SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO: UMA ANÁLISE ACERCA DA VIOLAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS MULHERES ENCARCERADAS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7855701


Juliana Rodrigues Ascenço1
Iago Zalenda Quintela Bejarana2
Delner do Carmo Azevedo3


RESUMO

A presente pesquisa buscou abordar sobre as vivências das mulheres no sistema carcerário e a violação dos direitos inerentes à pessoa humana. Como base, a pesquisa pautou-se na metodologia bibliográfica tendo três autores como principais referências para tal estudo que são: Cunha (2021), que trata da possibilidade de investimentos em políticas públicas para os detentos do sistema penitenciário; Queiroz (2015) que traz como complementação relatos de casos reais vividos por detentas dentro e fora do sistema prisional; Pires e Freitas (2018) que traz a desigualdade, e a resistência estatal em trazer para o sistema, uma qualidade de vida mínima. Dividido em três seções, este estudo é resultante da pesquisa acerca dos direitos fundamentais que devem ser garantidos às mulheres encarceradas. Assim, tem-se como problemática: como as condições envolvendo o encarceramento feminino se relacionam com os princípios fundamentais inerentes a elas? Evidenciou-se que a falta de políticas públicas influenciam de maneira negativa na vida da presa e recém socializada. O próprio sistema acaba  por desvalorizar essas mulheres e tal violação é caracterizada como crime punível. Mas, dentro   do sistema atual, não há quem acuse o acusador. Constatou-se que, dentro do Sistema Penitenciário, a violação dos direitos das mulheres é algo recorrente e que influencia de maneira  direta a sua continuação (ou não) no mundo do crime, bem como no processo de ressocialização das mesmas.

Palavras-chaves: Sistema Carcerário. Políticas Públicas. Dignidade Humana.

ABSTRACT

The present study sought to address the experiences of women in the prison system and the violation of the rights inherent to the human person. As a basis, the research was based on the bibliographic methodology, having three authors as main references for this study, which are: Cunha (2021), which deals with the possibility of investing in public policies for inmates of the penitentiary system; Queiroz (2015) who brings as a complement reports of real cases experienced by inmates inside and outside the prison system; Pires and Freitas (2018) that brings inequality, and state resistance to bringing a minimum quality of life to the system. Divided into three sections, this scientific article is the result of research on the fundamental rights that must be guaranteed to incarcerated women. Thus, the question arises: how are the conditions involving female incarceration related to the fundamental principles inherent to them? It was shown that the lack of public policies negatively influences the life of the prey and newly socialized. The system itself ends up devaluing these women and such rape is characterized as a punishable crime. But, within the current system, there is no one to accuse the accuser. It was found that, within the Penitentiary System, the violationof women’s rights is something recurrent and that directly influences their continuation (or not) in the world of crime, as well as in the process of their resocialization.

Key-words: Prison. Public Policy. Human Dignity.

  1. INTRODUÇÃO

As transformações sociais ocorridas nas últimas décadas envolvem a presença de mulheres dentro do sistema prisional brasileiro e essas mudanças acarretam o excesso de encarceramento feminino que ocorrem, no geral, pela falta de oportunidades e condição social.   No cerne, a cor da pele também é um parâmetro que se inclui em todo esse processo. Nesse sentido, percebe-se que o sistema prisional é, de maneira geral, um local que já possui diversos problemas. Entretanto, quando o foco se fecha em torno do tratamento dado às mulheres que ali se encontram, os reveses se intensificam, tais como: machismo, agressão, precárias condições de higiene ambiental e pessoal, falta de assistência integral à gestante e ao bebê (PESTANA, 2017).

Em relação aos diversos problemas que as mulheres enfrentam no sistema prisional, a questão da higiene é uma das mais graves, pois, a falta de suporte que é dado a elas deixa a desejar. Portanto, cabe ressaltar que muitas das vezes é a família que tem que prestar esse suporte, sendo que em alguns casos muitas delas são abandonadas pela própria família. Tornando assim, a situação mais difícil, e acabam ficando a desejar os itens de higiene.

Diante do breve exposto, esta pesquisa visa investigar acerca dos direitos fundamentais que devem ser garantidos às mulheres encarceradas. Assim, tem-se como problemática: como as condições envolvendo o encarceramento feminino se relacionam com os princípios fundamentais inerentes a elas? Percebe-se que a desigualdade social, que já é algo estrutural no mundo contemporâneo, é um fator que pode coadunar para esta causa. Partindo do  problema da pesquisa, este estudo apresenta como hipótese a noção de que a igualdade e os direitos fundamentais são lesados dentro do sistema penitenciário pela falta de políticas públicas, bem como a falta de políticas institucionais penitenciárias.

Ante todo o exposto,  tem como objetivo geral analisar como as políticas públicas dentro   do sistema penitenciário podem ser eficazes para coibir os fatores inerentes a desigualdades e lesões dos direitos fundamentais. E de maneira específica tem como objetivo: analisar o sistema carcerário feminino e suas peculiaridades; descrever como a falta de necessidades básicas afetam a qualidade de vida da mulher, e, por fim evidenciar a falta de políticas públicas frente aos direitos fundamentais.

Visando apresentar o quanto as mulheres estão sendo desvalorizadas dentro do sistema  prisional e o quanto de tal maneira essa desvalorização as afetam, sejam as que estão inseridas  nele e, bem como as que não estão, ou seja, este estudo tem por justificativa explanar como as desigualdades sociais afetam mulheres de forma direta e indireta por sua cor, raça, etnia e escolaridade. A pesquisa possui caráter dedutivo, nesse sentido, este trabalho utilizar-se-á de pesquisas mais gerais para se chegar a uma solução particular. Em relação aos métodos procedimentais, o mais visto cabível fora o comparativo. O método que estuda determinados indivíduos, condições e fatos da natureza a fim de se obter generalizações. Quanto   a natureza será pesquisa básica.

Quanto a classificação aos procedimentos, esta terá cunho bibliográfico e exploratório.   Nesse viés, a pesquisa bibliográfica busca tratar da presente temática por meios de livros, teses e dissertações entre outros meios, que são de suma importância para a complementação deste. Por esta razão, será tratado também da pesquisa exploratória, tendo em vista que sua complementação entre a pesquisa bibliográfica é evidente.

Nesse sentido, ter-se-á como base legal a Constituição Federal e a Lei de Execução Penal, no mais, como base teórica serão utilizadas obras de autores como Cunha (2021), que trata da possibilidade de investimentos em políticas públicas para os detentos do sistema penitenciário; Queiroz (2019) que traz como complementação relatos de casos reais vividos por detentas dentro e fora do sistema prisional; Pires e Freitas (2018) que trazem a desigualdade, e a resistência estatal em trazer para o sistema, uma qualidade de vida mínima. Por fim, no que diz respeito a abordagem do presente estudo, este tem uma abordagem qualitativa.

A presente pesquisa desenvolveu-se a partir de três seções nas quais estão baseadas em: A  primeira seção tratará do sistema carcerário feminino de maneira geral. Abordando os seus principais aspectos, conceitos e aplicações no ordenamento jurídico brasileiro; A segunda seção   buscará tratar como a falta de políticas públicas que visam auxiliar as mulheres em suas necessidades básicas, podem afetar a sua qualidade de vida. E por fim, a terceira seção tratará dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana e a falta de políticas institucionais básicas  para prover a efetivação desses direitos para as detentas.

  1. AS CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA CARCERÁRIO FEMININO

A história do encarceramento de mulheres no Brasil foi institucionalizada no final da década de 1930 por debates desencadeados por cientistas, médicos e/ou próprios dirigentes de instituições prisionais. Tais discussões provocaram a situação nos presídios brasileiros, daí a necessidade de separar homens e mulheres nos espaços prisionais (KARPOWICZ, 2017, p. 51).

Ao falar sobre a história das prisões femininas no Brasil, deve-se lembrar de uma instituição, a Congregação Bom Pastor d’Angers, que atua no Brasil desde 1891 e tem como missão ajudar e proteger mulheres em situação de sofrimento, exclusão social e menina e material. Nesse diapasão, o trabalho das Irmãs do Bom Pastor, juntamente com as deliberações  nacionais, se tornaram referência na reorganização prisional para separar presos homens e mulheres, quando o código penal não previa tal distinção (KARPOWICZ, 2017, p. 55).

O conteúdo de que trata acerca do instituto do sistema carcerário sempre foi uma realidade desde os tempos da escravidão, onde homens e mulheres eram presos em conjunto por seus atos considerados ofensivos. E, há muitas décadas, o aprisionamento feminino é uma realidade no Brasil e no mundo. Entretanto, apenas no ano de 1942, com Lemos Britto (um dos maiores ideólogos do sistema penitenciário do início do século XX), é que foi pensada e projetada uma instituição carcerária que atendesse de maneira exclusiva às mulheres (HELPES,   2018, p. 38).

As mulheres que já são bem vulneráveis e no sistema carcerário, ficam ainda mais, pelo   simples fato de serem do sexo feminino. Elas, que são inseridas dentro do cárcere, tendem a passar por várias transformações e o tratamento dado dentro do sistema, que em regra detinha o fito de se tornar um ambiente menos prejudicial, o torna mais difícil de ser encarado por elas.   

Pois, há uma grande necessidade de uma reforma no ambiente que elas são inseridas. Ambiente   esse, que busque amenizar a vivência em salas superlotadas. Nas quais, elas são encarceradas em condições humilhantes, tratadas como meros números ao invés de seres humanas com vidas  e necessidades biológicas.

A sociedade atual é marcada pelo machismo e pela desigualdade social, e isso faz com que o número de mulheres que se encontram em situações de cunho desgastante e  buscam uma saída no mundo do crime, seja cada dia mais crescente. Ademais, Karpowicz, (2017, p, 49) “explica que o estigma constitui as marcas e atributos pelos quais alguém é criticado e marginalizado pela sociedade.

Acrescenta Karpowicz, (2017, p, 49) “salientando ainda que o estigma num indivíduo prejudica não só  a situação social corrente, mas também as relações já estabelecidas e a imagem que os outros terão dele no futuro, ou seja, a sua reputação.” 

Portanto, as consequências de um estigma podem prolongar-se por toda a vida do indivíduo.  Assim sendo, uma mulher que tem a experiência do  cárcere em seu histórico de vida potencialmente será estigmatizada pela sociedade por um longo  período de tempo.

Assim descreve do autor que:

Quando um indivíduo deixa uma comunidade após haver residido nela por alguns anos, ele deixa atrás de si uma identificação pessoal, não raro presa a uma biografia bem circunstanciada que inclui suposições sobre como ele provavelmente “acabará”. Em sua comunidade atual, o indivíduo dará margem, também, a que outros componham uma biografia sua, um retrato completo que inclui uma versão do tipo de pessoa que ele era e do meio ambiente do qual ele saiu. Evidentemente podem surgir discrepâncias entre esses dois conjuntos de conhecimentos sobre ele; pode-se desenvolver algo semelhante a uma dupla biografia, à medida que aqueles que o conheceram e os que o conhecem agora pensam conhecer o homem em sua totalidade. (BARROS; BITTENCOURT, 2020, p. 13).

Desse modo, podemos constatar as dificuldades dessas mulheres no processo de reinserção. A mulher tem uma grande dificuldade com a socialização após sair do presídio, ademais, é perceptível que elas não possuem segurança alguma, sobre tudo porque a maioria são de baixa renda, em situação de vulnerabilidade social. 

Ou seja, o direito à educação e trabalho, importantes mecanismos para assegurar uma vida digna e também à ressocialização, não são garantidos para todas as detentas conforme a lei diz.

Muitas das vezes as encarceradas fazem do seu serviço moedas de troca e dado isto, realizam serviços em troca dos itens necessários à subsistência. 

Para Barros e Bitencourt,  (2020, p. 19) Contudo, “a situação que é imposta a elas no sistema penitenciário em relação a falta do suporte em suas necessidades básicas deixa a desejar, muitas das vezes pelo fato de serem mulheres.” O local no qual seria para, em tese, oferecer mais suporte em relação ao ambiente e necessidades básicas, resta defasado.

De Bangkok, (2018, p. 34) explica que “Outra característica que se faz presente em muitos dos estabelecimentos carcerários, o que existe em muitos é o problema da violência, seja ela física ou moral.”

Destaca-se que essa primeira é a que prevalece na maioria dos casos, pois há uma incidência do passado de todas essas pessoas, ou seja, muitas mulheres que estão inseridas no sistema carcerário possuem trauma na infância, e a condição eventualmente desencadeia uma onda de eventos envolvendo  desafio, agressão física, danos corporais e muitas vezes a morte.

É fundamental que os direitos da mulher sejam respeitados mesmo dentro dos presídios,  pois a Constituição Federal garante aos presos a efetivação de seus direitos mesmo dentro do sistema prisional, por consequência, não há outra lei contra isso e, em regra, ninguém pode violar ou prejudicar qualquer um de seus princípios, garantias e direitos fundamentais.

Acrescenta Barros e Bitencourt, (2020, 19) “De suma importância é, que mesmo dentro do cárcere a mulher tenha os seus direitos mantidos, pois a Constituição Federativa assegura aos presos a efetivação de seus direitos, ainda   que estejam dentro do sistema carcerário.” Desse modo, nenhuma outra lei pode se opor, e, via de regra ninguém pode desobedecer ou lesar nenhum de seus princípios as garantias e os direitos fundamentais.

De acordo com De Bangkok, (2018, p. 35) “Adicionalmente, é imprescindível elucidar que atualmente os prédios do sistema carcerário se encontram em condições precárias e a cada dia o número de mulheres nesse meio   crescem de forma gradativa.”

Nesse diapasão, uma característica a ser relatada também é o direito assegurado a mulher, que se faz presente no Código de Processo Penal, que determina a possibilidade de substituição da prisão preventiva pela prisão domiciliar, no caso de mulheres gestantes ou com filhos de até 12 anos. Tal característica se encontra pautada no artigo 318-A do CPP, porém possui restrições, senão observa-se:

Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que: I – Não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça    a pessoa; II – Não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente. (BRASIL, 1941).

No entanto, sabe-se que, infelizmente, a lei não se aplica ao caso concreto e o número de mulheres que faz jus a esse direito, mas que não as é concedido, é grande. Nesse mesmo seguimento, esse problema também está diretamente relacionado ao sistema jurídico, onde aquilo que está presente em lei somente é cumprido quando convém. Cita-se casos não só de homens, mas mulheres de autoridades que conseguem a substituição do regime de cumprimento  de pena, em tempo recorde (QUEIROZ, 2019, p. 28).

Ainda nesse diapasão, é importante traçar uma análise sobre os aspectos sociais da mulher encarcerada, Póvoa, (2019, p. 09) por exemplo, diz tratar-se da “clientela seletiva do direito penal”. Os registros mostram dados assustadores acerca do perfil da mulher encarcerada. 

Esse perfil, diz respeito diretamente ao sistema que as aprisiona, um sistema que, segrega um grupo específico de mulheres no cárcere bem como fora dele.

As condições precárias das penitenciárias brasileiras, tanto referente ao sexo feminino quanto ao masculino são diariamente questionadas. Não é segredo que o sistema carcerário brasileiro está longe de alcançar as descrições da lei. 

Contudo, a realidade é incompatível com o direito posto e as regras básicas de respeito à dignidade da pessoa humana não são aplicadas.  Inúmeras são as críticas no que tange ao tratamento dentro do sistema carcerário.  Espinoza  (2020, p. 18) aduz que “o cárcere é uma instituição totalizante e despersonalizadora, na qual predomina a desconfiança e onde a violência se converte em instrumento de troca. O único objetivo de quem está ali é sair, fugir, atingir a liberdade.”

As condições que envolvem o encarceramento violam totalmente os princípios da dignidade da pessoa humana, porque a sua violação constitui uma falta grave, e tal ocorrência acontece muito que dentro do sistema, as mulheres não tem o mínimo, como por exemplo, elas não têm kits de higiênico básica, não tem banheiros adequados, lugar adequado para fazer as suas necessidades fisiológicas, nada que venha a ser privado, então isso viola totalmente os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana.

E, nesse mesmo sentido, Lopes, et al.,  (2018, p. 13) apresenta:

A prisão é o lugar da exclusão, mas, quando em liberdade, esses indivíduos já estavam excluídos. Eram, também, estimulados pela sociedade de consumo a ir à busca dos objetos e bens desejáveis. A sociedade do instantâneo, que despreza e descarta os valores e limites, seduz um grupo que deseja desesperadamente fazer parte dos indivíduos “globais”, aqueles que têm autonomia.

Sob essa perspectiva, ao analisar a situação da mulher frente ao cárcere, é essencial levar em consideração a sua hipervulnerabilidade. Ora, a mulher já se encontra em situação de vulnerabilidade pelo fato de ser mulher. 

De acordo com Helpes, (2018, p. 39) “Outrossim, ela se encontra inserida em um sistema marginalizado, sistema esse que pretende excluir uma parcela da sociedade, sem sequer analisar  e dar enfoque às suas necessidades especiais.”

Ainda Helpes, (2018, p. 39)  “A política pública de atendimento a essas mulheres presas é uma necessidade essencial,    pois a falta de oportunidades de trabalho e uma vida digna são fatores que levam essas mulheres a se envolverem no tráfico e se identificarem com o mundo atual, garantindo fácil acesso ao dinheiro e ao poder.”

As prisões não se compatibilizam com a mulheres, elas precisam de um lugar específico e com cuidados específicos, tendo em razão que é um gênero feminino e tem necessidades distintas do masculino. As prisões femininas, tem que ser preparadas para elas, com todos os suprimentos necessários para saúde, bem-estar, boa alimentação e funcionários do sexo feminino que possam dar qualquer apoio necessário (PIRES, et al., 2021, p. 34).

A saúde também é extremamente importante para as mulheres, o que deixou de ser prioridade nas prisões. Dessa forma, o sistema prisional brasileiro precisa atender as necessidades de higiene, como absorventes, lençóis, sabonetes, e tudo o que for necessário para manter uma boa higiene, pois quanto mais locais (presídios) e são desinfetados e vivem em celas sem superlotação, têm menor risco de adoecer. (PIRES, et al., 2021, p. 34).

Em face das características próprias do sistema penitenciário feminino elencadas nessa seção, cabe à discussão acerca das políticas públicas necessárias para efetivação dos direitos fundamentais das detentas.

  1.  INEFETIVIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE RESSOCIALIZAÇÃO DAS PRESIDIÁRIAS

Sabe-se da falta e necessidade de investimento em políticas públicas de ressocialização para os presos, e o caso das mulheres apenadas é ainda mais complexo em virtude de suas condições demandarem peculiaridades, como por exemplo, em casos de maternidade. 

Aproximadamente, 5% da população carcerária é feminina, sendo que esse sistema precisa desenvolver medidas para melhorar as condições dessa população no sistema prisional, sendo assim medidas como penitenciárias que contemplem suas necessidades como berçário e creche, sala de atendimento em saúde, locais para atividades. Além da necessária capacitação dos profissionais envolvidos nessa realidade, é preciso que haja uma iminente igualdade de tratamento entre todos os colaboradores envolvidos na penitenciária (CUNHA, et all., 2021, p. 77).

E de acordo com INFOPEN – Levantamento de informações penitenciárias atualização – (2019), pensando na reinserção social da pessoa, que esteve anos encarcerada, considerando que o tempo médio de encarceramento previsto em julgamento para a população prisional brasileira é de 4 a 8 anos, faz-se necessário a existência de políticas e ações afirmativas que visem a auxiliar nesse processo (INFOPEN, 2019).

E considerando, assim como já exposto, que dentre estas políticas, o trabalho é fator fundamental para auxiliar no processo, fazendo-se necessário pensar que tipo de trabalho essas pessoas, que voltam para a sociedade extramuros, estão tendo acesso e sob quais condições.

Cabe ressaltar que a proposta de trabalho dentro do sistema prisional como a finalidade de libertar o encarcerado da ociosidade, geralmente associada ao trabalho físico, e assim então enquanto a atividade não for eficaz para aumentar a qualificação profissional do executor ou melhorar sua situação atual para que não venha a regredir, pode considerar que este formulário  não contribui para a contratação de graduados, porque assim se viesse a contribuir seria eficaz  para a segurança do emprego daquelas que saem da prisão, e precisam ser inseridas no mercado de trabalho. 

Assim, é preciso entender o atual ambiente laboral brasileiro, pois é nessa estrutura que as pessoas irão reinserir. Logo,

Frente a essas condições do sistema penitenciário, as políticas públicas devem ser baseadas na defesa dos direitos dos cidadãos com ênfase na dignidade da pessoa humana, em programas e projetos que garantam as assistências previstas na Lei de Execução Penal, além de um maior investimento tanto em controle como em participação e fiscalização aos Órgãos de execução penal. Já as políticas públicas voltadas para a ressocialização dos presos devem estar focadas em um processo de diminuição ou minimização dos níveis de vulnerabilidade e das pioras em decorrência do processo de aprisionamento. É importante destacar a necessidade de união entre as  políticas sociais e as de segurança pública visando a possibilidade de efetividade da ressocialização dos apenados (CUNHA, 2021, p. 01).

Outros pontos importantes e fundamentais para o desenvolvimento das políticas públicas e ressocialização das detentas principalmente no Brasil é: investir em trabalhos  voltados às detentas no meio educacional com o foco de abrir escolas no ambiente em que estão inseridas, para que as mesmas tenham um acesso à educação e que a prisão não as impeça de ter uma aprendizagem de qualidade. 

Para Pestana,  (2017, p. 39) “Visando assim, a escolaridade mínima e garantindo com isso melhores condições futuras, quando saírem e que forem ingressar no meio social novamente.”

Além disso, a educação prisional deve ser pedagogicamente focada em geral para jovens e adultos com materiais didáticos, tecnológicos e com educadores que foquem nessa realidade.

A realidade das mulheres no sistema prisional é que as que estão inseridas tem idades entre 18 a 36 anos, e a maioria que apresentam baixa ou nenhuma escolaridade, são jovens. Todas têm filhos, famílias dependentes, baixa escolaridade, provém de classes sociais desfavorecidas economicamente e se envolveram em atividades informais de trabalho antes do encarceramento (PIOVESAN, 2018, p. 56).

Diante do perfil estabelecido, verifica-se as precárias condições a que são submetidas as detentas:

A precariedade das condições de encarceramento das mulheres pode ser observada na estrutura física dos espaços onde são mantidas. No Brasil, existem, em média, 1.424 unidades prisionais das quais a grande maioria foi construída para atender aos homens.  As mulheres encarceradas, em quase todos os casos, ocupam edificações que não foram construídas para elas. Em decorrência disso, acabam ocupando prédios adaptados, que não consideram as suas especificidades: penitenciárias masculinas reformadas, prédios públicos desativados e até penitenciárias masculinas em pleno funcionamento que, quando recebem mulheres, passam a ser chamadas de mistas (DOTTI, 2018, p. 20).

Cabe ressaltar que qualquer indivíduo que cometa um crime ainda assim continua fazendo jus aos seus direitos, que independentemente, devem ser respeitados e observados de forma contínua e em concordância com as leis.

Destaca-se que a Constituição Federal de 1988  possui como fundamento, no art. 1º, inciso III, a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 198). E deve ser aplicado indistintamente a todos. 

De acordo com Pires, (2018, p. 57) “Com efeito, a pessoa privada de liberdade não está isenta desse direito. Ressaltando também no artigo 83, a Lei de Execução Penal aborda como deve ser estruturado os estabelecimentos penais, a fim de atender às necessidades básicas.”

Em relação à taxa de aprisionamento, os dados do INFOPEN indicam o número de mulheres presas para cada 100 mil habitantes. O Brasil figura na sétima posição mundial, com uma taxa de 18,5 mulheres presas a cada 100 mil habitantes, ficando atrás da Tailândia (66,4),  Estados Unidos (64,6), Rússia (36,9), Taiwan (23,0), Vietnã (22,2) e Myanmar (18,8). Tal posição é negativa, se considerar os altos números do ranking. A grande numeração a cada 100   habitantes de diferentes sexos corrobora para o disposto (RIBEIRO, et al., 2021, p. 39). 

As condições desumanas, a violência e a superlotação que historicamente caracterizaram as prisões brasileiras permanecem entre os problemas mais sérios de direitos humanos do país.

Em questão de trabalho, as políticas públicas poderão estar centradas a implantação de indústrias ou outras atividades que valorizem seu desenvolvimento nas prisões. O trabalho em unidades prisionais, está intimamente relacionado a profissionalização porque para se conseguir um trabalho precisa-se assim ter qualificação (RIBEIRO, et al., 2021, p. 39).

Sendo assim, são necessárias políticas públicas que além de qualificar a detenta irá também desenvolver habilidades e competências também com uma formação assim consciente da realidade.

Cabe salientar que a falta de políticas públicas deixa muito a desejar, não é porque as mulheres estão inseridas nas prisões que não merecem ser notadas pelos seus direitos.

Veríssimo (2109, p. 56) explica que: “O déficit   de ajuda à saúde delas que estão privadas de liberdade é uma pauta ainda irreversível. A exclusão também é um fator que pode ser negativo quando se trata de grupos socialmente desfavorecidos superior à população feminina.”

No fim, a sociedade brasileira está profundamente enraizada em um modelo patriarcal, a pessoa que inscreve a mulher em posição  subordinada e depreciação.

Esse modelo social é atribuído ao número de mulheres e aumentou substancialmente quando eram negras, indígenas, lésbicas, residentes em áreas rurais e na prisão, levando ao aumento da vulnerabilidade e desrespeito total, e à vista disso, observa-se que a política de saúde das mulheres não consegue expandir seu foco nesses grupos para atender às suas reais necessidades (VERÍSSIMO, 2109, p. 56).

Eis a observação de Moreira, (2017, p. 22) “a respeito do sistema penitenciário brasileiro: A realidade evidencia que os institutos prisionais são espaços de desumanização e de disseminação de doenças.”

Embora o Estado tenha o dever de elaborar políticas públicas que garantam acesso à saúde do cidadão e da população carcerária, isso não ocorre dentro e fora dos muros das prisões.

A Lei de Execução Penal prevê, ainda, que a sentenciada será alojada em cela individual, dotada de dormitório, sanitário e lavatório, sendo essa cela salubre com área mínima de seis metros quadrados (BRASIL, 1984).

Fato que também se encontra em total desrespeito pelo Estado, já que o grande número carcerário não permite seguir à risca o formato de lei.

Sendo assim, a inclusão de políticas públicas no sistema carcerário seria de natureza essencial para ajudar na ressocialização das detentas, porque sabe-se que o encarceramento não possui uma natureza educativa e sim repressiva, tendo em vista que quanto mais tempo essas mulheres se encontram encarceradas, mais chances elas terão de se tornar pessoas hostis, agressivas e brutas, fazendo com que, ao se deparar com a liberdade, venha cometer novas atividades ilícitas. Direção completamente oposta à função ressocializadora que prega o sistema prisional brasileiro (VERÍSSIMO, 2109, p. 56).

E é neste aspecto que Ramos, et al. (2019, p. 64) afirmam que:  “[…] o aumento da rigidez penal, seja em anos de condenação ou em determinado tipo penal, não contribui para a diminuição da criminalidade ou mesmo, para a efetiva ressocialização do preso.” 

Pelo contrário, os dados revelam que tende a aumentar a população carcerária. No entanto, é imprescindível um programa de ressocialização das detentas por meio da qualificação profissional, da educação, do trabalho, da progressão da pena,   permitiria sua reintegração à sociedade e esse seria a princípio o tratamento digno.

Algumas das mulheres são presas com a família construída, outras gravidas. Com isso há uma demanda por atendimento pré-natal atendimento no momento do parto e escolta no hospital, bem como de um lugar limpo e propício para cuidar de seu recém, nascido. 

Este gênero   sofre ainda mais discriminação familiar por estar presa. De acordo com Queiroz (2019, p. 44),  na obra “Presos que menstruam” quando uma pessoa é presa, sua família geralmente fica em casa e espera seu retorno. Quando uma mulher é presa, a história comum é que ela perdeu o marido e a casa, e seus filhos estão espalhados entre famílias e abrigos.

Ou seja, enquanto o homem volta para um mundo que já o espera, ela vai embora e precisa reconstruir seu mundo. Tal reflexão remonta os aspectos de fragilidade que a sociedade   instiga ver do lado feminino da história. 

Entretanto, tal situação apenas remonta o qual forte é o famoso “sexo frágil”, capaz de suportar a pior dor no ato de sua prisão, e conseguir se inserir no seio social como alguém que busca e possui uma visão de futuro para si e para os seus. 

Queiroz (2019, p. 44),  “uma   situação que não se pode negar no atual sistema carcerário é a falta de políticas institucionais que visem a efetivação dos direitos fundamentais inerentes à pessoa presa.”

Ramos, et al., (2019, p. 64)  “O sistema prisional brasileiro foi feito pra punir o seu caráter repressivo e violador de direitos humanos. Levando-nos a questionar até onde se é efetivado os reais direitos fundamentais da mulher numa sociedade cheia de mazelas crescentes devido às más políticas sociais de desenvolvimento humanitário.”

A pena imposta pelo legislador e posteriormente pelo juiz tem caráter sancionador, para que os que presos que forem não voltem a cometer os delitos. Ocorre, no entanto, que muitas das vezes, a mulher encarcerada acaba por perder seus direitos fundamentais, sobretudo a dignidade humana, princípio fundamental maior existente no ordenamento jurídico brasileiro e que rege todas as relações em todos os âmbitos de direito.

Ramos, (2019, p.16) Nesse âmbito, a “dignidade da pessoa humana, esta é um conjunto de valores e  princípios que está diretamente ligada aos direitos humanos e fundamentais, pois também garante que os cidadãos tenham seus direitos reconhecidos e respeitados”  E é a partir daí que se inicia a efetivação de seus direitos, por meio da dignidade, igualdade e respeito. Atualmente, não deveria haver nenhuma dúvida de que os direitos humanos compreendem os direitos dos homens e das mulheres.

O princípio da dignidade da pessoa humana constitui núcleo fundante e essencial de todos os direitos fundamentais previstos na ordem constitucional, e considera cada ser    humano igual e possuidor do direito de desenvolver-se física e psiquicamente, com respeito à vida e à liberdade. Nessa perspectiva, a dignidade da pessoa humana encontra-se no cerne da ordem jurídica brasileira concebendo a valorização da pessoa  humana como sendo razão fundamental para a estrutura de organização do Estado (FERMENTÃO, 2021. p. 82).

Sabe-se que, os direitos humanos são uma ferramenta importante para a proteção de todos os cidadãos, e no Brasil existem muitos documentos que protegem esses direitos, bem como garantias básicas destinadas a proteger a dignidade humana. 

De acordo com Ramos, (2019, p.16) “A lei foi ratificada na Constituição Federal de 1988, e o Código Penal de 1940 limitou o direito do Estado de punir, garantindo um tratamento que respeite a vida humana.”

Em vista disso a Constituição Federal de 1988  foi essencial nos esforços para a consolidação dos direitos humanos no país, ainda que não tenha sido uma forma totalmente efetiva para que fossem colocados em prática em todos os âmbitos sociais. O artigo 4º estabelece que: I- A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: […] II – prevalência dos direitos humanos (BRASIL, 1988).

O reconhecimento dos direitos humanos é uma realidade no país, porém, sua colocação em uma realidade prática, no cotidiano ainda demanda de esforços, como no caso do sistema carcerário do país, alterando-se a ideia de que os apenados não deveriam ser destinatários de direitos. Para Piovesan (2018, p. 54):

A dignidade da pessoa humana, (…) está erigida como princípio matriz da Constituição, imprimindo-lhe unidade de sentido, condicionando a interpretação das suas normas e revelando-se, ao lado dos Direitos e Garantias Fundamentais, como cânone constitucional que incorpora as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico a todo o sistema jurídico brasileiro. Como um fundamento do Estado Democrático de direito, o princípio da dignidade humana está  expressamente previsto na Constituição Federal, em seu artigo 1º, III: Art. 1º – A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana.

Nesse sentido, considerando que a dignidade da pessoa humana é princípio inerente a todo e qualquer ser humano, a falta de aplicações deste princípio dentro a situações diárias dentro dos presídios, onde as detentas são tratadas de forma desumana, tendo condições precárias durante a sua estadia, gera a lesividade da dignidade humana, princípio fundamental da Carta Constitucional. 

Fragoso, (2019, p. 45) “A principal função dos presídios é a transformação na personalidade das presas, visando ressocializá-las a partir de uma reflexão, introspecção e arrependimento por parte desta.”

A aplicação do princípio da dignidade humana tem sido medíocre. Há uma necessidade de melhor implantação deste nos presídios brasileiros, e uma ampla fiscalização. 

Tendo em vista   que o Estado brasileiro passou por uma série de reformas nas últimas décadas, sob a influência de mudanças na conjuntura internacional nas décadas de 1950 e 1960, percebe-se que o Brasil implementou novas formas de gestão e planejamento. A partir das décadas de 1970 e 1980, houve uma nova fase de redemocratização, que culminou com a instalação da Assembleia Nacional Constituinte em 1988 e a promulgação de uma nova constituição. A Magna Carta amplia os direitos sociais e os garante por meio de políticas públicas.

  1.  A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS NO SISTEMA CARCERÁRIO

O Brasil tem a quinta maior população carcerária feminina do mundo, depois de Rússia, Estados Unidos, China e Tailândia. Geralmente, as mulheres presas são mães, com baixa escolaridade e baixa classe econômica. Em uma situação caracterizada por extremas desigualdades sociais, muitos precisam dar apoio às famílias para que o crime não seja mais uma opção, mas uma questão existencial. Notavelmente, 68% dessas mulheres se tornaram prisioneiras por seu envolvimento no tráfico de drogas não associado às maiores redes de organizações criminosas, mas para pequenos negócios ou mesmo consumo (FRAGOSO, et al., 2019, p. 19).

O país não cumpre a constituição, as necessidades básicas do passado se deterioram ano a ano, resultando em crescimento populacional exclusão social, marginalizando inúmeras pessoas e fazendo com que um número crescente da população brasileira sofra. 

Essa situação, marcada pela negligência estatal, se agrava na prisão. Os relatórios indicam que muitas  mulheres presas por problemas de saúde, vítimas de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) ou infecções devido à falta de instalações de saneamento básico e outras mulheres grávidas que nunca receberam cuidados pré-natais. Estima-se que 622 mulheres grávidas ou lactantes no Brasil sejam mantidas em locais com saneamento precário e falta de estruturas adequadas para apoiar seus recém-nascidos (FRAGOSO, et al., 2019, p. 20).

De fato, essa realidade fere o princípio da dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, III), além de violar o artigo 6º da Constituição Federal (reconhecendo a saúde como direito social indispensável de todos) onde foi privado de sua liberdade logo após seu nascimento (BRASIL, 1988).

Em  seu livro Menstruating Prisoners, Nana Queiroz  (2019, p. 55) “entrevistou várias detentas que relataram a falta de itens específicos para mulheres, como absorventes.”

Neste caso, há relatos de mulheres usando migalhas de pão (internamente) durante a menstruação, o que viola o artigo 5 das Regras de Bangkok: o alojamento de mulheres presas deve conter as instalações e materiais necessários para atender às necessidades de higiene específica das mulheres, Inclui instalações sanitárias gratuitas almofadas e fornecer água regularmente para o cuidado pessoal de mulheres e crianças, especialmente aquelas que trabalham na cozinha e aquelas que estão grávidas, amamentando ou menstruadas (QUEIROZ, 2019, p. 55).

Queiroz  (2019, p. 55) “Além disso, muitos relataram que o médico responsável havia prescrito ansiolíticos e antidepressivos em conjunto com a administração penitenciária, sem nenhuma prescrição médica, apenas para torná-los ‘obedientes’.”

A superlotação em presídios femininos é outra realidade vivenciada pelas detentas. No início de 2018, foi lançada a Pesquisa Nacional de Informações Penitenciárias, e os dados são preocupantes. Entre 2000 e 2016, o número de mulheres encarceradas aumentou 656%, ou cerca de 6.000 mulheres foram encarceradas em 2000, em comparação com mais de 42.000 em 2016 (SAAR, 2020, p. 49).    Enquanto isso, a taxa média de crescimento para os homens no mesmo período foi de 293%, refletindo a curva ascendente do encarceramento em massa para as mulheres (SAAR, 2020, p. 49).

Esse salto se deve em grande parte à nova legislação sobre drogas, que entrou em vigor em 2006 e agora abrange 68% das mulheres presas no Brasil. Relatórios dizem que os presos compartilharam uma cela projetada para 12 com 46 presos. Portanto, diante do exposto, evidenciam-se diferentes tipos de violações de direitos humanos e práticas inconstitucionais em presídios femininos (QUEIROZ, 2019, p. 57).

Nesse sentido, o Estado deve intervir para implementar a legislação brasileira que garante os direitos das mulheres. É preciso avançar nessa frente, como a decisão do Superior Tribunal Federal (STF), em fevereiro de 2018, de colocar em prisão domiciliar gestantes e mães de crianças menores de 12 anos. Além de punir e dar segurança à sociedade, o objetivo principal da punição é garantir a ressocialização do indivíduo (SAAR, 2020, p. 52).

Dessa forma, o caráter universal dos Direitos Humanos é mitigado, apesar da positivação desses direitos em âmbito internacional e pelo próprio ordenamento jurídico brasileiro através da lei constitucional, gerando a violação à dignidade e aos preceitos normativos consolidados na esfera judicial.

Direitos humanos aprovados na lei brasileira Tratados e Convenções Internacionais, incluídos na Constituição Federal de 1988. Várias disposições legais sobre a proteção dos direitos básicos dos cidadãos.

A superlotação carcerária é uma evidência de que o sistema prisional não respeita os direitos fundamentais dos presos porque sua integridade física ou moral não é respeitada. 

Nesse  sentido, Veríssimo,  (2019, p. 55) refere-se à Lei de Execução Penal no parágrafo único do artigo 88: “O infrator será mantido em cela separada com quarto, banheiro e pia.” Parágrafo único – os requisitos básicos para uma unidade celular são: a) ambiente saudável devido à competição de fatores de aeração, insolação e regulação do calor adequados à sobrevivência humana; b) área mínima de 6 metros quadrados (seis metros quadrados). Na assistência judiciária aos detentos, o autor Veríssimo,  (2019, p. 55) “cita a Lei de Execução Penal em seus artigos 15 e 16.”

Para a autora acima, a assistência social é um direito da detenta consagrado na LEP, onde a detenta deve ser protegido para estar pronto para sua liberdade. Os assistentes sociais devem trabalhar para preparar as presas para o acesso ao trabalho, regularização de documentos e socialização. Atualmente, o serviço carece de pessoal e é maioritariamente prestado por voluntários, incluindo jovens académicos, figuras religiosas e alguns outros em solidariedade. Claramente, o Estado não leva muito a sério esse direito das detentas.

Os direitos humanos são inatos a todo ser humano, seja ele livre ou privado de sua liberdade. No conceito de Souza, (202, p. 57) “a dignidade humana constitui a qualidade intrínseca e única de cada ser humano, tornando-o digno de igual respeito e consideração por parte do Estado e da sociedade, que é complexa nesse sentido.”

O direito e o dever fundamental dos indivíduos de serem livres de todo e qualquer ato degradante e desumano, e as condições mínimas de existência para garantir uma vida saudável, além de proporcionar e promover sua participação ativa e corresponsável no destino de seus próprios sonhos.

E diante disso de acordo com o Veríssimo (2019, p. 43) “No sistema prisional brasileiro, o Estado geralmente viola os direitos fundamentais dos presos com respeito à dignidade, violando, assim, o ordenamento jurídico correspondente e gerando tratamento degradante, e vergonhoso aos detentos.” As penas privativas de liberdade aplicadas nos presídios convertem- se em penas cruéis e desumanas, sendo-lhes negado todo e qualquer direito à existência minimamente segura e salubre.

Dotti (1998), acrescenta ainda que:

A função da pena no Estado de Direito deve atender às exigências de proteção de todos os indivíduos evitando que a privação de liberdade se transforme na expressão hodierna das antigas penas de expulsão da comunidade, a exemplo da perda da paz, quando o proscrito era banido da comunhão familiar. (LISZT, tratado de direito penal alemão, trad. De jose Hygino Duarte Pereira, Rio de Janeiro, 1899, t.1, p.6, nota B (DOTTI, 1998, p. 32).

Em relação às garantias fundamentais da pessoa humana, Queiroz (2019, p . 45), manifestar-se que: “A Declaração dos Direitos Humanos estabelece as garantias fundamentais do homem e, em seu preâmbulo, além da liberdade, paz e justiça, estabelece o princípio da igualdade para todos. artigo 3º da Magna Carta, afirma que toda pessoa  tem direito à vida, à liberdade e à segurança.” Porém, contrariando esta norma, incide outra realidade, em que a segurança pessoal não é garantida.

Na maioria dos casos, nas instituições penais, a superlotação retira essa sensação de segurança. As frequentes lutas e mortes nesses locais são uma prova direta desse caos. 

De fato, diante do conteúdo proposto e das realidades do sistema prisional, o Estado não pode garantir mandamentos constitucionais, especialmente aqueles que não são respeitados pelo poder  público. Sendo assim, prescindível que as políticas institucionais previstas na seção anterior se  tornem válidas (VERISSIMO, 2019, p. 49).

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo, ao tratar da violação dos direitos fundamentais das mulheres no sistema carcerário feminino, demonstrou que desses estabelecimentos a falta de políticas públicas pode afetar diretamente o seu direito como ser humano.

No tocante à problemática da pesquisa, que se apresentou com o seguinte questionamento: Como as condições envolvendo o encarceramento feminino se relacionam com os princípios fundamentais inerentes a elas? Foi possível concluir que as condições que envolvem o encarceramento violam totalmente os princípios da dignidade da pessoa humana, porque a violação desses princípios a elas, constituem uma falta grave. E isso, acontece muito porque dentro do sistema, as mulheres não tem o mínimo, como foi relatado durante o trabalho de subsistência para sobreviver. Como exemplo dessa situação caótica podemos citar: elas não têm kits de higiene básica, não tem banheiros adequados, lugar para fazer suas necessidades, nada que venha a ser privado. Então, isso viola totalmente os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana.

Portanto, a hipótese da pesquisa, a qual se reporta à noção de que a igualdade e os direitos fundamentais são lesados dentro do sistema penitenciário pela falta de políticas públicas, bem como a falta de políticas institucionais penitenciárias, constatou-se positiva. No   decorrer da pesquisa foi possível perceber que a falta de políticas públicas voltadas para as condições femininas da condição do encarceramento feminino é uma condicionante ainda maior  para a lesão da dignidade da pessoa humana que dentro do sistema eles visam pelo menos no papel garantir uma passagem mais tranquila dentro do sistema prisional. Porém, sabe se que o propósito legal do encarceramento para as detentas sentenciadas é assegurar o papel da  ressocialização no sistema prisional. Na prática, entretanto, isso não acontece de forma eficaz e abrangente, pois a falta de efetividade das políticas públicas de modo integral e baseada no princípio da dignidade da pessoa, prejudica a ressocialização das detentas e, consequentemente,   sua reintegração social de forma digna.

Diante do exposto, tornou-se perceptível como o Estado e o próprio sistema reduz as expectativas dessas pessoas em face da ressocialização e até mesmo dentro de sua própria casa,  tendo que se reconstruir.

Nesse sentido, a análise das políticas públicas relacionadas às realidades vivenciadas por essas mulheres evidencia a necessidade de uma nova perspectiva de atuação nacional em todos os âmbitos. Melhorias essas que exigem de seus governantes que trabalhem em prol do progresso dessa classe. Traduzir as normas que protegem os direitos das mulheres presas em prática dentro das instituições prisionais é um grande desafio a se cumprir nos dias atuais, principalmente porque falta iniciativa. Assim sendo, é necessário investigar em profundidade as dimensões estruturais da atual criminalização e encarceramento de mulheres, para assim se chegar a uma forma inclusiva.

Assim, a falta de políticas públicas para atender esses presos após cumprirem a pena também é uma via de mão dupla para quem trabalha como público e em seu nome do público.   Em muitas situações, não por falta de vontade, mas pela falta de oportunidade de trabalhar para que possa viver com dignidade, muitas vezes leva essas mulheres a se envolverem no tráfico de  pessoas e a se identificarem com um mundo hoje visto como garantia de fácil acesso ao dinheiro e ao poder. A implementação de uma política educacional com base sólida e que valorize o sujeito e sua autonomia, apoiada por uma política pública séria de envolvimento social, econômico e político dessas mulheres, detém a capacidade de poupar a reincidência na prática   criminosa.

Ademais, foi visto até aqui que as faltas de políticas públicas influenciam de maneira negativa na vida da presa e recém socializada. Ocorre que o próprio sistema acaba por desvalorizar essas mulheres quando lhes nega atendimento básico como o fornecimento de absorventes, papel higiênico e uma comida de qualidade. Tal violação é caracterizada como crime punível, mas, dentro do sistema atual, não há quem acuse o acusador. De modo geral, constatou-se que ainda há muito percurso a recorrer, a efetivação dos direitos básicos da mulher  dentro do sistema carcerário é o primeiro de muitos passos que a sociedade deve dar em conjunto com o Estado, para prover a sua ressocialização em um momento posterior.

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1Juliana Rodrigues Ascenço, graduanda em Direito pelo Centro Universitário São Lucas – Porto Velho-RO, autora do presente artigo. Endereço eletrônico: ascencojuliana@mail.com
2Iago Zalenda Quintela Bejarana, graduando em Direito pelo Centro Universitário São Lucas – Porto Velho-RO, autor do presente artigo. Endereço eletrônico: iagozalenda@gmail.com
3Delner do Carmo Azevedo, professor de direito no Centro Universitário São Lucas – Porto Velho-RO, pos-graduado em Direito Ambiental, Direito Administrativo e Gestão Pública, Direito Processual Civil, Direito Tributário, orientador do presente artigo.  Endereço eletrônico: delnercazevedo@gmail.com