TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR

THE THEORY OF THE PRODUCTIVE DEVIATION OF THE CONSUMER 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10025894


Maria Vitória Santos Souza1;
Geovana De Souza Silva2;
Jennifer Alves Rates Gomes3


RESUMO 

A Teoria do desvio produtivo do consumidor surgiu após estudos relacionados com a aplicabilidade da perda do tempo útil. O doutrinador Marcos Dessaune foi o primeiro a estudar sobre o assunto. O tempo perdido de forma injusta e ilegítima pela falha da prestação de serviço por parte do fornecedor não é reconhecido como dano ao consumidor. Ao exercer alguma atividade no mercado de consumo, o fornecedor assume o dever de responder pelos potenciais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos conforme disposto na teoria do risco do empreendimento. O artigo 14º do Código de Defesa do Consumidor prevê que o fornecedor tem a responsabilidade pela reparação dos danos causados, seja relativo à prestação de serviço ou informações insuficientes e o parágrafo 3º, do referido artigo, dispõe que o fornecedor só será isento da responsabilidade se provar que a culpa é do consumidor ou não há defeito. 

Palavras-chave: Consumidor. Dano moral. Mero aborrecimento. Tempo. Teoria do Desvio Produtivo. 

ABSTRACT 

The theory of the productive deviation of the consumer emerged after studies related to the applicability of the loss of useful time. The indoctrinator Marcos Dessaune was the first to study the subject. Time lost unfairly and illegitimately due to the supplier’s failure to provide a service is not recognized as damage to the consumer. When exercising any activity in the consumer market, the supplier assumes the duty to respond for potential defects or defects in the goods and services supplied, in accordance with the enterprise risk theory. Article 14 of the Consumer Protection Code states that the supplier is liable for compensation for damage caused, whether related to the provision of services or insufficient information, and paragraph 3 of this article states that the supplier will only be exempt from liability if it proves that it is the consumer’s fault or that there is no defect. 

KEY-WORDS: Consumer. Moral damage. Mere annoyance. Time. Theory of Productive Diversion. 

INTRODUÇÃO 

A temática abordada por esta pesquisa desenvolve-se em torno da aplicabilidade da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, como espécie de dano moral. Tendo em vista que trata-se de um bem irrecuperável. 

Na Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, a perda do tempo útil ocorre quando o consumidor, depois de despender tempo útil e modificar suas atividades existenciais, tem o seu tempo desperdiçado perdido de forma involuntária para solução de um problema ou a contratação, reparação ou utilização de um serviço sem que o fornecedor ofereça uma justificativa tolerável e com a iminência de prejuízo na seara econômica e profissional ou no âmbito da convivência familiar. 

Dessaune4 conceitua que é necessário dar o justo valor jurídico ao tempo desperdiçado pelo consumidor, de forma injusta e ilegítima pela falha da prestação de serviço por parte do fornecedor e que a perda injusta e intolerável é capaz de atingir a sua integridade psicofísica que se torna o interesse jurídico acometido capaz de ensejar o dano temporal/moral pelo desvio produtivo. 

O doutrinador Pablo Stolze5 cita que “Na dinâmica(…), o tempo é um “fato jurídico em sentido estrito ordinário”, ou seja, um acontecimento natural, apto a deflagrar efeitos na órbita do Direito.” e o doutrinador Vitor Vilela Guglinski6 cita: 

Na seara jurídica o tempo é considerado parâmetro para a criação, 
extinção, modificação, aquisição e exercício de direitos, v. g. os 
institutos da prescrição, da decadência, da usucapião, da preclusão, 
entre outros (GUGLINSKI. O Dano Temporal e Sua Reparabilidade: 
Aspectos Doutrinários e Visão dos Tribunais Brasileiros). 

A teoria foi desenvolvida para preservar e demonstrar que o tempo livre do indivíduo também é destinado ao momento de lazer, seja ele, dormir, comer ou não fazer nada e abolir a ideia que o mesmo deve ser utilizado para resolver os problemas. 

Dessa forma, percebe-se que alguns doutrinadores defendem que o tempo possui relevância jurídica na aplicação do direito e que possui capacidade de gerar impactos negativos e, consequentemente, o dano moral. 

1. PRINCÍPIOS E FUNDAMENTOS DA TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO 

O Dr. Eurico de Barros Correia Filho, Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco, ao examinar a Apelação Cível nº 230521-7 7 sobre o caso de uma consumidora que foi obrigada a aguardar três horas e cinquenta e seis minutos por atendimento em um banco, fez uma reflexão sobre a importância do tempo para a sociedade: 

Desperdício de tempo, que se faz tempo sombra que nada traz do 
ontem para o amanhã, flagrado por Millôr Fernandes que, em seu 
refinado humor, o contempla, afirmando: “Quem mata o tempo não é 
um assassino, mas um suicida (PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. AC 
n. º 230521-7).

Como exposto, o tempo que foi perdido pela consumidora em um ambiente onde deveria ter o atendimento com mais facilidade, visto que são vários colaboradores para atender as demandas, jamais será recuperado pois sua rotina foi atrapalhada e suas obrigações sendo adiadas fazendo com que fiquem acumuladas. 

Conforme o entendimento da Relatora Desembargadora Regina Lucia Passos na Apelação Cível nº 019884-06.2019.8.19.0001, o tempo vital abrange a personalidade do sujeito e por isso, a perda do tempo no esforço de solucionar amigavelmente um transtorno de responsabilidade do fornecedor pela via judicial incide na Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor e equivale a lesão extrapatrimonial com direito a reparação8

De tal forma, conclui-se que o evento causou a perda do tempo de 
vida, que é um bem irrecuperável, integrante da personalidade do 
ofendido. Configurado, deste modo, o dever de indenizar (RIO DE 
JANEIRO. Tribunal de Justiça. AC nº 019884-06.2019.8.19.0001). 

Todavia, a Relatora Juíza Érika Ricci, na Apelação Cível nº 1007613-76.2021.8.26.0565, reconheceu apenas o inadimplemento da obrigação ao contrato de compra e venda não suficiente para a aplicação do dano moral, caso em que a autora adquiriu produto pelo site da ré, mas a entrega fora cancelada sem mais justificativas, logo a autora entrou com a ação para reaver o dinheiro pago nos produtos, visto que a ré demorou cinco meses para restituir o valor integralmente9

Não se trata, portanto, de hipótese em que a consumidora, para 
resolução da questão, teve de despender tempo e energia 
consideráveis, circunstância que impossibilita a aplicação da invocada 
teoria do “Desvio Produtivo do Consumidor” (SÃO PAULO. Tribunal de 
Justiça. AC nº 1007613-76.2021.8.26.0565). 

No que tange sobre o atraso do fornecedor para a entrega do produto solicitado o consumidor possui algumas opções para essa situação: 1 – Tentar entrar em contato com a fornecedora para pedir respaldo sobre a data de entrega e situação do produto; 2 – Realizar o cancelamento do produto por falta de cumprimento de entrega no prazo estipulado. Caso nenhuma dessas opções seja atendida e a empresa não der nenhuma explicação, o consumidor tem o direito de ressarcimento do valor integral do produto que foi efetuado o pagamento em até 30 dias. Se o pagamento for feito via cartão de crédito deverá ser feito o estorno do valor total ou boleto, o valor pago deverá ser estornado para a conta do consumidor. 

Ante ao exposto, percebe-se que as decisões citam a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor ou tempo como bem de valor jurídico, mas nem todas a reconhecem como pressuposto para pleitear o dano moral. 

2. TEMPO COMO BEM JURÍDICO 

O tempo é protegido de maneira implícita pelo ordenamento jurídico, conforme alguns artigos expressos, a exemplo o artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição Federal de 198810, o artigo 4º do Código de Processo Civil de 201511 e o artigo 18, parágrafo 1º do Código de Defesa do Consumidor12

François Ost, afirma que “o tempo é, inicialmente, e antes de tudo, uma construção social – e, logo, um desafio de poder, uma exigência ética e um objeto jurídico”13, interpretasse então que o tempo é um bem jurídico, podendo ser singular e/ou coletivo, sendo também inerente à personalidade humana diretamente ligada ao direito fundamental.14 

O tempo do indivíduo está ligado diretamente com a organização da sociedade e suas normas. É utilizado por aqueles capazes de comandar a organização social, como forma de controle para excelência das obrigações e compromissos. No âmbito jurídico, o tempo é empregado para a proteção, regularização e efetivação das obrigações, como por exemplo, a definição de prazos para protocolos, a delimitação do tempo para prescrição e decadência, as cláusulas contratuais para cumprimento das obrigações das partes. 

Claudia Lima Marques aponta que o tempo do fornecedor é um ônus econômico onde não há dúvidas em relação ao seu valor relevante, todavia há a desvalorização com o tempo do consumidor, onde o seu tempo é um aparato para o exercício de suas atividades cotidianas15

A perda do tempo do fornecedor gera prejuízos financeiros instantaneamente e pode gerar custos comerciais, o que faz com que seja reconhecida a sua importância. Todavia para o consumidor, a perda do tempo, na maioria das vezes causa apenas a inconveniência e frustração, em poucos casos, a perda econômica ou algum dano visível. 

O doutrinador Pablo Stolze16 leciona que “As circunstâncias do nosso cotidiano impõem um aproveitamento do tempo de que dispomos, sob pena de experimentarmos prejuízos de variada ordem, quer seja nas próprias relações pessoais, quer seja nos âmbitos profissional e financeiro.” 

O tempo para o indivíduo deve ser valorizado visto que é necessário um gerenciamento eficaz do mesmo para que não gere nenhum transtorno profissional ou pessoal. O desprendimento do tempo para resolver imprevistos faz com que a pessoa se afaste de seus afazeres pessoais, atrapalhando assim a sua rotina que muitas vezes é planejada. 

Imprescindível frisar que com tantas inovações tecnológicas e ferramentas que possibilitam ao consumidor a realização de suas tarefas de forma mais rápida e eficiente, inclusive à distância, pela internet, por exemplo, perder tempo em filas de banco, ao telefone, ou em idas e vindas de assistências técnicas, buscando resolver um problema gerado pelo próprio fornecedor em uma relação de consumo é um verdadeiro “atraso de vida” (BRAGA, 2019). 

Portanto, quando o consumidor tem de abdicar do seu valioso tempo de lazer, descanso ou de trabalho, tendo que alterar toda a sua rotina e adiando compromissos para resolver uma situação onde o fornecedor não cumpriu sua responsabilidade, trata-se da caracterização da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor. 

3. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR 

Na relação entre o consumidor e o fornecedor, na maioria das vezes, o fornecedor visa apenas o serviço rápido para gerar mais lucro, não considerando a qualidade e satisfação do cliente, em consequência há uma proteção especial com o consumidor, disposta no Código de Defesa do Consumidor, considerando a sua fragilidade e vulnerabilidade que também está relacionada a eficácia dos direitos fundamentais. 

Dessaune cita que, “para a pessoa ser livre, é indispensável que as demais respeitem a sua liberdade, o que é alcançado por meio de limitações individuais impostas pela lei”17

Diversos artigos do Código de Defesa do Consumidor18 dispõe sobre a responsabilidade do fornecedor, a exemplo, dos arts. 12 e 13, em que o fornecedor é responsável pelo fato do produto, onde está sujeito a responder pelo produto oferecido independentemente de a culpa ser sua ou não, devendo fazer o reparo do objeto decorrente do projeto e do art. 14, sobre responsabilidade pelo fato do serviço, caracterizando-se pela responsabilidade do fornecedor de oferecer a forma correta de manusear o produto, dispondo também sobre os riscos e resultado que pode ser esperado. 

A efetivação da proteção à liberdade está atrelada com a restrição da liberdade dos fornecedores e uma série de deveres impostos, dispostos nos artigos 4º, inciso IV e 39º19 do Código de Defesa do Consumidor. 

O progresso tecnológico, econômico e organizacional resultou no aumento da produtividade e da liberdade para que as pessoas pudessem aproveitar o tempo para as necessidades da vida pessoal, como resultado, a experiência do consumidor na relação consumerista é definida pelo produto final20

Carlos Roberto Gonçalves estabeleceu que a responsabilidade civil, como fato social, tem como propósito restaurar o equilíbrio moral e patrimonial violado pelo dano causado e é aplicada a qualquer atividade que possa gerar prejuízo a alguém. 

Na relação de consumo contemporânea o fornecedor tem a função de disponibilizar os recursos produtivos do consumidor com produtos e serviços de qualidade, de modo a permitir que o tempo do consumidor seja empregado na sua preferência de escolha. 

Dessaune defende que, juridicamente, o fornecedor tem o dever legal de incluir no mercado de consumo, produtos e serviços com qualidade-adequação e qualidade-segurança com informações claras para que o consumidor tenha a capacidade de desempenhar os recursos produtivos21

A missão geral de qualquer fornecedor é promover o bem-estar, 
contribuir para a existência digna e possibilitar a realização humana 
do consumidor, bem como de eventuais empregados e sócios e da 
comunidade que o cerca, em função dos quais ele (fornecedor) 
existe. (…) Ou seja, é dar ao consumidor, por meio de um produto ou 
serviço de qualidade, condições de empregar o seu tempo e as suas 
competências nas atividades de sua livre escolha e preferência, que 
geralmente são atividades existenciais. (DESSAUNE. Desvio Produtivo 
do Consumidor: O Prejuízo do Tempo Desperdiçado, p. 365). 

O doutrinador estabeleceu a expressão Modus solvendi para designar o “modo” compulsório do fornecedor para “reparar” os problemas de consumo potencial ou lesivos que se compreende na conduta desonesta e não cooperativa caracterizada pela habitualidade do fornecedor utilizando-se de justificativas para atenuar, impossibilitar ou exonerar sua responsabilidade22

Esse modus solvendi, pelo qual o fornecedor subverte a ordem 
jurídica e veladamente tenta transferir para o consumidor os seus 
deveres e custos profissionais que decorrem do problema primitivo, 
de modo diverso do que o CDC estabelece, configura a prática 
abusiva (gênero) vedada pelos arts. 25, 39, V e 51, I e IV, do CDC” 
(DESSAUNE. Desvio Produtivo do Consumidor: O Prejuízo do Tempo 
Desperdiçado, p. 362-363.) 

O fornecedor possui o dever de apresentar devidamente o produto que está sendo oferecido para o consumidor adquirir, sendo transparente apresentando os prós e contras para que não reste dúvidas

O autor menciona ainda, que as atividades existenciais do consumidor são fundamentais para o desenvolvimento de sua personalidade e pela execução do seu direito à dignidade23

4. O MERO ABORRECIMENTO E O DANO EFICIENTE 

A teoria do mero aborrecimento é caracterizada por um fato costumeiro em que não é indenizável, que apenas gera incômodo, frustração ou algo semelhante logo não atinge o judiciário, podendo ser coisas simples como atrasos, mau atendimento ao cliente que não resultam em danos graves. O fundamento para o mero aborrecimento é baseado na necessidade de diferenciação dos tipos de danos e lesões para os inconvenientes ou contratempos do cotidiano. 

Alguns magistrados categorizam a espera excessiva para resolução de um problema como mero aborrecimento e dissabores cotidianos, por não preencher os requisitos para a configuração do dano moral ou se enquadrou nos casos das exceções de necessidade de requisitos, sem reconhecer a perda do tempo útil e não considerando o fato de que o consumidor perdeu um tempo para tentar resolver a questão, conforme disposto pela doutrinadora Pamela Marchese24

Na Apelação Cível 1000116-32.2023.8.26.0309, a Relatora Cristina Zucchi reconheceu que, no caso, o cancelamento indevido da linha telefônica ultrapassou o mero aborrecimento, mas como o autor não tentou resolver de maneira administrativa, a Teoria do Desvio Produtivo não foi reconhecida: 

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. TELEFONIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR 
DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DO AUTOR DE CANCELAMENTO 
INDEVIDO DE LINHA FIXA DE TELEFONIA. SENTENÇA DE PARCIAL 
PROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE RECURSO DA EMPRESA DE TELEFONIA. 
INCONTROVERSA A PORTABILIDADE DA LINHA SEM SOLICITAÇÃO DO 
ASSINANTE. INTERRUPÇÃO INDEVIDA DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA. 
DANO MORAL CARACTERIZADO. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSOU O 
MERO ABORRECIMENTO OU DISSABOR COTIDIANO. ALTERAÇÃO DO 
BEM-ESTAR DO AUTOR. INDENIZAÇÃO DEVIDA. INDENIZAÇÃO FIXADA 
EM R$3.000,00 QUE NÃO ATINGE O CARÁTER PEDAGÓGICO DA 
MEDIDA. MAJORAÇÃO DA REPARAÇÃO PARA R$6.000,00, VALOR QUE 
SE MOSTRA COMPATÍVEL E RAZOÁVEL À HIPÓTESE. INAPLICABILIDADE 
DA TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR, UMA VEZ QUE 
INDEMONSTRADA A PERDA DE TEMPO ÚTIL OU A TENTATIVA DE 
SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS 
EM 20% SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. INTELIGÊNCIA (§ 2º, DO 
ART. 85 do CPC). SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Apelação 
provida em parte. 
(TJSP; Apelação Cível 1000116-32.2023.8.26.0309; Relator (a): 
Cristina Zucchi; Órgão Julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Foro 
de Jundiaí – 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 25/07/2023; Data de 
Registro: 25/07/2023) 

O dano moral é caracterizado quando ocorre a lesão a algum direito da personalidade, conforme mencionado no Código Civil25 art. 11 ao 21, onde no caso exposto houve danos ao autor por ter a linha telefônica cancelada sem nenhuma justificativa plausível. Portanto, a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor não foi aplicada no caso exposto, pois o autor não desperdiçou seu tempo produtivo de trabalho ou lazer tentando resolver a situação, porém sendo prejudicado do mesmo modo por ter que resolver judicialmente ao invés de achar uma solução com uma simples ligação ou conversa de maneira presencial. 

Nesse outro caso da Apelação Cível 1015434-22.2022.8.26.0008, a autora recebia telefonemas da ré com ofertas de serviços de maneira abusiva, portanto a relatora Rosangela Telles reconheceu a aplicabilidade da Teoria do Desvio Produtivo: 

APELAÇÃO. OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR 
DANOS MORAIS. OFERTAS DE SERVIÇOS E PRODUTOS DE 
TELECOMUNICAÇÕES POR MEIO DE TELEMARKETING. Pretensão 
deduzida pela consumidora visando fazer cessar as ligações direcionadas ao seu número de telefone celular, realizadas pela operadora de telefonia, que entende excessivas, bem como a condenação ao pagamento de indenização a título de danos morais no importe de R$5.000,00. Procedência em primeiro grau. Inconformismo da ré. Ligações originadas do prefixo 0303 que é da operadora CLARO. Telefonemas abusivos. Embora o oferecimento de produtos e serviços via telemarketing seja uma prática lícita, o abuso desse direito não deve ser tolerado. Exegese do art. 187 do Código Civil. Perturbação ao sossego do consumidor e prejuízo aos seus afazeres diários. Aplicação, ainda, da Teoria do Desvio Produtivo ou Perda do Tempo Livre. Danos morais caracterizados. Precedentes do E.
TJSP. Indenização mantida em R$5.000,00, quantia que se revela 
suficiente e proporcional ao fim que se destina no caso concreto. 
Sentença mantida. SUCUMBÊNCIA dos honorários advocatícios, 
segundo as disposições do art. 85, §11, do CPC/15. RECURSO NÃO 
PROVIDO. 
(TJSP; Apelação Cível 1015434-22.2022.8.26.0008; Relator (a): 
Rosangela Telles; Órgão Julgador: 31ª Câmara de Direito Privado; Foro 
Regional VIII – Tatuapé – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 
05/09/2023; Data de Registro: 05/09/2023)

 Diante o exposto, a teoria foi aplicada considerando os momentos em que a autora da ação teve de se abster de sua rotina para ter que atender as ligações excessivas da operadora, sendo prejudicada no seu dia a dia. O dano moral foi caracterizado nesse julgado, pois a requerente recebendo todas as ligações abusivas era obrigada a perder seu tempo de lazer ou até mesmo de trabalho no celular. 

O Dr. César Fiuza traz uma definição de dano eficiente e um exemplo de sua utilização26

Ocorre dano eficiente, quando for mais compensador para o agente 
pagar eventuais indenizações do que prevenir o dano. Se uma 
montadora verificar que uma série de automóveis foi produzida com 
defeito que pode causar danos aos consumidores, e se esta mesma 
empresa, após alguns cálculos, concluir ser preferível pagar eventuais 
indenizações pelos danos ocorridos, do que proceder a um recall para 
consertar o defeito de todos os carros vendidos que lhe forem 
apresentados, estaremos diante de dano eficiente. (…) O legislador 
poderia pôr fim ao dilema, editando norma, segundo a qual parte do 
valor da condenação iria para a vítima, a título de reparação pelos 
danos sofridos, enquanto a outra parte reverteria aos cofres públicos, 
sendo afetada a utilização em programas sociais.  

O Enunciado nº 445, da V Jornada de Direito Civil27 dispõe que: 

O dano moral indenizável não pressupõe necessariamente a 
verificação de sentimentos humanos desagradáveis como dor ou 
sofrimento.

O que demonstra que o dano moral não está limitado apenas a situações que o consumidor sinta sentimentos de dor e sofrimento, mas está ligado diretamente à violação de direitos de personalidade, como a dignidade, honra, imagem e outros aspectos inerentes ao indivíduo. A reparação por danos morais visa restaurar a dignidade e a integridade do indivíduo atingido, independente dos danos serem emocionais e não físicos. 

O dano eficiente está relacionado com a concepção de que o sistema legal deve explorar a alocação eficiente dos recursos para a compensação dos danos causados, para maximizar o benefício social. Os fatores, como a gravidade do dano, as possibilidades de ocorrência, os custos de prevenção e a capacidade do infrator de pagar a indenização. Alguns doutrinadores argumentam que pode enfraquecer o princípio da responsabilidade civil e sua proteção com os direitos individuais. 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

O objetivo dessa pesquisa era identificar como a teoria do desvio produtivo e o mero aborrecimento são aplicados nos casos de pedido de dano moral em que o tempo útil do consumidor foi desperdiçado. 

A Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor ensina que o tempo desperdiçado deve ser considerado relevante para a aplicação do dano moral e o seu reconhecimento de que seja capaz de gerar danos na qualidade de vida, como lazer, descanso ou bem-estar do consumidor, além do dano financeiro ou profissional. É uma forma de proteção e valorização do tempo do consumidor. 

Ficou demonstrado que as decisões judiciais não são uniformes em relação a aplicação da teoria. Na maioria, a mesma é apenas citada e utilizada como exemplo, mas não é capaz de gerar dano moral.


4 DESSAUNE, Marcos. TEORIA APROFUNDADA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR: Direito em Movimento, [S.l.], v. 17, n. 1, p. 15-31, jun. 2019. ISSN 2238-7110. Disponível em: <http://emerj.com.br/ojs/seer/index.php/direitoemmovimento/article/view/137>.
5 GAGLIANO, Pablo S. FILHO, Rodolfo Mário Veiga P. Novo Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil – Vol. 3. São Paulo: Editora Saraiva, 2022. 9786553622296. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553622296/. 
6 GUGLINSKI, Vitor Vilela, O DANO TEMPORAL E SUA REPARABILIDADE: ASPECTOS DOUTRINÁRIOS E VISÃO DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS. Misión jurídica, 2015
7 PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. AC n. º 230521-7, Relator: Des. Eurico de Barros Correia Filho, Data de Julgamento 07/04/2011, Quarta Câmara Cível.
8 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. AC nº 019884-06.2019.8.19.0001, Relatora: Des. Regina Lucia Passos. Data de Julgamento 19/05/2022, 24ª Câmara Cível
9 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. AC nº 1007613-76.2021.8.26.0565, Relatora: juíza Érika Ricci. Data de Julgamento 24/05/2022, 31ª Câmara Cível.
10 BRASIL. [Constituição Federal (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.Brasília. DF. Presidência da República, [vide Emenda Constitucional no 91 de 2016]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 28 mai. 2022.
11 BRASIL. Lei no 13.105, de 16 de março de 2015. Institui o Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 março 2015. Disponível em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 28 mai. 2022.
12 BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de set. de 1990. Código de Defesa do Consumidor, Brasília, DF, set 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm. Acesso em: 28 mai. 2022.
13 OST, François. O tempo do direito. Tradução de Élcio Fernandes. Bauru: Edusc, 2005
14 BRASIL. [Constituição Federal (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.Brasília. DF. Presidência da República, [vide Emenda Constitucional no 91 de 2016]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 28 mai. 2022.
15 MARQUES, Cláudia Lima. Prefácio. In: DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor: O Prejuízo do Tempo Desperdiçado, São Paulo. Revista dos Tribunais, 2011, p. 11. 
16 GAGLIANO, Pablo S. FILHO, Rodolfo Mário Veiga P. Novo Curso de Direito Civil – Responsabilidade Civil – Vol. 3. São Paulo: Editora Saraiva, 2022. 9786553622296. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553622296/.
17 DESSAUNE, Marcos. TEORIA APROFUNDADA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR: O Prejuízo do tempo desperdiçado e da vida alterada. 2 Ed. Vitória, ES: [s/n], 2017.
18 BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de set. de 1990. Código de Defesa do Consumidor, Brasília, DF, set 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm.
19 BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de set. de 1990. Código de Defesa do Consumidor, Brasília, DF, set 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm.
20 DESSAUNE, Marcos. Teoria Ampliada do Desvio Produtivo do Consumidor, do cidadão usuário e do empregado. Edição Especial do Autor. 3a edição. 2022. 
21 DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor: O Prejuízo do Tempo Desperdiçado, São Paulo: 2. ed. Vitória: Edição Especial do Autor, 2017, p. 365. 
22 DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor: O Prejuízo do Tempo Desperdiçado, São Paulo: 2. ed. Vitória: Edição Especial do Autor, 2017, p. 362-363.
23 DESSAUNE, Marcos. Desvio Produtivo do Consumidor: O Prejuízo do Tempo Desperdiçado, São Paulo: 2. ed. Vitória: Edição Especial do Autor, 2017, p. 354. 
24 MARCHESE, P.; ESPÓSITO DOS SANTOS, M. . M. . Responsabilidade civil: a existência de um mercado de danos morais e as decisões de “mero aborrecimento”. Revista Vianna Sapiens, [S. l.], v. 13, n. 1, p. 27, 2022. DOI: 10.31994/rvs.v13i1.861. Disponível em: https://viannasapiens.com.br/revista/article/view/861 
25 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.
26 FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 11. ed. Revista, atualizada e ampliada. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 720.
27 Enunciado 445 da V Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal. Disponível em: https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/366  


REFERÊNCIAS 

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406compilada.htm. 

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de set. de 1990. Código de Defesa do Consumidor, Brasília, DF, set. 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm. 

DE BATTISTI BRAGA, A. P.; PINTO ZAMPIER, M. A teoria do desvio produtivo do consumidor em contraposição à jurisprudência do mero aborrecimento:: uma questão de responsabilidade civil. Revista Vianna Sapiens, [S. l.], v. 10, n. 2, p. 20, 2019. DOI: 10.31994/rvs.v10i2.610. Disponível em: https://www.viannasapiens.com.br/revista/article/view/610. 

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PERNAMBUCO. Tribunal de Justiça. AC nº 230521-7, Relator: Des. Eurico de Barros Correia Filho, Data de Julgamento 07/04/2011, Quarta Câmara Cível. 

RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça. AC nº 019884-06.2019.8.19.0001, Relatora: Des. Regina Lucia Passos. Data de Julgamento 19/05/2022, 24ª Câmara Cível. 

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. AC nº 1000116-32.2023.8.26.0309, Relator (a): Cristina Zucchi, Data do Julgamento: 25/07/2023, 34ª Câmara de Direito Privado. 

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. AC nº 1007613-76.2021.8.26.0565, Relatora: juíza Érika Ricci. Data de Julgamento 24/05/2022, 31ª Câmara Cível. 

SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. AC nº 1015434-22.2022.8.26.0008, Relator (a): Rosangela Telles, Data do Julgamento: 05/09/2023, 31ª Câmara de Direito Privado.


1Acadêmico de Direito. E-mail: mavipvh@gmail.com. Artigo apresentado à Uniron, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2023;
2Acadêmico de Direito. E-mail: geosouzasilva23@gmail.com. Artigo apresentado à Uniron, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2023; 
3Professora Orientadora. Professora do curso de Direito. E-mail: jennifer.gomes@gruposapiens.com.br