REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.12525276
Felipe Sousa Santana1
André Felipe dos Santos de Carvalho2
SUMÁRIO
O estudo examina a evolução e a implementação do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) pela Polícia Militar no Estado do Maranhão, sublinhando a busca por valorização e legitimidade jurídica das instituições policiais. A introdução desse instrumento visa aprimorar a eficiência das ações de segurança pública e facilitar o acesso à justiça, especialmente para crimes de menor gravidade. No entanto, essa mudança provocou insatisfação e disputas entre as corporações policiais, revelando uma luta por poder e status funcional. A integração da função policial militar no universo jurídico apresenta-se como uma questão complexa. A Lei 9.099/95 e a adoção do TCO são pontos de tensão entre delegados da Polícia Civil e oficiais da Polícia Militar, levantando dúvidas sobre os objetivos corporativos subjacentes a essa prática. A eficácia do sistema judicial em assegurar o acesso à justiça e a celeridade processual é posta em xeque, com a percepção de que as carreiras jurídicas de Estado têm colhido mais benefícios do que as melhorias esperadas para a sociedade. A segurança pública é concebida como uma responsabilidade tanto do Estado quanto da sociedade, sublinhando a necessidade de uma integração comunitária efetiva, sendo o Termo Circunstanciado de Ocorrência uma das variadas possibilidades para realização desse objetivo pela Polícia Militar.
Palavras-chave: Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO); Polícia Militar; Acesso à Justiça e Segurança Pública.
ABSTRACT
The study examines the evolution and implementation of the Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) by the Military Police in the State of Maranhão, highlighting the pursuit of valorization and legal legitimacy of police institutions. The introduction of this instrument aims to enhance the efficiency of public security actions and facilitate access to justice, especially for minor crimes. However, this change has caused dissatisfaction and disputes among police forces, revealing a struggle for power and functional status. The integration of the military police function within the legal framework presents a complex issue. Law 9.099/95 and the adoption of the TCO are points of tension between Civil Police delegates and Military Police officers, raising questions about the corporate objectives underlying this practice. The effectiveness of the judicial system in ensuring access to justice and procedural celerity is questioned, with a perception that State legal careers have reaped more benefits than the anticipated improvements for society. Public security is conceived as a responsibility of both the State and society, emphasizing the need for effective community integration, with the Termo Circunstanciado de Ocorrência being one of the various possibilities for achieving this objective by the Military Police.
Keywords: Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO); Military Police; Access to Justice and Public Security.
1. INTRODUÇÃO
O acesso a uma solução justa de conflitos possui uma carga histórica e sociológica significativa, podendo ser justificado pela necessidade humana de resolver disputas com a intervenção de um terceiro imparcial. Esse terceiro, ao intervir, visa mitigar as consequências danosas para as partes envolvidas e proporcionar uma análise mais independente e serena da questão em litígio. Segundo Bonilla (2022), o acesso à resolução de disputas “é um componente estrutural da arquitetura conceitual do Estado moderno”. Essa afirmação implica que grande parte do debate sobre a existência e os modos de obter esse acesso é permeada por discussões formais acerca do Direito, do Poder Judiciário e das formas de otimizar seu funcionamento.
Todavia, restringir a análise do acesso à justiça a esses elementos limita excessivamente a compreensão e explicação dos fenômenos sociais que envolvem a concepção do que é Justiça. Tal redução temática também impacta o estudo das disputas e interesses presentes no horizonte analítico da mediação estatal na construção das estruturas formais de instrumentalização do direito (IGREJA e RANPIM, 2021).
Evoluções sociais quase sempre são acompanhadas do surgimentos de novas instituições ou de delineamentos de competências para instituições consolidadas que necessitam se compatibilizar com as demandas oras surgidas3. No caso do Brasil observa-se essa disputa principalmente durante o período final do regime colonial com a chegada da República. Estudantes universitários, acadêmicos, sociedade civil organizada, poder público e setores financeiros passaram a disputar espaços de poder objetivando decidir os rumos de projetos que o país deveria seguir. E dentro desse ambiente de disputa estavam os principais atores a determinar o que seria justiça no caso concreto (ADORNO, 2019; CARVALHO, 2008).
Com o advento da Constituição de 1988, emerge uma nova perspectiva sobre o papel das instituições e sua função na ampliação da concretização dos direitos sociais, especialmente em relação aos hipossuficientes. Instrumentos normativos e operacionais foram delineados para se integrarem na busca da efetivação do extenso rol de direitos consagrados pela neófita Carta Constitucional. Esse conjunto de normas, diretrizes e instrumentos possibilitou a elaboração da Lei 9.099/95, conhecida como a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Por meio dela buscou-se materializar o ideal de uma justiça célere e eficiente nas causas que envolviam menor valor financeiro ou reprimenda estatal.
A instrumentalização deste objetivo no âmbito penal passou a ocorrer através do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), o que gerou responsabilidades e competências para órgãos públicos de natureza policial. Esse mecanismo, concebido para acelerar o acesso ao Poder Judiciário em litígios envolvendo tipos penais com penas inferiores a dois anos de privação de liberdade, tornou-se, ao longo do tempo, alvo de disputas institucionais entre delegados da Polícia Civil e oficiais das Polícias Militares em todo o Brasil.
Contudo, como asseverado por Igreja e Ranpim (2021), o foco da análise revelou-se mais uma vez equivocado, centrando-se no possível conflito de competência formal para a realização de uma atividade pública, em detrimento do que poderia ser o pano de fundo mais relevante a ser estudado: a busca por maiores competências e status quo jurídico pelas corporações. Os benefícios para a sociedade são menosprezados.
Este artigo busca estudar como o surgimento da Lei 9.099/95 desencadeou uma disputa a nível nacional entre as duas maiores instituições4 do Sistema de Segurança Pública, permanecendo quiescente em âmbito regional – Estado do Maranhão – até a segunda década deste século. E em que medida esse litígio tem como pano de fundo não apenas possibilitar uma ampliação do acesso da população mais vulnerável à Justiça, mas a efetivação de demandas corporativas das instituições envolvidas. Para isso, fundamental analisar de forma abreviada a atividade policial no atual regime constitucional, mormente a realidade prática da Polícia Militar do Maranhão e a colmatação do TCO a essa realidade.
Por fim discorreremos sobre os possíveis objetivos da Polícia Militar do Maranhão na efetivação desta competência, analisando as possibilidades positivas da elaboração do TCO pelos milicianos e suas limitações, além de ponderar a realidade institucional frente aos demais órgãos de natureza jurídica – e juridicializado5 – do Poder Executivo do Maranhão, imiscuindo-se naquilo que parece ser pleito histórico da instituição6, a reestruturação da carreira.
2. SEGURANÇA PÚBLICA: Salvaguarda da Justiça e meios de intervenção.
A ideia de segurança pública exercida por instituições policiais militares sempre suscita a noção de poder de polícia, isto é, de um poder limitativo da liberdade individual em benefício do interesse público, ou, conforme decorre do art. 144, da Constituição da República, em benefício à ordem pública. Mas não é só. Para além disso, a segurança pública carrega em si uma prerrogativa constitucional indisponível, a ser garantida por meio de políticas públicas às mais diversas, de modo que ao Estado cabe a obrigação de criar condições objetivas que determinem o efetivo acesso a este serviço7.
De igual modo, conforme nos alerta José Afonso da Silva (2018), a segurança pública deve ser compreendida como uma tarefa e responsabilidade permanente do Estado e de todos, deste modo, cabendo à entidade política, como também à população colaborar com sua efetivação. Em consequência, deve-se reformar a noção de ordem pública no sentido de compreender que ela exige a integração comunitária e, assim, qualquer ato da instituição precisa considerar esta vertente da finalidade, ou seja, como nos expõe Luseni e Garcia (2020, pág. 182) o “compromisso primordial com a prestação de serviços de qualidade, eficazes e disponibilizados em prazos adequados”
Em outras palavras, a atuação da segurança pública em relação à citada concepção de ordem pública atrai para ela a necessidade de considerá-la como necessidade coletiva (VALENTE, 2017, p. 125). Ela é provida pela atividade estatal, mas sujeita-se aos interesses da coletividade, sobretudo, aos direitos fundamentais, mas não como finalidade única da segurança e sim como forma de entender que a segurança jurídica é um bem jurídico de natureza supraindividual.
David H. Bayley (2002) ao dissecar os padrões das instituições policiais em diversos países do mundo percebeu uma característica similar na maioria das organizações estudadas em seu trabalho: o elevado grau de consistência na manutenção do status quo estrutural, ou seja, uma manutenção da cultura na qual é originada8 e na qual se sustenta no momento. No caso brasileiro, isto evidencia-se pelo vínculo entre Forças Armadas e Forças Policiais Militares, em que pese sua divisão nas esferas de competência e de público a ser respondido diariamente pós 1988. O militarismo, sua natureza, valores particulares e supervalorização de bens jurídicos que se sobrepõem até mesmo ao indivíduo são percebidos nas normas federais e estaduais
Um militar é reconhecido como sua própria sociedade, separada da população civil mais ampla, com suas próprias necessidades, nascidas dos códigos de conduta e das exigências excepcionais da instituição. A eficácia militar depende da disciplina, liderança hierárquica e adesão aos comandos. Muitas das ofensas definidas nos códigos legais militares existem para obrigar a obediência às ordens e, de outra forma, garantir a capacidade da instituição de operar sob suas circunstâncias únicas. (KYLE; REITER, 2021, Pág. 4-5, tradução nossa. Grifo nosso).
Com isso, e cotejando-se com a instituição policial militar, a segurança pública, aos moldes das compreensões teóricas e práticas contemporâneas deve implementar um policiamento democrático como via de acesso a realização da justiça, pois segundo Valente (2017), ela é um meio de garantia dos direitos dos cidadãos e da própria justiça. A instrumentalização do preconizado nas Leis dos Juizados Especiais, via Termo Circunstanciado de Ocorrência, pelas Polícias Militares é – ou deveria ser – uma forma de implantação deste modelo democrático9, porém o que se discute neste ensaio é se seriam esses os objetivos corporativos reais por trás da implementação dessa novidade, tão polêmica e polemizada fora e interna corpores.
2.1 Termo Circunstanciado de Ocorrência nas corporações estaduais brasileiras.
A competência legal para a lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) pela polícia militar vige sob a ótica dos objetivos e princípios norteadores da Lei nº 9.099/95, a qual criou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e instituiu o TCO. Esta lei preceitua em seu artigo 2º que “o processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando sempre que possível, a conciliação ou a transação” (BRASIL, 1995, p. 1).
O legislador originário, ao formular a Lei dos Juizados Especiais Criminais, evidenciou um esforço deliberado para minimizar a intervenção do Direito Penal e Processual Penal em relação aos delitos de menor gravidade. Este enfoque visa permitir um controle mais eficaz sobre crimes mais graves e o crime organizado. Neste contexto, a lei busca uma simplificação estatal, proporcionando aos indivíduos lesados uma via mais acessível para a restauração da justiça. A principal porta de entrada para a resolução desses conflitos é a lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência, que representa um mecanismo célere e desburocratizado para registrar infrações de menor potencial ofensivo.
Este é o instrumento legal vigente para tratar dos crimes menos complexos e que tenham pena máxima não superior a dois anos e também os que constam no rol das contravenções penais pela autoridade policial que primeiro tomar conhecimento da prática delituosa para posterior – e imediato – encaminhamento ao juizado competente. Tal abordagem não apenas agiliza a resposta estatal, mas também reforça a eficiência do sistema judicial, permitindo que recursos sejam direcionados de forma mais adequada para a atividade ordinária dos órgãos do Sistema de Segurança Pública.
Para Medeiros (2005, p. 63), este instrumento “nada mais é do que uma autuação sumária onde o fato é narrado com todos os seus detalhes (autor, ofendido, testemunhas, local etc.), sem, contudo, prender-se ao formalismo verificado, e.g., na peça inquisitorial”. Desta forma, observa-se que o TCO tem como principais funções a agilização do acesso ao Poder Judiciário, a reparação dos possíveis danos sofridos pela vítima e a mitigação do encarceramento em massa dos cidadãos infratores (ao possibilitar penas alternativas em prejuízo a de prisão).
No Brasil, a utilização do Termo Circunstanciado de Ocorrência teve início de forma exclusiva pelas Polícias Civis e pela Polícia Federal. Com o passar dos anos, sua competência foi estendida às Polícias Militares, resultado de acordos, resoluções e instruções emanadas pelos Judiciários Estaduais e pelas Secretarias de Segurança Pública dos Estados. Essa expansão iniciou-se em 1997, com a Polícia Militar do Estado do Paraná, seguida pela adoção pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, especialmente para as infrações ambientais. Gradualmente, essa prática foi disseminada por todo o país, consolidando-se como um modelo de eficiência e efetividade, notadamente na Polícia Militar de Santa Catarina (PMSC).
No estado do Maranhão surgiu apenas em 2022, por meio da resolução-GP nº 117, de 16 de novembro de 2022, do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, permitindo às corporações militares, assim como a Polícia Rodoviária Federal, deflagrar procedimento de natureza criminal do tipo Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) em todo o território do estado. Aqui, assim como alhures, esta competência surgiu com a mesma polêmica sobre a legitimidade e interesses envolvidos na divisão de responsabilidades com a Polícia Civil.
O debate jurídico é antigo e já se ambientou na Suprema Corte brasileira por mais de uma vez, notadamente na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2862 e ADI 2618, tendo no entendimento do Ministro Cezar Peluso, naquela ação, a fundamentação que serviu de esteio para os demais precedentes e descrições doutrinárias:
[…] Ademais e a despeito de tudo, ainda que, para argumentar, se pudesse ultrapassar o plano de estrita legalidade, não veria inconstitucionalidade alguma, uma vez que, na verdade, não se trata de ato de polícia judiciária, mas de ato típico da chamada polícia ostensiva e de preservação da ordem pública – de que trata o § 5º do art. 144 -, atos típicos do exercício da competência própria da polícia militar, e que está em lavrar boletim de ocorrência e, em caso de flagrante, encaminhar o autor e as vítimas à autoridade, seja policial, quando seja o caso, seja judiciária, quando a lei prevê (g.n. – Lei 9.099/95).
Superada a celeuma jurídica (o que em verdade está longe de ser superado no universo político administrativo) Batista (1998) defende que o Termo de Ocorrência Circunstanciado, por ser um instrumento célere e reservado para relatar delitos menos complexos, deva tirar uma sobrecarga de trabalho das polícias judiciárias, deixando-as livres para investigar os casos mais complexos.
Menos tarefas incumbidas à polícia judiciária, que com seus poucos recursos, financeiros e humanos, ainda tinha que acolher os elementos probatórios dessas infrações de menor porte. A este órgão deve ser reservada a investigação dos delitos de maior gravidade, cuja apuração é de maior interesse da sociedade (BATISTA, 1998, p. 44).
As polícias militares que já implantaram o TCO fornecem um reforço estatal para a resolução de lides buscando evitar pequenos delitos, melhorando o atendimento imediato no local do fato ao cidadão, e evitando que estas pequenas ocorrências possam torna-se uma ocorrência de vulto, ou seja, mais grave, colocando em risco a vida do próprio agente de segurança e dos demais presentes. Giacomolli (1996, p. 26) aduz que: “se a vítima pode reclamar diretamente ao Juizado Especial Criminal, há que se admitir que Brigada Militar possa apresentar os envolvidos aos juizados, ao invés de levá-los à delegacia de polícia”.
Segundo Gomes (2002, p. 99), quase metade dos municípios brasileiros ainda não contava com a autoridade civil de carreira na virada do milênio. Quem desempenhava nesses lugares a função da Polícia Civil era o policial designado (geralmente militar). Sendo assim, tudo depende das peculiaridades locais e nesse aspecto, as resoluções estaduais, como a ora estudada, é pertinente em dar resposta a uma necessidade regional.
No entanto, o que se observa no cenário institucional pode ser menos uma preocupação genuína com o acesso célere à justiça para os mais necessitados, e mais uma busca das corporações castrenses por legitimidade jurídica e aumento de competências frente às demais, visando obter status funcional, ganhos estruturais, além de benefícios pecuniários. Esta dinâmica, conforme literatura especializada cotejada na pesquisa, revela uma tendência de instrumentalização do aparato jurídico público em prol de interesses corporativos, ao invés de um compromisso efetivo com a democratização e a eficiência da justiça. Deixamos o questionamento direto, franco e corporativista (por que não?) de Leitão (2019):
O mais cômico desta situação é que não se visualiza instituições como Poder Judiciário, Ministério Público, Procuradorias, Defensorias entre outras ao menos cogitando abrir mão de atribuições ou permitir que outras instituições façam por meio de arranjos jurídicos, suas vezes sob qualquer pretexto. Sabem por que? Responde-se de imediato e sem cerimônias, pois para conquistar espaços e atribuições, é um processo paulatino e de conquistas às duras penas que exigem tempo com demonstração de serviços prestados à sociedade, que não podem ser jogadas ao vento, por crises e outras conjunturas.
O robustecimento institucional e o crescimento das carreiras jurídicas de Estado (tanto do Poder Judiciário como do Poder Executivo) não se traduziram em melhorias no desempenho do sistema em assegurar os direitos constitucionais de acesso à justiça e celeridade processual, revertendo-se, ao contrário, em privilégios para os membros dessas carreiras (AQUINO, GARCIA, 2019).
3. ACESSO À JUSTIÇA: A busca do status jurídico pelas Polícias Militares.
Salvo rompantes momentâneos, a estabilidade de poder encontrada no âmbito do Poder Judiciário, e dos atores que o orbitam, é um antigo objeto de estudo, que mesmo com o passar dos anos parece remanescer inconteste e intocado pela opinião popular (ADORNO, 2019). Essa particularidade também foi/é objeto de desejo de muitas pessoas, instituições e carreiras, sejam por seu status, ou pela grande fatia de recursos mobilizados.
Porém no século passado, Sadek (1995, pág. 15), nos trazia uma importante faceta das atribuições determinadas para esses órgãos e então pouco discutida: As responsabilidades e consequências advindas do grande número de competências e privilégios sob o guarda-chuva dessas instituições:
O processo de fortalecimento institucional do Judiciário, enquanto organização, teria ainda que ser apreciado do ponto de vista do cumprimento efetivo de suas funções. Referimo-nos, aqui, a um aspecto igualmente fundamental, qual seja, a efetividade da instituição na distribuição da justiça. Este é o questionamento mais intenso que o Judiciário vem enfrentando no Brasil, responsável, por excelência, pelo que se convencionou chamar de “crise” da justiça.
Segundo Aquino e Garcia (2019, pág. 162) nesse mesmo período, “as instituições do sistema de justiça se converteram em forças de grande relevo na vida política brasileira, com significativa ingerência sobre a atuação dos demais Poderes do Estado, além das atividades privadas de interesse público”. Isso possibilitou que seus membros consolidassem posição privilegiada nas estruturas públicas, não sem a companhia das outras instituições descritas como essenciais à justiça. Instituições públicas outrora com papéis determinantes nos rumos da nação, como os militares, passaram a se resguardar nos espaços constitucionais que lhe cabiam, operacionalizando suas funções e observando as dinâmicas que o neoinstitucionalismo10 lhe impunham.
Os militares estaduais, por particularidade incluídos na função de policiamento preventivo e de salvaguarda da ordem pública, possuíam um papel mais limitado e restrito dentro de suas unidades federativas, vendo como sua face no espelho a Polícia Civil. Gestores de ambas corporações, Delegados de Polícia e Oficiais Militares, passaram a ser os responsáveis pela elaboração, planejamento e execução das políticas de segurança determinadas pelos Governos dos estados, disputando responsabilidades e competências que a lei lhe permitiam.
Paralelamente à aquisição da competência de natureza pré-jurídica, como elaboração do TCO, os Delegados de Polícia Civil conquistavam cada vez mais o status de atividade jurídica, angariando benefícios diversos. Seguiam assim a tendência deste perfil profissional – jurídico – frente às demais carreiras do Sistema de Segurança Pública e outras integrantes do Poder Executivo (Tabela e Gráfico 02). Em nível federal Aquino e Garcia (2020, pág. 179) demonstravam que “os defensores públicos da União e os membros da AGU têm remuneração média inferior às demais carreiras jurídicas, mas que permanece superior à remuneração do servidor público federal de nível superior.”
Valores vencimento base dos servidores públicos do Poder Executivo do Estado do Maranhão11. Carreiras Jurídicas e Juridicializadas. 2007 e 2024.
Gráfico 02: Diário Oficial do Poder Executivo do Estado do Maranhão nº082, de 27 de abril de 2007; nº 049 de 14 de março de 2023; nº 213 de 21 de novembro de 2023 e Portal da Transparência do Governo do Estado do Maranhão (2024). Valores em Reais brasileiro (R$). Elaboração dos autores.
A natureza jurídica do cargo de Delegado passou a ser buscada por seus sindicatos e associações12 em detrimento da valorização e especialização da técnica policial. À primeira vista, parece tratar-se de uma função que demanda de seus executores conhecimentos tanto jurídicos quanto técnicos13. No entanto, tal característica é comum a diversas funções de nível semelhante no Poder Executivo, como as de Auditores e Controladores, que também exigem uma formação jurídica aliada a outras especializações técnicas. A busca pelo enquadramento em condições análogas às dos Defensores Públicos e Advogados Públicos revela um intento de valorização que, em última análise, se traduz em alvissareiros benefícios pecuniários e acesso a um estatuto próprio, característico do universo das carreiras jurídicas.
A inclusão dos Delegados neste novo estatuto tornou-se objeto de cobiça por grande parte do oficialato das Polícias Militares no Brasil, levando à adoção de diversas estratégias para alcançar tal objetivo. Alguns estados passaram a exigir o título de bacharel em Direito para o ingresso no Curso de Formação de Oficiais, enquanto outros investiram na capacitação ao longo da carreira com cursos de pós-graduação strictu sensu. Além disso, muitos buscaram incluir a competência para lavrar Termos Circunstanciados de Ocorrência (DONATO; OLIVEIRA, 2019).
Todas essas iniciativas ocorreram paralelamente às negociações institucionais com agentes políticos dotados de poder decisório e ao debate legislativo para a elaboração da Lei Orgânica das Polícias Militares.
Conforme estudo realizado pela Federação Nacional dos Oficiais Militares do Brasil em 2020, na busca por inclusão, mais de dois terços das corporações estaduais já se encontravam habilitadas, ou em processo de habilitação, para a elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência. Essa habilitação foi alcançada tanto por meio de entendimentos com o Poder Judiciário quanto por iniciativas das Secretarias de Segurança Pública estaduais.
Há que se observar quais serão as consequências no âmbito do acesso qualitativo e quantitativo das pessoas à Justiça, e em que medida isso legitima o trabalho de policiamento preventivo/repressivo das instituições. A ver se o que busca as instituições policiais militares por trás de um roupa de benfeitora da justiça não é mais diretamente o fortalecimento da classe de gestores, visando “consolidar e até mesmo expandir uma série de prerrogativas e benefícios exclusivos dentro da máquina pública.” (AQUINO, GARCIA, 2019, pág. 176)
No Maranhão, a realidade foi posta e paulatinamente vem sendo difundida, tanto na capital quanto em parte dos 216 municípios. Cursos, capacitação e debates tem acontecido por meio da Diretoria de Ensino da PMMA e do Gabinete de Segurança Institucional do Poder Judiciário. Sobre essa dinâmica, falaremos no capítulo a seguir.
3.1 TCO. Breve histórico e dinâmica no Maranhão.
No estado do Maranhão constata-se que a temática fora trabalhada pelo legislador estadual há mais de 22 (vinte e dois) anos, especificamente no art. 60-E do Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão, modificado Lei Complementar (MA) nº 046, de 30 de novembro de 200014, quando o legislador consignou expressamente no parágrafo único que “o termo circunstanciado a que alude o art. 69, da Lei nº 9.099, de 26.09.95, será lavrado pela autoridade policial civil ou militar que tomar conhecimento da ocorrência” (MARANHÃO, 2000). Na ocasião, o Delegado de Polícia Federal Raimundo Soares Cutrim ocupava a Secretária de Segurança do Estado, então denominada Gerência de Justiça, Segurança Pública e Cidadania.
Em que pese tal fato, a Polícia Militar do Maranhão não adotou nenhuma medida administrativa para exercer a atribuição expressa de lavrar Termo Circunstanciado de Ocorrência nos casos de crime de menor potencial ofensivo. Os motivos são desconhecidos, mas o fato é que nada fora feito. Não houve na época disputa em torno da atribuição, como ocorrera em outros estados da federação.
Após 11 (onze) anos de inércia da polícia ostensiva estadual, por meio da Lei Complementar (MA) nº 144, de 28 de dezembro de 201115, alterou-se o parágrafo único do art. 60-E do Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão, tão somente para retirar a competência da autoridade policial militar para lavratura do TCO, mantendo apenas a competência da autoridade policial civil. À época, a Secretaria de Segurança Pública era ocupada por Aluísio Guimarães Mendes Filho, ex-agente de Polícia Federal.
Em 2020, durante a pandemia do COVID-19, por meio do Decreto (MA) nº 35.677, de 21/03/2020, modificado pelo Decreto (MA) nº 35.714, de 03/04/2020, o então Governador Flávio Dino, com vistas a reduzir deslocamentos a Delegacias de Polícia e aglomeração de pessoas, autorizou a lavratura do TCO pela Polícia Militar do Maranhão.
Somando-se a nova autorização, o Corregedor Geral de Justiça do TJ/MA, Desembargador Marcelo Carvalho Silva, por meio da Recomendação nº 002/2020 – CGJ, de 23/03/2020, recomendou que os juízes estaduais recebessem o TCO lavrado pela PMMA e pela PRF. À época, a Secretaria de Segurança Pública era ocupada pelo Delegado de Polícia Civil Jefferson Miller Portela e Silva. Mais uma vez, nenhum TCO foi lavrado pela PMMA.
A implementação da lavratura do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) pela Polícia Militar ocorreu efetivamente em 2022, através da Resolução-GP nº 117, de 16 de novembro de 2022, emanada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Esta resolução facultou às corporações militares, bem como à Polícia Rodoviária Federal, a competência para lavrar procedimentos de natureza criminal do tipo TCO em todo o território estadual, estabelecendo um marco significativo na atuação dessas instituições16.
Para o Desembargador Paulo Velten, então presidente do Tribunal do Justiça, o Poder Judiciário Brasileiro incorporou entre os seus objetivos nacionais, a Agenda 2030 das Nações Unidas, que visa construir países desenvolvidos, em uma cultura de inclusão17, destacando o Objetivo de Desenvolvimento Social 16, que impõe a todos a construção de instituições eficazes, responsivas, capazes de atender as demandas e anseios da sociedade no tempo e da forma adequada18.
A dinâmica de normatização, regulamentação e aplicação do Termo Circunstanciado, parecia a sua maneira identificar as dificuldades naquilo que a literatura nos informava sobre os países que conseguiram avançar em suas pautas de valorização e consolidação de suas instituições. A intensa dificuldade em perpetrar mudanças com o objetivo de construir instituições fortes, eficazes e legitimadas19.
Muitas medidas podem ser tomadas para fortificar a atuação das polícias militares. Certo é que as polícias militares que já implantaram o TCO fornecem um reforço estatal para a resolução de lides buscando evitar pequenos delitos, melhorando o atendimento imediato no local do fato ao cidadão, e evitando que estas pequenas ocorrências possam tornar-se uma ocorrência mais gravosa, com mais risco a vida do próprio agente de segurança e dos demais presentes ou com consequências mais danosas para ordem pública e convívio social20.
No entanto, o que se observa no cenário institucional é uma insatisfação com a nova atribuição, maximizada pela diferença salarial com a outra corporação responsável pela elaboração do TCO21, o que sugeriria estar a preocupação social com o acesso célere à justiça para os mais necessitados em segundo plano, tendo como plano de fundo primário a busca das corporações castrenses por legitimidade jurídica e aumento de poder, por meio da ascensão do status funcional e ganhos estruturais/materiais.
Subsídios profissionais responsáveis pela elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO). Estado do Maranhão.
Gráfico 02: Subsídio inicial e final22. Delegados de Polícia Civil e Oficiais da Polícia Militar do Estado do Maranhão. Elaboração dos autores
Agentes do Sistema de Segurança Pública do Maranhão responsáveis pela elaboração do TCO. Subsídio delegados de Polícia Civil do Maranhão – 3ª Classe e Especial – e Oficiais da Polícia Militar do Maranhão – 2º Tenente e Coronel. Ano: 2015, 2020 e 2024 (mês de referência: maio).
Fonte: Diário Oficial do Poder Executivo do Estado do Maranhão: nº 115 de 24 de junho de 2015, nº 074 de 23 de abril de 2015; nº 234 de 18 de dezembro de 2017 e nº 213 de 21 de novembro de 2023 e Portal da Transparência do Governo do Estado Maranhão (2024). Valores em Reais brasileiro (R$). Elaboração dos autores.
Todavia, como iremos discorrer na seção final, esta dinâmica – conforme literatura especializada cotejada na pesquisa – revela uma tendência de instrumentalização do aparato jurídico público em prol de interesses corporativos. Isso ocorre, todavia, sem que se perca de vista o compromisso efetivo com a democratização e a eficiência da justiça, pois não nos parece ser inviável, ou impossível, a triangulação de fatores de interesses que rodeiam a disputa pela competência na confecção do Termo Circunstanciado de Ocorrência.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo buscou analisar a aproximação entre a função policial militar e o universo jurídico no contexto do Maranhão, com foco na elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) pela Polícia Militar do Maranhão (PMMA). Através de uma metodologia que incluiu a análise de documentos, observação participante e análise de dados, foi possível identificar tanto os avanços quanto os desafios dessa integração.
A introdução deste instrumento representa um esforço para melhorar as condições organizacionais e materiais dos policiais militares. Essa iniciativa visa não apenas a capacitação técnica dos profissionais, mas também a promoção de uma maior eficiência nas ações de segurança pública, porém não sem consideráveis obstáculos interno e externos.
No entanto, é crucial reconhecer que essa aproximação, para além de alinhar-se a interesses corporativos, permite o compromisso com a efetivação de direitos e garantias fundamentais através do equilíbrio entre a melhoria da atividade operacional e a solução de demandas trazidas pela sociedade. A implementação do TCO pela PMMA tem o potencial de legitimar o trabalho de policiamento preventivo e repressivo, ao mesmo tempo em que fortalece a confiança da população nas instituições de segurança pública.
Em suma, a integração da função policial militar com o universo jurídico no Maranhão é uma iniciativa complexa, mas promissora. Ela oferece uma oportunidade única para aprimorar tanto a eficiência da instituição policial militar, quanto o acesso à justiça, sem perder de vista o referencial teórico problematizado neste artigo, o interesse corporativo em angariar benefícios pecuniários e interinstitucionais. Que não se perca de vista, há a possibilidade de como a teoria dos negócios nos ensina, por meio do conceito de jogos de soma não zero – ou ganha ganha – todos os participantes se beneficiarem de forma coletiva, melhorando-se índices e realidades urgentes em nosso estado.
3 North (2018, Pág. 122-123) ao descrever estas mudanças informa que a “estabilidade [das instituições] decorre do fato de que há numerosas restrições específicas que afetam determinada escolha […] mudanças significativas nesse quadro institucional acarretam uma profusão de mudanças em uma série de restrições, que compreendem não só restrições legais como normas de conduta […] ao mesmo tempo, o complexo de restrições informais e formais possibilita contínuas mudanças incrementais em determinadas margens”
4 Segundo o Raio-X das Forças de Segurança Pública do Brasil (2024), ao todo as Polícias Militares contavam em 2023 com um efetivo de 404.871 profissionais tendo as Polícias Civis 60.155 distribuído por todos o país.
5 A expressão “juridicialização” neste artigo define-se como a transformação, ou aproximação, da natureza da carreira do oficial da Polícia Militar do Maranhão àquelas atinentes ao “Judiciário e os órgãos que orbitam ao seu redor no desempenho de funções essenciais à justiça” (Ministério Público, Advocacia Pública e Defensoria Pública)”, conforme Luseni e Garcia (2020, pág. 161). Incorporamos a essa compreensão o Delegado de Polícia Civil, não apenas por pertencerem ao subgrupo de Atividades de Processamento Judiciário, como por serem concorrentes a PM na competência para a confecção do Termo Circunstanciado de Ocorrência.
6 Para além de pauta da greve ocorridas no ano de 2011 no Estado do Maranhão, o debate sobre organização das carreiras da Polícia Militar em nível superior, superou 20 anos no Congresso Nacional, sendo positivado em dezembro de 2023 por meio da Lei 14.751, a Lei Orgânica das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares.
7 Partindo deste princípio, e nos termos do entendimento da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o Poder Judiciário pode determinar que o Estado implemente políticas públicas em matéria de segurança pública, sem que isso demonstre qualquer tipo de ingerência no poder discricionário típico de realização de políticas pelo Poder Executivo. Para tanto, confira: STF – RE 559.646 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 7-6-2011, 2ª T, DJE de 24-6-2011.
8 Douglass North (2018) ao descrever sua teoria das instituições já descrevera as complexidades da mutação das organizações, especialmente as formalizadas e de natureza pública.
9 HERRERO (2019), em seu artigo sobre o Ciclo completo de polícia e sua eficiência na gestão e integração dos órgãos de segurança pública, delimita importante marco teórico entranhado no debate sobre a possibilidade das Polícias Militares realizarem TCO, o do ciclo completo de polícia no Brasil.
10 KLAFKE, G. F. Neoinstitucionalismo no direito: entre a pesquisa acadêmica e a dogmática jurídica. REI – Revista Estudos Institucionais, 2023 e HALL; TAYLOR. As três versões do neo-institucionalismo, 2003.
11 O ano de 2007 foi escolhido como referência devido a reestruturação exercida por meio da Lei Complementar 105 de 27 de abril de 2007, publicada no Diário Oficial do Poder Executivo do Estado do Maranhão nº082, de 27 de abril de 2007. Foi a última grande reestruturação das carreiras do funcionalismo público do Poder Executivo Maranhense.
12 Matérias diversas acerca dessa realidade/busca podem ser encontradas em site de associações de policiais civis e delegados pelo Brasil, vide https://sindpolmg.org.br/stf-oficial-da-pm-nao-e-carreira-juridica-mas-delegado-e/ (2010).
13 Esta busca material teve um importante revés formal no voto-decisão do Ministro Relator Gilmar Mendes na ADI 5.522. Plenário Virtual 11/02/2022: […] o dispositivo impugnado, ao conferir autonomia à carreira de delegado, atribuir independência funcional aos Delegados de Polícia Civil, incluir a categoria entre as funções essenciais à Justiça e ampliar seu rol de competências, incorreu em ofensa aos artigos 129, I, VI e VIII; e 144, § 6, da Constituição Federal.
Porém, substancialmente, como se verá no transcorrer do próximo capítulo, os ganhos permaneceram em diversos entes federativos, como no estado do Maranhão.
14 Publicada no Diário Oficial do Poder Executivo (MA) n° 230, de 30/11/2000.
15 Publicada no Diário Oficial do Poder Executivo (MA) n° 250, de 28/12/2011.
16 Na ocasião, por coincidência, o Secretário de Segurança do Estado do Maranhão, pela primeira vez na história recente do Estado, era um militar estadual, o Coronel QOPM Silvio Carlos Leite Mesquita
17 Igreja; Rampin. Acesso à Justiça e Transformação Digital: um Estudo sobre o Programa Justiça 4.0 e Seu Impacto na Prestação Jurisdicional, 2022.
18 Discurso proferido pelo então presidente do TJMA – e presenciado por um dos autores deste artigo – na solenidade de encerramento de Curso de Lavratura de TCO para policiais do CPAI-1, em Bacabal-MA, no dia 31 de março de 2023.Na ocasião confidenciou para os presentes que ao surgir a ideia do termo de cooperação com a PM, para implementar a lavratura do TCO, tão logo anunciou sua intenção, fora imediatamente desestimulado a fazê-lo, tanto por representantes da Polícia Civil, Sindicatos e Associações, sob o argumento de que surgiria uma indisposição entre as polícias, além da Polícia Militar não estar preparada para assumir tal atribuição. Ratificou a necessidade de enfrentamento à cultura extrativista das instituições, que levam aos servidores agirem somente com vistas aos seus próprios interesses, perdendo de vista o cidadão.
19 Legitimidade institucional conforme Barry Friedman em seu texto The politics of judicial review, 2005.
20 Para maiores informações sobre a Teoria das Janelas Quebradas, vide Wacquant, 1999.
21 PEREIRA, Jeferson Botelho. Delegado de Polícia: a autoridade policial a que se refere o art. 69 da Lei 9.099/95. 2019.
22 Para fins de análise foi selecionado os últimos postos/cargos de cada carreira. Delegado Classe Especial e Coronel QOPM, não necessariamente sendo todos atingidos pelos membros da instituição, notadamente na Polícia Militar.
23 Mediante a Lei nº 10.266, de 24 de junho de 2015, que versa sobre os reajustes salariais, mais de três mil servidores ativos e inativos dos Subgrupos Atividades de Polícia Civil (APC) e Processamento Judiciário (APJ) da Polícia Civil do Maranhão foram contemplados com uma recomposição salarial pelo Governo do Estado. Além de um reajuste de 5% nos subsídios dos servidores do Subgrupo APC, a Gratificação de Natureza Técnica (GNT) foi incorporada aos subsídios dos cargos que não possuíam curso superior. Embora essa gratificação tenha se originado de uma decisão judicial, sua aplicação era anteriormente restrita aos cargos de nível superior.
A categoria também recebeu reajustes em diversas verbas, incluindo Adicional de Insalubridade e outros benefícios. O total dos reajustes para o subgrupo de Atividades de Polícia Civil variou de 20% para os 950 servidores que já recebiam a Gratificação de Natureza Técnica, a 38% para os 1.981 servidores que passaram a receber a GNT após a medida (SEGEP, 2015). GRIFO NOSSO.
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1 Doutorando em Direito Constitucional e Mestre em Administração Pública pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), Bacharel em Direito e Segurança Pública. Oficial Superior da PMMA (Maranhão).
2 Especialista em Direitos Humanos, Cidadania e Gestão da Segurança Pública pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e Bacharel em Direito (UFMA). Oficial Superior da PMMA.