TRABALHANDO A LIBERDADE: UMA ANÁLISE DO PROJETO DE RESSOCIALIZAÇÃO DO CENTRO DE DETENÇÃO FEMININO DE MANAUS/AM

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10854847


Amanda Laize da Costa Bastos1:
Lidiany de Lima Cavalcante2


RESUMO 

Este trabalho tem a finalidade de apresentar o desenvolvimento da pesquisa de campo que fala sobre a ressocialização como um processo que visa capacitar e reintegrar socialmente o indivíduo privado de liberdade até o momento. O mesmo consiste na realização de cursos de capacitação, garantia de escolaridade referente aos ensinos fundamental, médio e também superior, vagas de emprego remunerado e não remunerado, etc.  

Portanto, esta pesquisa tem como objetivo geral, analisar o projeto “Trabalhando a Liberdade” no processo de ressocialização na vida de mulheres encarceradas no Centro de Detenção Feminino (CDF) de Manaus, os objetivos específicos, averiguar os critérios de inserção e as atividades desenvolvidas pelo projeto “Trabalhando a Liberdade”; Identificar o posicionamento das mulheres encarceradas sobre o projeto de ressocialização e apontar as contradições presentes no contexto de ressocialização das  detentas na cidade de Manaus.  

Optamos pela pesquisa de campo, que aconteceu na Secretaria de Estado de Administração Penitenciária do Amazonas, através de questionário que foi aplicado ás mulheres privadas de liberdade nesse Centro de Detenção, os dados coletados através desse instrumental teve uma abordagem quanti-qualitativa para embasar a construção da pesquisa. Através das respostas do instrumental conclui-se que 20% das mulheres que participaram da pesquisa estão entre 49 anos, o restante de 80%, encontram-se em variadas idades. 20% estão há 10 meses participando do projeto, mais 20% há 3 anos, e o restante de 60% estão em média de tempos variados. 90% dessas mulheres executam atividades de serviços gerais, 30% atividades de decoradoras, o restante equivalente a 50%, exerce diferentes tipos de atividades. 100% das participantes da pesquisa acreditam que o projeto melhorou o convívio das mesmas dentro do cárcere privado, advindo dessa porcentagem (100%) também acreditam que o projeto proporcionou novas habilidades para as mesmas. 90% avaliaram o projeto como ótimo, 10% como bom. Por isso espera-se que o processo de Ressocialização seja eficaz na produção de sujeitos capazes de reconviver em sociedade que respeitam direitos e limites na Cidade de Manaus. 

Palavras-Chave: Ressocialização; Mulheres Encarceradas; Reeducandas; Trabalhando a liberdade; 

ABSTRACT

This work aims to present the development of field research that talks about resocialization as a process that aims to empower and socially reintegrate the individual deprived of liberty until now. This consists of carrying out training courses, guaranteeing education for primary, secondary and higher education, paid and unpaid job vacancies, etc.

Therefore, this research has the general objective of analyzing the project “Working on Freedom” in the process of resocialization in the lives of women incarcerated in the Women’s Detention Center (CDF) of Manaus, the specific objectives, investigating the inclusion criteria and the activities developed for the “Working on Freedom” project; Identify the position of incarcerated women on the resocialization project and point out the contradictions present in the context of resocialization of inmates in the city of Manaus.

We opted for field research, which took place at the State Secretariat for Penitentiary Administration of Amazonas, through a questionnaire that was applied to women deprived of liberty in this Detention Center, the data collected through this instrument had a quantitative-qualitative approach to support the construction of the research. Through the instrument responses, it was concluded that 20% of the women who participated in the research were between 49 years old, the remaining 80% were at different ages. 20% have been participating in the project for 10 months, another 20% for 3 years, and the remaining 60% have been participating in the project for varying lengths of time on average. 90% of these women perform general service activities, 30% work as decorators, the remainder equivalent to 50%, carry out different types of activities. 100% of the research participants believe that the project improved their coexistence within private prison, resulting from this percentage (100%) also believe that the project provided them with new skills. 90% rated the project as excellent, 10% as good. Therefore, it is expected that the Resocialization process will be effective in producing subjects capable of coexisting in a society that respects rights and limits in the City of Manaus.

Keywords: Resocialization; Incarcerated Women; Re-educated; Working on freedom;

INTRODUÇÃO 

A pesquisa em questão fala sobre como a ressocialização de encarcerados do sistema prisional no Brasil tem sido um desafio aos profissionais que atuam na área da segurança pública e em unidades prisionais. A reintegração do condenado na sociedade após o período cumprido de pena tem se mostrado como uma utopia, uma vez que, na prática, o sistema carcerário no país apresenta grandes contradições e traços de precariedade, insalubridade e superlotação, onde se espraiam as mais variadas expressões da questão social, a exemplo da violência, drogadição, facções criminosas etc., no entanto, o processo de reintegração e ressocialização são condições sine qua non para a melhoria de vida dessas mulheres. Tal debate precisa ser fomentado na sociedade, haja vista que esta temática ainda é tratada como um tabu, envolto de discriminação, preconceito e estigmas pela sociedade. A sua importância, portanto, nasce a partir do reconhecimento da ressocialização como sendo um mecanismo fundamental para reintegração, capacitação e educação das apenadas, dando lhes novas oportunidades de trabalho e assegurando o abatimento de dias com redução do tempo de encarceramento, a partir da adesão ao projeto de remição de pena. 

O interesse pela temática foi motivado pela inserção desta acadêmica e experiência desenvolvida em campo de Estágio no Sistema Prisional. As tarefas desenvolvidas enquanto estagiária e as observações suscitadas naquele Campo, bem como as escassas produções acadêmicas sobre a temática na Região Norte, constatada pela Revisão de Literatura, acirrou o interesse para o desenvolvimento da pesquisa. 

Nesse contexto, além do interesse pessoal e acadêmico, o estudo exprime sua relevância ao trazer contribuições sociais com dados que desvelam a realidade sobre o projeto de ressocialização do Centro de Detenção Feminino na cidade de Manaus, assim como para o adensamento das produções teóricas sobre a temática, a partir do recorte local, de interesse aos discentes e profissionais no âmbito do Serviço Social brasileiro, amazonense e áreas afins. O presente trabalho é composto pela introdução, fundamentação teórica, metodologia, discussão dos resultados e considerações finais. 

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 

O presente referencial teórico metodológico sobre o sistema carcerário no Brasil consiste no resgate e apresentação das produções bibliográficas sobre a temática com vistas à delimitação do objeto a ser investigado. Nesse contexto, este estudo objetiva a materialização do projeto de pesquisa que ensejará o Trabalho de Conclusão de Curso, requisito obrigatório para a obtenção do título de bacharel em Serviço Social pela Universidade Federal do Amazonas – UFAM. 

Nesse sentido, tencionando a priori uma aproximação da temática, são apresentados cinco (5) produções em forma de artigos científicos trazidos por sites especializados com especificidades, locus, metodologia e abordagem teórica diferenciadas. 

A obra intitulada A ressocialização no sistema prisional brasileiro I (OLIVEIRA, 2018), discorre sobre o processo de ressocialização no âmbito sistema prisional brasileiro e ressaltando as contradições existentes nessa organização estatal que produz e reproduz a estigmatização de pessoas, atingindo ambos os sexos que se encontram inseridos nesse sistema. A autora menciona, ainda, a centralidade dos preceitos inscritos na Lei de Execução Penal – LEP, o qual acaba tornando um pesadelo nas celas de grandes presídios do Brasil. Nesse contexto, Oliveira (1990, p. 16) argumenta: 

O aspecto humano, a finalidade educativa, da pena, buscando   recuperar   o   condenado   para uma   inserção reintegradora do mesmo meio social, procurando não só a defesa da sociedade como colocar um elemento produtivo e reeducando no convívio com seus semelhantes. 

Essa crítica vai de encontro à finalidade da lei: a reintegração do condenado na sociedade após o período cumprido de pena que se mostra na realidade como uma utopia, uma vez que, na prática, o sistema carcerário no país traz sinais fortes de precariedade, insalubridade e superlotação, onde se espraiam as mais variadas expressões da questão social, a exemplo da violência, drogadição, facções criminosas etc., sendo, portanto, o processo de reintegração social algo mais amplo e não se reduz simplesmente, ao cumprimento da lei. O estudo em formato de monografia com pesquisa bibliográfica, realizado no ano de 2018, explicita a ineficácia da aplicabilidade da Lei de Execução Penal a partir da realidade vivenciada nas penitenciárias brasileiras e as dificuldades dos encarcerados no que se refere à reinserção na sociedade, devido ao cumprimento da pena ao que são submetidos. 

Em A ressocialização no sistema prisional brasileiro II (GARCIA, 2016), constata-se a centralidade do corpo técnico, profissional e interventivo no âmbito das questões criminalísticas do sistema prisional brasileiro. Realiza-se, ainda, uma breve analogia às orquestras, onde o maestro necessita de sua banda, este corpo profissional dispõe de um caráter interdisciplinar, abarcando profissionais fundamentais para atuação junto ao corpo prisional, sendo estes: Profissionais da Saúde, Profissionais Jurídicos, Profissionais Pedagógicos e etc. Partindo desse pressuposto, faz- se necessário considerar que a atenção ao público do sistema carcerário, mesmo que de forma precária e a curtos passos, vem ocorrendo e ganhando corpo institucionalmente. 

Esta pesquisa, mencionada acima, delineia-se sob a perspectiva de revisão bibliográfica com a utilização de livros, pesquisas acadêmicas na internet, jornais e demais meios de comunicação digitais, onde Garcia (2016) conclui que o caráter socioeducativo das penas não vem atendendo à sua finalidade de reeducação e ressocialização dos apenados, uma vez que estes se encontram em prisões superlotadas, muitas vezes, insalubres e vivem esquecidos à margem da dignidade mínima do indivíduo. 

O autor em epígrafe enfatiza, ainda, que são diversos os fatores que contribuem para o agravamento da crise do sistema prisional brasileiro, tais como o preconceito, a exclusão social alimentada pelo sensacionalismo utilizado pelas grandes mídias, bem como a ausência de políticas públicas destinadas a ressocialização efetiva do apenado no sentido da garantia de dignidade e reinserção na sociedade, pois, a priori, a finalidade da pena, para além da punição, é a ressocialização efetiva. 

No entanto, Greco (2011, p. 443) afirma que parece que a “sociedade não concorda, infelizmente, pelo menos a primeira vista, com a ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, o impede de retornar ao normal convívio em sociedade”, partindo desta sentença, pode-se afirmar que daí emanam as inúmeras contradições existentes no processo de ressocialização das pessoas em situação de privação de liberdade. 

O artigo Ressocialização: O desafio da Educação no Sistema Prisional Feminino (MARTINS, 2008), por sua vez, problematiza as desigualdades emanadas do sistema capitalista ao longo dos anos e o surgimento de seus impactos negativos na sociedade, deste modo, são adquiridas as estratégias de sobrevivência das pessoas pobres. Cunha (2010) se utiliza do autor em epígrafe para nos ensinar que; 

esse desenvolvimento anômalo não se manifesta apenas nas provações que produz e dissemina. Manifesta-se, também, nas estratégias de sobrevivência por meio das quais os pobres teimam em fazer parte daquilo que não os quer, senão como vítimas e beneficiárias residuais de suas possibilidades. Nessas estratégias nem sempre compatíveis com o bem comum, no recurso ilegal e ao antissocial por parte das vítimas, a sociedade inteira é alcançada e comprometida nas compreensíveis ações de sobrevivência daqueles aos quais ela não oferece a apropriada alternativa de vida. Porque, não nos iludamos, o capitalismo que se expande à custa da redução sem limites dos custos do trabalho, debitando na conta do trabalhador e dos pobres o preço do progresso sem ética nem princípios, privatiza ganhos nesse caso injustos e socializa perdas, crises e problemas sociais. Por diferentes caminhos, essas deformações se disseminam, penalizando a todos não só alguns, até mesmo aos principais beneficiários desse modo de produzir e acumular riquezas (MARTINS, 2008 p. 10- 11). 

Sob a perspectiva da autora, a criminalidade e o cometimento de atos infracionais estão também ligados a baixa escolaridade da população carcerária feminina, o que leva à reflexão sobre o papel da educação e qual sua função no processo de ressocialização. Martins, (2008) conclui, no seu estudo de caráter bibliográfico, que a abordagem da temática de ressocialização, sob o prisma dos direitos humanos, tem como finalidade dar ênfase à discussão na atualidade sobre o redimensionamento da política prisional e o grau de sua efetividade na redução dos danos sociais. 

A autora afirma que a falta de políticas públicas para auxiliar as reeducadas pós-cumprimento da pena se mostra como uma preocupação daqueles que trabalham com e em prol desse público, uma vez que lhes faltam oportunidades de trabalho, vida digna, fazendo com que essas mulheres se envolvam com o tráfico e outras atividades ilícitas, tornando evidente que somente políticas educacionais de valorização dos sujeitos e de sua autonomia, reduziria a possibilidade de retorno às práticas de delitos, ou seja, políticas públicas eficazes do ponto de vida da inserção social, econômica e política dessas mulheres. No entanto; 

o que verificamos hoje é que os delitos cometidos pela classe social mais abastada não são penalizados, pois esta possui recursos para sua defesa. A prisão hoje é uma instituição de criminalização da pobreza, uma vez que somente aquele que não possui conhecimento e recursos materiais para se defender é que acaba penalizado, muitas vezes com sentenças e julgamentos tardios e medidas punitivas severas à natureza do delito […] enquanto a sociedade não encarar os problemas que ela mesma cria, buscando mecanismos de humanização e inserção social de todos, por meio da redução da desigualdade social e econômica e garantia de oportunidades dignas, o problema da violência continuará penalizando a todos, inclusive a esta mesma sociedade que se sente confortável em seu mundo de muros e câmeras de segurança, com medo de tudo que está fora dele (CUNHA, 2010, p. 176). 

No artigo Ressocialização, Trabalho e Resistência: Mulheres Encarceradas e a produção do sujeito delinquente (MOULIN et. al., 2019), os autores buscam enfatizar o crescimento significativo da população carcerária brasileira nos últimos anos enfocando o público feminino, utilizando enquanto referência teórica Michel Foucault com o objetivo de evidenciar    as    práticas, funções    econômicas    e    políticas    que são manifestadas nas falas das entrevistadas assim como também suas subjetividades e aspectos identitários. 

Através deste estudo que consiste em revisão bibliográfica com observação empírica, tornouse possível identificar a existência de um conceito chamado dispositivos disciplinares e biopolíticos que evidenciam a transformação do indivíduo em sujeito, ou seja, quando um indivíduo independente do sexo biológico (homem ou mulher) adentra uma prisão, acontece a transformação do ambiente que se torna um espaço de produção subjetiva, a partir disto, o sujeito se materializa em cada pessoa e logo vem à tona a sua identidade e suas particularidades. 

Deste modo, de acordo com os autores, é inevitável o processo organizacional tendo em vista de que o mesmo é de suma importância dentro dessa realidade e é assim que estes dispositivos são formados, por um conjunto de ideias, cores, crenças, culturas e etc. […]     heterogêneo     que    engloba    discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo. O dispositivo é a rede que se pode estabelecer entre estes elementos (FOUCAULT, 1979, p. 244)

Entretanto, dentro da prisão estão mulheres com variadas histórias de vida enterradas e assoladas na maioria das vezes pelo tráfico de drogas, nesse sentido, dentro do sistema são incitadas ao trabalho com intuito de configura-las socialmente e a si mesmas, apesar de ser constatada uma certa resistência das apenadas no que diz respeito a adesão aos projetos de ressocialização, cada uma com suas particularidades, habilidades individuais e únicas. Em realidade, são sujeitas que nunca se renderão totalmente a um sistema frágil e viciado, não criativo, e sistematizado. 

Desse modo, torna-se fundamental que sejam direcionados investimentos na capacitação de profissionais que atuam dentro do sistema penitenciário e que saibam lidar com esse público específico, uma vez que dentro deste ambiente o preconceito e a diferença no tratar com as apenadas perduram, além das violências enraizadas na história das mulheres. Os autores concluem, por sua vez, que; 

sobre o caráter relacional dos dispositivos disciplinar e de segurança, observaram-se três formas de relacionamento: a) apesar de terem diferentes lógicas de funcionamento, os dispositivos disciplinar e de segurança agem de forma relacional e conjunta sobre as presas, mas de modo não hierárquico; b) os elementos ditos (regras do presídio, leis, comunicados) e não ditos (espaços, tempo, pulseiras, violência) que formam e fazem parte de cada dispositivo se relacionam entre si; e c) um dispositivo somente obtém sucesso em sua empreitada se estabelecer uma relação com os indivíduos que intenciona transformar em sujeitos, sendo que concomitantemente é afetado e afeta essa relação. Assim, o uso dos dispositivos como forma de análise das relações de poder possibilitou entender a dinâmica dos processos de organizing no presídio estudado, demonstrando as dificuldades de manter o pleno controle, permitindo, ao mesmo tempo, a análise tanto das estratégias de poder quanto de suas formas de resistência, rompendo com a dicotomia estrutura/agência. 

Em Significados da Ressocialização para Agentes Penitenciárias em um uma Prisão Feminina: Entre o Cuidado e o Controle, Barcinski et. al. (2017) ao realizar sua pesquisa utilizando a técnica de análise crítica do discurso com entrevistas semiestruturadas, identificou-se os significados contraditórios atribuídos por esta agente ao processo de ressocialização, nos explicitando a ambiguidade e as contradições que existem nas relações interpessoais de agentes penitenciárias e mulheres encarceradas. 

Segundo os autores, de um lado predomina o espírito acolhedor, do outro, punidor, impactando de forma direta nos processos de ressocialização das mesmas, uma vez que o ambiente em que a indivíduo- a está inserida, a modifica na forma comportamental. Na visão da agente entrevistada, através de suas falas, podemos perceber que além do serviço prestado ao trabalho, ela leva consigo uma preocupação, um olhar humanizado e ao mesmo tempo repressor. 

Na opinião da agente o processo de ressocialização depende mais do querer das mulheres privadas de liberdade, do que dos métodos e processos que são utilizados pelo sistema carcerário em função de reeducação e, embora tal crítica não tenha sido aprofundada no discurso da participante, entende-se que o fracasso ou as dificuldades inerentes ao processo ressocializador deva também ser creditado a uma estrutura social que obstaculiza as possibilidades reais de reinserção social. Portanto, ressocializar seria simultaneamente o resultado de esforços pessoais (das presas e das agentes) e de uma configuração social mais justa e igualitária. 

METODOLOGIA 

No que tange à abordagem teórica, optou-se pelo materialismo histórico-dialético, ou seja, uma concepção crítica da realidade, tendo em vista que a vertente materialista histórico dialética é uma abordagem metodológica que oportuniza uma leitura ampla da sociedade em sua totalidade e historicidade, e conforme nos ensina Netto (2001, p. 46) a respeito da análise marxista, esta expressa o caráter explorador do regime do capital e nos permite “muito especialmente, situar com radicalidade histórica a ‘questão social’, isto é, distingui-la das expressões derivadas da escassez nas sociedades que precederam a ordem burguesa”. Nesse sentido, a abordagem dos dados pauta-se pesquisa quanti-qualitativa, vez que é qualitativa por se encarregar de explorar fatos, apurando opiniões das mulheres inseridas no Centro de Detenção Feminino, além de trabalhar, de acordo com Minayo (2002, p. 21-22), “com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes”, sendo, a pesquisa qualitativa, portanto, o lugar onde a intuição, a exploração e o subjetivismo se expressam e ganham corpo, deixando para o caráter quantitativo “o espaço científico, porque traduzido objetivamente e em dados matemáticos”.

A referida pesquisa esteve dividida em 3 momentos, são eles: 1) pesquisa bibliográfica e documental, leitura de autores clássicos e contemporâneos; 2) revisão de literatura; 3) criação e organização do questionário, aplicação, categorização, análise de dados e o momento final de levantamento e verificação dos resultados obtidos. Respeitando os critérios de inclusão (Ter idade superior a 21 anos.) e exclusão (Não participar da modalidade remunerado; exercer atividades somente no Centro de Detenção Feminino Provisório de Manaus.) participaram 10 mulheres que se encontram privadas de liberdade e participando do projeto Trabalhando a Liberdade, bem como a pesquisa propõe.  

Vale ressaltar a importância de ter havido uma discussão teórica sobre o processo de ressocialização no Centro de Detenção Feminino, o qual se particulariza através do desenvolvimento de atividades voltadas para a capacitação, educação e socialização da Pessoa Privada de Liberdade (PPL). 

Para atingir o objetivo da pesquisa, considerou-se viável a escolha pelos referidos métodos/abordagens, tencionados a discutir com clareza os processos que dão corpo à realidade das mulheres encarceradas. No que tange à pesquisa bibliográfica, concorda-se com Gil (2008) quando preconiza que esta se utiliza de inúmeras contribuições de autores sobre a temática, assim como nos permite “a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente” (GIL, 2008, p. 50).  

Saliento, que está pesquisa, será transcorrida de acordo com a Resolução 466/12, que aprova as “diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos”; no item VII. 1, “Pesquisas envolvendo seres humanos devem ser submetidas à apreciação do Sistema CEP/CONEP” e a Resolução 510/2016, logo, ocorrerá a submissão desta, na Plataforma Brasil para a tramitação ética de análise, avaliação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa – CEP visando adquirir um parecer consubstanciado e o respaldo legal para o seu andamento. 

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 

A partir desta coleta de dados, podemos observar a satisfação referente ao projeto na maioria das mulheres que estão envolvidas nessa pesquisa. Em contra partida, através das respostas deste questionário, observa-se que a maioria das mulheres envolvidas ja encontram-se em idade madura, como mostra o gráfico abaixo, 20% correspondem a uma idade mais avançada, enquanto o restante se divide em variadas idades. Portanto, este fato chama atenção para a reflexão de uma questão social, onde a marginalização não atinge somente idades joviais como a sociedade costuma julgar.  

No quadro abaixo, está em questão o tempo em que as reeducandas estão participando do projeto. Observou-se que entre 20% das mulheres estão ativas a 10 meses, mais 20% estão inclusas na faixa de 3 anos. O restante equivalente a 60% varia em diferentes períodos de tempo. Observa-se que são poucas as mulheres que estão em um menor intervalo de carreira no projeto, sendo assim nota-se que as mesmas já adentram o sistema prisional há um considerável período de tempo, isso mostra que as mesmas têm grande interesse em participar do projeto não somente pela remuneração como também pela remição de sua pena.  

Já este gráfico seguinte, consiste nas atividades que as detentas desenvolvem dentro do projeto, as mesmas recebem na categoria remunerado um salário que é direcionado para a conta bancária de algum de seus familiares. Dentre as 10 mulheres envolvidas, 90% exercem mais de uma atividade dentro do projeto, porém, 90% encontram-se na categoria de serviços gerais, conseguinte a ornamentação como segunda categoria mais exercida sendo 30% decoradoras, no restante 50% delas exercem diversas atividades, como; Auxiliar de lavanderia; Auxiliar de Biblioteca; Costureira e etc.  

Agora o próximo gráfico mostrará a opinião das reeducandas em relação a como o projeto melhorou o convívio das mesmas, a partir do momento em que começaram a fazer parte do projeto, no momento da aplicação do questionário, uma delas fez questão de explicitar que o projeto tenciona-as a ter uma convivência mais saudável, respeitosa e harmoniosa. Abaixo pôde-se contemplar unanimemente que 100% dessas mulheres concordam que sim, o projeto ajuda na melhoria do convívio das internas no Centro de Detenção. 

Da mesma forma que anteriormente, 100% das mulheres concordam que o projeto incita nas mesmas novas habilidades de trabalho, agrega conhecimento, e as profissionaliza para o mercado de trabalho, mesmo que precisem estar sob limitações padrões do Centro de Detenção.  

Por fim, a última questão do questionário consistiu em uma avaliação referente ao projeto “Trabalhando a Liberdade”, englobando tudo que nele envolve: Atividades; Equipe Profissional; Treinamentos; Cronograma de Trabalho e Tratamento Interpessoal, etc. Vale ressaltar que no momento em que as reeducandas estavam respondendo o questionário havia uma agente penitenciária no recinto por questões de segurança e procedimentos internos, ou seja pode existir contradições na veracidade das respostas, uma vez em que existe o receio que advém da opressão hierárquica do sistema prisional, e da não efetivação dos Direitos Humanos. 90% das mulheres avaliaram o projeto como ótimo, 10% avaliaram como bom.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Conclui-se que até o presente momento pôde-se efetivar uma coleta de dados produtiva em relação ao objetivo geral da pesquisa que consiste em analisar o projeto “Trabalhando a Liberdade” no processo de ressocialização na vida de mulheres encarceradas no Centro de Detenção Feminino (CDF) de Manaus, e também específicos que são, averiguar os critérios de inserção e as atividades desenvolvidas pelo projeto “Trabalhando a Liberdade”; Identificar o posicionamento das mulheres encarceradas sobre o projeto de ressocialização e apontar as contradições presentes no contexto de ressocialização das detentas na cidade de Manaus. Entretanto, visualmente é possível perceber as questões sociais que estão além do processo de ressocialização na vida de mulheres encarceradas. Trata-se de um fenômeno histórico social que envolve o capitalismo voraz e desigual que vai desencadear a pobreza a falta de qualidade de vida, a escassez de direitos básicos como saúde e educação, estrutura familiar saudável e afins e que produzem o sujeito periférico marginalizado, Cunha (2010) vai dizer que, “Esse desenvolvimento anômalo não se manifesta apenas nas provações que produz e dissemina. Manifesta-se, também, nas estratégias de sobrevivência por meio das quais os pobres teimam em fazer parte daquilo que não os quer, senão como vítimas e beneficiárias residuais de suas possibilidades.” Tencionando isto ao público feminino, temos mulheres, mães, que se envolvem na criminalidade com o intuito de se tornar o sujeito provedor, ou por muitas vezes serem coagidas por parceiros que já se encontram no universo da criminalização, fato esse que expressa inúmeras desigualdades sociais. 

Contudo é preciso que as forças mobilizadoras que estão dentro da atmosfera transformadora da sociedade, evidenciem que é necessário um enfrentamento, uma intervenção estatal de qualidade para mostrar que o caminho da marginalização do sujeito social não será a melhor opção para que possam suprir suas necessidades, ressaltando que o encarceramento está presente e atual em nossa sociedade contemporânea, espera-se que esses resultados sirvam para acrescentar conhecimento cientifico, bem como contribuição no que diz a respeito da efetivação dos Direitos Humanos, e para que haja realmente uma ressocialização do público carcerário, objetivando a extinção da reincidência de indivíduos que cometeram crimes.        

REFERENCIAS 

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 1Graduando em Serviço Social – Universidade Federal do Amazonas, E-mail:amandalaize.alai@.edu.br;
 2Orientadora, Doutora em Sociedade e Cultura da Amazonia – Universidade Federal do Amazonas, Professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Amazonas e do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazonia da Universidade Federal do Amazonas. A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas – FAPEAM – Edital Universal de 2019. lidiany@ufam.edu.br