REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7315945
Thaynar do nascimento Almeida¹
Francine Adilia Rodante Ferrari Nabhan²
Rosyvania Araújo Mendes³
RESUMO
O presente estudo acadêmico foi realizado por meio de doutrinas e artigos sobre a situação atual do sistema prisional brasileiro, mais especificamente, sobre a forma de aplicação de penas no Brasil, as finalidades da pena e sua eficácia. Analisa de forma crítica a aplicabilidade desses meios dentro da sociedade. Além disso, aborda especificamente a desestruturação do sistema prisional brasileiro e evidencia o descaso da prevenção de crimes e da reabilitação/ressocialização do preso. O que se mostra um retrocesso para a sociedade moderna. Logo, foi utilizado o método de análise, sobre vários fatores que tornam precário o atual cenário do sistema prisional. Assim, a fim de verificar abandono e o descaso do poder público ao longo dos anos e como vieram por agravar ainda mais a desordem do sistema prisional brasileiro fora feita uma análise através dos gráficos da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário. A metodologia de trabalho foi constituída por meio de uma revisão bibliográfica, utilizando citações retiradas de artigos e doutrinas para embasar as conclusões apresentadas neste trabalho.
PALAVRAS-CHAVE: Sistema prisional. Penas. Direito Penal.
BRAZILIAN PRISON SYSTEM: AN APPROACH ABOUT PENALTIES, THEIR PURPOSES AND EFFECTIVENESS WITHIN THE COUNTRY.
ABSTRACT
The present academic study was carried out through doctrines and articles on the current situation of the Brazilian prison system, more specifically, on the form of application of sentences in Brazil, the purposes of the sentence and its effectiveness. Critically analyzes the applicability of these means within society. Furthermore, it specifically addresses the disruption of the Brazilian prison system and highlights the neglect of crime prevention and prisoner rehabilitation/resocialization. This is a step backwards for modern society. Therefore, the method of analysis was used, on several factors that make the current scenario of the prison system precarious. Thus, in order to verify the abandonment and neglect of the public power over the years and how they came to further aggravate the disorder of the Brazilian prison system, an analysis was made through the graphics of the State Agency for Administration of the Penitentiary System. The work methodology consisted of a bibliographic review, using citations taken from articles and doctrines to support the conclusions presented in this work.
KEYWORDS: Prison system. feathers Criminal Law.
- INTRODUÇÃO
O presente trabalho explana acerca do sistema prisional brasileiro, mais especificamente sobre as penas, suas finalidades e eficácia. No entanto, ao contrário do que estabelece o Código Penal, os presídios atualmente se tornaram um ambiente completamente degradante e desumano para o detento cumprir a sua pena, além de contar com a superlotação, a ausência de atendimento médico, a precariedade dos serviços de alimentação e higiene. Logo, essas circunstâncias desencadeiam diversas doenças físicas e mentais nos detentos, dificultando a ressocialização. Desse modo, este estudo visa especificar como funciona a aplicação dessas penas no direito brasileiro, e como se encontra a realidade dentro dos presídios do Brasil.
Os primeiros pontos a serem abordados serão o encarceramento em massa e a reincidência criminal. Assim, com o intuito de expor a realidade de que a política de encarceramento brasileira está lotando o sistema prisional, mesmo existindo outras formas de se cumprir a pena. Além disso, o primeiro ponto da pesquisa será demonstrar como se deu o início do sistema de reclusão no Brasil e qual a sua previsão legal, além de expor as consequências que esse sistema trouxe para a população pobre e negra no Brasil.
Ademais, serão exemplificados os tipos de pena dentro do sistema brasileiro, as finalidades dessas penas, além de ser analisado se de fato essas finalidades vêm sendo cumpridas ou se só estão no papel vivendo de meras teorias. Nesse sentido, o estudo irá demonstrar como a inflação legislativa está impactando negativamente o país. Visto que, a inflação legislativa acontece, pois não são verificadas e aplicadas com a qualidade necessária, os fatores de vigência, eficácia e efetividade dentro das leis que foram criadas.
Por fim, tendo abordado toda a parte teórica sobre o assunto e sanado os conceitos básicos e complexos, será demonstrado como anda a eficácia do sistema prisional brasileiro e como poderia ser aplicada uma prevenção de crimes no Brasil, visto que atualmente o país conta com um sistema prisional falido e o único destaque do país se encontra no ranking de países com a maior superlotação de presídios do mundo.
- REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
A respeito do início do sistema prisional brasileiro, pode-se dizer que a sua história, ao ser analisada desde os primórdios revela que desde a utilização desse sistema punitivo, a prisão foi considerada um local de exclusão social. O que pode ser claramente observado nas estruturas dos presídios brasileiros, com uma falta notável de construção adequada nos edifícios penitenciários. Na Carta régia, documento que continha determinações gerais e permanentes para o Brasil vindo da rainha de Portugal, fora possível observar que pela primeira vez o termo prisão e detenção foi mencionado, visto que a rainha pediu que fossem estabelecidas casas de correção no Brasil.
A Constituição de 1824, possui em seu art. 179, o estabelecimento e designação que as prisões deveriam ser locais limpos e seguros, além de determinar que deveria haver uma separação entre os réus, de acordo com a gravidade/natureza de seus crimes. Porém, houve um aumento significativo de detentos dentro do sistema carcerário ao longo dos anos, assim, o aumento da população carcerária trouxe limitações de espaço, o que ocasionou a inviabilidade do acesso ao direito de celas individuais para os detentos.
Ao decorrer dos anos, como nenhuma medida preventiva e modificadora foi tomada em relação a situação dos detentos, à situação do sistema carcerário brasileiro foi tomando cenários absurdos. Logo, podemos analisar os números apresentados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2021, foram levadas em conta todas as 147.937 pessoas que estão em prisão domiciliar, o que fez o Brasil ultrapassar a Rússia em números de presos.
Figura 01: Análise comparativa da população prisional a nível internacional.
Desse modo, o grande número de presos em prisão domiciliar somados com a população prisional em cumprimento de pena em regime fechado, qual seja os 566,4 mil em 2021, colocam o país entre os três maiores países com população carcerária em números extremos. Assim, tendo em vista que, desde a Carta Régia houve um grande avanço social e tecnológico, a situação atual do sistema carcerário brasileiro se encontra inaceitável.
O intuito do sistema prisional brasileiro desde os primórdios tem como objetivo principal a ressocialização, reinserir o indivíduo em sociedade novamente e a punição do crime cometido, para que este indivíduo não retorne a praticar um novo crime. Nesse sentido, o Estado deve assumir a responsabilidade de conseguir, efetivamente, combater os crimes, e o método utilizado é isolar o criminoso do convívio social, através do sistema prisional. Logo, este indivíduo será privado da sua liberdade, o que em teoria deveria este indivíduo deixar de ser um risco para a sociedade. Sobre esta teoria, Michel Foucault, teórico social, aponta:
[…] a reforma propriamente dita, tal como ela se formula nas teorias do direito ou que se esquematiza nos projetos, é a retomada política ou filosófica dessa estratégia, com seus objetivos primeiros: fazer da punição e da repressão das ilegalidades uma função regular, extensiva à sociedade; não punir menos, mas punir melhor; punir talvez com uma severidade atenuada, mas para punir com mais universalidade e necessidade; inserir mais profundamente no corpo social o poder de punir. (FOUCAULT, 2011, p. 39)
Cabe ressaltar que, as causas do excesso de presos no sistema carcerário, as superlotações, tem sua principal causa na lei antidrogas, tendo em vista que promove um excesso nítido de prisões com caráter provisório, a utilização do uso de regime fechado está sendo aplicada incorretamente, visto que há penas alternativas dentro do sistema prisional. Logo, pode-se observar que essas prisões não estão cumprindo o seu papel principal que é a reeducação e, sim, fortalecendo o crime dentro das penitenciárias brasileiras, pois diversos criminosos com crime da mesma natureza dividem celas.
Sobre esse assunto, pode-se pontuar a polêmica do ano de 2017, com a morte de mais de 100 detentos, no presídio do Rio de Janeiro, por uma guerra entre facções criminosas. O defensor público estadual Emanuel Queiroz fez alguns apontamentos que expôs a grande fragilidade do sistema penitenciário nacional, além disso, alertou que 4 dos mortos já deveriam estar soltos:
Em 2003, tínhamos cerca de 18 mil presos no estado. Em 2013, saltamos para 33 mil. Hoje, temos 51 mil presos. O crescimento nesses últimos três anos da massa carcerária foi maior que nos 10 anos anteriores. E qual foi a sensação de diminuição da violência? Nenhuma. Isso demonstra que o aprisionamento massivo não reflete na questão da segurança pública. (QUEIROZ, 2021)
Ademais, durante essa mesma audiência em que o defensor se manifestou, qual seja a audiência da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o ex-detento Samuel Lourenço também se pronunciou e comentou sobre os 9 anos que ficou excluído da sociedade no presídio do Rio de Janeiro:
“Não há espaço nas celas, não temos itens de higiene e as doenças vão se alastrando. Passamos calor, os cobertores que colocamos no chão para dormir ficam com cheiro de suor e nos falta água para lavar. Falta água também para o nosso consumo e a nossa família não pode levar”(LOURENÇO,2021).
Nesse ínterim, cabe mencionar que a maior porcentagem da população prisional é negra. Segundo dados da Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário, pode-se observar que os dados de 2018 apontam que 429,2 mil pessoas negras estavam privadas de liberdade, o que representava 67,5% do total. Entretanto, a população branca que se encontra privada de liberdade possui uma porcentagem muito inferior. Os dados de 2018 revelaram que eram 184,7 mil pessoas29%. O que torna evidente aumento significativo do percentual de pessoas negras encarceradas. De acordo com a cor da pele, os dados mostram que 64% da população prisional brasileira é formada por pessoas negras.
Figura 02: Análise comparativa de cor da pele dentro do sistema prisional
Portanto, resta evidente que o sistema carcerário no Brasil não está cumprindo com a legalidade, tendo em vista a precariedade e as condições humanas que os detentos estão vivendo. Ademais, o sistema carcerário se tornou um depósito de pessoas, com uma superlotação exacerbada e sem cumprir a sua principal função social: a ressocialização. Além disso, cabe pontuar que, de acordo com os dados da análise comparativa de cor de pele dentro do sistema prisional o país se encontra com alto número de negros encarcerados o que demonstra tamanha disparidade social, discriminação e preconceito com os negros que perdura a anos no Brasil.
Logo, os dados mostram que o direito penal não está se mostrando eficaz para conseguir conter os problemas existentes dentro do sistema prisional. Pelo contrário, está permitindo que exista e legitimação da violência, uma vez que está promovendo a superlotação dos presídios, transformando o cárcere em uma escola de crimes. Nesse sentido, o professor de processo penal, Sérgio Luiz Souza Araújo faz a seguinte crítica ao sistema carcerário e o não cumprimento da devida ressocialização:
Se quisermos efetivamente reintegrar o preso, temos que abandonar em todas as suas consequências práticas a concepção patológica de delinquente, própria da criminologia positivista. Parte-se em geral da concepção de que o delinquente é alguém inferior ou que padece de alguma anomalia física ou biológica. Os programas psicológicos, sociais, devem ser elaborados sobre o pressuposto teórico de que não existem características específicas nos detentos enquanto tais. A única anomalia que caracteriza toda a população carcerária é a condição de preso. (ARAÚJO, 2012, p.442)
Nesse ínterim, o Estado deve cumprir com a sua obrigação de garantir os direitos dos detentos, pois, atualmente o Estado assumiu o papel de infrator de leis e direitos. Tendo em vista que, o artigo 5ª, inciso III da Constituição Federal pontua que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante.”
Porém, a realidade brasileira é outra e o Estado está favorecendo esse tratamento desumano, ao passo que permite a superlotação dos sistemas prisionais. Além disso, os direitos do preso se encontram elencados dentro da Constituição Federal, no artigo 41 da Lei de Execução Penal:
I – Alimentação suficiente e vestuário;
II – Atribuição de trabalho e sua remuneração;
III – Previdência social: sobre a previdência social do preso, este deve contribuir voluntariamente para receber os benefícios, uma vez que o Estado não consegue nem assistir aquele que está livre e desempregado.
IV – Constituição de pecúlio: o trabalho sendo obrigatório deve o trabalhador preso receber uma remuneração adequada, podendo o Estado prever a sua destinação.
V – Proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação;
VI – Exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena: neste inciso está contida a recomendação de serem organizadas atividades recreativas e culturais em todos os estabelecimentos para o bem-estar físico e mental dos presos. O tempo do preso deve ser preenchido, sempre que possível, com atividades de ordem profissional, intelectual e artística, e não só esportivas.
VII – Assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa: é também direito do preso a assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa conforme se verá adiante. […]
Portanto, fica evidente que todos esses direitos não estão sendo assegurados aos detentos, dentro dos presídios brasileiros. E com esse cenário, o sistema prisional brasileiro é marcado com o descumprimento das leis e com desrespeito à dignidade humana dos detentos. Assim, a falência do atual sistema carcerário é um resultado da incapacidade de cumprir com a legalidade.
2.2 ENCARCERAMENTO EM MASSA
Ao se falar em encarceramento em massa, como mencionado anteriormente pode-se verificar a existência do encarceramento massivo dos negros, tendo em vista que a porcentagem de encarceramento dos negros, em comparação com os brancos possui uma grande disparidade de até 50% de diferença. No Brasil diversos são os motivos dessa disparidade de valores, mas principalmente o aumento do controle punitivo e a criminalização da pobreza, o que favoreceu o encarceramento em massa.
Logo, seguindo a linha de pensamento de Michelle Alexander, escritora e ativista dos direitos civis:
O caráter do Sistema de Justiça Penal é outro. Não se trata da prevenção e punição do crime, mas sim da gestão e do controle dos despossuídos. […] encarceramento em massa tende a ser categorizado como problema de justiça criminal oposto à justiça racial ou problemas de direitos civis. (ALEXANDER, 2018)
[…]
Pobres, desempregados, mendigos, nômades e migrantes representam certamente as novas classes perigosas, ‘os condenados da metrópole, contra quem se mobilizam os dispositivos de controle, mas agora são empregadas estratégias diferentes nesse confronto. Trata-se, antes de tudo, de individualiza-los e separá-los das ‘classes laboriosas’ (ALEXANDER, 2018)
Dessa forma, entre os maiores malefícios para a população do encarceramento em massa é a superlotação do sistema prisional, que não promove a ressocialização e reinserção do indivíduo em sociedade, a falta de higiene, atendimento médico e alimentação adequada para os presos, esses fatores acumulados causam a grande decadência do sistema prisional brasileiro. Através das colocações de Michelle Alexander ficou clara a segregação social que o sistema prisional acarreta e que o encarceramento em massa ocorre devido a repulsa da classe alta contra a classe baixa. Além disso, pode-se mencionar que o crescimento em massa do número de presos não é uma medida eficaz para o controle de crimes na sociedade.
Assim, pode-se analisar que o crescimento da população prisional ocorre de maneira extremamente acelerada no Brasil, pois possui uma base apoiada no racismo e muito classista. Para se afirmar essa teoria tem-se o argumento do advogado criminalista Alberto Zacharias Toron:
Isso indica que fizemos uma opção pelo encarceramento como política criminal e social. Seguimos usando celas e trancas como resposta à pobreza, à miséria e muitas vezes como forma de encarar os representantes de movimentos sociais que lutam contra esse estado de coisas. Trata-se de uma escolha desumana, ineficaz e perigosa. Desumana porque não afasta apenas a liberdade do preso — o que já seria muito —, mas priva-o da saúde, da educação, da dignidade. Ineficaz porque há muito se sabe que a prisão não ressocializa, não reeduca, não afasta o detento do mundo do crime. Ao contrário, insere-o em um sistema cultural em que o delito é a força motriz, é o modo de vida, dentro e fora da prisão. (TORON, 2019)
Nesse contexto, a política do encarceramento em massa promove um cenário desumano e perigoso, visto que tem como resultado o aumento da criminalidade. Diante disso, muitas pessoas aglomeradas em um sistema prisional, que não dá condições dignas, não oferecem um supervisionamento adequado, logo essa situação irá resultar em um conflito coletivo. A exemplo disso tem-se os primeiros comandos da capital, famoso hoje em dia como “comando vermelho”, que são frutos desse sistema de encarceramento em massa, que sempre coloca a opção no cárcere.
Figura 03: Análise dos encarcerados no sistema prisional brasileiro
Como se pode perceber 40% dos encarcerados ainda estão aguardando a condenação e já estão privados de liberdade, causando a superlotação nos presídios. Fugindo completamente do que dispõe no art. 85 da Lei de Execução Penal que prevê:
Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.
Parágrafo único. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária determinará o limite máximo de capacidade do estabelecimento, atendendo a sua natureza e peculiaridades.
No entanto, a superlotação viola as normas da Lei de Execução Penal, mas também, dos princípios constitucionais. Visto que, a Lei de Execução Penal também prevê que preso terá o direito de receber assistência material “em se tratando de higiene, instalações higiênicas e acesso a atendimento médico, farmacêutico e odontológico”. Porém, a realidade do sistema carcerário no brasileiro não abrange esses direitos, os presos estão submetidos a péssimas condições de higiene prejudicando a sua saúde física e emocional, o que dificulta a reinserção em sociedade. Sobre as condições higiênicas precárias no sistema prisional Virginia Camargo, pontua:
As prisões encontram-se abarrotadas, não fornecendo ao preso a sua devida dignidade. Devido à superlotação muitos dormem no chão de suas celas, às vezes no banheiro, próximo a buraco de esgoto. Nos estabelecimentos mais lotados, onde não existe nem lugar no chão, presos dormem amarrados às grades das celas ou pendurados em rede. (CAMARGO, 2006)
Nesse conjunto de circunstâncias, pode-se claramente analisar a situação crítica que o encarceramento em massa está causando no país, o que desqualifica o sistema prisional brasileiro. Pelo contrário, prejudica mais ainda a saúde mental do detento promovendo a reincidência criminal.
2.3 A REINCIDÊNCIA CRIMINAL NO BRASIL
O tema reincidência criminal começou a ser estudado com muita frequência nos últimos anos, visto que o percentual de pessoas que após sair da reclusão social foram ressocializados diminuiu muito e o porcentual de pessoas que após serem soltas cometeram outros tipos de crimes ou até o mesmo aumentou. Devido ao grande descaso com os detentos, a maioria destes quando saem do cárcere privado, após cumprirem suas penas, voltam a delinquir.
O Supremo Tribunal de Justiça, entende que:
O reincidente é o indivíduo egresso do sistema prisional que comete novo crime após cumprimento da pena estabelecida por crime anteriormente cometido. (STJ, 2021)
Sobre o assunto, o coordenador do centro de estudos e pesquisas em Segurança Pública, Luis Flávio Sapori, publicou um relatório de audiência, afirmando que:
A reincidência criminal pode ser conceituada de seis maneiras distintas:
(a) Reincidência por auto culpa, que considera nova prática de crime declarada pelo mesmo indivíduo;
(b) Reincidência policial, que é estabelecida por novo registro de crime do mesmo indivíduo na polícia;
(c) Reincidência penal, que supõe o processamento penal do mesmo indivíduo por nova prática de crime;
(d) Reincidência judicial, que envolve nova condenação do mesmo indivíduo por nova prática de crime;
(e) Reincidência penitenciária, que ocorre quando há segundo ingresso na prisão do mesmo indivíduo por nova prática criminal;
(f) Reincidência jurídica, que é o segundo processamento do mesmo indivíduo por nova prática de crime do mesmo título do Código Penal.
No âmbito brasileiro, a definição da reincidência criminal possui um viés jurídico. A sua definição se encontra no artigo 63 do Código Penal:
“Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”. (CP, 1940)
O STJ publicou um relatório em setembro de 2021, que pontuava que as taxas de reincidência criminal poderiam ser analisadas a partir das variáveis de perfil social e demográfico, visto que a população mais pobre e periférica possui um alto índice de reincidência. O que, mais uma vez, reforça o preconceito com as classes mais pobres. Além disso, a pesquisa aponta que quanto mais vulnerável a situação do indivíduo maior a chance de reincidência, o que é óbvio em um país em que o indivíduo precisa roubar o pão para poder comer e não morrer de fome e a resposta social é detê-lo dentro do sistema prisional, ao invés de promover, saúde, educação e condições dignas de trabalho.
Ademais, o Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça publicou um relatório em março de 2020, que pontuava as reentradas e reintegrações infracionais no Brasil. O presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Dias Toffoli afirmou:
Não há caminho para a superação do ‘estado de coisas inconstitucional’ do sistema prisional senão pela compreensão do caráter estrutural da crise que enfrentamos. Só seremos capazes de promover mudanças efetivas quando as soluções forem capazes de atacar as raízes dos nossos problemas. (TOFFOLI, 2020)
Além disso, o relatório disponibilizou o dado de que os adolescentes que foram submetidos aos regimes abertos tiveram um menor índice de reincidência criminal, enquanto os que foram designados para o regime fechado voltaram para o mundo do crime, e até mesmo alguns se filiaram a comandos dentro dos socioeducativos. O que revela que a pena privativa de liberdade pode trazer mais malefícios do que benefícios para a sociedade.
2. 4 TIPOS DE PENA DO DIREITO PENAL BRASILEIRO
O método privativo de liberdade é uma das formas de penas que são adotadas no Código Penal brasileiro e consiste na privação do direito de ir e vir do indivíduo, que irá recolher o condenado dentro do estabelecimento prisional e possui, em teoria, como a sua finalidade a ressocialização e a sua reinserção em sociedade, e a prevenção da reincidência criminal.
A legislação penal dispõe dos seus tipos de pena privativa de liberdade, qual seja: a reclusão, que são os crimes graves, a detenção, que são os crimes menos graves e a prisão simples, que seriam as contravenções penais. Ainda, prevê quais são os regimes de cumprimento de pena, tem-se o fechado, que seria o presídio de segurança máxima, o semiaberto, que em teoria seria a colônia agrícola, industrial ou equivalente e o regime aberto, que é a casa de albergado.
Segundo a Lei nº 2.848, do Código Penal existem 3 espécies de pena:
Art. 32 – As penas são: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I – Privativas de liberdade;
II – Restritivas de direitos;
III – De multa.
Sobre as penas privativas de liberdade, pode-se mencionar as suas duas modalidades, que são conhecidas como reclusão e detenção, que são encontradas no artigo 33, do Código Penal brasileiro:
Art. 33 – A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º – Considera-se: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;
b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.
§ 2º – As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.
§ 3º – A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais
Além disso, tem-se as penas restritivas de direitos que estão listadas no artigo 33, do Código Penal brasileiro:
Art. 43. As penas restritivas de direitos são: (Redação dada pela Lei nº 9.714, de 1998)
I – Prestação pecuniária; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
II – Perda de bens e valores; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 1998)
III – limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 1984)
IV – Prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)
V – Interdição temporária de direitos; (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)
VI – Limitação de fim de semana. (Incluído pela Lei nº 9.714, de 25.11.1998)
Por fim, o artigo 44, do Código Penal brasileiro aponta que a pena deve ser substituída quando não houver violência ou ameaça na hora do cometimento do crime e a pena aplicada não for maior do que 4 anos, ou até mesmo para crimes culposos independente da pena. O mesmo artigo aponta que isso se aplica se o réu não for reincidente em crime doloso e o réu não tiver uma lista de maus antecedentes.
2.5 AS FINALIDADES DAS PENAS BRASILEIRAS
Atualmente, a pena é utilizada no Brasil como uma resposta do Estado para quem não cumpre com a lei, assim, restringindo ou vedando um bem jurídico ao autor do crime, que tenha cometido um fato punível. O país conta com a tríplice finalidade na sanção penal, que são conhecidas como retributivas, preventiva geral e especial, ressocializadora/reeducativa.
A finalidade da pena preventiva geral se dá no momento da determinação da pena da conduta em questão. Na sentença o juiz irá aplicar a pena com o intuito de aplicar a finalidade retributiva e a preventiva especial, esta modalidade acontece depois do crime, com o intuito de evitar a reincidência do detento. Porém, a finalidade preventiva geral e a preventiva especial irão ocorrer em dois momentos diversos. Pois, se não fosse aplicada assim o princípio da individualização da pena estaria sendo violado. Portanto, segundo Rogério Greco, em seu livro: Curso de Direito Penal, pode-se observar que:
Prevenção Geral: Preocupação com a sociedade. Em dois aspectos distintos:
a.1 Negativa: a pena reflete na sociedade com o objetivo de evitar o cometimento do crime. Também chamada de prevenção por intimidação, um tipo de coação psicológica.
a.2 Positiva ou integradora: a pena tem a função pedagógica de reafirmar os valores impostos da norma vigente, o respeito ao direito. É o próprio Estado mantendo a ordem incidindo a norma penal sobre casos concretos.
[…]
Prevenção Especial: É concentrado no agente, evitando a reincidência e objetivando a ressocialização.
b.1 Negativa, a pena neutraliza o poder lesivo do criminoso retirando do convívio em sociedade. Tem a finalidade de evitar a reincidência.
b.2 Positiva, a pena terá efeito suficiente para que o agente desista de cometer novos crimes, promovendo a ressocialização após o cumprimento da pena. (GRECO, 2020)
Já na teoria retributiva será considerada a teoria de que a pena não serve como forma de retribuição, pois tem como finalidade punibilidade, ou seja, responde ao autor do delito com o cárcere.Esta teoria tem como base fazer com que o ato injusto cometido pelo indivíduo, seja retribuído através da pena.
Enquanto, a modalidade reeducadora ou ressocializadora, esta está totalmente ligada ressocialização, que visa conseguir reintegrar dentro sociedade os indivíduos que foram detidos em cárcere e já cumpriram suas penas, o intuito de aplicar a reeducação é justamente evitar a reincidência dessas pessoas no mundo do crime e promover a sua participação na vida social. Porém, não é esse tipo de modalidade que vem sendo utilizada no Brasil.
Ademais, para simplificar o entendimento sobre as finalidades da pena, cabe mencionar as três teorias criadas sobre quais são as intenções da pena: teoria relativa, teoria mista e teoria absoluta. A teoria relativa é utilizada com a função de impedir a existência de novos delitos, para combater novas condutas criminosas e sanar a reincidência criminal. A teoria relativa surgiu como um modo de contrapor a teoria absoluta, com o intuito de utilizar as teorias de prevenção geral e específicas.
Outrossim, a teoria absoluta se baseia no fato de que a pena deve ser um castigo e uma forma de consequência pelo crime que o indivíduo cometeu. Não tendo como base outro objetivo, somente punir, por acreditar que essa seja a única forma de se fazer justiça para a sociedade. Além disso, sustenta que a pena seria uma forma de ensinar os detentos que os meios justificam os fins, logo se você cometeu um crime será recluso da sociedade, como forma de punição.
Por fim, a teoria mista, é um conjunto de ideias das duas teorias, anteriormente mencionadas, relativa e absoluta, com o intuito de primeiro retribuir ao detento o mal que causou na sociedade, o punindo e posteriormente prevenir que seja cometido um novo crime, evitando a reincidência criminal.
Eugenio Raúl Zaffaroni, Ex-ministro da Suprema Corte da Argentina, explica um pouco sobre essas diferentes teorias:
O Direito Penal designa-se – conjunta ou separadamente – duas coisas distintas: 1. O conjunto de leis penais, isto é, a legislação penal; ou 2. O sistema de interpretação dessa legislação, ou seja, o saber do Direito Penal.” Define o direito penal como sendo “conjunto de leis que traduzem normas que pretendem tutelar bens jurídicos, e que determinam o alcance de sua tutela, cuja violação se chama “delito” e aspira que tenha como consequência uma coerção jurídica. (ZAFFARONI, 2008, p.79).
Nesse sentido, pode-se mencionar as teorias do consenso, teorias sociológicas sobre a criminalidade. A Escola de Chicago surgiu como resposta ao nível excessivo de crimes que são cometidos todos os dias em diversos países, entre eles o Brasil. Essa teoria é atualmente muito utilizada em alguns países como Noruega e Indonésia, que são referências a nível mundial, em termos de reeducação do preso, pois estuda a criminalidade urbana de forma a identificar quais são as áreas de delinquência, mais comumente encontradas nas periferias, em regiões mais pobres.
O que se pode observar é que onde existe mais degradação moral e física. Essas regiões são completamente esquecidas pelo Estado, viabilizando uma vida imoral para as pessoas que ali habitam. Desse modo, as teorias da Escola de Chicago pontuam que as cidades são o fator principal que influenciam o crime e o descaso com as pessoas aumenta a reincidência. O sociólogo Emile Durkheim apontou as teorias da Escola de Chicago como:
Teoria Ecológica: A teoria ecológica explica o efeito criminógeno da grande cidade, valendo-se dos conceitos de desorganização e contágio inerentes aos modernos núcleos urbanos.
Teoria Espacial: trata da reestruturação arquitetônica e urbanística das grandes cidades como medida preventiva da criminalidade.
Teoria da Tolerância Zero: baseada em decisões desprovidas de discricionariedade por parte das autoridades policiais de uma organização, as quais agem, seguindo padrões predeterminados.
Teoria dos Testículos Quebrados: Para esta teoria a atuação policial deve ser firme, com rigor, inflexível, até mesmo contra crimes considerados leves ou de menor potencial ofensivo pois, aos policiais pressionarem os criminosos com firmeza, farão com que estes últimos fujam.
Logo, pode-se observar que o objetivo das penas atuais é meramente baseado na punição, sem bases sociológicas, não se atentando ao fato de que apenas punir não sana o problema, pelo contrário só aumenta, tendo como prova a superlotação do sistema carcerário e o alto nível de reincidência criminal que pode ser observada nos dias atuais.
2. 6 A INFLAÇÃO LEGISLATIVA
Sobre a inflação legislativa é válido iniciar comentando sobre o seu significado, visto que é um termo não muito utilizado e pouco conhecido pela população. Essa expressão “inflação legislativa” vem sendo utilizada para falar sobre a produção em massa das leis no país. Atualmente, a inflação legislativa é responsabilidade do Poder Legislativo, Poder Legislativo, em pequenas proporções e do Poder Executivo, que utiliza a medida provisória como mecanismo de criação de leis, que anda assumindo papel dos antigos decretos-leis. No Brasil, a tentativa de satisfazer os desejos sociais levam os políticos a um excesso de criação de leis, o que prejudica a efetividade, comprometendo o ordenamento jurídico.
Marcelo da Costa Pinto Neves, Ph.D. em direito penal, enfatiza o motivo da produção insensata de leis brasileiras, resumindo o que foi mencionado anteriormente:
O legislador passa a elaborar cada vez mais diplomas legais com o objetivo de satisfazer as expectativas dos cidadãos, prevalecendo os anseios políticos em detrimento das exigências e limitações jurídicas. Destarte, em muitos casos, tais leis são elaboradas sem possuírem a mínima condição de efetividade, o que leva à necessidade de serem editados outros diplomas legais. A consequência óbvia disso é a aceleração da inflação legislativa. (NEVES, 2021)
Além disso, acrescenta que as normas simbólicas apenas retardam as verdadeiras soluções para as necessidades da sociedade:
Tal adiamento se deve ora ao despreparo dos legisladores para tratar de assuntos de suma importância, ora à falta de comprometimento destes com os reais interesses sociais, e, ainda, ao fundado temor de tomar uma posição que desagrade interesses de classes ou de comparsas, o que poderia acarretar a extinção de sua carreira política. (NEVES, 2021)
Assim, para que se possa entender qual a influência da inflação legislativa, dentro do ordenamento jurídico é necessário que sejam definidos os conceitos de vigência, eficácia e efetividade das leis, pois estão diretamente relacionados a esse conceito. A vigência está relacionada ao período de entrada dentro do ordenamento jurídico, assim, a lei terá caráter obrigatório para a sociedade a partir do momento que entrar em vigência e enquanto esse tempo durar. Logo, a norma jurídica, durante este tempo, deverá ser cumprida e respeitada por todos em sociedade. O advogado criminalista, Carlos Roberto Gonçalves pontua:
A vigência, portanto, é uma qualidade temporal da norma: o prazo com que se delimita o seu período de validade. Em sentido estrito, vigência designa a existência específica da norma em determinada época, podendo ser invocada para produzir, concretamente, efeitos, ou seja, para que tenha eficácia. (GONÇALVES, 2019)
Já a eficácia é observada e comprovada quando forem alcançados os objetivos planejados, quando é cumprida a função determinada e atingido o objetivo central que foi proposto. Sobre a efetividade, esclarece Luís Roberto Barroso, o ministro do Supremo Tribunal Federal:
[…] a efetividade significa, portanto, a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a materialização dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social. (BARROSO, 2020)
Portanto, pode-se perceber que a inflação legislativa acontece, pois não são verificadas e aplicadas com a qualidade necessária, os fatores de vigência, eficácia e efetividade dentro das leis que foram criadas. Uma vez que apenas surge a ideologia do legislativo de criar leis que tentam suprir as necessidades da população, ao invés de realmente apaziguarem as mazelas sociais que rodeiam o Brasil, causando diversos problemas na sociedade, dentre eles a pobreza, que aumenta os índices de furto no país.
2.7 A EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
Em primeiro ponto, cabe mencionar que a função da pena que priva a liberdade não tem sido cumprida no país, uma vez que o discurso de ressocialização não passa de meras falácias, uma vez que o sistema prisional se encontra em superlotação não oferecendo os direitos básicos aos detentos. Dessa maneira, verifica-se que a eficácia do sistema prisional se encontra falida e fracassada, tendo em vista que não oferece o mínimo de dignidade humana e qualquer condição de reeducação social ao indivíduo.
Pelo contrário, se encontra como um sistema que favorece a reincidência criminal. Logo, nesse cenário caótico, as penas alternativas se apresentam como a melhor opção a curto prazo, bem como as prestações de serviço à comunidade, que possui um alto índice de eficácia como forma de punição ao indivíduo.
A partir de todos os dados estatísticos já apresentados na presente pesquisa, sobre a situação atual do sistema carcerário brasileiro, pode ser feita uma análise crítica relacionada aos direitos que não vem sendo garantidos aos presos, bem como se resta clara a ineficiência do sistema carcerário. O grande fator que dificulta a reeducação do detento, para que retorne para a vida em sociedade, sem reincidir no mundo do crime é a não ressocialização na vida carcerária. O sistema está tão sobrecarregado com o número extremamente excessivo de presos que não atende à função pela qual foi concebido: punir enquanto ressocializa.
Nesse sentido, o sistema prisional brasileiro não possui eficácia, assim existe o questionamento do que pode ser feito no âmbito do Judiciário para solucionar essas questões. Pois, o que se espera é que ocorra uma correta aplicação das penas, de modo que o encarceramento seja a última medida a ser escolhida, com uma tentativa de melhorar a qualidade do sistema carcerário atual que se encontra caótico.
Visto que, todas as consequências do encarceramento em massa geram várias restrições, tais como p acesso à moradia, o que leva os ex-presidiários ao total desabrigo, favorecendo a pobreza e a situação dos moradores de rua no país. Além disso, existe outra problemática que é o acesso restrito ao mercado de trabalho, tendo em vista os estigmas sociais em relação ao histórico criminal. Ademais, outro fator muito importante a ser mencionado é a restrição de voto, fator que gera uma influência racial dentro dos resultados eleitorais.
Nesse sentido, o jurista Alessandro Baratta, que critica o atual sistema penal e à criminologia tradicional aponta:
“Neste trágico cenário, o cárcere apresenta-se como a solução ideal ao controle social, posto que, demonstrou ser a forma mais do que efetiva de exercer o poder disciplinar sobre os inimigos eleitos pelo capital e, portanto, também pelo direito penal, permitindo isolar e tratar os indesejáveis até que estejam aptos ao convívio social, quer dizer, estejam adestrados aos moldes da sociedade capitalista. Assim, não mais se deteriora o corpo, mas sim o adestra, pois, a pena privativa de liberdade permite o controle do corpo, comportamento e do tempo, de um modo à adestrar o indivíduo”.
[…]
Deste modo, o cárcere contribui para a manutenção da estratificação social, de forma que, os poderosos permanecem imunes, livres e, até mesmo, admirados. Em contrapartida a classe subalterna é alvo da reprimenda do sistema criminal – legislação, polícia, juiz, promotor e cárcere – tal como repulsa da sociedade e mídia, representando mais um empecilho para qualquer possibilidade ascensão social (BARATTA, 2021)
Dessa forma, as restrições mencionadas contribuem de forma direta para a insegurança econômica do indivíduo, impossibilitando o acesso ao trabalho, o que afasta a pessoa do círculo, gerando a ruptura das relações familiares, exacerbando as desvantagens na vida do ex-presidiário, vítimas do sistema penal que contribui com a desigualdade social.
A intenção principal é se fazer cumprir o papel do direito penal, e colocar em prática a preservação dos direitos dos detentos estabelecidos no Código Penal, que atualmente estão submetidos a condições completamente desumanas e sendo ignorados pelo Estado, o que se encontra contraditório, uma vez que o Estado deveria estar protegendo o ser humano. Todo esse ciclo caótico que os detentos são expostos favorece a violência dentro e fora dos presídios brasileiros.
Ademais, a Conectas Direitos Humanos, em 2018, fez uma recomendação das alterações que devem ser feitas com urgência dentro do sistema carcerário brasileiro:
“Os governos precisam encarar a questão do sistema prisional com profundidade e atacar realmente as causas destas situações, que são complexas e têm causas de diversas naturezas”
Ainda, a advogada da Conectas Direitos Humanos, Vivian Calderoni fez a seguinte consideração:
O objetivo deve ser diminuir o fluxo de entrada no sistema prisional e aumentar o de saída. Para isso, deve-se investir em alternativas penais em detrimento da pena de prisão, e a promoção de reformas na política de segurança pública, para que a atividade de inteligência policial seja desmilitarizada e focada nos crimes mais graves. Fomento e cobrança do Poder Judiciário e dos ministérios públicos na aplicação efetiva da Lei das Medidas Cautelares, que estabelece um leque de penas alternativas para substituir a prisão provisória; e aprovação do Projeto de Lei que cria a audiência de custódia, impondo prazo de 24 horas para que o preso em flagrante seja apresentado presencialmente ao juiz, na presença de seu defensor, para a análise da necessidade de prisão, sem videoconferência. (CALDERONI, 2020)
Logo, se faz necessária a ampliação de recursos para programas de reinserção de egressos do sistema prisional, para que esses sejam estimulados a retornarem para o convívio social sem reincidir no crime. Além de um favorecimento de contratos que devem ser celebrados pela Administração Pública com pessoas jurídicas para que os detentos realizem mais obras e serviços com cunho contributivo e reeducador.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao expor todas as circunstâncias a respeito do início do sistema prisional brasileiro, pode ser observado que desde a implantação desse sistema punitivo, a prisão foi considerada um local de exclusão social e sem nenhum plano de política pública. O intuito do sistema prisional brasileiro desde os primórdios tem como objetivo principal a ressocialização, reinserir o indivíduo em sociedade novamente e a punição do crime cometido, para que este indivíduo não retorne a praticar um novo crime. Logo, resta evidente que o sistema carcerário no Brasil não está cumprindo com a legalidade, tendo em vista a precariedade e as condições humanas que os detentos estão vivendo dentro dos presídios brasileiros.
Ademais, pode-se claramente observar a situação crítica que o encarceramento em massa está causando no país, o que desqualifica o sistema prisional brasileiro e não promove uma ressocialização de qualidade. Pelo contrário, prejudica mais ainda a saúde mental do detento promovendo a reincidência criminal. Assim, devido ao grande descaso com os detentos, a maioria destes quando saem do cárcere privado, após cumprirem suas penas, voltam a delinquir.
Vale acrescentar que, entre os tipos de penas do direito brasileiro o Código Penal aponta que a pena deve ser substituída quando não houver violência ou ameaça na hora do cometimento do crime e a pena aplicada não for maior do que 4 anos, ou até mesmo para crimes culposos independente da pena. Porém essa legislação não está sendo colocada em uso, o que está ocasionando a superlotação das penitenciárias brasileiras. Além disso, mesmo com leis em desuso pode-se perceber que a inflação legislativa acontece, pois não são verificadas e aplicadas com a qualidade necessária, os fatores de vigência, eficácia e efetividade dentro das leis que foram criadas.
Por fim, se faz necessária, com urgência a ampliação de recursos para programas de reinserção de egressos do sistema prisional, para que esses sejam estimulados a retornarem para o convívio social sem reincidir no crime. Além de um favorecimento de contratos que devem ser celebrados pela Administração Pública com pessoas jurídicas para que os detentos realizem mais obras e serviços com cunho contributivo e reeducador. Para que assim, possa se iniciar um programa qualificado de prevenção de crimes no Brasil.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXANDER, Michelle. A nova segregação: racismo e encarceramento em massa. São Paulo: Boitempo, 2018.
ARAÚJO, Sérgio Luiz Souza. A Prisão: Questionamentos acerca da ideia de ressocialização. Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 60, 2012, p. 435 – 451.
BRASIL. Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN Mulheres. Brasília: Ministério da Justiça, 2014.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Disponível em <http://bd.camara.gov.br>. Acesso Em; 03 out. 2022.
BORGES, J. O que é encarceramento em massa? Belo Horizonte: Letramento, 2018.
CAMARGO, Virginia da Conceição. Realidade do Sistema Prisional, 2006.
CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático da Lei 11.343/06. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
DE GIORGI, Alessandro. A miséria governada através do sistema penal. Trad. bras. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan: ICC, 2006. (Pensamento criminológico; v. 12).
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: Nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 39. ed. Petrópolis: Vozes, p.79, 2011.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016.
KARAM, Maria Lúcia. Proibição às drogas e violação a direitos fundamentais. 2013. Disponível em: <http://www.leapbrasil.com.br/textos>. Acesso em: 30 set. 2022.
MELOSSI, Dário; PAVARINI, Massimo. Cárcere e fábrica. As origens do sistema penitenciário (séculos XVI-XIX). Trad. bras. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2006.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, p.89, 2008.
RODRIGUES, T. Narcotráfico: uma guerra na guerra. 2 ed. rev. ampl. São Paulo: Desatino, 2012.
RUSCHE, Georg; KIRCHHEIMAR, Otto. Punição e estrutura social. Tradução, revisão técnica e nota introdutória de Gizlene Neder. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2004.
SANTOS, Mayara Maria Alonge. A política de Guerra as drogas e o encarceramento no Brasil: Trabalhadores do Tráfico. São Paulo.Anais do 16° Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social, 2018.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2008.
¹Acadêmica do 10° período do curso de Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP WYDEN.
²Orientador. Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional (UNITAU), Especialista em Direito Civil (UNISUL), Especialista em Direito e Processo do Trabalho (UNITEC), Especialista em Direito Tributário (Damásio).
Professora do Curso de Graduação em Direito da FACIMP WYDEN. Pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Jurídicas de Imperatriz (NUPEJI).
³Co-orientadora, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional – UNITAU; Especialista em Docência do Ensino Superior e Direito Administrativo – FACIBRA; Professora do curso de Direito da Faculdade de Imperatriz – FACIMP, E-mail: rosyvnia@gmail.com