TRABALHADOR DOCENTE: NA CONCEPÇÃO MARXISTA E NA ÓTICA CAPITALISTA 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8387346


Isabel Cavalcante Ferreira1
Carla Andressa Santos Muniz2
Jusenir BatistaMontalvã3
Maria do Carmo Ferreira dos Santos Silva4


Resumo

O presente estudo é resultado de indagações empíricas surgidas em momentos de formações continuadas e assembleias sindicais em que ocorreram diversas discussões a respeito da desvalorização social e política do trabalhador docente. Buscou responder à problemática: Em qual categoria (abstrata, produtiva ou improdutiva) encontra-se posta o trabalho docente? Tendo como objetivo compreender o significado do “Trabalhador docente” dentro da concepção marxista e também dentro da ótica capitalista. Assim, como compreender o valor e significado atribuído ao trabalho docente na sociedade global contemporânea. Como tudo tem uma razão histórica de ser e as coisas não acontecem por acaso pesquisamos a partir de grandes teóricos o que Karl Marx diz sobre trabalho como uma condição eterna da vida humana e sobre a abstração produtiva e improdutiva deste, pelos modos de produção capitalista, que vai desconsiderando a condição do trabalho ser eterno. Na perspectiva de compreender o trabalho docente, o seu valor e significado atribuído no mundo do trabalho contemporâneo. Dessa forma, consideramos nesse artigo apenas aspectos do trabalho docente relacionado à força de trabalho do trabalhador docente. A relevância do nosso estudo está em levar o trabalhador docente compreender a sua importância formativa de todas as outras profissões da sociedade capitalista. 

Palavras-chave: Trabalho. Trabalho Docente. Trabalhador Docente.  

1. Introdução  

O presente estudo é resultado de indagações empíricas surgidas em momentos de formações continuadas e assembleias sindicais em que ocorreram diversas discussões a respeito da desvalorização social e política do trabalhador docente. Como percurso metodológico utilizamos a pesquisa bibliográfica relacionada ao descritor “trabalho docente” para chegar a respostas das nossas indagações buscamos em bancos de dados como: Scielo, BDTD (Biblioteca Digital de Teses e Dissertações) e CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), com a finalidade de encontrar produções e referenciais teóricos para embasar, fundamentar e chegarmos ao estado de conhecimento sobre a temática trabalho docente e, dessa forma responder a  problemática: Em qual categoria (abstrata, produtiva ou improdutiva) encontra-se posta o trabalho docente? Para tanto, os principais autores que embasaram o nosso estudo foram: Antunes (2013; 2015), Castel (1998), Marx (1863; 2015), estes elucidaram as indagações, bem como auxiliaram na conceituação e significação da palavra trabalho. Mészáros (2002) vai elucidando a incorrigível lógica do capital e seu impacto sobre a educação, nos direcionando a compreensão de que a lógica estabelecida pelo capital impõe a precarização da educação, porque traz limitações sobre o mundo das ideias, afetando o trabalho intelectual, consequentemente, esses impactos afetam também a vida subjetiva/pessoal do trabalhador docente por estar presa às limitações e regulamentações da economia capitalista.  

A partir dessas elucidações teóricas tivemos como objetivos compreender o significado do “Trabalho” dentro da concepção marxista e também dentro da ótica capitalista. Assim como compreender o valor e significado atribuído ao trabalho docente na sociedade global contemporânea. 

Compreendemos que o significado do trabalho docente é considerado um trabalho abstrato por ser da área intelectual que envolve o pensar e o sentir, nesse sentido não é perceptível de imediato, isso porque não é reconhecido pela sociedade como um trabalho concreto. Porém, o trabalho docente mesmo não sendo perceptível de imediato, na ótica capitalista há valor de uso para a produção e reprodução do trabalho produtivo.  

Dessa forma, o trabalho docente realizado também pelo docente enquanto professor é de preparação para a vida social. Assim, alimenta e mantém a economia capitalista da sociedade global, logo se acha na mesma escala dos bens de produção geradores de lucro e mais-valia, quando autovaloriza o capital na preparação do indivíduo para o mercado de trabalho capitalista. Isso ocorre porque “[…] decai a uma mercadoria, torna-se um estranho, um meio da sua existência individual” (ANTUNES, 2013, p.8). 

Logo, enquanto trabalhadores docentes, não consideramos nosso trabalho pertencente à categoria improdutiva, pois, todo trabalho é uma atividade produtiva, sendo que a atividade realizada pelo trabalhador docente engloba a área mental e a área física. No que diz respeito ao trabalho mental o trabalhador docente necessita de uma formação contínua e permanente, uma vez que busca por novos conhecimentos para aperfeiçoamento da prática pedagógica.  

Quando se refere ao trabalho físico, o trabalhador docente desempenha no decorrer do desenvolvimento dos procedimentos metodológicos e práticos, tais como: elaboração dos planejamentos, confecção de recursos pedagógicos, atividades recreativas e trabalhos burocráticos que exigem esforço físico (braços e mãos), ao digitar conteúdos, avaliação e frequências inserindo no sistema. Portanto, consideramos o trabalho realizado pelo trabalhador docente como material, intelectual e produtivo.    

Em suma, a relevância do nosso estudo está em levar o trabalhador docente compreender a sua importância formativa de todas as outras profissões da sociedade capitalista e sua dialética do trabalho.           

O trabalho na concepção Marxista e também na ótica capitalista. 

Partindo da concepção Marxista entendemos que todo trabalho é uma atividade mental ou física que produz bens ou serviços. Podemos assim dizer que todo trabalho é uma atividade produtiva que se desenvolveu ao longo dos anos. Os bens para serem criados necessitam dos meios de produções, ou seja, conjunto formado pelos meios de trabalho e pelo objeto de trabalho, que incluem as fábricas, as ferramentas, as instalações e os recursos retirados da natureza – a matéria-prima. 
Além disso: 

Sabemos que é a partir do trabalho, em sua realização cotidiana, que o ser social se distingue de todas as formas pré-humanas. Os homens e mulheres que trabalham são dotados de consciência, uma vez que concebem previamente o desenho e a forma que querem dar ao objeto (ANTUNES, 2013, p. 07) 

Assim, o trabalho como atividade que evoluiu ao longo dos anos, precisou também da evolução humana. Neste sentido, o contexto da evolução humana o trabalho docente faz parte da educação para a vida. Logo: 

Em face de cada novo progresso, o domínio sobre a natureza, que tivera início com o desenvolvimento da mão, com o trabalho, ia ampliando os horizontes do homem, levando-a descobrir constantemente nos objetos novas propriedades até então desconhecidas. Por outro lado, o desenvolvimento do trabalho, ao multiplicar os casos de ajuda mútua e de atividade conjunta, e ao mostrar assim as vantagens dessa atividade conjunta para cada indivíduo, tinha de contribuir forçosamente para agrupar ainda mais os membros da sociedade (ANTUNES, 2013, p. 16-17). 

Evidentemente que a partir do agrupamento social, o desenvolvimento do trabalho de modo coletivo acelerou no intuito de atender também as demandas e necessidades para sobrevivência e organização do contingente humano pertencente ao agrupamento social. Assim partimos da conjectura que o conceito de trabalho e o valor atribuído a ele dependem da época, do local e de quem o controla. Do mesmo modo esse processo de trabalho e processo de valorização é atribuído ao trabalho docente.  

Ainda podemos entender que: 

[…] o trabalho é uma atividade central na história humana, em seu processo de sociabilidade e mesmo para a sua emancipação. Por outro lado, com o advento do capitalismo, houve uma transformação essencial, que alterou e tornou complexo o trabalho humano (ANTUNES, 2013, p. 9) 

Nessa direção, a definição de trabalho está relacionada à aplicação da força física e intelectual dos seres humanos que transformam a natureza para satisfazer as suas necessidades. Também pode ser considerado uma ação material ou intelectual transformadora do homem realizada na natureza ou na sociedade em que ele vive. Assim podemos entendê-lo como “[…] também fundamental na vida humana porque é condição para sua existência Social” (ANTUNES, 2013, p. 08). 

Pois: 

No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e portanto idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa subordinação é um ato isolado. […] Os elementos simples do processo de trabalho são atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seu objeto e seus meios. […] o próprio objeto de trabalho já é, por assim dizer, filtrado por meio de trabalho anterior, denominamo-lo matéria-prima (ANTUNES, 2013, P. 32). 

Assim, a força de trabalho tanto material ou intelectual despendida nas atividades realizadas individualmente ou em conjunto na sociedade precisam de organização, por conseguinte de uma liderança. Isso porque segundo Antunes (2015), “Os elementos simples do processo de trabalho são a atividade orientada a um fim ou o trabalho mesmo, seus objetos e seus meios” (ANTUNES, 2013, p. 15). Assim a liderança presente na força intelectual necessita ser empregada para a realização da produção necessária para atendimento das necessidades dos seres humanos. 

 Na ótica Marxista o trabalho pode ser entendido como a força de trabalho posta em ação para dar valor na elaboração de uma mercadoria. E toda mercadoria é o próprio objeto de trabalho, por assim dizer filtrado por meio de trabalho anterior, denominamo-lo matéria-prima. Logo, todo trabalho para Karl Marx tem um valor em si, pois, produz alguma mercadoria.  

Dessa forma, no processo de trabalho: 

A utilização da força de trabalho é o próprio trabalho. O comprador da força de trabalho o consome ao fazer trabalhar o vendedor dela. […] o trabalho é um processo entre o homem e a natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media, regula e controla seu metabolismo com a natureza. […] ao atuar, por meio desse movimento, sobre a natureza externa a ele e ao modifica-la, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. […] Pressupomos o trabalho numa forma em que pertence exclusivamente ao homem. (ANTUNES 2013, p. 31-32) 

E por pertencer exclusivamente ao homem o trabalho durante muito tempo foi considerado objeto de tortura, por ser executado como trabalho escravo e forçado, assim se encontrava em posição não privilegiada que degradava a imagem do homem. Mas, com a evolução ao longo dos anos, surgiu a burguesia e a partir dela o advento capitalismo que passou a enaltecer o homem/trabalho. Pois, este passou a ser visto como ferramenta necessária para o acúmulo de riquezas. 

A partir da lógica do acúmulo de riquezas, baseado em Marx, o conceito de trabalho torna-se capacidade do homem em transformar a natureza para promover a sua subsistência, por isso não dá para dissociar o trabalho da natureza. Isto posto porque o homem age sobre a natureza e a transforma para a sua subsistência. O homem enquanto trabalhador objetiva a natureza, consistindo nesses objetivos uma intima relação entre o acumulo de riqueza e a pobreza do trabalhador.  

Em outras palavras:  

O processo de trabalho […] em seus elementos simples e abstratos, é atividade orientada a um fim para produzir valores de uso, apropriação do natural para satisfazer a necessidades humanas, condição universal do metabolismo entre o homem e a natureza, condição natural, condição natural eterna da vida humana e, portanto, independente de qualquer forma dessa vida, sendo antes igualmente comum a todas as suas formas sociais (ANTUNES, 2013, p. 40) 

O trabalho como fonte geradora de acumulo de riqueza e enaltecimento do homem está relacionado com o surgimento da burguesia, do capitalismo. Contexto em que o trabalho se torna muito importante para o Estado Moderno e contemporâneo. A partir de Karl Marx e estudiosos da sua teoria, temos condições de compreender muitas coisas como o funcionamento da sociedade capitalista forjada no seio da burguesia – economia, política, principalmente sobre o trabalho, seu enaltecimento, sua intima relação com o acúmulo de riquezas do capitalista e a pobreza do trabalhador proletário. 

Para Karl Marx o valor não pago pela força de trabalho cedida pelo trabalhador proletário na produção de uma mercadoria é denominado mais valia de onde o trabalhador capitalista tira boa parte do lucro. No qual, se revela a exploração sofrida pelo trabalhador proletário, revela-se aí a alienação do seu trabalho.  

Isto porque o trabalhador proletário vende a sua força de seu trabalho, mas não é dono do seu tempo e nem do produto criado no ato do seu trabalho. Assim como nos dá condições de compreender e entender a íntima relação do trabalho docente com a sociedade capitalista que enaltece o trabalho como ferramenta geradora de riqueza, mais também palco de conflitos e interesses geradores das lutas de classes.  

Porque o dono o burguês capitalista detém a propriedade privada, os meios de produção também detêm e controlam os meios de trabalho. Tendo assim o trabalho como “a fonte de toda a riqueza, afirmam os economicistas” (ANTUNES, 2013, p. 13).  

Nesse sentido,  

O processo de trabalho em seu decurso enquanto processo de consumo de força de trabalho pelo capitalista, mostra dois fenômenos peculiares. 
Primeiro: o trabalhador trabalha sob o controle do capitalista a quem pertence o seu trabalho. O capitalista cuida para que o trabalho se realize em ordem e os meios de produção sejam empregados conforme seus fins, […] na medida em que seu uso no trabalho exija. 

Segundo: o produto, porém, é propriedade do capitalista paga, por exemplo, o valor de um dia da força de trabalho. A sua utilização, como qualquer outra mercadoria […] pertence-lhe, portanto, durante o dia (ANTUNES, 2013, p. 41). 

Mas para o trabalhador dono da força de trabalho a partir do surgimento da propriedade privada, da industrialização, até aqui agora, nos dias atuais, o trabalho no conceito de enaltecimento da sociedade global capitalista, gera: 

 […] Tempos de incertezas, […] o futuro é indeterminado, […] quando se quer apreender a especificidade do que acontece hit et nunc […] a situação atual é marcada por uma comoção que, recentemente, afetou a condição salarial: o desemprego em massa e a instabilidade das situações de trabalho, a inadequação dos sistemas clássicos de proteção para dar cobertura a essas condições, a multiplicação de indivíduos que ocupam na sociedade uma posição de supranumerários, “inempregáveis”, inempregados ou empregados de um modo precário, intermitente. […] marcado pelo selo aleatório (CASTEL, 1999, p.21, grifo do autor). 

Em que “O trabalho continua sendo uma referência não só economicamente, mas também psicologicamente, culturalmente e simbolicamente dominante, como provam as reações dos que não os têm”. (CASTEL, 1999, p.578). Porque trabalhador encontra-se na dependência do emprego e salário gerado por esse emprego ou acha-se sob “o domínio da necessidade” (IDEM, p. 22-23). Essa dependência também é natural quando se refere ao trabalho docente, pois que o realiza é um trabalhador comum que carrega consigo “[…] as condições de legitimidade do sistema que explora o trabalho como mercadoria, para induzi-los à sua aceitação passiva” (MÉSZÁROS, 2002, p. 17). 

Trabalho docente valor e significado atribuído a “Ele” na sociedade global contemporânea  

Podemos compreender que o trabalho enquanto atividade humana nem sempre tem o significado de criação para realização e valor pessoal do trabalhador.  Isso porque “[…] dentre as contradições do trabalho, são destacadas as condições criadas pela divisão do trabalho, em que o trabalhador não é dono do produto de seu trabalho e ao invés de se reconhecer em suas próprias criações acaba por se sentir ameaçado por elas”. (KONDER, 1985, p. 30). 

Sobre o trabalho, Antunes (2013) pontua que: 

[…] o trabalho é uma atividade central na história humana, em seu processo de sociabilidade e mesmo para a sua emancipação. Por outro, com o advento do capitalismo, houve uma transformação essencial, que alterou e tornou complexo o trabalho humano (ANTUNES, 2015, p.9). 

Assim sendo: 

A divisão capitalista do trabalho é contraditória. De um lado libera a força de trabalho, de outro a transforma em mercadoria. Socializa o trabalho enquanto se apropria dos seus resultados de modo a que o trabalhador perca o controle sobre o processo de trabalho quanto sobre o valor do produto (CURY, 2000, p. 17). 

Nessa perspectiva, o trabalho docente enquanto atividade produtiva desenvolvida na sala de aula, deveria ser livre e direcionada para auxiliar os estudantes a descobrir sua autonomia, pois esses enquanto estudantes e trabalhadores docentes são seres humanos, não mercadorias.  

O trabalho docente, força de trabalho intelectual, é mediadora entre o ensino e a aprendizagem e aquisição do conhecimento. É uma atividade que lida com indivíduos que possuem sua própria subjetividade e cultura advinda do contexto familiar e social. Logo, a característica da força do trabalho docente insere-se no conjunto dos trabalhos exercidos pelas práticas sociais não alienadas.   

De tal modo entendemos que a força de trabalho docente está fundada nos preceitos marxistas de que o trabalho é a base de toda humanidade, inclusive da essência humana. Imediatamente, podemos compreender que nessa força de trabalho está presente a possibilidade da revolução e desalienação, a partir da apreensão do conhecimento. E, ainda como uma força de trabalho que não gera lucro, mais sim realiza influência mútua na natureza humana, a mesma natureza que da base ao ser social. 

Além disso, tem papel fundamental no processo de formação para a emancipação e para transformação da realidade objetiva. É no âmbito das transformações históricas do trabalho, mediante relações corporativistas que desnuda o proletariado dos seus direitos trabalhistas e da cidadania, que se assume o individualismo como melhor solução das crises, bem como alicerçados nos mecanismos que nos são dados pelo modo de produção vigente, que buscamos conceituar o trabalho docente.  

Isto posto porque na ótica capitalista: 

A relação direta entre trabalho e salário encobre o fato de que esse trabalho deve entrar no sistema como mercadoria e que somente é produtivo de valor sob o comando do capital, na medida em que produz mais valor. Desse modo, o trabalho do capitalista e de todos os serviços não são produtivos desse ponto de vista, a despeito de serem indispensáveis. A mesma aula é produtiva de valor ao ser proferida numa escola particular que visa o lucro, mas deixa de o ser quando ministrada numa escola pública (MARX, 2015, P. 101) 

Na atual conjuntura do mundo do trabalho contemporâneo, o valor e importância do trabalho docente é calculado a partir dos indivíduos que se propõem a desenvolverem esse trabalho. Bem como o prestígio social do desenvolvimento do trabalho docente, tem por base nessa mesma sociedade, a instituição em que é desenvolvido e o atendimento de quem ou qual classe social da instituição.   

Dessa maneira observamos que a força do trabalho docente desse contexto é vista como um trabalho abstrato na medida em que se considera especificamente a formação dos indivíduos para atuar nos modos de produção existentes. Isto posto porque o trabalho abstrato não é visto como uma condição de satisfação subjetiva e liberdade para a vida humana. E sim visto como meio de ganhar dinheiro, gerar lucro para os capitalistas. 

Nesse sentido encontramos o trabalho docente na contemporaneidade nas diversas relações existentes entre capital, trabalho e mais-valia. Para entendermos as relações capitalistas de trabalho da sociedade global, devemos buscar entender o trabalho abstrato nas categorias de produtivo e improdutivo, pois esses são importantes subsídios de compreensão dessas relações, principalmente quando se trata da produção da mais-valia.  

Para Marx “[…] a natureza de uso e o caráter do trabalho concreto utilizado é totalmente indiferente […] o trabalho produtivo é puramente meio de obter dinheiro, de produzir mais-valia” (MARX, 1978, p. 486). Assim podemos entender que o trabalho produtivo para os trabalhadores capitalistas é a força de trabalho assalariada geradora de lucro, consequentemente do aumento do seu capital.  

Em outras palavras: 

Trabalho produtivo, portanto é o que – no sistema de produção capitalista – produz mais-valia para o empregador ou que transforma as condições materiais de trabalho em capital e o dono delas em capitalista, por conseguinte trabalho que produz o próprio produto como capital. 
Assim, ao falar de trabalho produtivo, falamos de trabalho socialmente definido, trabalho que envolve relação bem determinada entre o comprador e o vendedor do trabalho. (Manuscrito1863). 

Logo, 

O processo de trabalho capitalista não anula as determinações gerais do processo de trabalho. Produz produtos e mercadorias. O trabalho continua sendo produtivo na medida em que se objetiva em mercadorias como unidade de valor de uso e de valor de troca. Mas o processo de trabalho é apenas um meio para o processo de valorização do capital. É produtivo, pois, o trabalho representa em mercadorias, mas, se considerarmos a mercadoria individual, o é aquele que, em uma parte alíquota desta, representa trabalho não pago; ou, se levarmos em conta o produto total, é produtivo o trabalho que, em uma parte alíquota do volume total de mercadorias, representa simplesmente trabalho não pago, ou seja, produto que nada custa ao capitalista (ANTUNES, 2013, p. 126) 

Já o trabalho improdutivo para os trabalhadores capitalistas é o trabalho que não gera lucro, sim despesas, pois não aumenta seu capital. Compreendemos a partir do exposto que a relação entre trabalho produtivo e improdutivo tem a ver com lugar, o tempo e a relação social ao qual está inserido. Assim sendo “[…] todo trabalhador produtivo é assalariado, mas nem todo assalariado é trabalhador produtivo” (ANTUNES, 2013, p. 128).  

Então para o trabalhador proletário categoria que se encontra o trabalho docente, a relação entre esses tipos de trabalho é uma relação de alienação. E na relação de alienação o trabalhador docente enquanto proletário não resolve, mais define qual será o produto e qual será o destino final do que ele produz. Ou seja, o trabalho docente existe na medida em que “[…] é consumido por causa do seu valor de uso, não como trabalho que gera valores de troca; consome-se-o improdutiva, não produtivamente” (ANTUNES, 2013, P. 128).  

Pois, está inserido dentro de uma sociedade global que produz uma única morfologia de trabalho, que não oferta a possibilidade de participar de todas as etapas de produção do conhecimento. E isso limita e gera a alienação que leva a falta de perspectiva de o trabalho docente surtir efeito criativo e produtor de conhecimento. 

Outro fator causador da alienação no contexto atual é o fato do trabalhador está concorrendo um com o outro em termos de salários e essa concorrência também é causadora da alienação. No trabalho docente como em outros trabalhos o exercício diário de entrar nas salas de aulas e apenas transmitir os mesmos conteúdos diariamente, ano após anos sem objetivo.  

Esse fator torna o trabalho docente repetitivo, sem criatividade para produzir, visto que está direcionado apenas para realização da aula em função da nova morfologia do mundo do trabalho. Em que “é produtivo o trabalhador que executa trabalho produtivo; e é produtivo o trabalho que gera diretamente mais-valia, isto é, que valoriza o capital” (ANTUNES, 2013, p. 126). 

Pois, na nova morfologia do mundo do trabalho contemporâneo, na visão de Antunes (2015), a classe-que-vive-do-trabalho não se restringe somente aos trabalhadores manuais, mas a todos trabalhadores que “vendem a sua força de trabalho”, inclusive os intelectuais.  

Dessa forma: 

“[…] tem como núcleo central os trabalhadores produtivos […] e não se restringe ao trabalho manual direto, mas incorpora a totalidade do trabalho social, a totalidade do trabalho coletivo assalariado que produz diretamente mais-valia e participa diretamente do processo de valorização do capital; o trabalhador produtivo, por isso, detém um papel de centralidade no interior da classe trabalhadora. É preciso acrescentar, porém, que a moderna classe trabalhadora também inclui os trabalhadores improdutivos, aqueles cujas formas de trabalho são utilizadas como serviço, tanto para uso público como para o capitalista, que não se constituem como elementos diretamente produtivos no processo de valorização do capital” (ANTUNES, 2015, p. 139). 

A força de trabalho docente, na realidade do sistema econômico capitalista que separa trabalho manual e trabalho intelectual, é negociada e redefinida, tanto no setor público quanto no privado. Quando o trabalho docente passa a ser negociado se transforma em mercadoria, gera a mais-valia e se iguala às demais categorias de trabalho produtivo que visam ao lucro e não ao conjunto das práticas sociais, acarretando, dessa forma a proletarização e o controle da força do trabalho docente.  

Porque uma coisa é o trabalho docente visto como produtor de conhecimento e formador de indivíduos conscientes das suas identidades. Outra coisa é o trabalho docente visto como uma força de trabalho proletária, vendida no mercado como uma única forma de sobrevivência digna, ofertada em troca de uma remuneração assalariada. Ou seja, como trabalho abstrato gerador ou não de mais-valia, mais que é uma mercadoria, “é unidade de valor de uso e valor, seu processo de produção tem de ser unidade de processo de trabalho e processo de formação de valor” (ANTUNES, 2013, p.43).  

E é essa a atribuição de valor ao trabalho docente no processo de produção capitalista contemporâneo. 

Isso: 

Na medida em que, […] é considerado, os diferentes processos particulares de trabalho separados no tempo e no espaço, que tem de ser percorridos para produzir […] podem ser considerados como diversas fases sucessivas do mesmo processo de trabalho. […] o tempo de trabalho exigido para a produção dos elementos constitutivos […] enquanto o trabalho empregado diretamente no processo final. […] pode-se considerar o tempo de trabalho contido no material de trabalho e nos meios de trabalho como tivesse despendido numa fase anterior […] que valor de uso o carrega é indiferente ao valor, mas um valor de uso tem de carrega-lo. Segundo, pressupõe-se que somente o tempo de trabalho necessário, sob dadas condições sociais de produção. […] pois apenas o tempo de trabalho socialmente necessário conta como formador de valor (ANTUNES, 2013, p. 44-47). 

Nas condições sociais de produções, no espaço e tempo gasto a força de trabalho docente possui um valor de uso porque, transforma-se numa mercadoria a ser aplicada na produção capitalista, sendo assim adequada a um novo valor. Sendo assim, “o valor de toda mercadoria é determinado pelo quantum de trabalho materializado em seu valor de uso, pelo tempo de trabalho socialmente necessário à produção” (ANTUNES, 2013, p. 43, grifo do autor).  

Logo, o valor determinado para a força de trabalho enquanto mercadoria está presente nas relações de produção, de valor salarial do trabalho que foi desenvolvido, pois, toda mercadoria produzida pela força de trabalho possui uma formação de valor de uso e de troca.  

Nesse sentido ao tratar da venda da força de trabalho enquanto mercadoria, Antunes (2013) parte do pressuposto que: 

O trabalho passado que a força de trabalho contém, e o trabalho vivo que ela pode prestar, seus custos diários de manutenção e seu dispêndio diários de manutenção e seu dispêndio diário, são duas grandezas inteiramente diferentes. A primeira determina seu valor de troca, a outra seu valor de uso. […] O valor da força de trabalho e sua valorização no processo de trabalho são, portanto, duas grandezas distintas. Essa diferença de valor o capitalista tinha visto quando comprou a força de trabalho (ANTUNES, 2013, p. 52). 

Nesse sentido, quando o capitalista compra a força de trabalho do trabalho docente não observa que essa força se acha na mesma escala dos seus bens de produção que gera lucro, faz o dinheiro circular com a geração da mais-valia. O trabalho docente é produtivo quando autovaloriza o capital na preparação do indivíduo para o mercado de trabalho capitalista.  

Contudo, o valor do trabalho produtivo é resultante do valor que se separa do produto material. Isto posto porque, “o conceito de trabalho produtivo se estreita. A produção capitalista não é apenas produção de mercadoria, mais essencialmente produção de mais-valor” (MARX, 2015, p. 706). No caso do trabalho docente o produto é o conhecimento – considerado imaterial. Assim sendo, “[…] o produto não é separável do ato de produção” (ANTUNES, 2013, p. 137). Entretanto: 

Se nos for permitido escolher um exemplo fora da esfera da produção material, diremos que um mestre-escola é um trabalhador produtivo se não se limita a trabalhar a cabeça das crianças, mas exige trabalho de si mesmo até o esgotamento, a fim de enriquecer o patrão.  Que este último tenha investido seu capital numa fábrica de ensino, em vez de numa fábrica de salsichas, é algo que não altera em nada a relação (MARX, 2015, p. 706). 

Portanto, a questão de o trabalho docente ser considerado improdutivo pelos capitalistas consiste no fato em que trabalhadores “[…] docentes podem ser meros assalariados para o empresário da fábrica de conhecimentos” (ANTUNES, 2013, p. 138), por não gerar a mais-valia e, muito menos encontra-se diante da “[…] economia política clássica sempre fez da produção de mais-valor a característica decisiva do trabalhador produtivo. Alterando-se sua concepção da natureza do mais-valor, altera-se, por conseguinte, sua definição de trabalhador produtivo” (MARX, 2015, p. 707).  

Considerações  

Consideramos que esse artigo surgindo de indagações empíricas foi realizado a partir da investigação qualitativa em educação de Bogdan e Biklen (1994), demonstraram que “[…] A investigação qualitativa em educação assume muitas formas e é conduzida em múltiplos contextos” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 16). E, na pesquisa bibliográfica centrado em leitura dos teóricos, tais como: Antunes (2013; 2015), Castel (1998), Mészáros (2002) e Marx (1863;2015). Buscou-se responder a problemática “Em qual categoria encontra-se posta o trabalho docente”?  

Partindo desses teóricos relatou sobre o trabalho na concepção Marxista e na ótica capitalista e trabalho docente valor e significado atribuído a “Ele” na sociedade global contemporânea.Em que, alcançou o objetivo proposto de compreendermos o significado e valor atribuído ao trabalho docente na sociedade global contemporânea. 

Podemos compreender na concepção marxista o significado de trabalho, sendo genericamente a capacidade de auto realização humana no ato do processo de criação e produção, a partir da transformação da natureza para atender as necessidades humanas subjetivas e coletivas de subsistência.   

Como também compreendemos que na ótica capitalista, o significado de trabalho está presente na obrigatoriedade de atender os requisitos do reconhecimento pelas conquistas no acúmulo de riquezas, na detenção do poder e domínio social sobre a subjetividade individual e coletiva dos povos. Também que seu valor está agregado ao trabalho produtivo derivados das conquistas concretas e dos resultados que geraram lucros para a produção capitalista. 

Percebemos que trabalho produtivo e improdutivo são subcategorias do trabalho abstrato, bem como que a mais-valia é o excedente que o trabalhador capitalista ganha à custa do trabalhador assalariado. Nessa direção, compreendemos propriedade mais-valia no trabalho intelectual docente, pois mesmo sendo um trabalho abstrato, muitas vezes considerado improdutivo, acrescenta valor de uso, porque possui uma força de trabalho que não gera lucro imediato, mais realiza influência mútua na natureza humana, a mesma natureza que da base ao ser social e gera renda para economia capitalista. Ademais, tem papel fundamental no processo de formação para a emancipação e para transformação da realidade objetiva. 

Prontamente, o trabalho docente enquanto mercadoria tem valor de uso para o mercado de trabalho, no que produz todos os dias como valor de troca. O valor de troca tem como base o trabalho produtivo que enquadra na produção dos saberes e a troca sendo realizada por meio da educação, que “no reino do capital, […] é, ela mesma, uma mercadoria”. (MÉSZÀROS, 2002, p.16). 

Com efeito, o trabalho docente na ótica capitalista há valor de uso para a produção e reprodução do trabalho produtivo, que alimenta e mantém a economia capitalista, pois encontra-se em “[…] uma relação social fundada na propriedade privada, no capital e dinheiro” (ANTUNES, 2013, p.).  

Por fim, acha-se na mesma configuração dos bens de produção geradores de lucro, renda e mais-valia, quando autovaloriza o capital na preparação do indivíduo para o mercado de trabalho capitalista.                

Referências 

ANTUNES, Ricardo (Org.). A dialética do trabalho. São Paulo: Expressão Popular, 2013. 160 p. 

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação Qualitativa em Educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994. 

CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: Uma crônica do salário. 2ª ed. Petrópolis – RJ, Vozes, 1998.  

MARX, KARL. O Capital: A crítica da economia política. Livro I. O processo de produção do capital. Boitempo, 2015. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2547757/mod_resource/content/1/MARX%2C%20Karl.%20O%20Capital.%20vol%20I.%20Boitempo..pdf. Acesso em: 10/04/19. 

MARX, Karl 1863. Produtividade do Capital, Trabalho Produtivo e Improdutivo 
Manuscritos Económicos de Marx de 1861 a 63 Parte 3) Mais Valia Relativa. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1863/mes/prodcapital.htm. Acesso em: 10/04/19. Fonte: Livro 4 – Teorias da Mais Valia. Volume 1. São Paulo: Bertrand Brasil, 1987. – pp. 384-406. 

MÉSZÀROS<ISTVÁN,1930. A Educação para além do capital. 2ª ed. São Paulo: Boimtempo, 2008. (Mundo do trabalho). 


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