalho escravo.

O Código Penal, conforme se buscou demonstrar no estudo, em seus vários dispositivos tratam acerca do bem jurídico que estabelece os tipos penais e suas respectivas punições, visando garantir a ordem e a segurança na sociedade, inclusive capitulando as condutas que venham causar danos aos indivíduos escravizados. Tal capitulação, ainda se encontra respaldada pela Lei 10.803/2003, que aborda as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades abusivas ao trabalho.

Nesse sentido, foi possível se constatar, frente à problemática apresentada, que em relação ao trabalho escravo, tanto o Código Penal como as demais normas esparsas no ordenamento jurídico, admite e prevê o trabalho escravo como um crime e os infratores devem sofrer sanções penais. A Lei estabelece requisitos para responsabilizar a pessoa jurídica. Assim, havendo a caracterização do crime, as penas específicas para a pessoa jurídica são: de prisão de 2 a 8 anos e multas pela violência causada.

Dessa maneira, ao abordar todos os objetivos apresentados ao estudo, compreende-se que existe o cometimento de crime no que se refere ao trabalho escravo e que se torna necessário a aplicação da lei, visando instrumentos cabíveis em defesa dos indivíduos escravizados. Para tanto, ainda, faz-se necessário que o poder público mantenha-se atento, criando outras medidas se preciso for para combater as formas desumanas vivenciadas por muitos trabalhadores, tendo em vista que o papel da lei é garantir a democracia e viabilizar os direitos de todos.

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Edmundo Ferreira dos Santos – Graduando em Direito pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA, em Itamaraju (BA), E-mail: conasan@outlook.com1
José Ferreira Filho – Mestre em Educação na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA, em Itamaraju (BA).2